terça-feira, 10 de novembro de 2009

O Limite da Floresta Amazônica

Desde muito, paira no ar a pergunta até que ponto a nossa Floresta terá condições de resistir como um ecossistema à negligência maligna de governos sucessivos, federais e estaduais, diante do avanço de interesses sejam ignaros, sejam gananciosos, de posseiros, fazendeiros e agronegócios, que resultam no desmatamento e/ou degradação de o que, em priscas eras,von Humboldt denominara a hiléia amazônica.
Como é tristemente comum no Brasil, o discurso singular ou plural dos grupamentos envolvidos será guia tão falso e destituído de credibilidade quanto uma nota de três reais. Mister será atentar para a práxis, pois aqui pilharemos a verdade.
Se nos fôssemos fiar por juras ambientalistas, todos os governos – como o de Fernando Henrique que abriu as portas para as madeireiras da Malásia, ou o de Lula da Silva, o ecologista light, que no atacado depreda cavernas e baixa a MP da grilagem, e no varejo firma untuoso abaixo-assinados de Christiane Torloni e Victor Fasano – nos transmitiriam a leda tranquilidade dos crédulos.
Decerto incomodará ao Presidente Lula que na Unesco, ao receber comenda, irrompa um cartaz importuno, clamando pela preservação de o que resta da Floresta Amazônica. Embora se descubra defrontado com sinalização de perigo permanente, a manifestação irritará a Lula, porque, incômoda, tal cena peca sobretudo por embaraçá-lo diante de grados personagens estrangeiros.
O episódio nos ajuda a bem entender a realidade. A despeito de a avidez de indivíduos e a frieza de multinacionais e assemelhados atacarem de forma contínua e persistente – de modo a empalidecer os feitos dos vândalos – o maior recurso natural brasileiro, que em tal viço e concentração remanescente inexiste alhures, os governos quer federal ou estadual, o defendem com a palavra, enquanto permitem, pela porta dos fundos de incúria, fraqueza e até cinismo, que operem ininterruptas as motosserras e demais petrechos do progresso da savanização – de que o Pará já nos proporciona mais do que um trailer – e do deserto das paisagens degradadas.
Deixa-nos perplexo que personalidades de formação e cultura tão diversas quanto o atual e passado presidentes tenham agido diante deste desafio de maneira tão similar e tão deplorável. Cedem com monótona regularidade a injunções eventuais e a mesquinhos interesses políticos, enquanto esquecem o dever de, mais do que coerência com a própria palavra, salvaguardar o que resta do enorme recurso natural, a que o estrangeiro contempla com a melancolia dos despossuídos.
Nesse quadro de não só temática desolação, os estudiosos, os climatologistas e ambientalistas cumprem a sombria tarefa de clamar para os crassos ouvidos dos mercadores da política, a fim de alertá-los de que a vigésima-quinta hora das situações irreversíveis não se acha assim tão longínqua quanto o desejariam os míopes e oportunistas encarregados de tal custódia.
A última e desalentadora nova sobre os limites da floresta amazônica nos é trazida por estudos do climatologista Carlos Nobre, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE). Segundo suas avaliações, 40% de desmatamento seria o índice além do qual a hileia amazônica entraria em colapso.
Consoante os derradeiros cômputos da observação, 18% da Amazônia estão desmatados, e outros 10% a 12% se encontram em estado de degradação ou fragmentação.
Por cálculos acessíveis ao especialista, transpostos os 40% o clima muda de forma permanente. E, acrescenta a matéria de Miriam Leitão que condensa o pensamento de Nobre, quando mudar o clima, a floresta não volta. Perde a capacidade de se regenerar, perde a resiliência. Assim, na floresta tropical úmida, o solo – cuja relativa pobreza se afigura conhecida – precisa de água o ano inteiro, o que não ocorre em vegetação savanizada, em que chove apenas parte do ano, seguida por longo período de seca.
Os severos, tétricos e ominosos dados vão muito além dessas coordenadas. Não obstante, pelo visto seguramente não bastam para convencer líderes emaranhados na permanência enganosa do ainda verde presente.
Se o centenário antropólogo francês recentemente falecido fez a própria etérea fortuna nas letras com tristes trópicos, que galardões exibirão para os pósteros aqueles faltos do sagrado dever de preservar a riqueza que nos legaram os fracos mas argutos portugueses, e que, com o mártir Chico Mendes na vanguarda, tem sido objeto do anônimo empenho de trabalhadores e exploradores brasileiros ?

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