A intervenção de urgência a que teve de submeter-se em Havana revelaria a existência de um tumor médio na área pélvica.
Essa falta de cuidados preventivos, a que todos, no seu próprio interesse, devem submeter-se através de check-ups periódicos, criou uma situação duplamente desvantajosa para o presidente da república da Venezuela.
Por um lado, a enfermidade não foi detectada em seu estágio inicial quando, pelas atuais condições da medicina, as possibilidades de cura são muito maiores. Quanto mais cedo o câncer é diagnosticado,mais crescem as perspectivas de que seja eliminado do organismo.
Com a progressão desimpedida da enfermidade, ela tende não só a aumentar localmente, mas também a difundir-se no corpo através das chamadas metásteses- migração para outras áreas do organismo de células cancerosas.
A oncologia tem feito grandes progressos nas últimas décadas. Se revelados em fase inicial, quase todos os tipos de câncer podem ser tratados com sucesso. Há, no entanto, uma grande variedade na virulência dos seus diversos avatares. Por outro lado, a experiência demonstra que as possibilidades estatísticas de vencer o insidioso ataque são muito maiores se o enfermo recorre a tratamento na sua fase inicial.
A descoberta da doença por Chávez em estágio mais adiantado, a par da desvantagem clínica acima indicada, também o forçou a escolha que tampouco correspondia ao seu precípuo interesse como paciente.
Ao invés de procurar tratar-se nos centros médico-hospitalares mais adiantados, e com maiores recursos, Hugo Chávez Frias optou por continuar a ser cuidado em Havana. Muito provavelmente, sua eleição se deve a preocupações de sigilo clinico. Tal ficou bastante claro nos contatos tentativos estabelecidos com o Hospital Sírio-Libanês.As exigências que foram colocadas, todas elas relativas a uma obsessão de segredo, a que esse nosocômio, pelas suas normas de transparência, não pode admitir.
Por isso, Chávez - e o seu círculo – se viram obrigados a continuar o tratamento em Cuba. Em todos os regimes autoritários, através dos tempos, a regra da suposta manutenção da saúde do autocrata tem sido respeitada. Até o papado o evidenciava em passado relativamente recente. Já foi citado por este blog o provérbio romano segundo o qual o Papa goza de ótima saúde até a sua morte. Mutatis mutandis, essa verdade do poder se aplica ao próprio Chávez, quando procura tranquilizar a população no que tange às perspectivas da doença.
A leitura de sua situação clínico-patológica, no entanto, tende ao pessimismo. Ao lado de suas assertivas, ora repetidas de confiança na intervenção divina, continuam a avançar os sinais do temor do oficialismo, como o é a formalização do Conselho de Estado, que visaria a blindá-lo contra a sua falta. Por outro lado, fala-se de fratura em parte do fêmur. Embora seja possível que se origine do emprego da radio-terapia, o mais provável seria a metástese óssea.
Dentro das condições de ocultação do estado da doença, os rumores representam as frestas pelas quais a verdade tenta vir a tona. Se esse estado de coisas pode ser conducente a diversas discrepâncias, o bom senso tende a sublinhar a probabilidade do agravamento de sua condição clínica, e do consequente recurso a todo tipo de fabulação.
Como no caso emblemático dos antigos pontífices, a cujo poder absoluto se aferrava a sua família e todo o entorno respectivo, as tentativas de estender tal domínio teriam sempre o limite ineludível e inexorável da morte física do Papa, e o respectivo termo do Pontificado.
No dizer do monge Roger Bacon conhecimento é poder. Essa máxima aparentemente singela, se não tem os seus efeitos desmentidos por mudanças abruptas, tende a ser, em tais casos, utilizada com maior proveito pela outra parte.
( Fonte: O Globo )
Nenhum comentário:
Postar um comentário