Seria um desastre para
o ideal da União Europeia que a praga do coronavirus
lograsse acabar com a instituição de Bruxelas. Diante do visível agravamento
dos problemas da UE, por conta dos
efeitos da pandemia, alguns líderes já temem que a Cofid-19 possa acirrar crise que contribua para que
esse sonho tornado realidade por líderes como Robert Schuman, Konrad Adenauer e tantos outros venha a ser atingido e enfraquecido
por posturas que privilegiem interesses particulares nacionais sobre a
necessidade da união comum, em que a ambição de nações-membro, por vantagens de toda natureza venha a passar adiante do que
é essencial - a união em torno de organização sediada em Bruxelas, como
pressuposto determinante de o que carece de ser mantido acima de tudo - a unidade da organização e a sua manutenção
acima de todas as conveniências particulares e setoriais, eis que ela é a cynosure que não só representa o anseio
do europeísmo, mas também o fortalecimento de instituição que está acima de
quaisquer particularismos, pois ela simboliza a reificação de um ideal concreto
- a paz e a prosperidade na Europa, que está acima de jogos de poder como concretização
de uma meta por muitos séculos ansiada e por fim implementada. O interesse
geral europeu supera as eventuais conveniências nacionais, e ele, sob nenhuma
condição, pode ser preterido ou negligenciado, porque tal equivaleria à
desconstrução de um ideal que veio sobrepor-se ao flagelo das guerras entre
países fraternos, o que equivale a conflitos intestinos.
As crises podem revestir interesse,
na medida em que apontem medidas indispensáveis a serem tomadas, assim como a
necessidade de privilegiar o comunitário sobre o particular. Na comunidade,
enquanto ela for respeitada, estará toda força, guardada a premissa de que a
CEE existe não para benefício de uns poucos, mas de um conjunto de países europeus
que privilegia a unidade como a reificação da defesa do interesse e dos
princípios democráticos, que sobrelevam às conveniências particulares. Não foi
por acaso que a consolidação da presente organização em Bruxelas correspondeu a
um interesse conjunto europeu, em que o todo sobreleva ao particular.
Não se esqueçam que nos
particularismos está a origem de todos os conflitos e foi com o escopo
precludente de estabelecer o organismo europeu para evitar que os interesses
nacionais continuassem a ser a raiz dos séculos de conflito que caracterizam a
história do Velho Continente. O homem já venceu a muitas pragas e pestes na sua
história. Bruxelas sedia um organismo
que representa o interesse pan-europeu. Que não se esqueçam os seus membros que,
se na União está a força, a Paz inexiste ou claudica, se o interesse comum é desvirtuado em favor de
vantagens setoriais. A Europa, que Bruxelas representa, vela pelo bem comum
europeu, mas sem cegos egoísmos nem torpes particularismos, porque o escopo de
quem aqui está a representar e defender os ideais dos maiores europeus, não
deve esquecer por um momento quantos sacrifícios nacionais e pessoais cobraram
os muitos Poderes Nacionais, com os sangrentos resultados que vemos povoar
tantos monumentos no Velho Continente.
A União Européia, pelo peso da História,
de tantas lutas, muitas decerto gloriosas, mas outras também maléficas e
perniciosas, soube elevar-se acima dos particularismos nacionais, porque a
experiência política europeia mostra que na justiça e na defesa dos princípios
europeus do igualitarismo está a reificação de uma filosofia política que
privilegia a Paz e o interesse comum, porque se a jornada foi longa, ao cabo de
tantos conflitos, a geração do pós-guerra mundial e os seus herdeiros, que
vemos à volta, devem defender o europeísmo não como algum ideal a ser retirado
de velhos baus, mas a expressão da
coerência que é defensora exaltada da Paz e do Interesse Geral, no caso da
vasta, multiforme Nação europeia. Não da
boca para fora, ela é filha e portanto
defensora da Justiça, que não é apenas placa atrás do dossel de um Juiz ou de
um Tribunal. Como organismo democrático
que somos, estamos aqui para defender a Europa como símbolo de Justiça e de
atenção a todos os seus filhos e como extensão deles, as suas Nações Membro.
Preservemos a sua unidade que surge como projeção do interesse comum. E tal
interesse não é mera figura de retórica: ele existe para dar sentido ao
princípio acima enunciado, que veio permitir que o patrimônio e o ideário da
União Europeia seja representado pela Democracia e a defesa de seus princípios
de Justiça e Equidade. Estaríamos
desmentindo e renegando a herança que as mentes fundadoras desse organismo nos legaram se ousássemos
quebrar tais princípios e ideais, pois a grande força de organizações como a
União Europeia está na respectiva defesa dos interesses de todos os
Países Membros - e quem há de contestar que aí se insere a Justiça para todos, na defesa pertinaz dos direitos de todos os
membros, na expressão imorredoura de outro Continente, cuja nação também deve
associar-se a tal propósito, porque ela é também decorrência dos princípios que
nortearam essas palavras.
(
Fonte: O Estado de S. Paulo )
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