Há muita coisa que causa estranheza no movimento operário em Jirau. A mídia falou de suas características, da rapidez com que se alastrou a outras obras do PAC, em seletiva cobertura da greve e da alegada violência. Em colunas de comentaristas, foi dada ampla guarida ao discurso empresarial, que supostamente não atinava com o motivo de sua eclosão. Tais jornalistas, que transcreveram com extrema correção a versão dos patrões, terão inserido, aqui e ali, sub-reptícia ironia ou guardado aceno de eventual suspicácia quanto à credibilidade da história contada por gente do andar de cima.
No Congresso, que se saiba, não se alçou ninguém à tribuna, para tratar do assunto e levantar a possibilidade de investigação acerca dos eventos de Jirau. Poder-se-á dizer que o atual poder legislativo, perdido no dédalo do corporativismo, não se assinala por tais iniciativas. Os seus integrantes semelham só interessar-se por assuntos pro domo sua, quando não se pilham envolvidos em escândalos. Por mais medíocres e apagados que surjam diante de nós Câmara e Senado, faltos de motivação e talvez de competência, resta sempre a tenaz esperança de que alguém se anime a suscitar a questão.
Conforme refere Elio Gaspari – o único que em ‘O ocaso do sindicalismo emergente’ tratou do tema – na segunda-feira, dezoito de abril, milhares de trabalhadores aceitaram acordo coletivo negociado pela empreiteira Camargo Corrêa com a CUT e o sindicato dos operários na construção civil de Rondônia. Horas depois, sempre segundo Gaspari, a empreiteira anunciou que demitirá quatro mil empregados.
Tal afrontosa degola de indefesos peões parece lembrar outros tempos, não o de um governo em que o Partido dos Trabalhadores é a principal força dirigente, a começar pela Presidenta.
O Ministro Gilberto Carvalho, secretário-geral da Presidência, e homem da confiança de conhecido sindicalista, hoje ex-Presidente da República, antecipara na semana passada – lembra mais uma vez Gaspari – o corte de operários, argumentando que a construtora contratara gente demais.
Em torno, silêncio. Dirão alguns, um atroador silêncio diante da demissão em massa. Silêncio do bem-encorpado e falante Ministro do Trabalho e Emprego, Carlos Lupi, e das grandes centrais, da Força Sindical do Deputado Paulinho Pereira da Silva e, last but not least (por último, mas não menor), do presidente Artur Henrique, da celebrada e aguerrida Central Única dos Trabalhadores (CUT), braço sindical do P.T.
Dispensa de quatro mil operários não é assunto de somenos. Sobretudo se com a tinta ainda úmida das firmas do acordo coletivo. Em tais circunstâncias, não poderá deixar de parecer não só punitiva, mas também uma virtual retomada do absoluto controle pela grande empreiteira.
Como o levante fora reação de gente humilde, em que o peso do número ensombreceu os núcleos diretivos, agora a mão pesada do patrão cai sobre quatro milhares de pessoas, que vão pagar por um movimento de todos os peões da obra.
Nenhuma reação das estruturas do governo do Partido dos Trabalhadores. Na verdade, se reação há é a dos empresários.
No entanto, por humildes e anônimos que sejam os integrantes desta espontânea revolta, e por calados que estejam os que vivem do discurso da defesa do trabalhador, a verdade dos pequenos peões e o porquê da sua fúria contra os métodos e as garantias da Camargo Corrêa, quiça demasiado confiante na modéstia e no isolamento do formigueiro humano que construía a hidrelétrica de Jirau, tal verdade, mais cedo ou mais tarde, se erguerá com traços ríspidos e implacáveis.
À sua volta, as autoridades lamentarão que os fatos sejam afinal descobertos. É uma pena, dirão os mais loquazes entre os medalhões, que os responsáveis não mais possam receber o merecido castigo.
( Fonte: O Globo )
quinta-feira, 21 de abril de 2011
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