sábado, 30 de agosto de 2008

Dos Jornais - IX

FOLHA DE S. PAULO (30.VIII.08)
O GLOBO

Eleições Americanas. A escolha por parte de John McCain de Sarah Palin, republicana, governadora do Alaska, como sua companheira de chapa tem diversas facetas. Por um lado, representa hábil jogada política, que constrange Barack Obama em sua decisão de preterir Hillary Clinton, sua adversaria nas primárias, e sobretudo na negativa de compor-se com Hillary e formar o que os americanos chamam de ‘dream ticket’, isto é, a chapa partidária mais forte. Não há negar que John McCain, ao convocar a desconhecida Palin como candidata à Vice, contribui de forma determinante para que os dezoito milhões de eleitores da Senadora por New York não se esqueçam até novembro do tratamento não exatamente favorável que o Senador Obama optou por dispensar à sua rival nas primárias democratas. Ironicamente, o conservador (e havido como independente) John McCain toma posição supostamente mais aberta e progressista do que o seu contendor, indicando uma mulher como candidata a Vice-Presidente.
Não é pouca coisa decerto, eis que será a segunda mulher candidata a Vice (a primeira foi Geraldine Ferraro, vice de Walter Mondale, em 1984, em chapa derrotada por Ronald Reagan e George Bush senior). Obama julgou que Hillary não fazia por merecer tal designação. Com todos os discursos que procurem eludir (spin) este fato, será ele constante dessa eleição, que afetará de algum modo a muitos eleitores e sobretudo eleitoras de Hillary, não muito felizes com o tratamento que lhe foi reservado por Obama e a cúpula democrata.
Entretanto a questão não se limita a tal aspecto. Há igualmente na seleção conotações com implicações negativas. Sarah Palin de 44 anos é ainda mais conservadora do que McCain, sendo adepta do criacionismo (que nega a teoria da seleção natural de Darwin), da derrubada da decisão da Suprema Corte em Roe versus Wade (o que implica em ser contrária ao aborto), evangélica, favorável à exploração do petróleo no círculo ártico e à política econômica de Bush. Em algumas dessas questões, e notadamente na do aborto, Sarah Palin tem posições mais radicais do que McCain.
Para alguém que seria o sucessor direto de um septuagenário com problemas de saúde, o lado democrata aponta para a sua experiência nula em matéria de política externa, o que, salvo engano, não semelha um argumento muito forte se se perguntar qual é a experiência nesse campo do candidato democrata.
Finda a Convenção de Denver, a presteza tática de John McCain não ensejou a Obama sequer um fim de semana para descansar nos próprios louros. Agora, será aguardar a Convenção Republicana, a realizar-se na próxima semana. Uma vez concluída essa fase, se poderá verificar qual o candidato que se acha na dianteira, ao encetar-se o periodo decisivo da campanha. Nesse ensejo, será importante observar se a polêmica indicação por John McCain de uma mulher há de representar um fator relevante na determinação do resultado dessa eleição presidencial.

Um comentário:

Rafuili disse...

Difícil saber se Palin contribuirá para atrair votos dos indecisos ou se enfraquecerá a campanha McCain em razão de suas parcas qualificações políticas e da evidente capacidade de gerar fofocas sobre sua vida familiar. McCain, de moto próprio ou incitado por seus "spin doctors", evidentemente procurou explorar o "gender issue" a seu favor na equação para novembro. Sua "running-mate", contudo, deveria ter sido escolhida mais por suas qualificações pessoais e políticas do que por sua idade, beleza (aliás questionável) e seu "novelty factor", aspectos que parecem ter prevalecido na surpreendente decisão final (se é que esta foi efetivamente final...)
Decerto o GOP tem em suas fileiras mulheres mais qualificadas (não digo necessariamente experientes) para o possível exercício da presidência.
O perfil político da governadora "Miss Simpatia" (ler, a propósito, a coluna de Maureen Dowd no NYT de ontem) não inspira confiança ou entusiasmo. Não falo, repito, de sua experiência, mas sim de sua trajetória, que evidencia ser pouco mais de uma política acidental. Me absterei de maiores comentários sobre o interesse mediático em torno da vida pessoal da governadora e de sua família, frisando apenas que nos EUA esse tipo de notícia pode eclipsar rapidamente qualquer aspecto positivo - e relevante - de uma candidatura.
É certo que o conservadorismo de Palin atrairá eleitores (algum que já não estivesse deciddido a votar por McCain ou contra Obama?), mas espantará boa parte do eleitorado feminino, certamente as minorias hispânica e negra, e qualquer eleitor "pro-choice", ambientalista ou a favor de leis mais rígidas para controle de armas de fogo. Duvido que sua idade, aparência física e o fato de ser "nova" na cena política em Washington desequilibrem a balança em favor dos republicanos. No frigir dos ovos, não me parece ter sido uma escolha sensata.