A praça de Nossa Senhora da Paz, cercada por grades ainda em condições aceitáveis de conservação, é um espaço de verde preservado, aberto durante o dia para as mães, as babás, as crianças, e os idosos. Ali esse público plácido verá os alegres cachorros correrem nas suas brincadeiras esfuziantes pelos gramados recém-aparados.
Por toda a parte a sombra de árvores frondosas, muitas com raízes a se enovelarem pelo chão, como se fossem longas, nodosas cabeleiras, a distribuirem recantos de sombras amigas e afáveis, acolhedoras mesmo.
Ora, não mais se encontram as antigas manchas do descuido e de outras presenças que afugentavam os tímidos e passageiros visitantes. Se hoje, os podemos deparar, enquanto caminhamos, tangidos por diversos compassos, nas largas calçadas que margeiam a praça, a quem deveríamos agradecer por esta quase anacrônica paisagem de clarões matinais a brilharem entre sombras coleantes e serenas, a evocarem quadros de uma Ipanema só visível em velhas fotografias ?
Nesses dias de memória curta, sem atenções nem mesuras, em que os bondes e as rimas dos anúncios não mais circulam, a quem cabe os obrigados de antanho ? Pois veja, ilustre passageiro de um tempo apressado, em que asfalto e concreto se unem para nos arregimentar em locais despojados de fantasia e devaneio, esse refúgio de época de passadas, longínquas estações, que apenas se encontra em esquecidos baús e nas estórias de nossos avós – será, pasmem, a um prefeito desconhecido a oportuna recuperação de logradouro, que se desfazia por obras de negligente indiferença.
Eis que de repente tudo ameaça mudar. Se a estrada que leva ao inferno dizem estar pavimentada por boas intenções, quantos desertos, quantas desolações surgem pela suposta invocação do falso progresso ?
Se a praça da Paz foi preservada, e se as antigas grades foram restauradas, as árvores e os canteiros facilitavam tal propósito, eis que o trabalho de recuperação se arrimava em realidades preexistentes. As demais praças de Ipanema se debatem com outros desafios. Na General Osório, as cicatrizes das invasões de feiras e feirinhas; no Jardim de Alá, a despeito dos reparos, rondam as incertezas da segurança.
Senhor Prefeito Eduardo Paes. Se lhe respeitamos a escolha da Barra como residência, desejamos de nossa parte que o coração de Ipanema não se vá rasgar, em atentado não só ao espírito do bairro, senão ao próprio ambiente.
Abraçar as árvores não basta, mas é um bom começo. O fotógrafo Eugène Atget, com a sua Leica, corria pelas vielas de Paris, no afã de retratar as velhas casas, cuja esquiva beleza queria preservar das brutais marretas dos demolidores.
De que nos servem as hediondas bocarras dessas modernosas cavernas, que para se entranharem na terra precisam também elas derribar o pouco de natureza, de sossego, de verde e de belo que nos resta ?
Os grandes espaços não existem apenas para aguçar a cobiça das construtoras. A praça da Paz é uma pausa, que o bom senso de nossos maiores e de seus antecessores soube respeitar. Defrontada pela igreja, e ladeada de edifícios, ela convida tanto à contemplação, quanto a singelos passeios. É uma herança de discreto culto à beleza e ao bucólico convívio de crianças brincando, de velhos lendo, de mamães olhando, e de cães correndo.
Senhor Prefeito Eduardo Paes, por favor, não nos reduza à contingência de recorrer a novos Atget para tentar documentar o que é sobremodo difícil de captar em imagens. Não é como um quadro na parede que nós queremos ver a praça de Nossa Senhora da Paz.
terça-feira, 20 de outubro de 2009
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