A heterodoxia fiscal só engana os tolos, e a sua crescente presença não diz bem de nossas contas, nem de suas perspectivas. Já vai longe o tempo da ortodoxia e do dever de casa bem feito, que resultaram em índices que incrementaram a atração do Brasil como economia emergente.
No entanto, o aparelhamento do Estado por um partido e a meta de fazer a sucessora do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, somados aos habituais desatinos de ano eleitoral, na gestão do Ministro Guido Mantega nos três anos finais do segundo mandato de Lula tornaram bastante mais fosco o quadro econômico-financeiro.
Se malabarismos contábeis – ou comportamentos heterodoxos em matéria econômica – fossem a solução, com todos os planos mirabolantes que se propunham a abater o dragão da inflação na década perdida, o Brasil decerto poderia exportar catedráticos para o terceiro mundo com a cartilha de livrar-se da praga inflacionária.
Foi somente quando a administração se capacitou, com o Plano Real, de que mágicas não serviam e sim o dever de casa bem feito, é que o Brasil deixou de ser o país da inflação. Acionada desde o governo Juscelino Kubitschek e jamais até então debelada, devemos aos governos de Itamar Franco e de Fernando Henrique Cardoso, esta magna conquista.
Se anteriormente, Lula e o PT foram adversários ferrenhos do Plano Real, cujos resultados fingiam ignorar, para viabilizar o primeiro mandato e continuar mantendo ao largo a inflação e os demais desarranjos financeiros, Lula aceitou implementar o que antes apostrofara.
Durante o primeiro mandato, luziu a economia, sob a gestão acurada do Ministro Antonio Palocci Filho. Se crises houve – e a do mensalão foi decerto a maior -, não sofreu a parte financeira, e em consequência a nau capitânia passou a singrar em mar de almirante.
Com a partida de Palocci da Fazenda e a assunção de Guido Mantega, o comportamento mudou. E voltaram os artifícios contábeis para disfarçar os malfeitos e a deterioração nas contas públicas.
Se em 2009 a crise financeira internacional repercutiu não como risível marolinha, ao diminuir a arrecadação de tributos (determinada pela redução da atividade econômica pelo recuo na procura) e já tinha induzido o Tesouro a recorrer artifícios fiscais, a situação em 2010 copiou a do ano anterior, posto que a sua causa determinante haja sido o desvairio eleitoreiro e a inchação da máquina estatal.
Para o superavit fiscal primário, que é a parte da arrecadação destinada ao pagamento dos juros da dívida, a meta oficial era atingir 3,1% do PIB. Como não houve receita fiscal suficiente do Estado – a economia feita foi de R$ 101,6 bilhões, ou 2,78% do PIB -, o remédio foi recorrer às ditas ‘receitas extra’ (que, na verdade, não o são strictu sensu), com o desconto de parte dos investimentos do PAC, no montante de R$ 11,7 bilhões. Não bastando tal expediente, se aditaram os R$ 32 bilhões da capitalização da Petrobrás, o que completou, para inglês ver, a soma devida, com o mínimo previsto de 3,1% do PIB.
Em suma, como assinala a Folha: “Mais de 40% do superavit foi obtido por meio de operações contábeis que não representaram efetivamente aumento de receita ou corte de gastos e que, por isso, não ajudam a reduzir a inflação e a dívida.”
O que agrava o quadro é que o governo se valeu de tais mecanismos em um ano em que a economia teve bom desempenho (com alta superior a 7%). Se, mesmo com a arrecadação acrescida a esse ponto, a administração do PT não conseguiu fechar as contas, o que acontecerá em ano com progressão econômica menos acentuada ? Assinale-se que o crescimento em 2010 foi o maior desde l986.
Em 2011, para conter a inflação se pedirá mais do Banco Central em termos de aumento de juros, além de maior aperto no crédito. Em outras palavras, se deverá sufocar a progressão do crescimento para pagar os pecados das loucuras fiscais do governo anterior (notadamente, as capitalizações e o aparelhamento do Estado). Tudo isso sem contar a corrupção, que é talvez o tributo mais pesado a onerar a máquina estatal.
( Fontes: Folha de S. Paulo e O Globo )
terça-feira, 1 de fevereiro de 2011
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