Os Estados Unidos estão em pleno verão boreal, a Administração Barack Obama apenas completa sete meses, e o Presidente e família terão férias em Martha’s Vineyard, balneário elegante em uma ilha na costa de Massachusets, que é famoso desde os tempos dos Kennedy.
Ao contrário do que prenunciavam as primeiras pesquisas, com índices de aprovação bastante altos, o primeiro semestre não terminou sob os mesmos auspícios. Os horizontes não mais se encontram desanuviados, com as risonhas perspectivas da posse ao pé do Capitólio.
Pode-se ponderar que não é surpreendente venham as coisas a evoluir dessa forma, eis que as expectativas trazidas da campanha e da eleição tendem a defrontar-se com as dificuldades do governo cotidiano, as impaciências de seus partidários, as dúvidas dos independentes, e raivosa indisposição da direita, incitada e açulada pelos demagogos de plantão, como Rush Limbaugh.
Sem embargo, o quadro hodierno da opinião pública estadunidense mostra ventos de mudança, e não para melhor: a aprovação geral de Obama caíu doze pontos, ora se achando em 57%. Por sua vez – e o que é mais preocupante – a desaprovação do novo presidente ascende a 40%. Verifica-se, portanto, tendência para crescente polarização da opinião pública, não mais desequilibrada como de início, mas aproximando-se de uma virtual equipolência.
Aumenta, por conseguinte, a insatisfação com a liderança de Obama, e como decorrência natural, as resistências às propostas da Administração democrata.
Na verdade, esta oposição, se é reflexo de diversas causas, tem uma determinante principal, que avulta diante das demais e constitui o fator precípuo para condicionar os ânimos em um viés contrário ao governo de Barack Obama.
Tampouco há de surpreender que tal papel venha sendo desempenhado pela proposta de reforma do plano geral de saúde.
Ao invés do profissionalismo evidenciado para a obtenção da indicação pela Convenção do Partido Democrata, profissionalismo este que levou a campanha de Obama a superar Hillary Clinton, a favorita para a nomination, na longa e quase interminável disputa das primárias partidárias, a Administração Barack Obama não se preparou de forma adequada para enfrentar as mui previsíveis manobras da coligação opositora a quaisquer mudanças substanciais no statu quo da assistência sanitária nos Estados Unidos.
Dado o precedente do embate da Administração Clinton contra essa nada santa aliança, que abateu a tentativa capitaneada pela Primeira Dama Hillary Clinton com frustrante facilidade, fica difícil adivinhar por que razão esta nova investida foi empreendida de forma tão pouco coordenada e quase amadorística.
A despeito dos esforços do Partido Republicano e de sua esbravejante ala tele-radiofônica, em apresentar a presente proposta como intento de implantar o socialismo médico em terra americana, na realidade a questão não é ideológica.
Essa argumentação política nada mais é do que cortina de fumaça para convencer a maioria do povo estadunidense de um perigo inexistente. Com essa vociferante linha auxiliar que, como de hábito, não tem escrúpulos no seu trato com a verdade, a coligação farmaco-médico-hospitalar e as grandes seguradoras almejam afastar a ameaça governamental às enormes vantagens econômico-financeiras auferidas pelo atual sistema, baseado na maximização do lucro e não no interesse de cada paciente.
Quanto ao partido republicano, normalmente a reboque do grande capital, tudo que contribuir para abalar a posição de Barack Obama e do partido democrata será compreensivelmente bem-vindo, atendido o recente desastre eleitoral que lhe dizimou a representação no Senado e na Câmara.
Outro equívoco da Administração Obama foi o de não privilegiar agências públicas de assistência sanitária – que é o paradigma adotado por Nancy Pelosi na Camara de Representantes – e indicar por baixo do pano que poderia trocar tal modelo pelo de cooperativas sanitárias sem fins lucrativos. Esta é a solução preconizada pelo Comitê de Finanças do Senado, presidido pelo Sen. Max Baucus (Montana). Um grupo de seis senadores (três democratas e três republicanos), liderados por Baucus e por Charles E. Grassley (Iowa/Rep.) estaria buscando solução de compromisso, com o aparente apoio da Casa Branca.
A irritação em muitos parlamentares democratas tem aumentado, diante da disposição presidencial de abandonar a opção pública, que faz parte do programa partidário, por uma versão aguada do plano de saúde, que é aceita por republicanos e pelo lobby das seguradoras privadas, presumivelmente por não apresentar qualquer risco ao predomínio do presente sistema.
Apesar de dispor de sólidas maiorias na Câmara e no Senado, Obama tem envidado esforços para lograr o apoio de republicanos, em busca de ilusório plano bipartidário, com o qual o G.O.P. – excluído um insignificante punhado de moderados – não dá sinais de que possa estar de acordo.
O que vemos, portanto, é que no encalço da miragem de plano bipartidário, Obama aliena o apoio da ala progressista (que se sente traída). Por outro lado, dentro de lógica arrevezada, aceita continuar a negociar com o Senador Grassley, mesmo depois da acusação mentirosa deste senador de que o Plano de Saúde da Administração Obama incluía cláusulas com supostas câmaras da morte para velhinhos...
Talvez não seja demasiado tarde para que a atual situação possa ser revertida. Se, no entanto, Obama e seu Chefe de Gabinete, Rahm Emanuel, esquecerem o profissionalismo da campanha eleitoral, e buscarem amigos entre seus adversários, mais uma vez o povo americano não terá plano de saúde digno do nome, a par de outras pouco agradáveis consequências políticas que acompanharão esse malogro.
domingo, 23 de agosto de 2009
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Um comentário:
O artigo foi um alerta. Não estava acompanhando o encaminhamento dado pelo Obama em relação às agências públicas de assistência sanitária. Para variar o poder público se dobrando para o poder privado. Parece que esta questão não tem condições de avançar.
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