Nova Carta por referendo ?
Hoje está sendo votada a nova Constituição síria. De acordo com a vontade do Palácio, submete-se ao povo a sua aprovação por referendo. Supostamente, anunciaria passagem a um regime mais democrático, que sucederia ao atual de partido único por um multipartidário.
Semelha óbvio que se insere nas vãs promessas de Bashar al-Assad. Até o presente, ele as descumpriu todas e nada, absolutamente nada, garante que agora seja diferente.Tentar aprovar nova carta magna nas presentes circunstâncias, com um país conflagrado por situação que beira a guerra civil, com cidades – como Homs – sitiadas e sob a artilharia pesada, grita aos céus não ser este o momento mais adequado.
A oposição anuncia o propósito de não comparecer, pela absoluta impropriedade do procedimento, seja pela sublevação, seja pela falta de credibilidade de quem apresenta a mensagem.
Nesse tipo de regime é sabido o valor do voto. A fraude campeia, e os encarregados das seções de votação conhecem bem o próprio ‘dever’ que é o de apresentar os inchados totais das urnas da ditadura, como sói acontecer não só em muitos países árabes,como na Federação Russa do aliado Vladimir Putin, e na ditadura bielo-russa de Alexander Lukashenko.
Não é de hoje que os princípios inseridos em tais Constituições não correspondem à realidade do país. Já nos tempos sombrios da ditadura de Josef Stalin, pobre daquele que porventura acreditasse nos ditames da Carta. Muito cedo seria expedido para o arquipélago Gulag, que nos descreve Alexander Soljenitsin.
No caso de Bashar al-Assad, dados os extremos em que se debate, trata-se de patético artifício, que sequer engana a seus partidários.
Há ironia pesada na participação, tornada inelutável pelas circunstâncias, do ex-candidato derrotado no segundo turno, com todos os seus 44 milhões de votos, em uma primária para escolha do representante do PSDB para o próximo pleito do poder executivo municipal de São Paulo.
A relevância da disputa não tem nada de simbólica. Trata-se do terceiro orçamento na União, e o PSDB não se pode dar ao luxo de perdê-la. Por isso, a aceitação de José Serra de passar pelas forcas caudinas das primárias partidárias, em que disputará com militantes que não tem qualquer comparação com a sua força nacional, estadual e municipal, implica, a par da incógnita da votação em colégio reduzido, em desconforto ineludível. Para que ele não se transforme no coveiro do PSDB, terá de submeter-se ao teste das primárias, sob o sufrágio da militância. Para a eleição anterior, Serra lograra inviabilizar a proposta do desafiante Aécio Neves.Sua negação lhe terá custado caro, dada a circunstância de haver acarretado, segundo alguns, a sua quase cristianização pelo rival em Minas Gerais.
Por sua vez o PT, que tanto apreço tinha pelas primárias, agora parece preferir a verticalização das indicações, como sinalizado pela imposição pelo ex-Presidente Lula do nome de Fernando Haddad, com o brutal afastamento da candidata natural, a Senadora Martha Suplicy. Haddad é o típico candidato oficialista, que pode congregar, como o fez em 1953 Francisco Antonio Cardoso no embate contra Janio Quadros, uma ampla aliança (UDN, PTB, PSD PR e PSP)de diversos medalhões (o governador Lucas Garcez e Adhemar de Barros, entre outros). Tal, no entanto, não foi suficiente para deter o quase desconhecido Janio Quadros, apoiado por dois pequenos partidos (PDC e PSB), a esmagá-lo com o dobro dos votos.
Se o poder corrompe, como na frase célebre de Lord Acton, ele também pode tornar menos sensíveis para os desafios e sobretudo as mutações da política aqueles acostumados a pairar nas alturas da aprovação popular.
Tal semelhava ser o caso de gospodin Putin – um gigante no regime sucessor de Boris Ieltsin. No entanto, a realidade pode preparar surpresas para aqueles que se julgam votados à trajetoria ascendente nas altas esferas de governo.
O que seria apenas um episódio no trajeto reservado a Putin – com a volta à presidência, denegada a reeleição a Dmitri Medvedev – representou, na verdade, forte e real choque para as otimistas expectativas do atual Primeiro Ministro.
Os comícios para a Duma, a forma em que se realizaram, não só com a súbita presença de votação contra o partido oficial, mas também com a irrupção de uma despejada fraude, contribuíram para modificar radicalmente a avaliação de Putin, assim como e sobretudo, o mito de seu controle dito absoluto da política na Rússia.
Para quem gosta de se apresentar com o torso desnudo – em clara imitação do Duce Mussolini, na sua divulgação da chamada Batalha pelo Trigo -, ou em outras posturas de homem forte, Vladimir Putin terá sentido o insidioso ataque dos comícios de oposição, e de uma relativa queda na respectiva avaliação.
Apesar de ser bastante provável sua vitória, já em primeiro turno, para o próximo sexênio, dada a pobreza do grupo de candidatos selecionados para enfrentá-lo (como o secretário do Partido Comunista Guennadi Ziuganov, Vladimir Jirinovski, da direita nacionalista). A perspectiva de um segundo turno afigura-se como um evento bastante improvável, embora não possa ser excluído. Putin antes pairava em níveis de aprovação de cerca de 80%. As últimas peripécias o redimensionaram , mas nada ainda que implique na hipótese de um segundo escrutínio, eis que a sua popularidade ora se situa em torno de 60%.
Para causar uma eventual surpresa, da ordem daquela provocada por François Mitterrand no pleito para o segundo septenato de Charles de Gaulle, até o momento o homo novus, encarnado pelo multimilionário Mikhail Prokhorov, não representa efetiva ameaça, eis que a aprovação deste último está ainda no reino de um só dígito. Como o primeiro turno está marcado para quatro de março as possibilidades de uma reviravolta não são grandes. Mas, manda a prudência, não fechar-lhe por inteiro a porta.
( Fontes: O Globo, International Herald Tribune )
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