sábado, 1 de setembro de 2012

Ecos de Tampa


                                          
        O quê dizer da Convenção do Partido Republicano em Tampa ? Dentro do cerimonial do sistema eleitoral americano, com os seus dois grandes partidos, o Democrata e o G.O.P., as grandes convenções marcam o início da reta final na longa campanha para a presidência da república. Há decerto muitos outros pequenos partidos no cenário político americano, mas eles em geral não contam em termos de afetar alguma eleição. No passado recente, há exceções que confirmam a regra: Ross Perot, como terceiro candidato admitido aos debates em 1992 com os candidatos republicano (George H.W.Bush) e democrata (Bill Clinton); e a candidatura alternativa de Ralph Nader, que prejudicou em 2000 o candidato democrata Al Gore.
       O tertius Perot, que obteve cerca de 19% do voto popular (superior a todos os candidatos fora do esquema bipartidário, desde a votação de Theodore Roosevelt em 1912). No entanto, Ross Perot não alcançou maioria mesmo simples em nenhum estado, e por isso não teve nenhum voto no colégio eleitoral.
       Pela constituição americana, os eleitores comuns, a cada quatro anos, votam em ‘grandes eleitores’ por estado. O total desse colégio eleitoral é de 538 delegados, sendo os totais dos estados calculados de acordo com o tamanho da respectiva população. Assim, v.g., a California tem 55 delegados (ou votos no colégio), o Texas 34, Nova York 31, e a Flórida 27. Ganhará a eleição para presidente que a maioria dentre esses eleitores indiretos, pouco importando haver sido derrotado no total do voto popular (como aconteceu em 2000 e em diversas outras ocasiões no passado).
        Na atualidade, a importância da convenção está precipuamente na imagem que ela passa para o cidadão comum do candidato e do partido. Em um pleito extremamente apertado como promete ser o de 2012, no qual se decide não só o presidente para 2013-17, mas também a maioria nas duas Casas do Congresso, para 2013-15 (os mandatos dos deputados são de dois anos e os dos senadores de seis), a impressão transmitida pelo principal candidato – no caso Mitt Romney, como pretendente à cadeira de Obama – é muito importante.
      Será o seu discurso de ‘aceitação da candidatura’ – o aspecto formal de haver conseguido suplantar a todos os seus rivais internos, através de um programa por vezes massacrante de ‘primárias’ nas quais o seu estado-maior dispendeu milhões de dólares – que marcará tal ingresso nos dois últimos meses da campanha (os comícios são em seis de novembro p.f.).
      Nessa alocução, transmitida por todos os veículos de comunicação, inclusive as redes públicas de televisão, é que a persona do candidato chega a todos (ou quase todos) lares americanos, com o seu carisma e proposta partidária.
     Um dos principais problemas enfrentados pelo Partido Republicano em Tampa, na Flórida, não terá sido decerto o furacão Isaac, malgrado as incertezas que este fenômeno meteorológico causou no aspecto logístico. Mitt Romney, que já disputara a indicação em 2008, surgiu como a maior força no GOP para o pleito de 2012. Essa predominância se devia sobretudo a dois fatores precípuos: (a) a falta de grandes candidatos para desafiar o presente incumbent – i.e., o presidente em exercício – não obstante seja o democrata Barack H. Obama, o 44º presidente americano ; e (b) a resistência da militância republicana contra Romney (que detinha um apoio inicial de cerca 25%), havido como pouco conservador e moderado, o que, no universo corrente do GOP, dominado pelos evangélicos e a ultra-direita do Tea Party, implicam em apreciação denigratória.
       Para ver-se livre dos rivais, Romney foi ajudado pela mediocridade deles e/ou defeitos de caráter ou de biografia, o que se comprovou pela instrumentalidade da disputa das primárias. Dessarte, sairiam paulatinamente de campo Rick Perry (governador do Texas), Herman Cain (afro-americano conservador, o que para muitos é um oxímoro), Newt Gingrich (ex-Speaker, afastado por decisão da Casa de Representantes),e, por fim, Rick Santorum (ex-senador pela Pennsilvania e que derrotara Mitt em todos os estados do Sul profundo).     
