sexta-feira, 14 de agosto de 2020

A Vale e as vítimas de Brumadinho

                  

        Os anos passam e a chamada estratégia negocial da Vale do Rio Doce continua a prevalecer desde o tempo de Mariana e do então desastre da bacia do rio Doce, em época da chamada Samarco, que ainda hoje é citada por alguns como se fora conceituada empresa, quando na verdade não passa de um trinca multinacional de mineradoras, protegidas por firma de fachada. Nesse contexto, o desastre da ruptura da barragem afetaria sobretudo a bacia do Rio Doce.  O desastre de Mariana assinala em especial como macabra ouverture  dos males que as barragens à montante podem produzir. Entre Mariana e Brumadinho, constitui a grande culpada, só que na primeira, ela se protegeu por firma de fachada - a Samarco - que era uma criatura da Vale e de outras duas multinacionais estrangeiras. Presidiu, no entanto, à ruptura da primeira barragem, um ritmo em que o avanço da lama seria sinalizado por rede telefônica, o que já mostra a pouca urgência que a criatura     imprimia a um eventual alerta sobre  o eventual rompimento. Não obstante, essa catástrofe - que teve os seus mortos - produziria as suas vítimas econômicas, ao afetar toda a bacia do Rio Doce, que está à jusante das águas das três multinacionais mineradoras. malgrado tivesse afetado a bacia do rio Doce, com as pegadas de uma multinacional - ligada a outras duas

        As represas à montante, no caso da ruptura da barragem de Brumadinho, iriam mostrar para os infelizes que moravam a jusante, como seria diferente o golpe das águas (e do lodo) represados da multinacional Vale.

        Não sei quantos brasileiros terão pleno conhecimento desse escândalo a céu aberto, se se contempla  - e aí o horresco referens[1] de Virgílio se assenta como uma luva - a horrenda rapidez com que os torrões de lama e de água barrenta se projetaram terra abaixo nos prados declinantes de Brumadinho, com criminosa, espantosa mesmo velocidade, a tudo levando de roldão, inclusive as centenas de infelizes que acreditavam estar matando a fome no refeitório da mega-empresa, sufocados que seriam pela torrencial avalanche de lama, que se projetou por toda a área circunvizinha, atingindo, inclusive, o parque turístico de Inhotim.

        Sem embargo de sua postura de defensora das eventuais vítimas dos grandes desastres que ocorreram com as barragens da Vale do Rio Doce, notadamente a de Brumadinho, com a sua coleta macabra de mortes, mas sem esquecer a primeira, a de Mariana em que a Vale de uma certa forma se escondeu por trás da Samarco, em que esta firma congloba três minera-doras, uma das quais sendo a própria Vale do Rio Doce.

        Por força dessa postura, máxime refletida na tragédia de Brumadinho, a mineradora, como refere a Folha de S. Paulo, vem sendo questionada por moradores daquela cidade de Minas Gerais para a concessão de indenizações, assim como por cortes no auxílio emergencial.

        Nesses termos, de pouco valeram fotos em família, comprovantes de residência e uma carteirinha do plano de saúde da Vale, para que Igor de Oliveira Júnior, de 25 anos, fosse reconhecido como familiar do padrasto Renato Vieira Caldeira, pela Mineradora.

        Debalde a família de Renato, um dos 272 mortos no rompimento da barragem da Vale do Rio Doce em Brumadinho, tentou fechar acordo com a mega-empresa, mas a Vale, optando pela exclusão do enteado como titular a qualquer direito como familiar do padrasto Vieira Caldeira, forçou a família a entrar com ação na Justiça do Trabalho.

        Entrementes, como refere a materia da Folha, enquanto a Vale retoma a política de dividendos para acionistas, depois de lucrar R$ 5,3 bilhões no segundo trimestre de 2020, uma decisão no Tribunal Regional do Trabalho em Minas Gerais reduziu a indenização a ser paga à família.

        A decisão em segunda instância veio depois de recurso apresentado pela Vale,  que negou ter culpa pelo rompimento e disse haver tomado todas as medidas para garantir a segurança da barragem. A determinação em primeira instância previa pagamento de R$ 650 mil à viúva e a cada um dos dois filhos biológicos, e R$ 400 mil ao enteado. Em comparação,o acordo coletivo homologado pela Justiça do Trabalho no ano passado, previa pagamento de R$ 700 mil para cada cônjuge e filhos, sendo R$ 500 mil por dano moral e R$ 200 mil a título de seguro adicional por acidente de trabalho. O acordo teve a adesão de mais de 80% das famílias, segundo o Ministério Público do Trabalho.

        Entretanto, no caso de Renato, a nova decisão no caso considerou constitucional um artigo da legislação trabalhista que define teto  equivalente a 50  salários do trabalhador (R$ 3.495, no caso em tela) Mulher, filhos, e enteado devem receber R$ 174.750, cada por danos morais, totalizando R$ 700 mil, além de danos materiais.                  

        Inara Vieira Caldeira, com 21 anos, filha de Renato, tentou fechar o acordo, mas a empresa disse que só valeria com toda a família aceitando. Segundo disse Inara: "Eles não estão nem aí para a dor que a gente sentiu, as coisas que a gente passou."

        Segundo informação do órgão institucional competente, há  3.799 processos na Justiça Estadual, 1.442 na trabalhista e cinco em âmbito federal, relacionados ao rompimento da barragem em Brumadinho. Destes processos, 4,201 seguem ativos. 

        Por sua vez, na Justiça do Trabalho, há 124 em recurso, na segunda instância.

        O tribunal em tela não tem levantamento de quantos processos foram levantados pela mineradora Vale do Rio  Doce.

        Por sua vez, segundo relata a Folha, a mineradora não respondeu ao questionamento apresentado pelo jornal.

        Ainda faz parte do sofrimento das famílias: "As famílias de Camila Taliberti da Silva, Luiz Taliberti Ribeiro da Silva, da mulher dele, Fernanda Damian de Almeida, e de Lorenzo, que estava na barriga da mãe, grávida de cinco meses, também enfrentam recursos, mas no âmbito cível. Uma decisão de setembro de 2019 definiu indenização de R$ 11,8 milhões.

        Eles estavam na Pousada Nova Estância, que foi soterrada pela lama. A Vale apelou pedindo que o valor fosse reduzido e questionando o reconhecimento de Lorenzo como vítima, segundo a defesa das famílias. No recurso, a mineradora cita um caso de morte por erro médico onde o valor da indenização foi fixado em R$ 100 mil.

        O valor inicial pedido pelas famílias era de R$ 40 milhões, dez milhões para cada vítima, levando em consideração  a indenização calculada em documento da própria Vale, US$ 2,6 milhões para cada vida.  O processo de Renato também pedia um valor inicial com base no documento.

        Há relatos de demora no pagamento da indenização para outros  atingidos pelo desastre, além das famílias das vítimas,em ações e acordos com a mineradora.

        Por outro lado, o pagamento emergencial que havia sido definido para todo o município, foi reduzido pela metade em 2020, exceto para bairros mais afetados. Por decisão própria, porém, a Vale decidiu estender o pagamento integral a outros bairros da cidade.

 

(Com especial agradecimento e louvor a Fernanda Canofre, reporter da Folha de S. Paulo, nesta matéria de Sexta-feira, catorze de agosto de 2020, que faz justiça à gente de Brumadinho fundamente afetada pela tragédia - Vitimas de Brumadinho enfrentam recursos da Vale)

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