segunda-feira, 11 de abril de 2011

Inflação e Responsabilidade

      Seria desnecessário recordar o que significou no Brasil a inflação em termos de obstáculo ao desenvolvimento e de tributo adicional para os assalariados e pensionistas ? Excluídas as novas gerações surgidas após o Plano Real – que não sofreram tal experiência -, os demais olvidados ou são néscios, ou irresponsáveis.
      A esse respeito, em sua coluna dominical, Miriam Leitão nos brinda com sábias palavras: ‘se há uma coisa que as últimas décadas nos ensinaram é que com inflação não se brinca, num país que tem o histórico do Brasil’.
      A princípio, para fugir da ‘marolinha’, mas depois por haver gostado dos remédios, o presidente Lula – com a anuência de Guido Mantega, que não sabe dizer não ao chefe – enveredou por uma política de estímulos fiscais e de crédito. De início, tal recurso era necessário, mas o uso do cachimbo faz a boca torta. Uma vez controlada a recessão decorrente da crise financeira internacional, o governo carecia de sustar os estímulos da desoneração fiscal e do geral facilitário em matéria de crédito.
      Tampouco interrompeu o emprego do mágico instrumento da capitalização, que encantou ao Presidente Lula pelos recursos adicionais proporcionados – os demais, como se sabe, já estavam comprometidos com o assistencialismo e o empreguismo, o que explica, mas não justifica a queda nos investimentos estatais. Muito pelo contrário, eis que as capitalizações continuam na ordem do dia, pois também agradam à Presidenta, como se viu na enésima capitalização do BNDES. Nesse jogo tosco, que só ilude aos torpes e áulicos, o ‘corte’ de cinquenta bilhões no orçamento se foi pelo ralo, com a nova ‘operação’ financeira do BNDES em igual montante...
      O PT possuía um triste retrospecto em termos de combate à inflação. Esse partido e o seu corifeu demonstraram serem efetivamente os últimos a acreditarem na eficácia do Plano Real. Enquanto toda a população sentia o alívio proporcionado em viver num mundo livre da cultura inflacionária e do paroxismo dos reajustes, o PT e seu candidato teimavam em comparar o Plano Real com os artifícios do passado. Levaram essa denegação a extremos.
     Por fortuna, o seu maior adversário era a patente reimplantação da normalidade.
     Ao vencer afinal nas urnas, houve a princípio o temor de que Lula e o PT trariam de volta o dragão. No primeiro mandato, graças ao dever de casa bem feito pelo Ministro Palocci, a economia continuou progredindo, crescendo o renome brasileiro nas finanças internacionais.
     No segundo mandato, as coisas mudaram. Pelas gastanças do Presidente e fraqueza do sucessor de Palocci, aquela velha conhecida principiou a dar os ares de sua graça. Desnecessário repetir a série de dispêndios levianos que formariam o que chamei em blog anterior a dádiva de Lula.
     Dona Dilma, por causa de uma de suas irritações, resolveu prescindir do Ministro Henrique Meirelles no Banco Central. Ele havia ousado repetir a condição da chamada autonomia na instituição, nunca aceita pelo predecessor. Tanto bastou para que a dama se desvencilhasse do importuno e designasse para o lugar Alexandre Tombini.
    Não é segredo que o controle da inflação no Brasil recai sobre o Banco Central. É  instrumento único, que atua sobretudo através da elevação da taxa de juros e o controle do crédito. Ora, pelo visto, a atuação do BC não mais se pautará por uma interpretação assim tão estrita. A sua equação para enfrentar o dragão adaptou-se às preferências desenvolvimentistas da sucessora de Lula. Dessarte, nas reuniões do Copom (o conselho monetário que decide sobre a taxa Selic) luzirá forte a necessidade da manutenção do crescimento econômico.
    Fica mais fácil agora intuir porque Guido Mantega passou a enterder-se tão bem com o presidente do Banco Central. Na verdade, o fenômeno da inflação continua a ser minimizado por Mantega e Tombini. Tudo não passaria de efeitos sazonais que, a crer no que diz o sr. Mantega, vão desaparecer. Por circunstâncias palacianas, a dupla sabe o que a Chefa quer ouvir.
   Os que já viveram a experiência inflacionária – e a ingente dificuldade de expungi-la da ânsia dos reajustes e contínuos aumentos – vêem o quadro com crescente preocupação. O aprendiz de feiticeiro permitiu que o gênio saísse da garrafa. Agora, os seus sucessores, ao invés de conscientizar-se da tarefa precípua, nos brindam com o papo furado de que tudo não passa de algo fugaz, que um dia vai sumir...
   O Brasil goza de enganosa pausa em que a força do real condiciona a irrefreável vinda dos dólares especulativos. Com a inflação – ou a contínua desvalorização da moeda – tais atrativos desaparecem forçosamente.
   Infelizmente, nossos governantes parecem ignorar quais são os grandes desafios desse membro dos BRIC. Permanecemos uma potência agrária e manufatureira, com as exceções de regra (Embraer). Não é mistério que arrostamos gargalos temíveis na infraestrutura. E, com a anuência do leitor, estendamos esse conceito de infraestrutura à área do conhecimento e da ciência. As nossas indústrias se queixam da falta de trabalho qualificado.
   O assistencialismo – que semelha ser o forte do PTsó cuida de um presente sem futuro. Se não investirmos no conhecimento estaremos destinados a ser o que hoje somos – uma grande promessa que, por misteriosas razões, jamais se desvencilha dos próprios cueiros.
   E aí se completa o círculo da prestidigitação. Parece bonito, engana a muitos por uns tempos, mas volta sempre ao ponto de partida. Para os que vivem do imediato, basta.
   Mas para aqueles que, mesmo sem uma câmera, tem uma ideia na cabeça ?



                                                                        ( Fonte: O Globo )

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