De uns tempos para cá, as relações diplomáticas, antes apanágio do Estado, passaram a depender dos laços ideológicos e, por conseguinte, das posições partidárias dos chefes de governo respectivos.
A diferença entre uma postura e outra não é das menores.
Difere a natureza das relações entre movimentos políticos e Estados. Há entre formações políticas , decerto, uma componente ideológica no seu relacionamento, mas também uma fluidez que é típica da mutabilidade dessas correntes, e que explica em boa parte a sua maior capacidade de adaptação. Por outro lado, o caráter temporário e informal constitui, dentro das variações da política interna, uma espécie de segunda natureza, que garante a tais movimentos a indispensável flexibilidade e potencial mutabilidade.
Ao contrário da mutabilidade da politica interna, a diplomacia – que é a face externa da realidade nacional – para manter a respectiva coerência carece de guiar-se por parâmetros diversos, que se caracterizam não só pelo respeito à realidade externa de cada Estado com que mantém relações, mas também pela aplicação da própria coerência como estado, vale dizer, na defesa dos interesses nacionais permanentes, e na manutenção de atitude pacífica no que tange aos demais Estados.
Exemplo dessa coerência se encontra, v.g., nas relações diplomáticas do Império do Brasil com as repúblicas sul-americanas, e, especificamente, na política de limites, assinalada pelos acordos e o princípio do uti possidetis. A previsibilidade nessas relações e o respeito aos antecedentes, ensejaram a um país com a nossa extensão continental limites reconhecidos. Quando foram contestados, em poucos casos, a tradição política e jurídica, mantida através do estudo dos antecedentes e maços respectivos, assegurou na quase totalidade das arbitragens a prevalência da política de Estado da Chancelaria brasileira.
Essa viga mestra da política externa foi mantida sob todos os governos e regimes no Brasil. Até no plúmbeo período da chamada revolução de 31 de março, os militares tiveram discernimento suficiente para respeitar tais parâmetros.
Sem embargo, com os governos do Partido dos Trabalhadores, a política de Estado anterior passou a apresentar exceções que, se não foram muitas, tendem a indicar que a nossa diplomacia, como expressão de política de Estado, tende a mostrar desvios que podem afastar-nos do interesse nacional para eventuais conveniências de facção política.
Uma primeira mudança nesse sentido foi a modificação introduzida no chamado Tratado de Itaipu. Por determinação do Presidente Lula da Silva, para acolher um pedido do então Presidente Fernando Lugo, do Paraguai, foi dada vultosa compensação financeira àquele Estado, pela triplicação do custo pago pela taxa de cessão energética, que contrariou a equilibrada estrutura do Tratado, para atender a reivindicações de partido, dada a proximidade ideológica entre o P.T. e o então partido do presidente paraguaio.
Dessa confusão entre compromissos de Estado e conveniências ideológicas também sofrem as relações econômicas e comerciais do Mercosul, notadamente pelas distorções aceitas pelo governo Dilma Rousseff impostas pela Argentina de Cristina Kirchner, desrespeitando não só a letra dos compromissos assumidos, mas os interesses de nossos exportadores, com consideráveis prejuízos.
Outra modalidade dessa diplomacia de partido e não de Estado, foi ontem vista pelo telefonema da Presidenta para Nicolás Maduro, a fim de cumprimenta-lo pela vitória e ainda por cima elogiar “o clima de normalidade da votação”.
Como se sabe, na Venezuela o regime chavista se apropriou do Estado e de suas instituições, a ponto de torná-las expressões nacionais permanentes em órgãos de representação do Partido chavista.
Assim como nas antigas democracias adjetivadas da Europa do Leste, as representações do Estado na verdade encarnavam o interesse do Partido Comunista, na Venezuela chavista os órgãos do Estado constituem duplicações da vontade do partido do Comandante.
Com esses elogios fora de propósito, a diplomacia de Estado no Brasil não só se apequena, mas vira piada de mau gosto.
( Fonte
subsidiária: O Globo )
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