sexta-feira, 12 de junho de 2020

O Brasil é um País Sério ?


                       
         A situação da Covid-19, que não pára de crescer, me faz recordar a velha frase do general de Gaulle sobre a nossa Terra, na qual dizia que  "o Brasil não é um país sério".
            O então presidente da França nos acoimava pela conduta do governo brasileiro de então, e por isso, nos tempos da chamada guerra da lagosta, o velho general nos imputava por alegada falta de seriedade.

            Essa pecha teima em não sair de nossas costas, e agora eu me pergunto, se não seria o caso de os governos estadual e municipal - não falo do federal, cuja atuação estava indo muito bem no tempo do Ministro Mandetta, mas que foi estranhamente destituído pelo Presidente Bolsonaro, de uma tal maneira, que a razão com o tempo cresce de que a sua brusca exoneração se deve à circunstância de que Mandetta se comportava de modo exemplar, e por isso tinha o total apoio da população
            Cresce, portanto, a impressão de que o Presidente que se pauta pela falta de coordenação a nível federal ficara irritado com o êxito do ministro Mandetta na Saúde, e por isso, tratou de irresponsavelmente livrar-se de um ministro popular junto ao Povo e que se afirmava nesse campo, gozando do inteiro apoio da população.

                 O resultado que ora temos - depois da passagem apagada do ministro Teich na Saúde - é ter o ministério entregue a pessoal que não é do ramo, e, por conseguinte, faltam as diretivas federais para somar-se ao trabalho dos governadores.

                    Ontem, como o meu leitor terá presente, dei espaço no blog aos epidemiologistas e demais entendidos nesse ramo, em que a presença de firme orientação federal é um grito que não sai da garganta, porque falta a indispensável coordenação federal - que só o Poder Executivo pode imprimir - para que os diversos esforços estaduais sejam complementados. Não é à toa que o Brasil é um país continente. Passou o tempo das capitanias hereditárias e agora se afigura a hora de enfrentar mais esse descomunal desafio, que não pode tão só ser deixado à conta de governadores estaduais e prefeitos de grandes cidades.  

                         Não é que esse esforço não seja meritório, como ele o é, de fato. Mas no gigante Brasil não faz o menor sentido que o transformemos em um Adamastor de colchas de retalhos e prescindamos no bom combate ao aporte de uma visão geral que, ao invés de enfraquecer, contribui para lançar as grandes linhas dessa porfia em que a Covid-19 - que não conhece divisas estaduais nem municipais  - tem de ser combatida em todos os fronts, não faltando ao federal a indispensável visão de conjunto.

                           É bem verdade que, desde a exoneração de Mandetta, falta a 
coordenação federal, que tenta  substituí-la por uma grande incógnita. Por razões que a razão desconhece, uma vez posto na rua, Mandetta - e, valha-me Deus, por bons serviços - o antigo desconforto que Sua Excelência o Presidente faz sentir a todos no que tange à ausência de uma presença da governança federal forte e determinada no esforço de coordenação dessa batalha que grassa pelo país afora.

                            Por bizarro que pareça, a única iniciativa que tem a ver com o foro presidencial foi aquela de investir contra a Globo e o apresentador W. Bonner, ao arrogar-se o Chefe da Nação a colocação das informações gerais do interesse do Brasileiro a estranhas instâncias, que levaram a imprensa, em um movimento uníssono, a somar forças e a cuidar conjuntamente da coleta indispensável dos dados sobre tal flagelo.
                                A reação escancara duas coisas: a relevância da Covid-19 e os perigos da ignorância ou menosprezo da informação. É lamentável que mais uma vez o Presidente Bolsonaro mostre que não está entendendo a natureza desse toynbeeano[1] desafio ao Brasil e a seu Povo, e tal disparidade em termos de compreensão não poderia ter ficado mais visível  do que na reação da imprensa, através de seus principais órgãos, e, porque não dizer, na revolta das entidades republicanas, em que se pudesse confundir o direito à Informação como se fora questão de somenos.

                                 A instância federal e a consequente coordenação permitiu que a pandemia viesse a ter um reforço inesperado, que resultou da irresponsável flexibilização. Referia-me há pouco à presença, através de reportagem do Estado de S. Paulo, de professores catedráticos e de especialistas na matéria, que confrontam as medidas de várias administrações, em numerosos estados - puxando a fila São Paulo e Rio de Janeiro - que favorecem a citada flexibilização, que vai contra o parecer comum de diversos especialistas na matéria, com que abrem as comportas para o acúmulo de pessoas nas lojas, nos transportes e nos shoppings, como se ficassem impacientes os gestores da coisa pública municipal e estadual, com medidas demasiado severas, que buscam - a exemplo de todos os países que venceram tal magno desafio - conter o afluxo do público, mantê-lo o mais possível em casa, para assim cortar  as possibilidades de contágio, em grandes conglomerados, nos ônibus lotados, nos shoppings que regurgitam de gente, e por aí afora.

                    Lembrar-se-á o leitor amigo da referência no começo do blog, em que é voz corrente - para evitar os desastres da Lombardia na Itália, e também o da Espanha -  que carece de manter a população fora dos grandes ajuntamentos, que caracterizam shoppings, conduções públicas, metrôs e partidas de football...
                      As autoridades responsáveis nesses dois países - Itália e Espanha - pagaram alto preço, ao terem permitido por carência de conhecimento que o amontoado de gente em tais locais contribuísse para o silêncio que vem com a presença de Thanatos (morte). Todos os especialistas na reportagem do Estadão lamentam essa flexibilização, que na pressa produz grandes viveiros para o coronavirus, nessas multidões que são arautos malditos de enormes surtos de mortandade, que tem de ser acoimada de estúpida porque afoita e dispensável.
  
                      Em certas horas os líderes políticos devem agir com responsabilidade e respeito aos ditames de uma ciência ainda nova, mas que já mostra perigos e certezas. Se for evitada a estouvada flexibilização, e se se cuida de manter a gente em casa, a terrivel doença não poderá espraiar-se na trêfega vontade de sair à rua, de ir ao shopping, de meter-se em ônibus lotados.   É saber chão que os ajuntamentos de povo são uma maldita benesse para a covid-19.  Países sensatos com bons governantes podem rejubilar-se a seu tempo com medidas severas de contenção de grandes aglomerações. É conhecimento comezinho, que parece incomodar a muitos políticos, que se sentem impelidos a abrir as comportas desse particular inferno que é aquele próprio do coronavírus.

                        A prudência - que se vê até nos animais - deveria ser exercida pelos nossos líderes tanto os municipais, quanto os federais.  O Povo pode resmungar agora, mas agradecerá mais tarde.  O inferno ainda está por perto. Não se afobem em abrir tais cancelas, que são ainda as da morte. Pacientemos um pouco. Crescerá o nosso conceito em termos de juízo, e creio que muitos, com a gente do ramo - e não os picaretas de atividades congêneres -  acabarão por agradecer-lhes não só por passarmos a boa imagem do juízo diante da adversidade, senão por principiar a reação brasileira contra aqueles que - como o general Charles de Gaulle - nos julgam pouco sérios, sôfregos, sem querer saber de ordem e cuidado, porque tais atributos podem significar uma senhora diferença entre a vida e a morte.

( Fontes: Estado de S. Paulo, O Globo, Folha de S. Paulo )


[1] Arnold Toybee, grande historiografo inglês, autor do monumental  "A Study of History", 11 vols.

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