sábado, 30 de abril de 2011

A Inflação e o Mercado Internacional

           Por enquanto, a súbita irrupção da inflação na economia brasileira tem provocado duas espécies de reação. De um lado, as chamadas notícias ruins, que são os índices inflacionários, bem acima das metas do Banco Central e do Ministério da Fazenda, e também nessa faixa, o desempenho da Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa).
           De outra parte, as notícias boas se cingem por ora ao meio ponto percentual – julgado suficiente pelo Copom para controlar a carestia -, às providências da Fazenda no que concerne à contenção do crédito, e, last but not least (por último, mas não por menos), as promessas da Presidente Dilma Rousseff de mobilizar a administração nesse combate. Ontem mesmo,no pronunciamento dedicado ao 1º de maio, Dilma, na sua voz monocórdia, sublinhou que o ‘governo vai jogar duro contra a inflação’.
           Lula já entregou a faixa presidencial faz muito, mas a sua presença, para o bem, e para o mal, continuará a ser sentida em muitos aspectos. Para não ficar tão só nas ruins, na alocução da noite do dia 29 – Getúlio Vargas, que abriu as portas do governo para o fator trabalho, costumava falar em praça pública no dia primeiro de maio – a Presidente se comprometeu a muitos programas – alguns retirados da cartilha do candidato do PSDB – e fez apresentação bastante burocrática das futuras benesses a serem distribuídas. O Presidente Lula, com a sua longa prática política, sabia tornar interessantes os temas de sua apresentação, retendo a atenção do espectador pela hábil dosagem das inflexões do discurso.
           Quanto às más, talvez a abertura irresponsável das cancelas para o nosso familiar dragão haja sido a mais grave. Essa dádiva, um senhor pepino que caíu no colo da sucessora, começa a repontar em muitos cantos. Espera-se que o governo – e nesse conceito sublinho a Presidenta, o Ministro da Fazenda e o Ministro-presidente do Banco Central – cumpra o que dele se espera, não apenas na palavra, mas sobretudo na práxis.
           O noticiário econômico de hoje trata do respingo da inflação na bolsa brasileira, a Bovespa. O seu comportamento foi realmente decepcionante no passado mês de abril, se cotejado com os demais mercados mobiliários do mundo. Nesse mês, a queda foi de 0,48%, considerada a variação do dólar, de acordo com dados da Bloomberg.
           Dessarte, na variação em abril do dólar, para os negativos 0,48% da Bovespa, se contrapõem os dados positivos das bolsas de Frankfurt (11,35%), Paris (7,42%), Londres (6,83%), o Dow Jones de New York (3,98%) e a Nasdaq também de New York (3,32%). Até a bolsa de Tóquio assinala no mês marca superior à nossa (3%), assim como, Cidade do México (2,19%) e Hong Kong (0,96%).
           No que respeita à evolução durante o ano, Frankfurt continua a liderar com 20,39%, Paris se segue com 19,57% e Londres, bem abaixo com 10,24%, as duas bolsas nova-iorquinas (Dow Jones e Nasdaq) com, respectivamente, 10,65% e 8,32%. Na parte de baixo da lista, Hong Kong, com 3,06% e Cidade do México, com 3,02%. A única bolsa com desempenho inferior à brasileira é a de Tóquio, cujos 3,71% negativos têm pesadas razões como justificativa. A nossa performance, de 0,48% positivos, deixa portanto bastante a desejar.
           Por que a atuação da Bovespa vem sendo tão medíocre ? O principal motivo do recuo é a inflação, com o seu súbito avanço e o que promete de efeitos desestabilizadores na economia.
           O Brasil sofreu por muitos anos a estagnação econômica que é um dos principais fenômenos decorrentes da espiral inflacionária. Afetada a moeda no que tem de mais importante que é a promessa de estabilidade no respectivo valor, entramos no que os chineses denominam de tempos interessantes, dada a possível mutabilidade dos principais marcos de referência.
           O investidor foge das incertezas como o diabo da cruz. Surto inflacionário ou a sua ameaça, implicam em medidas de restrição ao crédito e a outras possibilidades heterodoxas. Por isso, se às voltas com altas no custo de vida, a atração do país emergente decresce deveras, eis que os fundos dos inversores hão de preferir o investimento em países desenvolvidos, que não têm pressão inflacionária, e indicam recuperação econômica.
          A valorização do real pode ter aspectos negativos pelos problemas que causa na sua apreciação em relação ao dólar estadunidense. Não obstante, a respectiva estabilidade é uma espécie de fanal que atrai o investidor estrangeiro, à cata de juros mais altos para os seus fundos. Para um país com tendência tão marcada para os balanços de contas correntes deficitárias, tal afluxo constitui verdadeiro maná, poupando a autoridade monetária de negociar o equilíbrio das contas em condições por vezes difíceis e onerosas.
          Agora, com o ingresso em cena de dona Inflação tudo tende a mudar. As correntes que prestigiavam o mercado brasileiro (e a sua bolsa) encetam o caminho inverso, e, de uma hora para outra, de orgulhosos credores passamos à diversa condição de devedores.
          Por conseguinte, em finanças, as boas situações não decorrem de ocos jogos de cena. É necessário fazer o dever de casa e é deste dever de que o mercado internacional, pelos motivos conhecidos, passou a duvidar.
          Por tal razão, o mercado internacional tem os olhos postos em Dilma Rousseff, Guido Mantega e Alexandre Tombini. De suas ações – e não de seus discursos – e resultados objetivos alcançados, dependerá a respectiva reação estrangeira. Se as águas continuarem revoltas, as conversas de nada servirão.


                                                                           ( Fonte: O Globo )

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