sábado, 1 de dezembro de 2012

O Inferno Astral de Susan Rice


                                           
            Os republicanos podem estar em minoria no Senado Federal, mas não será por isso que hão de desistir de colocar entraves à eventual candidatura de Susan Rice à sucessão de Hillary Clinton no Departamento de Estado.
            Dessa questão o blog de dezenove de novembro p.p. já se ocupara, mas o passar das semanas não parece ter enfraquecido a empresa de senadores do G.O.P., que dá a impressão de alimentar-se de antiga quizília de Rice com o então candidato presidencial John McCain.
            A campanha terá deixado ressentimentos em McCain pelas críticas acerbas que julgou haver recebido da democrata Rice, cujo estilo nunca terá pecado por excesso de diplomacia. A vingança, aquele proverbial prato que se come frio, se é presença amiudada na política, costuma ser um empecilho nesse peculiar mundo, por trazer conotações pessoais a questões que hão de pairar melhor na esfera dos assuntos de estado.
            Se ainda não há indicação formal de quem sucederá Hillary nas relações exteriores, Susan E. Rice, a presente embaixadora estadunidense no Conselho de Segurança, parte na disputa com o caloroso apoio do próprio Presidente Barack Obama, que a definiu como ´extraordinária´, com  soberbo trabalho no Conselho. A par disso, Rice estaria palmilhando uma trilha conhecida, como na segunda administração de Bill Clinton por Madeleine Albright.  
            Até o presente a discussão limita-se aos ‘talking points’, que fundamentaram a intervenção de Rice nas entrevistas televisivas de 16 de setembro p.p dos principais canais. Essa expressão inglesa que se refere aos tópicos a serem desenvolvidos no discurso concerne neste caso a um papel preparado pelos setores de segurança (CIA), relativo a “manifestações”, ‘inspiradas espontaneamente’ pelos protestos no Cairo contra um vídeo que satirizava o Profeta Maomé.  Posteriormente, a identificação dos suspeitos atacantes fora substituída pelo termo ‘extremistas’, para evitar designações explícitas dos grupelhos terroristas envolvidos.
            Como se sabe, a candidatura Mitt Romney e o partido republicano tentara transformar o assassínio do embaixador americano J. Christopher Stevens em uma questão eleitoral, com vistas a embaraçar o presidente, levantando a suspeita de eventual responsabilidade no magnicídio. A exemplo de outros, tampouco esse propósito frutificou, pois a opinião pública teve presente o irreprochável desempenho no particular da Administração Obama.
            Há de causar espécie, por conseguinte, que integrantes da bancada republicana na Câmara alta, depois das salvas iniciais do senador John McCain, queiram transformar em principal peça da acusação contra Susan Rice justamente os aludidos talking points que fundamentaram a intervenção da embaixadora nas Nações Unidas. Sem responsabilidade direta no tema – e atendendo a pedido da Secretária Hillary Clinton – o que se poderia increpar à Susan Rice seria uma suposta falta de discernimento político quanto ao aludido papel, a que de resto ela corretamente se cingira.
           A via crucis de Rice no Senado continua em série de reuniões, em que foi acompanhada por Michael Morell, candidato a diretor da  CIA. Seguindo o script partidário, tanto a Senadora Susan Collins (Maine-Rep), a mais antiga da oposição no comitê de inteligência, quanto o Senador Bob Corker (Tennessee- Rep) não se impressionaram com a argumentação da pré-candidata democrata. No entanto, a observação de Collins pode ser útil para sublinhar as limitações dos questionamentos do GOP:  “continuo a ser perturbada pelo fato de que a embaixadora na  ONU decidiu desempenhar o que era essencialmente um papel político durante o momento mais agudo em uma contenciosa campanha política presidencial”. Por isso, acrescentou a Senadora pelo Maine “ela necessitaria de mais informação suplementar”, antes que possa apoiar a candidatura de Rice a Secretária de Estado.
            Se não se discute a capacidade de Susan Rice para assumir o Departamento, seria um erro atribuir a principal objeção à sua candidatura ao seu caráter pugnaz, ao invés dos dotes suasórios que possam servir para o encargo. Tais razões podem ser instrumentais no intento de afastá-la, mas não constituem a verdadeira motivação da bancada republicana.
          Com efeito, há outro potencial candidato para o posto de Secretário de Estado. Trata-se de John Kerry, ex-candidato derrotado a presidente em 2004. Não se discutem nem as qualificações, nem a respectiva aspiração desse senador democrata para o posto. Sem embargo, a simpatia dos colegas do GOP pela eventual candidatura de Kerry semelha constituir a inegável motivação para essa rejeição da embaixadora Rice.
         Para tornar-se Secretário de Estado, John Kerry careceria de renunciar à sua cadeira de Senador por Massachusetts. Tal representaria uma dádiva inesperada para os republicanos. Depois da vitória de novembro, com o reforço da maioria da  bancada democrata no Senado, além de não ser o momento de enfraquecê-la, implicaria em óbvia oportunidade para o senador republicano Scott Brown, que acaba de ser derrotado por Elizabeth Warren, de tentar recuperar o assento como senador por Massachusetts através de mais uma eleição especial.
         Dessa maneira, se para a pré-candidata Rice os republicanos só vêem dificuldades, as observações acerca da designação de John Kerry chegam a ser embaraçosas pelo unânime sentimento no GOP de que ele não  teria qualquer dificuldade em ser confirmado pelo Senado..
           Diante de o que precede, e o manifesto êxito da embaixadora Susan E. Rice na difícil missão de representante estadunidense junto às Nações Unidas (e notadamente como membro permanente do Conselho de Segurança), todas as restrições apresentadas pelo GOP    fundadas no limitado documento de talking points tendem a configurar o tropo de linguagem designado por red herring, vale dizer um desvio intencional da real motivação das reservas republicanas.
          Como é conhecido o porquê do boi na linha na pré-candidatura de Susan Rice, as condições se colocam para que a Administração Obama e a bancada liderada pelo Senador Harry Reid decida não pelo que manifestamente aproveita ao GOP,  mas sim o que constitui o precípuo interesse não só do partido, quanto do próprio governo.
          No caso, se não seria citável o pensamento de Mao Zedong, não há negar que se encaixe perfeitamente na conduta dos senadores republicanos. Para o fundador da RPC, a avaliação de qualquer proposta não pode eximir-se de determinar qual é a sua fonte autoral, pois ela ajudaria a determinar qual constitui a sua real intenção.                 

 

( Fonte: International Herald Tribune )

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