A tão esperada decisão do STF sobre a Lei complementar nr. 135, geralmente conhecida como lei da Ficha Limpa, tardou bastante. Infelizmente, o resultado será comemorado por poucos – os beneficiários desse virtual interregno que lhes foi concedido -, e deplorado por muitos.
Não lancemos toda a responsabilidade sobre os ombros do novel Ministro Luiz Fux. Afinal, o seu voto não é solitário e se junta a outros cinco, que também se tinham pronunciado pela não-validade imediata da Lei da Ficha Limpa.
De início, os cinco ministros que souberam entrever, além do formalismo, o interesse da Nação: Ayres Britto, Joaquim Barbosa, Ricardo Lewandowski, Carmen Lúcia e Ellen Gracie.
Nada melhor sintetizara tal desígnio que o Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral. Pelas mãos do então Secretário Geral da CNBB, o bispo D. Dimas Barbosa, comissão do MCCE fez entrega, em setembro de 2009, a um contrafeito Presidente Michel Temer, do projeto de lei de iniciativa popular, que seria avalizado por cerca de dois milhões de eleitores.
Contra tal propósito de moralização do acesso aos Poderes Legislativo e Executivo – e fazer para tais cargos valer o requisito a que se submetem os postulantes de qualquer emprego público, por humilde que seja – olhava indisposta, por trás do desconforto do Presidente da Câmara dos Deputados - a maioria corporativista da Câmara e do Senado Federal.
Dessa magna lei, muitas lições podem ser tiradas. A primeira delas é dupla: encômio aos constituintes que oportunamente acolheram o instituto da iniciativa popular para as leis. Em fim de contas, a soberania do Povo não é apenas recurso retórico, a enfeitar os preâmbulos das Constituições.
Essa aspiração pela moralização das duas Casas do Congresso – que semelha não conviver bem com os rarefeitos ares da capital federal – era sentida por largo arco da sociedade brasileira. Ela se pauta por princípios éticos e morais que muita vez não logra distinguir no comportamento de muitos de seus representantes.
A tramitação dessa proposta legislativa de iniciativa popular pode servir de manual de consulta futura para outros projetos. Seria impensável a aprovação de qualquer projeto oriundo de legislador ou grupo deles, que se propusesse os mesmos fins perseguidos pela iniciativa popular capitaneada pelo MCCE. Somente a pressão da opinião pública – e não aquela publicada – enfiou goela abaixo de Suas Excelências o sufrágio unânime de o que se tornaria a Lei Complementar nr. 135. Todas as reticências e dificuldades foram postas de lado, na evidenciação das razões que subjazem na máxima de que a hipocrísia é a homenagem que o vício presta à virtude.
Se há tristeza com a sentença do Supremo – e há fundados motivos para tanto -,
deixemô-la de parte e nos voltemos para o futuro, não esquecidos que esse trabalho de moralização e aperfeiçoamento da democracia é obra comprida e aturada. Entrementes, para informar o manual da viagem para novos e mais reconfortantes ares, citemos observações para tanto valiosas: “O cidadão tem o direito de escolher, para a formação dos quadros estatais, candidatos de vida pregressa retilínea”(Ayres Britto); “a História nos mostra que, de tempos em tempos, é preciso fazer opções” (Joaquim Barbosa); “ Não se verificou alteração da chamada paridade de armas.Todos os candidatos de todos os partidos estavam exatamente na mesma situação antes do registro, antes das convenções partidárias” (Ricardo Lewandowski); “Não vejo quebra das condições de igualdade” (Carmen Lúcia); “A Lei da Ficha Limpa permanece. O STF não derrubou a lei. Pelo menos não por enquanto.” (Ellen Gracie).
A respeito dessa inesperada suspensão da validade da Lei Complementar nr. 135,
se afigura, outrossim, relevante mencionar o que referiu no seu voto a Ministra Ellen Gracie: as centenas de e-mails por ela recebidos de pessoas preocupadas com o resultado do julgamento. Essa inquietude, desatendida pela maioria da alta Corte, permanece.
Por fim, quase em nota de pé de página, a aparente indicação de que a sentença contrária pode ter pelo menos um bom resultado: apagar por fim o esbulho de que foi vítima o casal Capiberibe no Amapá. Constituía decerto nota irônica que João Capiberibe (PSB) e sua esposa Janete Capiberibe (PSB) houvessem caído na malha da Lei da Ficha Limpa. É de augurar-se que, pelo menos neste particular, não nos equivoquemos no prognóstico.
(Fontes: O Globo e Folha de S. Paulo )
quinta-feira, 24 de março de 2011
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