quinta-feira, 28 de março de 2013

O Congresso e os Direitos Humanos

                                        

         Na sessão de ontem, quarta-feira 27 de março, o deputado pastor Marco Feliciano (PSC-SP) desenvolveu o que seria estratégia para manter-se na presidência da Comissão dos Direitos Humanos da Câmara.
          Antes da Comissão iniciar seus trabalhos, seguranças da Câmara questionavam os interessados, cobrando apresentação de senhas de participação.
          O primeiro tumulto irrompeu quando a comissão ouvia o deputado estadual paulista Fernando Capez (PSDB) sobre a situação dos torcedores corintianos presos na Bolívia.
          Protestou então o manifestante Marcelo Regis Oliveira, de um grupo LGBT de Brasília. Gritou ele que Capez estava sentado ao lado de um deputado racista, com referência a Feliciano.
          Prontamente, o presidente interveio, determinando aos seguranças que prendessem o rapaz de barba: “Racista é crime pelo Código Penal. Ele vai ter que provar isso e vai sair preso daqui”.
         Instalou-se, nesse momento, confusão generalizada, e o deputado decidiu mudar a sede do plenário. No ensejo, vetou a presença de manifestantes na audiência pública que trata da contaminação por chumbo por parte da população de Santo Amaro (BA).
        A sessão se desenvolvia em atmosfera peculiar. De um lado, grupo de evangélicos cantava músicas religiosas; de outro, os manifestantes do movimento LGBT protestavam contra o deputado, separados pelos seguranças.
        Compondo o quadro, havia cinco convidados para a audiência, em representação de ministérios.
        A esse respeito, o presidente Feliciano declarou: ‘Vivemos um momento ímpar de democracia. Os senhores puderam constatar  o nível de democracia aplicado por um segmento (LGBT).’ E completou: ‘Agradeço o esforço e a coragem de virem até aqui.’
         Nesse momento, o deputado Nilmário Miranda (PT-MG) pediu a palavra:
         A solução é uma só: a saída de Feliciano. Não sei qual seu objetivo. Fui contra a sua presença desde o primeiro dia, desde que seu nome despontou como possível presidente.”
          O desejo do antigo presidente da Comissão até o momento não se realizou. No plenário, há troca de farpas entre o pequeno Partido Social Cristão (16 deputados) e o PT ( 89 deputados), partido da Presidente Dilma, e a maior bancada da Câmara. Diante de críticas  de deputados petistas no plenário, que condenaram a retirada do manifestante, o líder do PSC, André Moura (SE), censurou o partido de Dilma por haver indicado dois condenados pelo mensalão (José Genoino e João Paulo Cunha) para a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ).
           Por sua vez, o deputado Marco Feliciano responde à denúncia do Procurador-geral da República, Roberto Gurgel, em inquérito por homofobia. Neste processo, o pastor é defendido por advogado com emprego e salário pago pela Câmara, i.e. Rafael Novaes da Silva, secretário particular desde fevereiro de 2011.
         O dr. Rafael também é suposto acompanhar Feliciano em interrogatório nas dependências do STF, no próximo dia cinco, em que acusado de estelionato por um juiz federal designado pelo Ministro Ricardo Lewandowski, relator da ação. Cabe notar que neste processo o deputado Feliciano já é réu e tem como advogado o mesmo secretário parlamentar.
          A princípio, causa estranheza que deputado acusado de homofobia em processo movido pelo Procurador-Geral da República – sem falar da ação por estelionato de que é réu – venha a ser indicado para presidir uma Comissão que deveria ser importante, como o é a de Direitos Humanos.
          Na atual sopa partidária, o PSC, com dezesseis deputados, não deveria em princípio assumir tal Comissão, e ainda mais por representante contra quem pesa uma denúncia do Procurador-Geral da República e um processo de que é réu sob acusação de estelionato.
         A saída do PT da presidência da Comissão, deu ensejo à indigesta pretensão do PSC. Surpreende e estarrece mesmo que um partido das dimensões do PSC possa empolgar posição de tal relevo e visibilidade.
         Todos sabemos que as questões no Congresso se conduzem e se decidem nas quartas-feiras, o único dia de presença integral nas duas Câmaras. Em termos de condução de matéria, essa peca decerto pela ligeireza e impropriedade.  Posto que o PSC é  sigla onde se congregam evangélicos, católicos, entre outros, sendo controverso o nome indicado, a pauta da Comissão recomendaria o exercício de cautela.
         Essa cautela e ponderação não foram encontradas, s.m.j., nem na Mesa Diretora, nem na própria Presidência, com o Deputado Henrique Alves (PMDB/RN). Por que se permitiu se cristalizasse o nome de alguém que sofre denúncia por homofobia, e cujas opiniões no capítulo são no mínimo controversas ?
        A Sociedade Civil se tem manifestado de forma inequívoca contra a presença do senhor pastor Marco Feliciano na presidência da Comissão.
        Esse desafio, Presidente Henrique Alves, não concerne apenas os grupos de pessoas que a cada semana se abalam até a Câmara para manifestar sua discordância com essa escolha que o presidente emérito, Nilmário Miranda, qualifica de indevida, recomendando a sua saída da Comissão.
        Tal desafio concerne diretamente à Câmara. Cabe à Presidência da Câmara criar condições que favoreçam o trabalho e o debate civil, mas não o dissenso e a balbúrdia criada por escolha que não se coaduna com os padrões a que estamos habituados nas sessões da Comissão.
        O trânsito político, o respeito pelo trabalho pregresso e a experiência no setor devem ser os critérios a nortear a seleção de representante que venha a ensejar o diálogo construtivo e o trabalho normativo da Comissão.
        O desenvolvimento das diversas sessões desde a sua controversa indicação vem demonstrando que o senhor deputado Marco Feliciano não tem condições para levar a cabo tal empresa.
        

(Fonte: O Globo )

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