quarta-feira, 8 de abril de 2020

Blog 7000


                                                 

          Do terraço de nosso apartamento, em Ipanema, em boa, prazerosa situação, que ganhei na loteria da vida, pelo meu próprio esforço em trabalho honesto, aturado, por vezes difícil e até árduo, por mexer com costumes diversos, e a presença por vezes prenhe de ameaças junto a poderes demasiado próximos, tenho seguido, por costume conjugal, que minha querida esposa me fez aprender, com o prazer que nos traz a visão desse eterno, silente espetáculo que se contenta com a visão antiga do firmamento.  Não há experiência que se lhe possa comparar, se dispuseres da oportunidade para vires a tornar-te, nessa cerúlea, distante, infinita solitude, vestida de longínquas, maravilhosas formas que se abrem com os caprichos de tapete persa mergulhado no céu mudo e profundo, a quem visitam riscos de luxuriantes fantasias, enquanto na sua indiferente e eterna tolerância, esse espaço infinito nos contempla, na mudez da própria linguagem, eis que com sublime e eterna indiferença admite à sua faustosa presença a  mais um expectador  dessa visão que do rei que se crê magnífico,  seja ele amado dos súditos ou não, ao humilde, tosco pastor que, em cuidando do próprio rebanho, poderá entreter-se com tal cintilante espetáculo, de que da sua eterna mudez há gente que crê receber mensagens, além dos próprios caprichosos signos de  calendário que não está aberto para muitos.  Nas noites hodiernas, malgrado as selvas urbanas e as desenfreadas construções que barram nos campos e nas montanhas ingressos antes abertos àqueles que se comprazem a construir - quem sabe bordar - complexos enredos que da abóbada celeste, excluídas as interrupções ditadas pelos  maus humores das intempéries - semelham  estar para sempre à disposição dos mortais  - se desde o começo dos tempos, aos pastores nos campos, e aos caçadores em ermas montanhas e densas florestas terá proporcionado das estrelas e dos astros a visão magnífica, a cintilarem nervosos e com esplendor alvíssimo, por vezes trêmulo, noutras faiscante, altivo, ainda que visões fugidias as intercalem diante da humildade entranhada do divino Pastor, e da agressiva, ostentatória presença dos guerreiros que ousarem praticar toda série de perversa afirmação de arrogante altivez,  quer vestida dos mudos, terríveis exércitos que em marcha batida reclamam do domínio de terras do sem fim,  quer se avantajam pela perfídia e as sinuosas companhias que constróem pela força da própria resolução, enquanto outros de andrajos costuram uniformes, à medida que avançam cobertos pelas cúmplices trevas e a audaz transformação da fraqueza em força,  sequer enjeitando os truques mofinos do ardil, que é a arma dos fracos que cobiçam as riquezas e o luxo de outrem acaso encastelado por velhas ou modernosas  muralhas. Hoje se queres deparar a antiga floresta, em que ainda se refugiam seus prístinos habitantes, descendentes decerto desses  mesmos  indígenas com que Alexander von Humboldt[1] o primeiro estrangeiro que nas primícias do século XVIII a terá atravessado  na sua densa, pródiga e maravilhosa riqueza de mãe-Terra. Hoje temos a Papa Francisco que com a sua austera coragem - que arrosta a deserta Praça de São Pedro, por conta do coronavírus, em mais uma praga a ser vencida - convocou o Sínodo para a Amazônia. Que os céus e o povo brasileiro contemplem no futuro a Amazônia com a sua divina floresta conservada, para maior glória do Senhor e segundo os estranhos, mas maravilhosos desígnios da Providência. Que a floresta amazônica, esta maravilha do século XXI, possa ser preservada, com a ajuda e os préstimos dos amazônidas,  que são na maioria indígenas, e destarte defendida  da ameaça de seus invasores, em especial dos madeireiros, que para ela, mãe de todas as florestas e pulmão do Planeta Terra,  constituem séria ameaça. 
         Com as bênçãos de Papa Francisco, preservemos a Amazônia, que é uma das maiores riquezas naturais da Terra, orgulho do Brasil, que na célebre metáfora traz, na verdade, para o nosso planeta os indispensáveis pulmões para combater a poluição, denunciada pela Ciência e a Igreja.


( Fontes: Estado de S. Paulo e Folha de  S. Paulo )


[1] Alexander von Humboldt, Berlin, Barão (1769-1859).

Um comentário:

Mauro disse...

Olá Pai,
Cumprimentos pela marca histórica, mas principalmente pelo lindo texto, poético e realista ao mesmo tempo.
Grande abraço e Feliz Pascoa,
Mauro