quinta-feira, 15 de agosto de 2013

Notícias direto do Front

                                        
Crise no Egito

            As forças de segurança do exército mataram um número ainda imprecisado de pessoas – os totais com pelo menos 278 mortos e pelo menos dois mil feridos. Entre as baixas, dois jornalistas: o cinegrafista Mike Deane, com 61 anos, do Sky News, e a repórter Habiba Abd Elaz, de 26 anos, da Gulf News, de Dubai. O veterano Deane foi abatido pelo tiro de um sniper[1] do exército. O massacre ocorreu nesta quarta-feira, catorze de agosto. Além do Cairo, houve choques entre Exército e Irmandade Muçulmana nas cidades de Alexandria e Ismailia.
         O Governo Obama determinou a suspensão de exercício militar com as Forças Armadas do Egito.
           O vice-presidente interino, Mohamed El-Baradei, renunciou em protesto à violência do Governo. El-Baradei é Prêmio Nobel da Paz.
           Por ordem do general Abdul-Fattah el-Sisi, o governo interino declarou estado de emergência por um mês. Está suspenso o direito a julgamento, ou ao processo legal. Volta-se assim ao estado de coisas vigente no governo de Hosni Mubarak, em que prevalecia a lei marcial.
          A combalida Irmandade Muçulmana não parece inclinada a abandonar as concentrações em praças e os sit-ins. No entanto, a violência castrense, que mata indiscriminadamente, pode forçá-la a outra tática.
          Recorda-se o que sucedeu na Argélia, em que o exército, diante da perspectiva de vitória da Frente Islamita, em 1991 suspendeu sine-die as eleições. O processo levaria a uma longa guerra civil – em que o terrorismo e os ataques contra estrangeiros inocentes se estenderia por quase uma década, com crescente radicalização. Em muitos dos massacres – ocorridos na campanha e em povoados próximos da capital – pairava sobre os verdadeiros responsáveis pelos extermínios o véu não tão-diáfano da dúvida, eis que na confusa anti-lógica da rebelião, os civis eram as vítimas determinadas, mas os assassinos podiam ser ou das guerrilhas islamitas, ou do próprio exército.
          É de augurar-se que o Egito escape deste processo infernal. A Irmandade – se antes se envolvia em ações armadas – desde muito escolhera a via da legalidade. Agora ela se descobre derrubada da presidência, com Mohamed Morsi preso, e os seus numerosos filiados perseguidos e abatidos. A via da política continuaria aberta para eles,  ou o ambíguo recurso às armas, diante de adversário armado e disposto a atirar, antes de perguntar ?

 
 Um  Perdão para o Cavaliere ?

 
           Silvio Berlusconi, que se acreditara o mago da justiça, a quem os processos se desdobravam em recursos, e nos quais sempre surgia a saída da prescrição, ou de sua prorrogação, e nunca a sentença definitiva e irrecorrível, como na lenda, o vaso tantas vezes levado à fonte numa certa e inesperada vez, não é que se rompeu o encanto, e o que era um jogo, alimentado por advogados, testemunhas, e alçadas de juízes, acabou virando o pesadelo da condenação transitada em julgado.
           O Cavaliere pensou a princípio em uma saída na base do desespero, sem outro fundamento que a imprevisibilidade peninsular. Não terá funcionado a salvação in extremis de referir a questão para o foro europeu.
            Agora, diante talvez das ameaças de Silvio Berlusconi de misturar assuntos públicos (a estabilidade do gabinete E. Letta) com questões muito privadas de seus incontáveis deslizes, não é que se agita diante do eterno trêfego e fugitivo inaferrável a incôngrua possibilidade de um perdão presidencial ?
            O ridículo e o absurdo convivem com o privilégio na velha bota itálica, mas o Presidente Giorgio Napolitano, esta reserva moral, acenou a Berlusconi com a possibilidade de um perdão. Como o Cavaliere é o chefe do partido que garante a sobrevivência do Gabinete, entende-se qual será o quid-pro-quo.
            O Presidente da República afirma que, se respeitadas as estritas condições, a combinação pode funcionar. Ou será que não? Valerá a pena preservar um ministério ameaçado, por conta de mais um perdão – este formal – a Silvio Berlusconi.  E qual será a opinião dos magistrados da Corte de Cassação, uma vez mais confirmada a incolumidade penal  do nobre Cavaliere ?

