sábado, 4 de abril de 2020

A Cofid-19 pode acabar com a UE?


                              
          Seria um desastre para o ideal da União Europeia que a praga do coronavirus lograsse acabar com a instituição de Bruxelas. Diante do visível agravamento dos problemas da UE, por conta dos efeitos da pandemia, alguns líderes já temem  que a Cofid-19  possa acirrar crise que contribua para que esse sonho tornado realidade por líderes como Robert Schuman, Konrad Adenauer  e tantos outros venha a ser atingido e enfraquecido por posturas que privilegiem interesses particulares nacionais sobre a necessidade da união comum, em que a ambição de nações-membro, por vantagens  de toda natureza venha a passar adiante do que é essencial - a união em torno de organização sediada em Bruxelas, como pressuposto determinante de o que carece de ser mantido acima de tudo -  a unidade da organização e a sua manutenção acima de todas as conveniências particulares e setoriais, eis que ela é a cynosure que não só representa o anseio do europeísmo, mas também o fortalecimento de instituição que está acima de quaisquer particularismos, pois ela simboliza a reificação de um ideal concreto - a paz e a prosperidade na Europa, que está acima de jogos de poder como concretização de uma meta por muitos séculos ansiada e por fim implementada. O interesse geral europeu supera as eventuais conveniências nacionais, e ele, sob nenhuma condição, pode ser preterido ou negligenciado, porque tal equivaleria à desconstrução de um ideal que veio sobrepor-se ao flagelo das guerras entre países fraternos, o que equivale a conflitos intestinos.

           As crises podem revestir interesse, na medida em que apontem medidas indispensáveis a serem tomadas, assim como a necessidade de privilegiar o comunitário sobre o particular. Na comunidade, enquanto ela for respeitada, estará toda força, guardada a premissa de que a CEE existe não para benefício de uns poucos, mas de um conjunto de países europeus que privilegia a unidade como a reificação da defesa do interesse e dos princípios democráticos, que sobrelevam às conveniências particulares. Não foi por acaso que a consolidação da presente organização em Bruxelas correspondeu a um interesse conjunto europeu, em que o todo sobreleva ao particular.
           
            Não se esqueçam que nos particularismos está a origem de todos os conflitos e foi com o escopo precludente de estabelecer o organismo europeu para evitar que os interesses nacionais continuassem a ser a raiz dos séculos de conflito que caracterizam a história do Velho Continente. O homem já venceu a muitas pragas e pestes na sua história.  Bruxelas sedia um organismo que representa o interesse pan-europeu. Que não se esqueçam os seus membros que, se na União está a força, a Paz inexiste ou claudica,  se o interesse comum é desvirtuado em favor de vantagens setoriais. A Europa, que Bruxelas representa, vela pelo bem comum europeu, mas sem cegos egoísmos nem torpes particularismos, porque o escopo de quem aqui está a representar e defender os ideais dos maiores europeus, não deve esquecer por um momento quantos sacrifícios nacionais e pessoais cobraram os muitos Poderes Nacionais, com os sangrentos resultados que vemos povoar tantos monumentos no Velho Continente. 

              A União Européia, pelo peso da História, de tantas lutas, muitas decerto gloriosas, mas outras também maléficas e perniciosas, soube elevar-se acima dos particularismos nacionais, porque a experiência política europeia mostra que na justiça e na defesa dos princípios europeus do igualitarismo está a reificação de uma filosofia política que privilegia a Paz e o interesse comum, porque se a jornada foi longa, ao cabo de tantos conflitos, a geração do pós-guerra mundial e os seus herdeiros, que vemos à volta, devem defender o europeísmo não como algum ideal a ser retirado de velhos baus,  mas a expressão da coerência que é defensora exaltada da Paz e do Interesse Geral, no caso da vasta, multiforme Nação europeia.  Não da boca para fora, ela  é filha e portanto defensora da Justiça, que não é apenas placa atrás do dossel de um Juiz ou de um Tribunal.  Como organismo democrático que somos, estamos aqui para defender a Europa como símbolo de Justiça e de atenção a todos os seus filhos e como extensão deles, as suas Nações Membro. Preservemos a sua unidade que surge como projeção do interesse comum. E tal interesse não é mera figura de retórica: ele existe para dar sentido ao princípio acima enunciado, que veio permitir que o patrimônio e o ideário da União Europeia seja representado pela Democracia e a defesa de seus princípios de Justiça e Equidade.  Estaríamos desmentindo e renegando a herança que as mentes fundadoras  desse organismo nos legaram se ousássemos quebrar tais princípios e ideais, pois a grande força de organizações como a União Europeia está na respectiva defesa dos interesses de todos os Países Membros - e quem há de contestar que aí se insere a Justiça para todos,  na defesa pertinaz dos direitos de todos os membros, na expressão imorredoura de outro Continente, cuja nação também deve associar-se a tal propósito, porque ela é também decorrência dos princípios que nortearam essas palavras.

( Fonte: O Estado de S. Paulo )

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