quarta-feira, 21 de setembro de 2011

Inflação sob Controle ?

                               

       Dos reclamos que se possam  fazer dos dois mandatos do Presidente Luiz Inacio Lula da Silva, o silêncio no que tange à administração econômica-financeira reflete  um comportamento adequado. Ao contrário de o que temia o mercado, a lição de casa foi aplicada, sem experimentos, nem regurgitos da velha oposição petista à política econômica que dera sequência ao Plano Real.
       No período de Antonio Palocci na Fazenda, a autonomia do Banco Central sob a direção de Henrique Meirelles foi respeitada. Com a sua queda, e a vinda de Guido Mantega, as características deste ensejaram alguns deslizes menores, sobretudo a falta de reação maior quando do aquecimento dos preços. Tisnaram, é verdade, um pouco o quadro as notórias ‘capitalizações’ do BNDES e, sobretudo, a influência das ‘bondades’ do ano eleitoral, e a atribuição a efeitos ‘sazonais’ de o que já aparecia como sinais inflacionários.
     Nos oitos anos, no entanto, em que Meirelles esteve no Banco Central, o respeito do Presidente Lula – malgrado a menor força de Mantega – foi, no geral, mantido aos princípios de uma gestão que deu sequência à anterior no combate à inflação.
     Infelizmente, esse quadro não mais existe. Já a substituição de Henrique Meirelles por Alexandre Tombini não emitira o sinal aguardado pelos observadores financeiros. Bastou que Meirelles se reportasse à desejável autonomia do Banco Central, para que a presidenta se apressasse a dispensar-lhe os serviços.
    O passado, com as décadas perdidas pela inflação, ensinara que em matéria financeira inexistem atalhos no combate à carestia. Convivemos demasiado tempo com o suposto dragão para nos cientificarmos que fora da ortodoxia financeira não há válidas soluções para que logremos vencê-lo e consigná-lo à história inflacionária brasileira. Se heterodoxia financeira para algo servisse, a inventividade de nossos ministros com a miríade de planos por eles apresentados a uma sociedade cada vez mais cética formaria uma cátedra universitária de todas as panaceias e falsos remédios excogitados para que enfim se golpeasse à morte a besta infernal.
     Não faz vinte anos que ela se foi – malgrado artificialmente conservada em um penca de índices remanescentes do período inflacionário – e eis que ela mostra de novo a sua hedionda cabeçorra.
    Não são as manchetes dos jornais que nos gritam da alça dos preços, e dos agourentos índices. Tampouco é o aparecimento ainda discreto das tais maquinetas, anteriores à 1994, empenhadas na frenética remarcação dos preços, em supermercados e no comércio em geral.
    É uma outra linguagem que reaparece, com as promessas vazias de antanho. A Presidente da República tem repisado, em vários pronunciamentos, que a inflação está sob controle.
    Este gênero de assertiva, ainda mais se repetido ritualmente, desperta a suspicácia de que as coisas não são bem assim.
    Não se exorciza a inflação de tal maneira. Se a nova geração desconhece esse tipo de pajelança, as anteriores a têm bem vívida na memória e a dispensam pela sofrida experiência.
     A economia brasileira – e sobretudo os brasileiros e brasileiras para repisar uma invocação reminiscente de tais tempos – sofreu as agruras da estagnação e as cruéis mágicas de mírificos planos (na vanguarda apocalíptica o Plano Collor que apesar de inconstitucional foi engolido pelos poderes competentes para legar ao povo indizível sofrimento e mesmo desgraça). Tudo isso, para quê ? Para nada, até que, com beneditina paciência, se cosesse o Plano Real que viria refazer o esgarçado tecido da confiança do Povo brasileiro.
    A dizer verdade, preferiria não ter a necessidade de repetir esta história, que muitos pensavam fazer parte de um acervo de conquistas da cidadania nacional.
    Senhora Presidenta, a inflação só estará sob controle, se às suas palavras corresponderem ações que corroborem a autenticidade do propósito.
    Palavras vazias, slogans, de nada adiantam. Nem se deve queimar no altar do desenvolvimentismo a estabilidade financeira.
    Se o encanto já está quebrado, e a antiga cobiça, a burra esperteza dos ágios e dos sobrepreços reaparece, carregada pela chusma dos índices, não será por zombar da inteligência do Povo brasileiro que a inflação, como nos plúmbeos anos de seu reinado, será estigmatizada. As  frases ocas, as vãs promessas de ocasião se dispersam e se dissipam levadas pelos ventos da demagogia.
    Se não forem arrimadas em séria gestão das finanças, não valem sequer um minuto de atenção.
    Pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo-15 (IPCA-15), a inflação voltou a acelerar (malgrado a propalada expectativa governamental e a ata do Copom, que justificou o corte nos juros, entre outros motivos, por boas perspectivas no front dos preços) alcançando 7,33% em setembro. Segundo analistas, esta foi a maior expansão para o mês desde 2003.
    Tampouco ajuda a alta do dólar, que contribui para pressionar a carestia, embora a depreciação do real ajude a nossa indústria e desestimule a gastança em viagens ao exterior.
    Nesta encruzilhada, a Presidenta tem uma clara opção: ou passa a respeitar a política anterior do tripé anti-inflacionário, que pelo êxito pregresso carece de ulteriores justificativas, ou adentra o terreno de uma política de desenvolvimento com inflação. Terá no próprio PT exemplo dessa alternativa: seja na sua luta contra o Plano Real, que desfazia como artifício eleitoreiro, chegando a contestá-lo no Supremo, seja na sua negociada aplicação bem-comportada, após a assunção do mando por Lula.
     Já estamos nos transes dos arreganhos inflacionários. Se há ainda tempo para restabelecer a estabilidade anterior, seria bom recordar que uma vez saído do frasco o gênio inflacionário, por uma mescla de estupidez e fraqueza, assaz dificultoso será reconduzi-lo para onde estava.
     Com a inflação, salvo um punhado de especuladores, todos perdem. Mas dentre esses perdedores, é bom que a sucessora de Lula tenha gravado na mente que, se porventura permitir no seu governo o retorno do maldito dragão, será melhor esquecer qualquer veleidade de reeleição.



( Fonte:  O Globo )   

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