quinta-feira, 13 de agosto de 2009

Versões em Confronto

Mais uma vez está a Ministra Dilma Rousseff, Chefe da Casa Civil do Presidente Lula, e pré-candidata à Presidência da República, às voltas com episódio em que a sua versão de uma determinada situação é contestada por outra parte.
Na vez anterior, no escândalo da utilização abusiva do cartão corporativo por ministros no inchado gabinete presidencial surgiu um suposto dossiê sobre emprego questionável do dito cartão no governo FHC, dossiê este atribuído à iniciativa da Ministra Dilma Rousseff. Em todo o episódio, a Ministra-Chefa da Casa Civil se pautou pela negativa de preparação de qualquer dossiê, definindo as planilhas como um ‘banco de dados’.
Desta feita, o filme se repete, a negativa é igualmente peremptória, mas há certas diferenças, eis que a outra parte dessa acareação virtual, até o presente a cargo da mídia, tem maior importância funcional do que as testemunhas de acusação arroladas na ocorrência pregressa.
A questão foi levantada pela ex-Secretária da Receita Federal, Lina Vieira. Segundo asseverou, ela teria sido chamada para um encontro sigiloso com a Chefe da Casa Civil, ocasião em que a Ministra Dilma teria pedido que agilizasse as investigações do fisco sobre as empresas da família Sarney.
Lina Vieira, consoante o próprio relato, respondeu-lhe que “não sabia da auditoria e que ia verificar”. Na ocasião, não fez Lina qualquer outro comentário. Ficou, no entanto, com a impressão de que o recado era para encerrar a fiscalização.
A Secretária da Receita não deu posteriormente qualquer retorno à Ministra-Chefe da Casa Civil. Lina interpreta a solicitação no contexto do então processo de eleição no Senado : “acho que não queriam problema com Sarney”.
A Secretária Lina Vieira, como se sabe, foi recentemente afastada pelo Ministro da Fazenda, Guido Mantega, da direção da Receita Federal. A sua atuação não terá satisfeito a Mantega, e a provável causa da exoneração haverá sido o problema fiscal com a Petrobrás.
Em casos do gênero, nos quais existe contraposição de versões respectivas, eis que a conciliação dos depoimentos contraditórios não se afigura factível, necessariamente há a presunção de que uma das partes diz a verdade, e a outra não. Nesse sentido, desde a Roma imperial, um dos intrumentos tendentes a fazer progredir a investigação é a interrogação cui prodest ? (a quem aproveita ?)
A instâncias da oposição, que cumpre o seu papel, a ex-secretária da Receita foi convidada a depor na Comissão de Constituição e Justiça, na próxima terça-feira, dia dezoito de agosto. Como no âmbito da C.P.I. da Petrobrás o seu testemunho não seria viável, pela oposição da maioria, que controla esta comissão, Lina Vieira comparecerá na CCJ, com vistas a contribuir para eventual melhor entendimento de o que efetivamente aconteceu.
Se a Ministra Dilma Rousseff dispensa apresentações, assim como o seu alter ego, a chefe de gabinete Erenice Guerra (igualmente presente na discussão do alegado dossiê contra FHC), tal decerto não é o caso com Lina Vieira.
Nas suas palavras “não custava nada ela ter dito a verdade. Qual a dificuldade ? Na minha biografia não existe mentira. Não preciso disso, estou passando um momento muito dificil por causa da entrevista. Não tenho costas quentes, não tenho ninguém para me defender. Não sou candidata a nada, não preciso de palanque.”
Por sua vez, a Ministra Rousseff voltou a negar ter tido qualquer encontro reservado com a secretária da Receita Federal, Lina Vieira, para tratar das investigações do fisco sobre empresas da família do Senador José Sarney. Consoante Dilma, Lina terá de provar o que disse: que as duas tiveram encontro sigiloso, a pedido da Ministra, e que esta teria pedido para agilizar as investigações, fazendo a então Secretária da Receita entender que ela queria encerrar logo o caso.
Dentro de seu estilo consueto, Dilma Rousseff acrescentou: “Há coisas que a gente não afirma, a gente prova. Eu não tive essa discussão com a secretária da Receita Lina Vieira.”
Por enquanto, as coisas estão nesse pé. Cada um tem o direito de supor o que melhor lhe parecer, mas por ora não semelha lícito tirar conclusões taxativas. Cabe aguardar a evolução do contraditório, atendida a hipótese de que o depoimento da Ministra em comissão do Congresso não seja blindado pela situação.
Esqueceu-me apenas aditar a intervenção do Presidente Lula da Silva: “Não faz parte da personalidade da Dilma e eu, sem ter conversado com a Dilma sobre o assunto, de ontem para hoje, eu duvido que a Dilma tenha mandado recado ou conversado com qualquer pessoa a esse respeito. Não faz parte da formação política da Dilma.”
( Fonte: O Globo, de 12 e 13 de agosto de 2009)

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