Serve a poucos a polêmica entre o STF e o Legislativo. Decerto não ao interesse da Sociedade e da Democracia.
Iniciada pela aprovação, a toque de caixa, pela Comissão de Constituição e Justiça de uma nova Proposta de Emenda à Constituição, o desenvolvimento da questão e da controvérsia expôs alguns fatos comprometedores.
De início, a CCJ deu inútil barretada a membros que lá não mais deveriam ter guarida ao chancelar a tal PEC 33. Sob o golpe inesperado, os membros do STF questionados pela imprensa não disseram que o rei está nu.
Com a pausa necessária para a reflexão, dois juristas, um mais adstrito ao aspecto constitucional, outro às peripécias da política, mostraram que a suposta ameaça à autonomia do STF não existe.
No particular, semelha inconteste a análise do professor Pedro Estevam Serrano. No depoimento, publicado pelo Estado de S. Paulo, diz ele que a proposta padece de inconstitucionalidade. Com efeito, o inciso III do parágrafo 4º do artigo 60 da Constituição proíbe a deliberação, pelo Congresso, de emenda constitucional tendente a abolir a separação de poderes.
Nas suas palavras, “além de impedir a extinção da separação, a Constituição veda, por cláusula pétrea (meu o grifo), a restrição de sentido ou a alteração na divisão de funções que modifique a competência originária.
“Ao Supremo Tribunal Federal compete interpretar de forma definitiva as normas constitucionais. Procurar restringir esta competência, mesmo que por meio de emenda, fere frontalmente a cláusula pétrea, imutável, de nossa Constituição.”
Ora, como demonstra o professor Serrano, foi justamente o que fez a CCJ ao aprovar por unanimidade a PEC 33, eis que tal emenda restringe de forma inconstitucional a esfera de competência do STF estabelecida pela Constituição.
Pergunta-se, por oportuno, aonde foram parar os expertos em direito em constitucional na CCJ. Sabemos que as decisões no Congresso não devem tardar pelos estreitos prazos que Suas Excelências se estabeleceram, ao limitar, na prática, a atuação dessa colenda assembleia e de suas comissões às quartas-feiras. Mas é pelo menos embaraçoso para uma comissão que se pretende a mais relevante da Câmara vir a aprovar, de afogadilho, como em corte canguru, uma proposta eivada desse vício redibitório.
Por outro lado, talvez o Ministro Gilmar Mendes não devesse interferir em questões internas no Congresso, como tramitação de emendas. Daí, talvez empurrado pela inércia congressual e o recurso da oposição – diante da manifesta inconstitucionalidade da iniciativa do Governo Dilma em dificultar a formação de partidos, sobretudo os que não sejam legendas de aluguel e que ponham em risco a sua antojada eleição no primeiro turno – exista similar fundamento para a estranheza dos presidentes de Câmara e Senado.
Tomando a liberdade de citar uma vez mais mestre Pedro Estevam Serrano, “ se por um lado é verdade que nossa Suprema Corte tem invadido competência do Legislativo em diversas decisões, (...) há que se considerar que não é por meio de inconstitucionalidades não republicanas que nosso Legislativo resolverá o problema.”
Todo esse cocoré em torno do ataque ao Supremo e suas competências, na verdade não teria existido se a CCJ houvesse agido com a atenção e a responsabilidade que ela deveria ter exibido, para que o seu parecer no futuro mantenha a esperada credibilidade. Ao comportar-se da forma descrita, apenas se deixou instrumentalizar por quem, por razões inconfessáveis, aproveita tentar fazer o circo pegar fogo.
Ainda bem que temos juristas dignos desse nome. Pois as demais reações, seja dos ministros do STF, seja de congressistas, traem respostas fora de propósito, que não se atêm ao que realmente importa.
Antes de manifestar-se, é importante que as pessoas, sobretudo aquelas de responsabilidade na matéria, pensem e se expressem de forma lapidar.
(Fontes: Estado de S. Paulo, O Globo )
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