       Dentro do ritual da Convenção, o sonho dos dirigentes partidários é de que o discurso do candidato - que, assim, se torna o campeão do respectivo partido para chegar, no caso da oposição, à Casa Branca - reflita o ponto mais alto na cerimônia.
       Há dois outros momentos a entrarem, em  escala crescente,  para  levar ao auge a entronização do máximo representante partidário. Reporto-me aos discursos de keynote – em que em geral se distingue um possível futuro candidato à nomination – e que serve para dar a nota sobre o programa do candidato e do partido bem como  o do designado para a vice-presidência.
      Desta feita, o governador de New Jersey, Chris Christie – e que saíra cedo da disputa, aliando-se a Romney – foi o keynoter. O problema com a sua alocução foi a que terá pensado mais na própria pessoa, do que na do candidato. Na realidade, só abandonaria a promoção pessoal, após haver passado largamente da metade do respectivo discurso. Pode-se assim dizer que a sua intervenção não terá contribuído muito para o entusiasmo dos convencionais acerca de quem ele apontava formalmente como o grande nome do GOP para a eleição vindoura.
      Seguiu-se a alocução do deputado Paul Ryan, recém-guindado à chapa como vice-presidente. O querido da ala conservadora majoritária e tido como provável cabeça de chapa no futuro,  atual presidente da Comissão de Orçamento da Câmara, eletrizou, com a sua peculiar argumentação, os crentes tanto no vasto auditório, quanto na assistência herziana. Traduzida na nossa linguagem, a palavra de Ryan bombou, tendo um efeito de público similar ao da surpresa de há quatro anos, ensejada pelo discurso de Sarah Palin, que John McCain pinçara do anonimato para a notoriedade da campanha de 2008. Desta feita, se não houve espanto, Ryan não deixou de encher as medidas dos seus correligionários, como verdadeiro crente no programa do GOP.
      Antes da entrada em cena do candidato, há duas outras apresentações que ganharam  realce na história de Tampa. Para compensar as deficiências em termos de comunicação e de entusiasmo de Mitt Romney junto ao gênero feminino, a direção do certamen acreditou oportuno chamar ao púlpito sua esposa Ann Romney. A própria capacidade de comunicar-se e de simpatia surpreenderam. Ann sofre de uma doença séria e já foi operada de câncer no seio. O seu carisma e alto astral encantaram o público. Foi com tal propósito – compensar a notória deficiência nesse capítulo do candidato – que ela foi chamada e correspondeu plenamente.  Assinale-se que Barack Obama supera Romney em aceitação pelas mulheres americanas em cerca de dez por cento. Consoante assinalou o New York Times, o problema estava em que a performance de Ann frisasse as lacunas do marido.
         Por fim, a representação de Clint Eastwood – que se fez acompanhar de uma cadeira vazia, no batido truque de um falso diálogo – em que procurou desmerecer do candidato democrata (e atual presidente) deu a nota picante a uma convenção sensaborona, mas não trouxe muita novidade, a par de recalcar a diferença entre um bom diretor de cinema e o voo baixo de um renitente true believer (fã incondicional) do Partido Republicano.
         Nesse contexto, e em meio a comentários pouco alvissareiros sobre quem será o candidato republicano em 2016, não se poderia esperar do ex-governador de Massachusetts um discurso porventura eletrizante ou que não desafinasse de um  tom up-beat (pra cima) da Convenção.
        Mitt não é um grande orador (como R.Reagan), nem tem condições de mergulhar  no que dele espera o público à sua volta (como Bill Clinton). Pela sua rigidez, tem óbvias dificuldades de comunicação no trato com o eleitor.
       Que o candidato republicano ainda tenha chances de ganhar a eleição reflete uma série de circunstâncias, a começar pela grande recessão,  consequência da gestão ruinosa daquele presidente que não deve ser mencionado (i.e., George W. Bush), mas cujo responsável para todos os fins no presente é Barack Hussein Obama.
      Ainda há muito chão a ser palmilhado, a começar pela imediata Convenção Democrata em Charlotte, na Carolina do Norte.       
 

 

( Fonte subsidiária: International Herald Tribune)

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