quarta-feira, 6 de junho de 2012

O Falso Domínio Ruralista

                           
        A bancada ruralista, este epifenômeno da distorcida representação dos Estados, em que unidades da Federação esparsamente povoadas têm inflado o número de deputados, enquanto  se impõe tetos legais as de maior densidade demográfica, espelha a absurda realidade de que o peso do voto não seja o mesmo em todo o país.
        É manifesto que uma representação desequilibrada, em que o sufrágio do cidadão vale mais no Amapá do que em São Paulo, não está no interesse nacional. A Constituição de 1988 carimbou como válidas as benesses do regime militar que para assegurar maioria no Congresso optara pelos grotões em detrimento  da paridade de voto e cidadão para a Câmara dos Deputados. Na teoria constitucional, é bom lembrar que a Câmara baixa representa o Povo, enquanto o Senado assegura a representação paritária dos Estados.
      Salta aos olhos, portanto, que são necessários mecanismos para garantir que a vontade nacional seja respeitada. Se chegamos a esse desvirtuamento da representação, pela miopia dos constituintes de 1988 – atribuindo peso desproporcional a áreas de menor densidade populacional  - grita aos céus que não se pode conviver com  sistema que não reflete o sentir da Nação brasileira.
      Das duas, uma: ou se submetem  a referendo leis que venham a ser contestadas por não expressarem a lídima vontade do Povo brasileiro ou, o que seria mais simples, se estabeleça a paridade do voto em todo o Território Nacional. Como a representação dos Estados tem a igualdade política assegurada pelo Senado – segundo o modelo americano -, as bancadas para a Câmara, a cada censo, devem corresponder a um quoeficiente único. Os estados que porventura tiverem povoação igual ou inferior ao dito quoeficiente elegerão um deputado para a Câmara, valendo a extensão do território estadual como distrito eleitoral. Este é o sistema americano em que o número de assentos na Câmara (em nosso caso, 512) se distribui conforme o peso demográfico estabelecido pelo estado federativo, consoante o último censo demográfico. Com isso, se evitam os chamados ‘burgos podres’, resquícios de antanho na Inglaterra do século XIX, e que deram muito trabalho para serem varridos para a lata de lixo da História.
      Vemos agora se prefigurar no Congresso mais uma clamorosa discrepância com a vontade nacional. Dispondo de  representação inchada, em que avulta a vanguarda do atraso, um Congresso com uma desproporcional bancada ruralista se arma para uma fronda contra os vetos da Presidente Dilma Rousseff e a indispensável  Medida Provisória.
      O país anfitrião da Rio + 20 seria transformado em anacrônico êmulo da Malásia e de tantas outras nações que permitiram a destruição dos próprios recursos naturais. Dessarte, como em episódios do passado (V. as pantomimas dos relatórios Aldo Rebelo e Paulo Piau) se prepara o quadro tendente ao atropelamento do Código Florestal, com uma provocadora profusão de emendas (620 !), e pelo controle da Comissão (17 deputados e senadores ruralistas em um total de 26 parlamentares).
     A própria Presidente irritou-se com a arrogância de tais bancadas, criticando o ‘egoismo burro’dos que querem crescer sem preservar. É um modelo às avessas, na contramão da História que, se prevalecer, nos transformará na risota da Conferência e, pior do que isso, numa estúpida escolha, em que, iludidos por falsos e efêmeros ganhos, essa gente desembesta rumo aos inevitáveis penhasco, como os lemingues que semelham serem os seus modelos preferidos.
      Se procede que tais representações foram indicadas pelos líderes partidários, cabe ao Governo determinar os critérios que presidiram a tais seleções. Se forem acaso similares àqueles que nortearam a votação de toda a bancada do PMDB, sob as ordens do deputado Henrique Alves  (RN), é mais do que tempo para determinar a que Administração o líder partidário pensa representar.Não é aceitável que Suas Excelências se locupletem com as benesses da Base de Apoio para denegar o voto ao Governo quando lhes der na telha.
     Outra maneira seria a de recorrer a consultas nacionais para determinadas questões reputadas de maior importância, e que não podem ficar ao talante de maiorias que, na verdade, não refletem a vontade do Povo brasileiro.
    Esse patrimônio nacional que nos torna o país com a maior floresta  natural, legado de tantas gerações que não por acaso foi agregado à riqueza do Brasil, não podemos permitir que um grupo de insensatos nos faça perde-lo. Basta de relatores ruralistas, basta de falsos códigos com inúteis APPs de cinco metros que ,ao zombar da natureza, só garantem desgraças e inundações.



( Fonte subsidiária: O Globo )

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