A manchete pode
deixar incrédulo a muitos, mas em termos de atuação política e econômica, será
lícito duvidar dos limites da Administração Trump ?
Não parece possível, por conseguinte, fazer comparação com a política de
presidentes americanos anteriores, no que tange às atitudes de Trump.
O
45º chefe de estado americano tem surpreendido a muitos com a sua falta de
coerência com linhas políticas seguidas notadamente por seu antecessor
imediato, Barack Obama.
Desfez sem pestanejar o acordo
estabelecido com o Irã, cujo estabelecimento e implementação exigira muito
esforço de coordenação da Administração Obama. O que visara integrar a
república dos ayatollahs no contexto
da política internacional, a par de buscar controlar as ambições de Teerã, em
termos nucleares.
Todo esse meticuloso trabalho diplomático foi desfeito, sem muito
pestanejar, como se Donald Trump tivesse a lidar com traços de giz em um quadro
negro.
Também nas Nações Unidas, a ação do governo Trump parece ater-se mais a
ações temperamentais ou idiossincráticas desse presidente, a ponto de ser
difícil distinguir uma linha coerente na sua ação diplomática. Com uma canetada, desfez a aliança comercial
do Pacífico, em iniciativa que parece cair no colo da China Comunista.
Em diplomacia, a previsibilidade e a coerência são traços essenciais. Se
se parte, como tem agido Trump, para mexer com antigos e bem-sucedidos acordos
comerciais, como um macaco a mexer com porcelana e cristais, não será muito
difícil prever os possíveis resultados.
Também nas Nações Unidas e a
fortiori nos órgãos que a complementam em Genebra, o voluntarismo
tem sido o traço principal de uma Administração que se aferra a dogmas como a
da aliança carnal (pedindo licença ao
presidente Menem na sua estranha denominação quanto a diplomacia de
subordinação extrema aos E.U.A) com Israel, refletida em estapafúrdias
iniciativas, como a sabotagem a política que vise uma relação mais estreita com
o mundo árabe, que pelo menos tente uma equiparação entre direitos judeus e
palestinos. Poderia alguém imaginar Trump reunindo lideranças árabes e judaicas
nos jardins da Casa Branca, como Bill Clinton, ao ensejo dos acordos de Oslo e
o aperto de mão entre Iasser Arafat e Yitzhak Rabin?
Ninguém duvida das reações emocionais que muita vez são indissociáveis
no caminho para a criação de laços entre esses povos irmãos - o árabe-palestino
e o judaico -, como está documentada a
indignada reação de Rabin contra seu companheiro
no governo israelense Shimon Peres pelo fato de haver ensejado que Arafat o
cumprimentasse ?!
O episódio mostra o quanto o aspecto
emocional ainda avultava, mesmo entre líderes israelenses de nomeada.
Não obstante, o papel
de Donald Trump, um político da direita republicana, e que se pavoneia com modos
histriônicos e iniciativas demagógicas, tem sido com relação tanto às Nações
Unidas, tanto no contexto da chamada questão judaica, quanto na relação entre
árabes e judeus, de um caráter desastroso, que se dissocia dos esforços dos
dois povos e dos Estados Unidos, com vistas à pacificação e a uma eventual superação
desse dissídio entre dois grandes povos,
no que se denomina tanto como questão judaica, médio oriental ou o que nos
parece mais equilibrado, como questão judaico-palestina.
Se bem que os
presidentes americanos, por uma série de razões de política interna, dada a
existência de relevante diáspora nos Estados Unidos de extração judaica, tenham
evidenciado inegável pendor pela causa israelense - e as vezes que o Premier
Bibi Netanyahu pensa poder instrumentalizar essa relação em favor de Israel,
todos esses fatos surgem com evidência que nos dispensam de aprofundar tal
questão.
Não obstante, o
Estado-cliente (i.e., Israel) se
tenha valido muito dessa especial relação, através de uma série de presidentes
americanos, nunca tal relacionamento chegou ao ponto praticado pelo atual
presidente americano. Com efeito, Donald
Trump tem tomado medidas que estão no limite do irresponsável. Ao cortar a
contribuição americana à UNRWA (órgão das Nações Unidas que se esforça em
minorar a penúria do Povo palestino e de seus refugiados), que apesar de seu vulto jamais fora contestada
por seus antecessores, o Presidente
Trump age de forma mesquinha e com estreiteza de visão. Essa mesma estreiteza, nós a encontramos em
iniciativas que mais parecem provocações, do que atos políticos com fins
confessáveis.
