quinta-feira, 20 de agosto de 2009

Como Destruir uma Legenda

No começo está o afã do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva em fazer a sua enérgica Ministra-Chefe do Gabinete Civil, Dilma Rousseff, candidata à Presidência da República, sem maior tradição no Partido dos Trabalhadores, egressa do PDT e que nunca enfrentou o teste das urnas. Lula, todavia, não teve grandes dificuldades em transformar a sua preferência pessoal por Dilma em candidatura do próprio PT. Para tanto valeu-se,nao apenas de ser presidente da república, mas também por achar-se arrimado em estratosféricos níveis de popularidade.
Por outro lado, sendo o fundador e principal líder do Partido dos Trabalhadores, e, como soi acontecer, não crescendo à sombra da pujante e frondosa árvore outras tão frondosas e comparáveis em tamanho, não lhe foi muito difícil convencer a correligionários pré-candidatos de menor estatura a desistir da insensata empresa de afrontar o potente patrocinador de sua seleção para candidata e desejada sucessora no Palácio do Planalto.
O Presidente Lula não terá, nesse capítulo, inovado. É uma recorrente fantasia de homens poderosos sonharem em colocar criatura sua no próprio assento, seja para salvaguardarem o respectivo legado, seja mesmo para continuarem, por interposta pessoa, a exercer a essência do poder. Essa ilusão, na verdade, se implementada pelos meios válidos em cada país, corre o grave e usual risco de que a criatura se volte contra o criador. Com efeito, se ela dispuser de real acesso às rédeas do poder, será evolução até banal, com incontáveis exemplos pela história e mais além, a ponto de adentrar as névoas da mitologia.
Vencida esta primeira etapa do trabalho, principiam a repontar as insídias nas futuras fainas. Em seu segundo mandato, Lula opta pela aliança pluri-partidária, com ênfase nessa grande e amorfa coalizão de líderes regionais, na mor parte despojada de outra ideologia que não a do poder, que é o PMDB. Este megapartido tem hoje pouco ou nada a ver com a agremiação do Dr. Ulysses Guimarães. Como remanescentes testemunhos do espírito passado, restam poucos, v.g., Pedro Simon (RS) e Jarbas Vasconcellos (PE). Os demais em geral se alinham ao comando de lideranças do estampo de Renan Calheiros e Michel Temer.
O apoio do PMDB costuma custar caro. Se à sombra de tal legenda não logram vingar ambições presidenciais, as amplas e maleáveis maiorias na Câmara e no Senado são, através de seus chefes e cabecilhas, ávidas de cargos e benesses. Para tanto, o Presidente Lula não trepidou em inchar o respectivo ministério, até transmutá-lo em difuso e quase anônimo conglomerado, que menos trata dos assuntos de Estado, do que a ele sobrecarrega.
Infelizmente para o fundador do PT, as coisas não ficariam nisso. A ‘candidatura’ de José Sarney, sempre negada pelo interessado, posto que ao mesmo tempo propulsionada por interesses nem sempre confessáveis, levaria à vitória de Pirro da conquista da curul do Senado Federal.
Como ignorou e mesmo traíu a candidatura do próprio partido, Lula contribuíu para acirrar a cizânia, que logo floresceria em sucessão inarredável de escândalos. Exposto José Sarney, o mais velho e bem-sucedido coronel da República, senhor do Maranhão e do Amapá, o seu crescente e visgoso apego à cadeira da presidência, a cada denúncia de novos escândalos, tenderia a tornar-se mais pesado e oneroso para o Presidente e seus planos.
Não obstante, é mister reconhecer que, em sua presente encarnação, Luiz Inácio Lula da Silva tem sido sempre coerente em privilegiar conveniências eleitorais sobre princípios, posições da opinião pública e, sobretudo, contra a tradição ética, a linha e os interesses do seu partido, o PT.
Com efeito, a desenvoltura presidencial tem sido tamanha que a sua identificação com o partido fundado em 1980, com base nos princípios de justiça, ética e defesa democrática, pode ser mesmo posta em dúvida, tamanho é o seu menosprezo pela passada imagem e perspectivas vindouras do Partido dos Trabalhadores, a que tem transformado em peça de manobra para propósitos mais contrários àquilo com que o povo sempre associara a sigla do PT.
A carga de José Sarney, e de sua manutenção pelas coortes a mando de Renan Calheiros, não poderia representar pior maldição para o PT e a sua bancada no Senado. O Presidente Lula não tem medido esforços para tornar mais acintoso e humilhante tal atrelamento à situação que implica em escárnio para as pretéritas doutrinas e posições da militância petista.
Diante da indizível e molesta fraqueza de Aloizio Mercadante e de tantos outros – que não se podem desvencilhar do estigma de pusilânime mediocridade – as palavras do Senador petista Flávio Arns (PR), ao ensejo do adicional opróbio da absolvição de Sarney pelo Conselho de Ética - “O PT jogou a ética no lixo. Vai ter de achar outra bandeira.(...) Posso dizer que me envergonho de estar no PT” – se elas não podem resgatar a fortuna partidária, infundem pelo menos uma dupla certeza.
A gente realmente séria e honesta do PT, ou abandona o partido – como a Senadora Marina Silva – ou, circundada por arrivistas e oportunistas, não tem outra opção do que formular o possível epitáfio para o que foi um grande partido, em que a ética era escrita com letras maiúsculas.

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