O corte de R$ 50 bilhões no orçamento foi anunciado ontem pelos Ministros Guido Mantega (Fazenda) e Miriam Belchior (Planejamento). Esse ajuste fiscal será principalmente em despesas de custeio e emendas parlamentares. Terá sido pela natureza das medidas que a colunista Miriam Leitão assinalou que “ há mais vento que caroço” em tais cortes.
Frisando que “não vai ser sem dor”, o Ministro Mantega disse serem necessários os cortes para garantir a expansão dos investimentos e a queda dos juros. Nesse quadro, estão suspensos concursos e nomeações. No entanto, os investimentos no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) não estariam afetados. Diante de sua afirmativa anterior, a confirmar-se que o PAC não sofra qualquer diminuição, verificar-se-ía que a injunção do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva será respeitada.
O Ministro da Fazenda igualmente se referiu ao novo salário mínimo, acentuando que as negociações sobre o reajuste do mínimo em R$545,00 estão encerradas.
Dada a posição das centrais sindicais – que mereceram, inclusive, a censura do ex-Presidente Lula, em sua primeira intervenção ostensiva pró-Presidente Dilma -, as posições dos partidos, notadamente o PMDB, na sua queda de braço como Governo, por causa de Furnas e alhures, assim como até de membros do gabinete, como o indefectível Ministro do Trabalho Carlos Lupi -, tudo isso forma um cenário de aprovação não necessariamente tranquila do valor estipulado pela novel Administração.
Atendidas as inúmeras imbricações do mínimo em termos de índice econômico – um legado da fraqueza monetária pré-Plano Real -, a sua manutenção no valor de R$ 545,00 será a condicional sine qua non para que o referido corte de R$ 50 bilhões não venha a carecer de ulteriores aumentos.
Pensar o impossível, ou o flagrantemente contrário aos mores da política, mesmo no Brasil, eis que até flagrantes inconstitucionalidades como o confisco do Plano Collor colheram a aprovação não só do Congresso mas também, e a fortiori, dados os aspectos jurídicos que sobrelevam na eventualidade, pelo próprio Supremo Tribunal Federal – não constitui, portanto, vão exercício teórico. É segredo de Polichinelo que a maioria governamental não reflete concordância temática ou política, mas tão somente o resultado da conjunção de interesses eleitorais.
Seria de augurar-se que essa disparatada maioria numérica no Congresso, resultado da não-realização de reforma política e eleitoral, não vá dar frutos amargos para o governo Dilma Rousseff. Com essa grande frente fisiológica constituída pelo PMDB, e a despeito da presença de Michel Temer como Vice-Presidente, não se pode descontar a inchação do mínimo, insuflada pelos descontentes deputados Eduardo Cunha e Henrique Alves.
A alça da inadimplência determinou o aumento das taxas do crediário em 1,76% , de 5,69% (ou 94,27% !) em dezembro, para 5,79% mensais (96,49% anuais!), em janeiro. No caso dos financiamentos de carros, a taxa subiu 2,5%, de 2,4% ao mês (32,92 % ao ano), para 2,46% (33,86%). A par disso, para financiar um carro, a maioria dos bancos passou a pedir ao cliente entradas de 20% a 30% do preço do veículo. Tornam-se história os empréstimos sem entrada e até com pagamento de prestações diferida a um ou dois meses, mediante depósitos simbólicos de R$ 1,00.
Essa agressiva política anterior, que remonta ao governo Lula e à fase da dita ‘marolinha’, visava ao menos manter alto o consumo de bens duráveis, para que não sofresse a indústria de veículos. Sem embargo que tal política terá facilitado a presente inadimplência, ela evitou o desemprego da mão de obra nas montadoras, com benefício para o trabalhador. A conotação negativa – os gordos lucros das montadoras estrangeiras, logo reexpedidos ao estrangeiro para socorrer as matrizes em dificuldades – é um outro ângulo da questão, decorrente da ruinosa política de FHC (e de administrações anteriores) de não apoiar as montadoras nacionais. Em consequência, como também se sabe, o Brasil é o único dos BRICs a não dispor de indústrias auto-motivas genuinamente nacionais. Ficamos apenas com o parque das fábricas de auto-peças, a que tampouco o governo tem apoiado, e que são submetidas a imposições das montadoras, devido às características do regime de monopsônio[1] que prevalece nas suas relações com cada uma das montadoras.
Por fim, é oportuno ter-se presente que a desoneração da folha de pagamentos – uma das mais esperadas providências no que tange a enfrentar o chamado custo-Brasil - só será realizada se o governo achar contrapartida em receitas. Tal vinculação foi deixada meridianamente clara pelo Ministro Mantega ao sublinhar que diante do corte de cinquenta bilhões do orçamento e da redução antecipada de dezenove bilhões na arrecadação fiscal, qualquer incentivo à economia – o que inclui a diminuição dos encargos fiscais sobre a folha de pagamentos – só será possível se houver espaço fiscal.
No país do impostômetro, a autoridade frisa que só se poderá tirar da folha (de pagamentos das empresas) se se puder colocar o tributo em outro lugar. Não cansarei o leitor com o elenco das alternativas fiscais ora em consideração. De forma ominosa no horizonte, não deixam, contudo, de acentuar que a criação de imposto do tipo da CPMF é uma das opções.
Creio desnecessário continuar nessa senda. Só acrescentaria que quando a CPMF foi derrubada pelas oposições no governo Lula, as autoridades fazendárias previam que o mundo viria abaixo. Como igualmente se sabe, nada disso ocorreu, tendo sido a pranteada CPMF logo substituída como fonte tributária por providenciais incrementos em outras taxas e impostos. Querer a CPMF faz parte de uma cultura de alta imposição tributária, que todos os brasileiros conhecem e a grande maioria deplora.
( Fonte: O Globo )
[1] comprador único de vários vendedores.
quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011
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