terça-feira, 9 de outubro de 2018

ONU: RPC quer assumir lugar dos EUA


                    
          A manchete pode deixar incrédulo a muitos, mas em termos de atuação política e econômica, será lícito duvidar dos limites da Administração Trump ?
            Não parece possível, por conseguinte, fazer comparação com a política de presidentes americanos anteriores, no que tange às atitudes de Trump.
             O 45º chefe de estado americano tem surpreendido a muitos com a sua falta de coerência com linhas políticas seguidas notadamente por seu antecessor imediato, Barack Obama.
              Desfez sem pestanejar  o acordo estabelecido com o Irã, cujo estabelecimento e implementação exigira muito esforço de coordenação da Administração Obama. O que visara integrar a república dos ayatollahs no contexto da política internacional, a par de buscar controlar as ambições de Teerã, em termos nucleares.
              Todo esse meticuloso trabalho diplomático foi desfeito, sem muito pestanejar, como se Donald Trump tivesse a lidar com traços de giz em um quadro negro.
               Também nas Nações Unidas, a ação do governo Trump parece ater-se mais a ações temperamentais ou idiossincráticas desse presidente, a ponto de ser difícil distinguir uma linha coerente na sua ação diplomática.  Com uma canetada, desfez a aliança comercial do Pacífico, em iniciativa que parece cair no colo da China Comunista.
                Em diplomacia, a previsibilidade e a coerência são traços essenciais. Se se parte, como tem agido Trump, para mexer com antigos e bem-sucedidos acordos comerciais, como um macaco a mexer com porcelana e cristais, não será muito difícil prever os possíveis resultados.
                 Também nas Nações Unidas e a fortiori  nos órgãos  que a complementam em Genebra, o voluntarismo tem sido o traço principal de uma Administração que se aferra a dogmas como a da aliança carnal (pedindo licença ao presidente Menem na sua estranha denominação quanto a diplomacia de subordinação extrema aos E.U.A) com Israel, refletida em estapafúrdias iniciativas, como a sabotagem a política que vise uma relação mais estreita com o mundo árabe, que pelo menos tente uma equiparação entre direitos judeus e palestinos. Poderia alguém imaginar Trump reunindo lideranças árabes e judaicas nos jardins da Casa Branca, como Bill Clinton, ao ensejo dos acordos de Oslo e o aperto de mão entre Iasser Arafat e Yitzhak Rabin?
                    Ninguém duvida das reações emocionais que muita vez são indissociáveis no caminho para a criação de laços entre esses povos irmãos - o árabe-palestino e o judaico -, como está documentada  a indignada reação de Rabin contra seu  companheiro no governo israelense Shimon Peres pelo fato de haver ensejado que Arafat o cumprimentasse ?!   
                       O episódio mostra o quanto o aspecto emocional ainda avultava, mesmo entre líderes israelenses de nomeada.
                        Não obstante, o papel de Donald Trump, um político da direita republicana, e que se pavoneia com modos histriônicos e iniciativas demagógicas, tem sido com relação tanto às Nações Unidas, tanto no contexto da chamada questão judaica, quanto na relação entre árabes e judeus, de um caráter desastroso, que se dissocia dos esforços dos dois povos e dos Estados Unidos, com vistas à pacificação e a uma eventual superação  desse dissídio entre dois grandes povos, no que se denomina tanto como questão judaica, médio oriental ou o que nos parece mais equilibrado, como questão judaico-palestina.
                          Se bem que os presidentes americanos, por uma série de razões de política interna, dada a existência de relevante diáspora nos Estados Unidos de extração judaica, tenham evidenciado inegável pendor pela causa israelense - e as vezes que o Premier Bibi Netanyahu pensa poder instrumentalizar essa relação em favor de Israel, todos esses fatos surgem com evidência que nos dispensam de aprofundar tal questão.