 
Wendy Davis para governadora

 
          O filibuster de Wendy Davis começou cedo e ao contrário dos do Capitólio,em Washington, quem se propõe a enterrar um projeto através de intervenção até o final da sessão, não disporá de quaisquer facilidades.  A antiga cortesia texana cedeu lugar à baixaria republicana. A congressista tem de pronunciar o discurso de pé e não pode afastar-se do pódio sob nenhum motivo, o que pressupõe maior controle fisiológico. Para dificultar ainda mais o exercício democrático, quem discursa tem de observar o tema de sua alocução, sob pena de ter a palavra cortada.
          Wendy Davis é senadora estadual no Texas, e pertence à bancada minoritária do partido Democrata. Desde a época da loura Ann Richards nenhum democrata logrou eleger-se para a governança daquele estado.
           O Texas é um estado vermelho – dentro das idiossincrasias americanas esta é mais uma. A cor  vermelho pertence ao conservador Partido Republicano e o azul, aos democratas. Assim, não vá um comentarista distraído tomar a menção de que um estado é vermelho, como se a cor indicasse algum sentido progressista e liberal na Terra do Tio Sam... Muito pelo contrário.
            Mas voltemos a Wendy Davis. Não foi por falta de baixarias de seus colegas congressistas da situação que a senadora Davis prevaleceu ao final.
            Quando o discurso se aproximava da hora terminal, a excitação na internet e dentre os partidários da senadora cresceu de forma viral. Graças ao sucesso da filibuster, que enterrou a possibilidade de ser aprovado ainda naquela legislatura o projeto em tela, que restringia[2] ainda mais o direito ao aborto no estado do Texas, Wendy virou à americana uma celebridade.
             Com a poeira baixando, a antes quase desconhecida Wendy, com a sua popularidade ganha com muito denodo – chegaram inclusive a procurar cassar-lhe a palavra, sob pretexto de que saíra do assunto do discurso – a senadora resolveu tentar o que para muitos é ainda empresa quixotesca (há vinte anos, só republicanos são eleitos para governador). Esta série foi iniciada por quem derrotou Ann Richards, para tanto valendo-se de todos os truques, e que atende pelo nome de George W. Bush, que se declarou um conservador compassivo (terá sido por isso que não comutou nenhum pena de morte dos infelizes que a ele apelaram, como instância derradeira).
             A popularidade e a coragem de Wendy a ajudarão nesta corrida, que se prefigura assaz difícil, com o GOP como favorito. Dado o seu tutano, ela promete ser uma concorrente muito competitiva.  É o de que carece a combalida legenda democrata nesse estado sulista. Seria surpresa além do agradável que, assim como na empresa do filibuster, Wendy logre vencer contra quase todos os prognósticos.
             Abriria um pouco os horizontes do estado chamado da Estrela Solitária. Deve ser dose aguentar governadores como Rick Perry aquele a quem bastou nas primárias um único debate com os adversários, para ter de sair da corrida para a nomination do candidato do GOP a Presidente. Há um limite mínimo até para o Q.I. de concorrentes para a Casa Branca...

 

(Fontes:  International Herald Tribune, Folha de S. Paulo, The New Yorker )



[1] Sniper – atirador designado para matar.
[2] Com a sentença da Corte Suprema, do início da década de setenta, dentro do princípio do direito à privacidade a mulher americana tem direito ao aborto. Com o crescimento da direita nos Estados Unidos, (na Corte Suprema, os conservadores têm maioria de 5 a 4), esse direito tem sido reduzido pelos Estados vermelhos, que estabelecem a proibição do aborto depois de um certo número de gestação.

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