sábado, 16 de março de 2013

Um Santo para os nossos dias

                           
           mais  de  treze anos  escrevia  artigo com o título acima(1). Nele se mesclava a satisfação com a então ‘próxima conclusão de processo de beatificação’ e a suposição que talvez estivesse ‘na grandeza de seu exemplo de tolerância e caridade cristãs, e na por vezes incômoda relevância do legado, o motivo’ por que tal processo haja ‘deparado tantos obstáculos e tardanças’.
         O pontificado de Paulo VI, a quem seu antecessor tanto distinguira, se estendeu por quinze anos, e se Papa Montini logrou concluir a obra do Concílio Vaticano II, infelizmente não encontrou tempo para elevar aos altares a memória do Papa Buono.
         Tal perplexidade seria partilhada por muitos, e notadamente por Dom Loris F. Capovilla, que foi secretário pessoal de João XXIII, e que lhe dedicou inúmeras obras, como “João XXIII – Papa de Transição”, publicada no 16º aniversário da morte de Papa Roncalli, em 3 de junho de 1979.
         A exemplo de muitos outros, não tenho dúvidas que João Paulo I, Papa Luciani, que uniria seus dois antecessores no próprio nome, cuidaria, se a sua passagem pelo sólio pontifício não houvesse sido tão abreviada, de reparar esta omissão que dom Loris cuidara de transformar em sua especial missão.
         Só nos anos terminais do respectivo longo reinado na Sé de Pedro, João Paulo II encontraria tempo afinal para tornar beato a Papa Giovanni. Antes tarde do que nunca. Surpreende, no entanto, que o Papa do Concílio, cuja bondade e sapientia cordis[2]  não estavam entre seus legados menores para a comunidade cristã, tenha devido esperar cerca de quarenta anos para subir aos altares, quando o seu culto já se encontrava no coração de tantos fiéis, na Itália e no mundo.
       Mas a aura de santidade e a autêntica devoção venceriam por fim uma das manifestações do inverno na Igreja, de que nos fala Karl Rahner, S.J. o maior teólogo conciliar.
       Em artigo que precedeu à eleição do Cardeal Jorge Mario Bergoglio como Papa Francisco, expressara a esperança de que o Espírito Santo se manifestasse no Conclave. A certeza de sua interveniência os fiéis congregados na Praça de São Pedro, convocados pela fumaça branca da Capela Sistina, e o mundo católico, por intermédio da globalização das comunicações televisivas, quem poderá negar diante da alva e singela imagem do novo Sucessor de Pedro ?
       As similitudes com Papa Giovanni são demasiado óbvias, e muitos, leigos ou não, as têm assinalado. A simplicidade e a bondade são traços que aproximam a comunidade católica e, segundo o exemplo joanino que encontramos na oração de abertura do Concílio,  a Igreja como Mãe e Mestra sente ora necessidade, não de condenações, mas de congraçamento e unidade.
       Dia a dia, pelo exemplo de inteireza e singeleza, Papa Francisco volta a abrir as janelas dos palácios vaticanos, e se aproxima dos homens, trazendo para o mármore e a pompa dos salões da Santa Sé os ares e os costumes das comunidades cristãs, em que, dentro da obediência e da fé,  prevalece o exemplo dos antigos cristãos e não os privilégios da corte.
      Em visita da praxe diplomática, Espedito Resende, nosso embaixador de então junto à Santa Sé, me apresentou em 1979 ao Prefeito da Congregação para as Causas dos Santos, Cardeal Corrado Bafile. Nessa oportunidade, com a desenvoltura dos jovens, perguntei a Sua Eminência quantos anos seriam necessários para a santificação de Papa João XXIII.
       A sua resposta – cinquenta anos, pela necessidade de evitar as paixões do momentâneo – me pareceu, na época, de excessiva prudência. Hoje, após tantos anos transcorridos, estou propenso a pensar que, em fim de contas, o Cardeal Bafile teria alguma razão.
       Se a sua cautela houvesse sido atendida, a beatificação de João Paulo II por Papa Bento XVI não teria sido tão açodada e tão diversa da longa espera imposta ao Papa Buono.
       E, vejam só, no próximo três de junho se completam cinquenta anos da morte pontifical de João XXIII, em que o mundo, católico e não-católico se uniu na expressão do sincero pesar pela partida do Papa do Concílio.  Que magnífico dom seria para o mundo católico e cristão  a canonização do beato Papa Gioavanni.

 

( Fonte:  Annuario Pontificio,  1980 ).        



[1] Publiquei a de 2 março de 2000  artigo com o título acima na coluna Opinião do JB.
[2] Sabedoria do coração (palavras ditas por João Paulo I).

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