quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

O Regime Fascistóide na Hungria

                                
        Ao contrário de o que pensam alguns, a opção pela extrema direita não é ainda um fantasma que costumava assombrar a Europa nos anos cinzentos do entre-guerras. A Grande Guerra, aquela iniciada em julho de 1914, pelos Impérios Centrais, em meio às ambiguidades do Secretário do Exterior de Sua Majestade,  Edward Grey, e sob a doce ilusão de que as tropas do Kaiser voltariam à casa já com a outonal queda das folhas das árvores, iria transformar-se não só em abominável matança de jovens  gerações no conflito das trincheiras, mas também em fautora de desequilíbrio político na  chamada MittelEuropa.[1]
       O idealismo do Presidente Woodrow Wilson e as espertezas de seus aliados europeus  transformariam a Mitteleuropa, em que até então a presença de nominal grande-potência (o Império Austro-Húngaro) assegurara o desejável equilíbrio, em uma profusão de pequenos países, com grandes pretensões territoriais.
      O equilíbrio ensejado pela dita Monarquia Dual (o império dos Habsburgo formado pela união de Áustria e Hungria) esfacelou-se, com a formação da Tcheco-Eslováquia e as aquisições territoriais dos países balcânicos, à custa de Viena e Budapeste, ora metamorfoseadas em métropoles de pequenas nações.
      A Grande Guerra, que a estulta ambição de uns, e os equívocos de pequenos políticos, seria na verdade a antecâmera dos horrorores da Segunda Guerra. Na Europa central, abandonada à própria sorte, e nas disputas das ligas contrapostas, a Hungria do Almirante Horthy, que se proclamava Regente da parte magyar do desaparecido trono dos Habsburgos em Viena, mostrava outra contradição, que a chefia do Estado fosse confiada a um oficial de marinha de  país sem mais acesso ao mar (landlocked).  
      Antes de 1939, portanto, era um país de direita, sob a cercania nazista, com os acessos de anti-semitismo que desde o início do século já infestava a Europa central. Dessarte, a tendência a regime autoritário de direita, que se tornou imperante com a vitória eleitoral em 2010 do partido Fidesz, de Viktor Orban, não pode ser entendida como se fora um raio a rasgar inopinadamente o céu azul.
     Se nos comícios de 2010, o populismo de Orban logrou maioria de dois terços no parlamento – maioria essa que dá preocupante liberdade ao Fidesz para investir contra as garantias democráticas preexistentes – essa transformação carece de ser entendida em contexto mais amplo, com a insatisfação das massas de eleitores com os partidos liberais.
     A Hungria, que é integrante da União Européia, manteve a própria moeda, o forint, que com a inflação interna de 4,3% (considerada alta – não esqueçamos que a de D. Dilma é de 6,5%) torna difícil o pagamento de dívidas de particulares indexadas em euros. A recente Constituição, promulgada em 1º de janeiro corrente, omite ‘república’do título oficial da Hungria, e inclui diversos parágrafos que a Amnesty International considera violar os direitos humanos. Assim, define o começo da vida com a concepção, o casamento entre um homem e uma mulher, e a possibilidade de prisão perpétua sem comutação de pena.
     Valendo-se da esmagadora maioria de que dispõe, Viktor Orban vem concentrando o poder nas suas mãos. Nesse particular, o intuito autoritário do regime de Fidesz se assinala em medidas contra a independência do banco central nacional, a idade de aposentadoria compulsória de juízes (rebaixada ultimamente, aparentemente com o intúito de desvencilhar-se de magistrados mais independentes), assim como a independência do órgão encarregado das estatísticas nacionais.
    A Comissão de Bruxelas, depois de muita tardança, resolveu tomar ações legais contra o governo de Viktor Orban, pelas suas iniciativas manifestamente contrárias aos princípios democráticos que constituem a base da União Europeia.
    Essa lentidão burocrática – talvez devido ao gigantismo da Autoridade de Bruxelas, e a sua divisão em inúmeras instâncias que mais parecem existir para acomodar comissários das respectivas nações do que para atender a um controle comunitário – também pôde ser notada no caso helênico, em que certas fraudes cometidas por empresas gregas só persistiram pela virtual falta de vigilância.
    Por fim, o que muitos na Hungria julgavam já devesse ter acontecido, se inicia um processo de exame do regime instituído por Viktor Orban.Convocado pelo Presidente da Comissão Europeia, o Primeiro Ministro  da Hungria deverá discutir recentes medidas introduzidas em seu país, e que vão ao arrepio das liberdades constitucionais que informam a democracia na União Europeia.
    “ A Hungria é um membro-chave da família europeia. Não queremos que exista sombra de dúvida a respeito dos princípios democráticos e valores que devem prevalecer no país. Quanto mais cedo isto se resolver, melhor.”
     Tais declarações de José Manuel Barroso se seguem à negativa feita por Orban a solicitações escritas pelo Presidente da Comissão Europeia de que abrogue legislações sobre a estabilidade financeira húngara, bem como o Banco Central.
     Apesar de se tratar de país pequeno, o direitismo autoritário húngaro representa indubitável ameaça no campo político à coesão da União Europeia, assim como as peripécias financeiras de Atenas o são no campo econômico.
 

( Fontes:  CNN, International Herald Tribune )    



[1] A Europa do Meio 

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