Lembram-se acaso do PT, de seus nobres causas e propostas quando na oposição? Se nem todas foram acertadas – ressaltam neste capítulo a negação da assinatura da Constituição de cinco de outubro de 1988 e a histérica campanha contra o Plano Real – haveria então partido político mais aguerrido e mais ético ? Podia-se, decerto, discordar do Partido dos Trabalhadores, mas seus militantes se empenhavam no bom combate, seja, v.g., contra os trezentos picaretas no Congresso, seja contra os malefícios do coronel José Sarney no seu vice-reinado do Maranhão.
Quando Luiz Inácio Lula da Silva ascendeu ao mando, com a sua campanha de paz e amor, se em termos econômico-financeiros teve o bom senso de desdizer os intuitos pregressos e adequar-se às conquistas da administração anterior – e crédito seja dado não só ao líder histórico, mas também aos gestores Antonio Palocci e Henrique Meirelles – os anos posteriores mostrariam que o poder seria pernicioso para o P.T.
Quem acaso esqueceu a imagem da aceitação displicente de propina de três mil reais por Maurício Marinho, dirigente da ECT (Correios) e militante do PTB ? Emblemática da corrupção invasiva, a exposição logo se transmutaria na crise do mensalão, que abalou as estruturas do poder petista, e que demandou o sacrifício propiciatório do Chefe da Casa Civil, José Dirceu, que teve não só de renunciar ao seu “governo”, mas não tardaria em ser cassado por uma Câmara assustada ?
A pergunta que hoje acossa a muito militante sincero do P.T.: por que se evaporou tão rápido o caráter ético do Partido ? Não há negar que ainda nele existam aqueles que vêem com nostalgia o comportamento anterior, mas tampouco alguém se atreveria a dizer que tudo continua como dantes, nos bons tempos de oposição de princípio ?
Por onde anda a chamada faxina ética? Malgrado D. Dilma com ela lidasse de forma ambígua, enjeitando-lhe o propósito moralizante, mas aceitando os pontos nas pesquisas, a estranha dissociação se confirmaria quando da manutenção do mui amigo Ministro Fernando Pimentel.
A postura ainda ficou mais clara com o esvaziamento da Comissão Ética da Presidência da República, que forçou a renúncia do Ministro Sepúlveda Pertence.
Não há combate à corrupção pela metade. Os diversos escândalos que no Executivo e no Legislativo lhe tem assinalado uma inquietante ubiquidade têm funcionado quase sempre como se a exposição do malfeito – e o eventual afastamento do cargo – constituísse o processo completo.
Se se mantém a impunidade – de que há exemplos gritantes tanto no Executivo, quanto no Legislativo – uma das razões será a falta não de castigos exemplares, mas de qualquer castigo digno desse nome quando são individuados escândalos.
A exposição do delito e o afastamento do cargo representam apenas uma das faces da reação da sociedade. Agir como se tal bastasse – como é o comportamento habitual – minimiza a falta cometida, e não tem qualquer efeito deterrente para o futuro.
A prática delituosa – qualquer que ela seja – continuará a atrair os picaretas e o público do artigo 171, se eles continuarem a fruir desse tratamento light, que não se cinge a privar-lhes da liberdade, mas também é quase um incentivo à reincidência.
O programa governamental Minha Casa Minha Vida vaza corrupção por todo lado. O preço dessa prática é alto, e não se limita às infrações penais, e à sua malversação. O ralo imundo da corrupção, ao consumir em propinas, comissões e quejando, o que se destina a dar moradias dignas às classes desfavorecidas, cerceia na prática o programa e o deforma em moradias mal-construídas, verdadeiros aleijumes.
Agora nos chega a notícia de que pequenos construtores de moradias populares pagaram propinas de 10 % a 32% do valor do imóvel. Tais pagamentos (o chamado pedágio) seriam negociados pela RCA, firma de ex-servidores do Ministério das Cidades, e que está sendo investigada por fraudes no programa.
A corrupção sistêmica não é tão bizarra quanto querem fazê-la parecer. Por um lado, ela é responsável em que o arrocho do impostômetro – a brutal carga que se achega dos 40% a todo brasileiro – tenha um pífio retorno. A falta de saneamento básico - e a prevaricação de muitos prefeitos – se traduz no acréscimo da dengue e em outras doenças endêmicas. Também a ganância dos corruptos se traduz em rachaduras nas moradias populares, em falta de básicas condições de residência (ruas pavimentadas, esgotos, escolas, etc.).
Muitos artistas se prestam de bom grado a expor suas risonhas e muita vez belas fisionomias, na propaganda oficial. Há os campeões do gênero, que serviram a todos os governos, inclusive o militar.
Esta dissociação da realidade faz parte do fenômeno. E será motivo para comentário ulterior.
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