O Cabral a que me refiro não é, por
certo, esse nosso viajante Governador, o da turma do lenço, a quem o Rio, com
justiça, hoje castiga em baixíssimos índices de aprovação, que refletem o
descalabro nos transportes públicos de massa, na educação e saúde.
Reporto-me a outro
e muito bem conhecido, Pedro Álvares Cabral, o descobridor
oficial da Terra de Santa Cruz que, por ordem de el-Rei D. Manuel, ancorou a frota de treze naus na baía de Porto
Seguro.
Teve aqui o seu
banho de fama, rumando em seguida, para as brumas do esquecimento, nas bandas
da Índia, com as especiarias e miragens
de império estendido muito além dos meios e população da heroica gente lusa que
o Infante D. Henrique lançara no mar oceano.
Por primeira vez
na República, por que Luiz Inácio Lula da Silva – para sua honra –
não ousou enveredar pelos caminhos chavistas das eleições, preferindo, ao invés
de terceiro mandato, passar a faixa à companheira petista Dilma Rousseff.
A reeleição –
esta nova praga brasileira – fora inventada em má-hora pelo professor Fernando Henrique Cardoso, e até hoje,
em todos os níveis da República, pagamos o amargo sobrepreço de corrupção e
desgoverno que tal prática, tão antibrasileira, trouxe para prefeitos,
governadores e presidentes.
Dos dúbios critérios
de Lula da Silva, há de escrever, com seu estilo distante e quiçá impessoal,
esta amorfa entidade que chamam de História,
cujas páginas surgiram por primeira vez nos circunstanciados relatos, por vezes
cômicos, por vezes terríveis, mas quase sempre humanos, do mais insigne cidadão
da hoje sepulta Halicarnasso. Assinale-se, por oportuno, que depois de décadas
de relativo menosprezo, Heródoto, o pai da história, semelha superar o seu eterno rival, também grego, o
ateniense Tucídides.
Mas voltemos às
realidades terrenas do ciclo de Lula da Silva. Após haver inventado, malgrado
opiniões em contrário, a sua sucessora, cunharia a seguir o apelativo – para ele
objetivo e não depreciativo – de poste, com
que foi mimoseado o seu ex-Ministro da Educação, Fernando Haddad e a própria Mulher
do Lula (como Dilma era conhecida no Nordeste). O fundador do P.T. não
acha, de resto, pejorativo esse apodo, embora não creio todos tenham a mesma
opinião.
Já discuti e
muito esse assunto, e não creio oportuno aqui aprofundá-lo. Basta apenas dizer –
e com tristeza – que muito depõe contra o critério do eleitor ceder a outrem o
critério de determinar quem deva e quem não deva ser eleito. Algum dia, o candidato será escolhido não
por indicação, mas por mérito, proposta e folha corrida.
Pensando bem, de 1500 para cá as
coisas não mudaram tanto quanto parecem. Aos pobres e incautos indígenas que o
acolhem na praia de Porto Seguro, e depois serão os perplexos assistentes da
Primeira Missa, Cabral presenteia com miçangas e bugigangas, artefatos de
discutível valia, mas que causam admiração aos índios pelo brilho, formato e
consistência. Mais surpresos ainda ficariam pela indumentária da estranha
gente, vinda não sabiam de onde.
Apesar dos pífios
resultados de quase três anos de mandato, beira o estarrecedor que o nível de
aprovação da Presidente Dilma Rousseff
se afaste dos baixios dos tempos das surpreendentes passeatas de junho.
Sem falar
da inflação, que ela trouxe, com singular estouvamento, de volta, e que ora nos
ronda, quase sempre estourando o teto dos índices em combate que mais parece a
campanha dos exércitos derrotados da OKW
nazista, em contínua retirada, que a patética linguagem dos comunicados não
podia disfarçar.
Para quem se
diz desenvolvimentista, quanto açodamento e quanta trapalhada ! Os métodos são
discutíveis – e os blogs já se detêm
bastante no seu caráter irregular, no seu amadorismo e, sobretudo, no
respectivo assistencialismo.
Ao invés de
obras de infraestrutura, na carência dos investimentos e na sua irregularidade,
no portentoso ralo da corrupção – e, por falar nisso, que dizer da falta de
saneamento básico em tantas cidades brasileiras – continuam no mercado as
miçangas e as bugigangas que, como uma nêmesis, nos perseguem desde Cabral.
Para quem se
preocupa tanto com números, as estatísticas castigam já não digo no melancólico
índice de crescimento negativo do PIB
neste terceiro trimestre de 2013 de menos 0,5%. Em todo o governo Dilma,
o crescimento do PIB fica em 2,1%,
num parâmetro igual ao segundo mandato de FHC,
mas não ao primeiro, no começo do Plano Real, que supera o dílmico índice com
2,4%.
Somos a terra
do impostômetro, do empreguismo público desvairado, da opção pelo consumo, com mais
carros nas ruas, com escapamentos de terceiro mundo (faltam os controles
vigentes no circuito Elizabeth Arden), e os lucros das feitorias vão
para as combalidas matrizes no Primeiro mundo. O assistencialismo está aí no
bolsa-família, já na segunda geração, e nos diversos mimos que artistas de
segunda categoria anunciam, como descontos em eletrodomésticos.
Por quanto
tempo nos caberá a velha maldição de Cabral, como se permanecêssemos para
sempre desvalidos. O que se precisa é de trabalho digno, higiene e saneamento
(que trazem saúde), educação (que constrói a dignidade e o futuro). Falamos de
estradas desde Washington Luís, JK as rasgou e construíu, e os
pósteros permitiram a sua deterioração. Falamos de bom governo e se inventa a
reeleição, que é a mãe da ubíqua corrupção e do desgoverno sistêmico.
Que país e que
governo temos, se quando os índices do IBGE
começam a despencar, devemos agradecer que ainda dispomos de instituições
de estado, que nos servem a verdade e não a subdesenvolvida patranha dos
índices manipulados de Cristina, viúva de Kirchner.
Na verdade, o
que se carece é reinventar o Brasil. Agora, um morador de rua é o primeiro a
ser castigado pelos excessos das passeatas de junho. Isso me relembra o infeliz
que foi parar na cadeia por haver comido uma casca de árvore.
De trabalho,
dedicação e dignidade o Povo brasileiro não é pobre. Precisamos com urgência
trazer estes singelos mas sinceros princípios para Brasília e suas instituições tão afastadas da
realidade brasileira.
Poderá alguém
negar que a meta síntese de Juscelino se transmutou em cruel caricatura?
(Fontes
subsidiárias: Folha de S. Paulo, O
Globo )
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