Configurou a
provocação à causa palestina o súbito reconhecimento de Jerusalém como capital
de Israel pela Presidência Trump, em gesto que tenta humilhar o Povo
Palestino, assim como a sua Entidade, que já tem, não obstante, avançado muito no
caminho do generalizado reconhecimento internacional. Apesar disso, na gestão Trump reponta um
claro retrocesso na questão da Palestina, o que, além de ser cruel com esse
povo sofrido, só contribui para acirrar a justa revolta tanto da Autoridade,
com seu Presidente Mamoud Abbas, quanto do povo árabe em geral, pelo desrespeito à igualdade de direitos que
deveria ser respeitada pelos Estados Unidos. A transposição para Jerusalém da capital
de Israel foi nesse sentido tentativa de enorme retrocesso na causa de uma paz
justa no Oriente, a começar pela igualdade de direitos.
É essa falta de
estruturação coerente na respectiva diplomacia que tem dado alento a um alegado
retrocesso na política multilateral e, em especial, no que tange às Nações
Unidas. O desacerto é tal que vem reforçando a ambição da República Popular da
China de preencher o suposto vácuo deixado pelos Estados Unidos nas Nações
Unidas. Parece-me, não obstante, difícil que uma ditadura como a hoje presidida
por Xi Jinping, tenha condições de assumir essa liderança. É o que assevera um despacho vindo de
Genebra: "A imposição de uma nova imagem chinesa na ONU, segundo diplomatas
( acreditados naquela cidade,) passa também por tentar imprimir a visão do mundo
de Pequim. "Assim como os americanos após a 2ª Guerra Mundial, a China
considera que este é o seu momento", disse um experiente negociador, na
condição de anonimato.
No entender da fonte de Genebra, a China não
se limitaria a uma política de simbolismos. Assim, nas resoluções que ela
passou a propor, todos os textos se demarcam pela nova linguagem da cooperação.
Nesse sentido, a determinação de Beijing é de bloquear qualquer tipo de crítica
às suas políticas. No caso de eventuais dúvidas, promover a ideia de que nada é
superior à soberania.
Se a imagem do massacre de
Tiananmen ainda persista, a RPC vem propondo novos textos aos debates. Nesse
sentido, ela conseguiu os votos necessários para ocupar um lugar no Conselho de
Direitos Humanos.
A estratégia
chinesa também privilegia resoluções que promovam direitos coletivos, e não
individuais. Ao mesmo tempo, os chineses de Xi Jinping tentam minar ideias
hoje consagradas como os direitos humanos de ativistas, questionando-lhes a
legitimidade.
Conclusão. Pela sua visão medíocre e necessariamente
limitada, este 45º presidente estadunidense, que caminha nas pegadas de
Buchanan - consensualmente reconhecido como o pior presidente dos Estados
Unidos da América - pode ser o primeiro presidente do Declínio nos EUA, ainda que essa fase estadunidense tenha surgido
pela guerra do Iraque, na qual George W. Bush dispendeu bilhões de dólares, com
o que causou o dito declínio, que tem sido analisado por vários escritores e
jornalistas americanos. É um tanto a visão de Oswald Spengler, o historiador
alemão, autor da obra A Decadência do
Ocidente, publicada sob o impacto da
paz de Versailles, e das sanções e primeiras perdas territoriais determinadas por
aquele Tratado, que simboliza o espírito revanchista que seria uma das escusas
de Hitler para lançar o Reich Alemão
na sua Segunda Guerra Mundial, com os ruinosos resultados do geral
conhecimento.
( Fontes: O Estado de S. Paulo: "China ocupa vácuo
deixado pelos EUA nas Nações Unidas"; Oswald Spengler "A Decadência do
Ocidente"; The New Yorker, artigos sobre o Decline .)
Nenhum comentário:
Postar um comentário