quinta-feira, 26 de janeiro de 2012

Presidencialismo ou Feudalismo ?

                            
         O atual sistema de governança do lulo-petismo – malgrado os malfeitos e as envergonhadas faxinas, a administração de Dilma Rousseff nele não introduziu alterações substanciais – poderia ser descrito como um presidencialismo feudal.
        Com efeito, a chamada base de apoio é uma ampla aliança, costurada mais pela fisiologia do que por comprometimentos ideológicos. Em troca de cargos no imenso puleiro estatal, os diferentes partidos deverão sufragar, no Congresso e alhures, as posições do Palácio do Planalto. 
       A experiência tem demonstrado à saciedade que essa aliança, em que o interesse da facção prepondera, ao invés de proposta séria de governo, não tem condições de formato orgânico e coerente. A adição das respectivas bancadas pode apresentar no papel números de imponente maioria. No entanto, por serem agregadas e de escasso comprometimento ideológico, a pluralidade é a sua característica.
      Para que se tenha ideia da estranha criatura engendrada pela hegemonia política pós-mensalão, um simples teste constitucional desvelará que o presente regime presidencialista só de modo superficial corresponde ao disposto pela Constituição de cinco de outubro de 1988.
     Assim, a presidente nomeia os ministros de estado. Sem embargo, excluídos aqueles que peculiarmente se denominam oriundos da quota do Chefe de Estado, a norma não-escrita lhe impõe designar os nomes indicados pelos partidos respectivos.
     Esta emenda não-escrita ao regime adotado pela Constituição Cidadã não é decerto de pequena monta.
    Havia, no passado, a ilusão de que o (a) presidente poderia chamar para os gabinetes ministeriais brasileiros com qualidades exponenciais e singularmente capazes na esfera das respectivas pastas.
   Com o vigente arremedo, a presidência se transforma em um posto notarial, eis que a sua ocupante não tem mais a iniciativa da designação do nome do ministro. Como um escrivão, concorda com a indicação, desde que as exigências formais para a nomeação sejam atendidas.
    Essa funda alteração nas prerrogativas da Primeira Magistrada da Nação terá outras consequências. Dentre essas, talvez a mais relevante está em uma segunda deformação dos mandamentos constitucionais.
   Como se recorda, as constituições brasileiras – e a atual não difere – estatuem que os ministros são demissíveis ad nutum. Em outras palavras, nomeados livremente pelo presidente, tais autoridades continuam no cargo somente a critério do Chefe de Estado. O então Ministro Eduardo Portella mostrou o significado prático dessa condição, ao afirmar, em uma crise envolvendo o seu ministério,  que ‘estava’ ministro.
     De qualquer forma, a inadequação desse sistema lulo-petista de governança se vê confirmada a cada crise político-administrativa.
    Antes, a presidente se via forçada a conviver com ministros que manifestamente desejaria substituir. Para dar um exemplo, aí está o Ministro Mário Negromonte, das Cidades. Permanece ele no cargo por vontade de Dilma Rousseff ?
     As disfunções  do presente anti-sistema não se cingem, obviamente, à nomeação de ministros. O seu caráter fisiológico gestou um monstro ministerial, refletido na inchação da máquina, com graves consequências não só administrativas, senão economico-financeiras. Por essa condição extra-numerária dos auxiliares diretos da Presidente, as reuniões ministeriais nos proporcionam momentos constrangedores em termos de eficácia de governo. A par de congregarem os ministros titulares, tais reuniões evidenciam que qualquer coordenação será ilusória, pela manifesta contradição com um sistema ágil e integrado de governabilidade.
    A atual crise relacionada com a decisão já anunciada do Palácio do Planalto de demitir o Diretor-Geral do Departamento de Obras contra as Secas (DNOCS), Elias Fernandes Neto, pode ter uma serventia.
    Como se observa, aqui não se fala de Ministro de Estado. A exoneração é de funcionário de escalão inferior, por notórios motivos de favorecimento do respectivo estado (Rio Grande do Norte).
    No entanto, a Presidente Dilma Rousseff não exonera de pronto o servidor. Como se vê, a regra feudalista se generaliza. O padrinho do funcionário – no caso, o líder do PMDB Henrique Eduardo Alves – resolve confrontar o Planalto. Ameaças, como a de convocar o Ministro Fernando Pimentel, do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, são lançadas.
    Tampouco aqui é o momento de se discutir o conselho do amigo Pimentel à sua Presidente, quanto à vantagem política de afastá-lo do cargo. O que estarrece é a insolência do padrinho político.
    Manda o bom tom a desnecessidade de designar a natureza dos métodos utilizados pelos caciques estaduais na preservação dos respectivos feudos.
   O que interessa aqui é expor o caráter inaceitável desse sistema patrimonialista, em que se pulveriza o poder federal, incapaz de nomear e de demitir ministros e outras autoridades subalternas, sem a caução dos chefes e chefetes políticos eventualmente atingidos.
    Será a confederação e não mais a Federação a meta do sistema vigente ?



(Fonte subsidiária:  O  Globo)

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