sábado, 23 de julho de 2011

Dívida: sem acordo todos perdem

           Há um aspecto em toda essa crise política americana que não pode ser esquecido. Não elevar o teto da dívida não é questão de somenos, suscetível de ser instrumentalizada por qualquer das partes.
           O fato de o Partido Republicano haver decidido tornar essa providência que mantém o estado de solvência das finanças estadunidenses objeto contencioso e, por conseguinte, pendente de negociação entre as partes, já diz muito sobre a deterioração das relações políticas, e da falência do bipartidarismo.
           Acresce notar, como agravante, que a tentativa de extorsão política é realizada sobre matéria de interesse geral da comunidade nacional. Na hipótese de falta de acordo, as consequências já descritas pelos especialistas são nefastas e terríveis, e tenderão a ter sérios efeitos sobre as finanças nacionais e internacionais. Nessa hipótese, não se pode mesmo excluir que sobrevenha crise financeira internacional, nos moldes da desencadeada pela falência do Banco Lehman Brothers, em setembro de 2008.
           Daí vem a referência ao suposto enlouquecimento do Partido Republicano, mencionada neste blog a  propósito de coluna do Prêmio Nobel Paul Krugman sobre tal postura do GOP.
           Não é a primeira vez que os republicanos fazem uso deste recurso. Se em 1995, Newt Gingrich não tirou proveito político do expediente, em 2011 as atuais perspectivas, com pouco mais de uma semana até o vencimento em dois de agosto, são pelo menos inquietantes.
           Com o recuo do Speaker John Boehner, e as suas recriminações ao Presidente Barack Obama – culpado de intentar elevar os impostos -, as negociações, conduzidas pela Presidência, voltam ao alto mar.
           Nos dias anteriores, um animado presidente viera à sala de imprensa para assinalar a possibilidade de entendimento a partir de projeto elaborado por uma dita gangue dos seis no Senado. O acordo esboçado por três senadores democratas e três republicanos, na verdade, constituía pouco mais de um esboço, e exigiria detalhamento que a exiguidade do prazo e a tramitação por duas câmaras faria questionável o sucesso antes da data limite de dois de agosto.
           Surgiu outro aspecto ligado a esse anteprojeto no Senado, que levantou questionamentos. Houve quem considerasse o endosso de Obama, máxime em fase ainda preliminar, como prejudicial à tentativa de compromisso. Dentro da contenciosa atmosfera, teria sido visto como no mínimo prematuro.
           A posição do Presidente vem merecendo críticas e não só do lado do GOP. O partido democrata é o defensor dos programas Medicare (para idosos) e Medicaid (para os pobres). Daí, a especial atenção às minorias dada pelos democratas que é característica fundamental desse partido. Provoca, por isso, crescente perplexidade e censuras de parte de deputados da base democrata a alegada disposição de Barack Obama em admitir cortes nesses programas, os quais fariam que pobres, negros e idosos arcassem com substancial parcela de cortes impostos pelos republicanos para agilizar o desejado acordo bipartidário.
           A recusa republicana em elevar os tributos – mesmo em rubricas em que, na verdade, equivaleriam ao restabelecimento a níveis anteriores (como no caso da baixa determinada por Bush jr. para os mais ricos) – dificulta qualquer perspectiva de acordo, porque não é equilibrado nem justo que não se recorra a qualquer incremento de impostos.
           Obama terá subestimado o peso para o seu partido dos programas sociais. Ao aceitar colocar na mesa garantias do Medicare e Medicaid, admitiu que conquistas históricas do próprio partido possam ser objeto de negociação. Por isso, a sua posição nas pesquisas, depois de avaliações favoráveis decorrentes da irresponsabilidade do GOP, voltou a cair. Essa queda se deve notadamente ao desagrado dos eleitores liberais-progressistas, diante da aceitação pelo presidente de trazer para o cesto de concessões as vantagens obtidas por camadas menos favorecidas, como negros e idosos.
           Entramos praticamente na reta final das negociações de um grande acordo. Há um detalhe, porém. Ao aproximarmo-nos da vigésima quinta hora, nenhum grande acordo paira no horizonte. Não obstante, a proximidade da data e as suas desastrosas implicações, tendem a manter viva a chama de um entendimento de ultimíssima hora, que contrarie os prognósticos pessimistas.
           O instinto de sobrevivência não se limita aos democratas, liberais e progressistas. Ele também existe nos republicanos, conservadores e, quem sabe, membros do Tea Party.
           A par de alguma solução mágica de última hora, no entanto, a passagem do tempo será determinante para tornar um final aceitável e até uma arrumação questionável (muddling through) cada vez menos provável. E nesse jogo, nas condições presentes, não haveria ganhadores.


(Fonte subsidiária: CNN)

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