quinta-feira, 2 de abril de 2020

New York em tempos de Covid-19


                                           
                 
        A oportuna e muito bem documentada matéria de Natasha Madov, datada de New York, nos fala sobretudo  do bairro de classe média Queens - além de Manhattan, da classe mais alta, do Brooklyn, mais popular, do Bronx e de Staten Island -  esse mega-bairro que é o Queens hoje concentra um terço dos casos  de Covid-19, com um total de mortes que está em 386 (o total de casos no distrito é 14.966). Como assinala, com oportunidade a reportagem, em meio à pandemia, a presença das sirenes se tornou tão frequente que fica impossível não prestar-lhes atenção, pela nervosa passagem das ambulâncias e ao que elas significam.
             Como assinala o artigo, se a cidade de New York é o epicentro da crise do coronavírus nos Estados Unidos, por assim dizer o epicentro do próprio epicentro está no hospital municipal Elmhurst, em Queens, que é um distrito que responde por um terço dos casos de toda a megapole.

               Dessarte, o coordenador de produção Chris Jones não carece de estatísticas para saber quão sobrecarregado está o Elmhurst.  Ele está na rota  das ambulâncias que se dirigem ao hospital. Assim, ouvir-lhes a passagem se tornou tão frequente que a filhinha de onze meses, Joni, imita o som de suas sirenes.
                'Ouvimos pelo menos duas vezes por hora", diz. Para Jones "o pior não é   ouvi-las, é saber o que elas significam." Portador  de doença autoimune, Jones faz parte do grupo de risco para Covid-19 e está isolado com a esposa e a filhinha nos 74m2 de seu flat de um quarto desde sete de março. Desde então, só saíu do prédio 5 vezes, porque a despeito das medidas de isolamento, não é fácil se manter a dois metros das pessoas  dentro do edifício ou mesmo na calçada. "Deixo para colocar o lixo para fora tarde da noite, para não correr risco de topar com alguém. E uso luvas de látex."

                 New York acelera para triplicar seus leitos hospitalares, de 20 mil para 60 mil, com vistas a poder atender à população infectada antes do pico dos casos, previsto para meados de abril. N.York tem cerca de 170 hospitais (particulares e municipais). O governador Andrew Cuomo, entre outras providências para esse megadesafio, quer estabelecer central para direcionar profissionais e suprimentos para onde eles sejam mais necessários, e não descarta a transferência de pacientes de Covid-19 para hospitais no interior do estado. Com efeito, não só UTIs e enfermarias estão lotadas; a prefeitura disponibilizou  carros frigoríficos  para hospitais, cujos necrotérios estejam operando além da própria capacidade. 
                  Os relatos de médicos e enfermeiros, nas salas de emergência e UTIs, retratam cenário apocalíptico, em que profissionais de qualquer especialidade são transferidos para ajudar em pronto-socorros superlotados.  Além da falta de materiais de proteção, pacientes chegam tão doentes que são postos diretamente em respiradores mecânicos, aos quais ficam conectados por semanas inteiras. 

                  Um dos médicos do Elmhurst descreveu o volume de pacientes como uma tsunami, com doentes morrendo em macas ou cadeiras à espera de um leito. A crise também atinge hospitais privados. Fotos de enfermeiros da rede Mount Sinai usando sacos de lixo por cima das vestes cirúrgicas circularam nas redes sociais nos últimos dias. Um alívio para os hospitais locais chegou na forma do navio-hospital da Marinha americana que atracou em Manhattan na 2a.feira (30). O USNS Comfort fornecerá mil leitos e doze salas cirúrgicas.

                        O centro de convenções Jacob Javits, na região oeste de Manhattan, também foi convertido em hospital de campanha com 1.200 leitos, e o governo estadual está construindo hospitais temporários em outras partes da  cidade.

                        Enquanto isso, os nova-iorquinos seguem entocados em casa, e as ruas, bem mais vazias do que o normal.  As ordens executivas do prefeito Bill de Blasio fecharam escritórios e serviços não essenciais, estabeleceram a regra de dois metros de distância e proibiram aglomerações, mas não obstaculizaram o direito de ir e vir. Assim, uma das cinco vezes em que Jones colocou o pé na rua foi para ir ao parque Flushing Meadows, em Queens. "Foi o único lugar onde nos sentimos seguros para manter a distância necessária das outras pessoas".

                        Os mais de 2800 playgrounds da cidade continuavam abertos até o governador anunciar nesta quarta, o seu fechamento. Parques, contudo, seguem abertos. Antes, De Biasio já havia fechado dez parquinhos infantis municipais porque os frequentadores não estavam seguindo a regra de manter distância entre si. O prefeito disse ainda que autorizou a polícia a aplicar multas de US$200 a US$250, para quem não respeitar a ordem de isolamento social.

                         A esposa  de Jones, Jessica Letkemann (44), espaça ao máximo as saídas com a filha pequena, porque "as pessoas não tem noção". Ela diz que, embora as ruas estejam vazias, muitos não se incomodam de dividir as calçadas estreitas com ela e o carrinho de bebê e não mantêm distância, chegando a reclamar quando ela pede que se afastem.

                       "Tem entregadores andando de moto ou bicicleta na calçada, idosos indo fazer compras e muita gente mais jovem  andando com os cachorros",  descreve. 
          
             "Mas ninguém vai à rua para passear, é para fazer algo e voltar logo depois."


( Fonte: Folha de S. Paulo )  

Nenhum comentário: