segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

Amarga Herança

Segundo estudo do economista Fernando Montero, divulgado por O Globo, o governo Lula aumentou as despesas em R$ 282 bilhões (descontada a inflação), sendo que 78,4% (R$ 220,9 bilhões) desse aumento ocorreu no segundo mandato.
A diferença de comportamento fiscal entre o primeiro e o segundo mandatos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva já foi assinalada diversas vezes neste blog. Do Dr. Jekill [1](o médico) do primeiro passamos ao Mr. Hyde[2] (o monstro) do segundo. Obviamente, a liberdade para a farra fiscal aumentou com a saída de Antonio Palocci do Ministério da Fazenda e a sua substituição por Guido Mantega. No segundo mandato, com a preocupação de eleger a sucessora, a par da justificativa da crise global, houve salto irresponsável no empreguismo e na dívida líquida do Estado.
Houve considerável incremento nos gastos correntes, o que dada a reduzida elasticidade no setor, importa em peso permanente para o futuro. Só em pessoal, e a apenas no segundo mandato, as despesas incharam em R$ 51,8 bilhões. Já nos benefícios previdenciários, o aumento foi de R$ 73,3 bilhões. Montou, portanto, a despesa total nessa área a R$ 220,9 bilhões.
Malgrado a sobrecarga tributária – involuíu de 32,01% (2002) para 34,4% (2010) – e o consequente aumento da arrecadação, tanto a dívida líquida do setor público cresceu de R$ 892,3 bilhões em 2002 para R$ 1,476 trilhão em 2010, quanto o superavit primário passou de 3,27% (2003) para 2,03% (2009) e 2,78% (2010). Assinale-se, por oportuno, que o mais alto superavit fiscal foi o de 2005 com 3,79%.
Os superavits fiscais de 2009 e 2010 tinham como metas respectivas 2,5% e 3,1%. O Governo Lula não só não alcançou a meta, como teve de recorrer a artifícios para fechar as contas, ao descontar os investimentos com o PAC.
Não surpreende, por conseguinte, que a inflação tenha voltado a crescer. Assim, de um mínimo de 3,1% (IPCA) em 2006, o último ano do primeiro e bem-comportado mandato, inflou para 5,9% (2008) e 5,91% (2010). O principal instrumento de que dispõe o Estado para combater a inflação – os juros básicos (taxa Selic) – foi mantido no nível mais baixo de 8,75% até 2010, quando foi elevado em meados deste ano para 10,25%. Com a farra fiscal do governo anterior, cabe indagar o porquê da demora do Banco Central do Dr. Meirelles em acionar o controle inflacionário básico disponível pelo Estado brasileiro.
Com a apreciação do real, os saldos da Balança comercial do Brasil de um máximo de US$ 46,4 bilhões (2006), se achataram consideravelmente para US$ 20,2 bilhões (2010) e, malgrado a elevação nas cotações da commodities (continuamos a depender das matérias primas na nossa balança) há uma estimativa de US$ 9,57 bilhões para 2011. Este baixíssimo excedente comercial vai traduzir-se no balanço de transações correntes deficitário, o que nos fará depender dos investimentos produtivos estrangeiros (Ied) e especulativos para reequilibrar o balanço de pagamentos. A propósito, deve-se ter presente que se os indicadores economico-financeiros piorarem, se tende a tornar-se mais onerosa a operação no indispensável reequilíbrio nas contas.
Em razão de o que precede, o governo Dilma Rousseff – cuja eleição se deve em boa parte ao aumento do crédito e à farra fiscal do anterior governo do PT – terá de proceder a um inédito aperto de cinquenta bilhões de reais. Este arrocho fiscal não implicará, como se pode presumir, em altos índices de popularidade de Dilma Rousseff. Com a inflação e a taxa de juros em alta, e as decorrentes dificuldades na concessão de crédito, terá chegado a hora de pagar a conta pela farra fiscal da administração Lula. Ironicamente, será a beneficiária dessa largueza de recursos e de despesas sem o indispensável tributário, que incorrerá na insatisfação de um público acostumado com a frouxidão creditícia e seus longuíssimos prazos, que viabilizaram a a compra de bens de consumo duráveis.
Com o aperto no crédito e o aumento da inadimplência, não é necessária bola de cristal para prever-se a queda na avaliação respectiva, e a despedida dos altos patamares de aprovação popular da administração Lula, em termos de Datafolha e Ibope.

( Fonte: O Globo )

[1] Personagem do conto de Robert Louis StevensonO Estranho Caso de Dr. Jekyll e Mr. Hyde.
[2] Idem.

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