quarta-feira, 2 de maio de 2012

O Dilema de Dilma

                                        
       Em rede nacional, e ainda por cima no horário do Jornal Nacional, a Presidente Dilma Rousseff atacou os bancos. Depois de haver deles conseguido uma primeira redução nos juros  bancários, ela, como diria o falecido general-presidente João Figueiredo, resolveu  ‘recrudescer’.
      Em função do processo de fusões, os grandes bancos privados no Brasil são apenas dois. Dentro de ordem similar de grandeza, há dois gigantes no setor público.
      Sob a batuta da Presidente da República, esses  últimos representam peças relevantes na pressão a ser exercida sobre os dois mega-bancos particulares.
      Iniciada sob sua Administração, a direção do Banco Central se mostrou disposta a colaborar, através de pontuais decisões do Copom[1], para a baixa dos juros. Como o Governo depende essencialmente dos juros para controlar a inflação, essa estratégia tem evidentes riscos.
      A temida volta do Dragão representou ameaça para a conquista do Plano Real. Por causa da crise financeira internacional, o governo Lula,  em ano eleitoral, cuidara para que a ‘marolinha’ não  fosse demasiado sentida na economia brasileira.
     Daí  a permanência de fatores pró-carestia, originados dos últimos meses do governo Lula, em que a economia aquecida – e não  por condicionantes sazonais, como alegara o Ministro Guido Mantega – mas configurando real ameaça inflacionária, não foi enfrentada prontamente como deveria ter sido.
    Já nesta Administração, a inflação desrespeitou de início os prognósticos oficiais. No final, terminaria o ano beirando exceder o nível máximo previsto. A princípio, o governo Dilma pensara lidar com a alça dos preços sobretudo com o mantra de asserções bombásticas, mas de questionável valia macroeconômica. No combate à carestia, a Chefe de Estado se limitava mais a palavras do que a ações efetivas.
    Por determinação sua,  o Copom continuou a reduzir a taxa Selic. No entanto, influenciada por condições internacionais, a curva da inflação voltou a níveis administráveis.
    Com a queda da carestia, pode prosseguir a baixa na Selic. No momento, os juros reais, uma vez descontada a inflação, estão em 3,3% ao ano, que é o nível mais baixo desde o início dos anos noventa.
     Para baixar os juros ainda mais – e colocá-los em nível de país desenvolvido – o governo se vê obrigado a alterar o rendimento mínimo da poupança, fixado por lei na variação da Taxa Referencial (TR),a mais 6,17% ao ano.
     Por que a necessidade de mexer com a poupança ? Trata-se da necessidade de evitar o seguinte cenário: se a taxa basica do BC (i.e., a taxa Selic) ficar muito próxima daquela da poupança, pode verificar-se a fuga dos recursos para a caderneta, o que criaria problemas aos bancos e governo.
     Este filme já foi visto antes, e a indicação da Administração de que mexeria nas regras para a poupança tiveram péssima repercussão no público, dada a confiança popular na caderneta. Por causa de tais reações, gorou o propósito de alterar as condições da poupança.  Apesar da conveniência financeira de mudar as regras, as consequências de tais projetos repercutiriam numa queda na avaliação do governo junto à opinião pública.
     Em outras palavras, a presidente Dilma entra em área minada se resolver mexer com as regras da poupança. A popularidade desta aplicação – que deriva igualmente da estabilidade de suas condições – implica em desafio importante para o governo que se atreva a mudá-la.
     O desafio se torna ainda mais complicado porque se as condições da poupança forem alteradas, a segurança do instrumento perderá em atrativo para o seu grande público (que são as classes menos favorecidas), o que redundará em menor aceitação do governo.
    Os grandes e gordos bancos particulares podem ser, na aparência, um alvo atraente para a Administração Dilma – como refletido no seu ataque ao ensejo do 1º de Maio -, mas a perseguição da baixa nos juros é  estratégia arriscada para um país cujo principal instrumento de defesa contra a inflação reside no nível dos juros básicos (fixados pelo Copom). Nessa arremetida, outro desafio está na caderneta de poupança, de longa e entranhada popularidade entre as classes de baixa renda.
    Vencido aquele primeiro obstáculo, este segundo – até o presente todas as tentativas de mexer na poupança malograram, por causa da repercussão negativa na curva de avaliação do governo pela opinião pública – avulta portentoso.
    Logrará Dilma Rousseff conciliar essas duas variáveis que, no passado, se provaram inconciliáveis ?
    A dificuldade provém da pouca flexibilidade das soluções. Ou se mantém os atrativos da poupança, em detrimento da taxa de juros, ou esta prevalece contra aquela popular aplicação.
     Este dilema configura um pouco a quadratura do círculo. Se Dilma lograr manter o seu prestígio, forçando os bancos privados a baixarem inda mais os juros para o consumidor, e preservar de alguma forma a poupança, terá superado o seu criador e mestre.
     Mas a façanha precisa confirmar-se, para que se lhe tire o chapéu.



(Fonte:  Folha de S. Paulo )

   



[1] Comitê de Política Monetária.

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