                            Não obstante, o Estado-cliente (i.e., Israel) se tenha valido muito dessa especial relação, através de uma série de presidentes americanos, nunca tal relacionamento chegou ao ponto praticado pelo atual presidente americano.  Com efeito, Donald Trump tem tomado medidas que estão no limite do irresponsável. Ao cortar a contribuição americana à UNRWA (órgão das Nações Unidas que se esforça em minorar a penúria do Povo palestino e de seus refugiados),  que apesar de seu vulto jamais fora contestada por seus antecessores, o  Presidente Trump age de forma mesquinha e com estreiteza de visão.  Essa mesma estreiteza, nós a encontramos em iniciativas que mais parecem provocações, do que atos políticos com fins confessáveis.
                              Configurou a provocação à causa palestina o súbito reconhecimento de Jerusalém como capital de Israel pela Presidência Trump, em gesto que tenta humilhar o Povo Palestino, assim como a sua Entidade, que já tem, não obstante, avançado muito no caminho do generalizado reconhecimento internacional.  Apesar disso, na gestão Trump reponta um claro retrocesso na questão da Palestina, o que, além de ser cruel com esse povo sofrido, só contribui para acirrar a justa revolta tanto da Autoridade, com  seu Presidente Mamoud Abbas,  quanto do povo árabe em geral,  pelo desrespeito à igualdade de direitos que deveria ser respeitada pelos Estados Unidos. A transposição para Jerusalém da capital de Israel foi nesse sentido tentativa de enorme retrocesso na causa de uma paz justa no Oriente, a começar pela igualdade de direitos.
                            É essa falta de estruturação coerente na respectiva diplomacia que tem dado alento a um alegado retrocesso na política multilateral e, em especial, no que tange às Nações Unidas. O desacerto é tal que vem reforçando a ambição da República Popular da China de preencher o suposto vácuo deixado pelos Estados Unidos nas Nações Unidas. Parece-me, não obstante, difícil que uma ditadura como a hoje presidida por Xi Jinping, tenha condições de assumir essa liderança.  É o que assevera um despacho vindo de Genebra: "A imposição de uma nova imagem chinesa na ONU, segundo diplomatas ( acreditados naquela cidade,) passa também por tentar imprimir a visão do mundo de Pequim. "Assim como os americanos após a 2ª Guerra Mundial, a China considera que este é o seu momento", disse um experiente negociador, na condição de anonimato.
                            No entender da fonte de Genebra, a China não se limitaria a uma política de simbolismos. Assim, nas resoluções que ela passou a propor, todos os textos se demarcam pela nova linguagem da cooperação. Nesse sentido, a determinação de Beijing é de bloquear qualquer tipo de crítica às suas políticas. No caso de eventuais dúvidas, promover a ideia de que nada é superior à soberania.
                              Se a imagem do massacre de Tiananmen ainda persista, a RPC vem propondo novos textos aos debates. Nesse sentido, ela conseguiu os votos necessários para ocupar um lugar no Conselho de Direitos Humanos.
                               A estratégia chinesa também privilegia resoluções que promovam direitos coletivos, e não individuais. Ao mesmo tempo, os chineses de Xi Jinping tentam minar ideias hoje consagradas como os direitos humanos de ativistas, questionando-lhes a legitimidade.
Conclusão.  Pela sua visão medíocre e necessariamente limitada, este 45º presidente estadunidense, que caminha nas pegadas de Buchanan - consensualmente reconhecido como o pior presidente dos Estados Unidos da América - pode ser o primeiro presidente do Declínio nos EUA, ainda que essa fase estadunidense tenha surgido pela guerra do Iraque, na qual George W. Bush dispendeu bilhões de dólares, com o que causou o dito declínio, que tem sido analisado por vários escritores e jornalistas americanos. É um tanto a visão de Oswald Spengler, o historiador alemão, autor da obra A Decadência do Ocidente, publicada sob o impacto da paz de Versailles, e das sanções e primeiras perdas territoriais determinadas por aquele Tratado, que simboliza o espírito revanchista que seria uma das escusas de Hitler para lançar o Reich Alemão na sua Segunda Guerra Mundial, com os ruinosos resultados do geral conhecimento.

( Fontes:   O Estado de S. Paulo: "China ocupa vácuo deixado pelos EUA nas Nações Unidas";  Oswald Spengler "A Decadência do Ocidente"; The  New Yorker, artigos sobre o Decline .)

Nenhum comentário: