Ler artigo de Burkhard Bilger, no New Yorker de 19 & 26 de dezembro, 2011, sob o título “O Grande Oásis”, não é experiência fácil. Nele o jornalista se ocupa dos esforços empreendidos em diversos países (Omã, China, Israel, Burkina Faso), muitas vezes em condições difíceis, não só em deter o avanço da área desértica, mas também em recuperar áreas para o verde e a vida.
Essa luta se desenvolve em vários fronts, e em alguns protagonistas ela nos surpreende. Os chineses gastam menos de cinquenta centavos de dólar por muda de árvore. Desde 1982 plantaram mais de quarenta bilhões, muitas das quais na faixa de três mil milhas na margem sul do deserto de Gobi. Por volta de 2020, os chineses planejam acrescentar mais de cem milhões de acres de árvores – área maior do que a Alemanha.
As condições da realização do esforço da RPC não são ideais. Longe disso. Os camponeses não o fazem voluntariamente, por isso reservam as melhores terras para os respectivos campos de cultivo, nem se dão ao trabalho de aguar as mudas. Por isso, os percentuais de êxito são baixos.
Ao contrário, em Israel, o sucesso é bem maior. Desde meados dos anos sessenta, se conseguiu florestar milhares de acres no deserto do Negev,empregando singelos sistemas de irrigação para a água da chuva. Ao contrário da China, o investimento está em torno dos quarenta dólares, mas o nível de sucesso é de noventa por cento.
Existe outro sistema, introduzido pelo holandês Pieter Hoff, com a sua invenção da chamada Waterboxx. Esse aparelho se destina a regiões em que a pluviosidade é minima. Cada caixa tem um tanque circular, de quatro galões, feito de polipropileno, com um tubo de fundo aberto no meio, na área em que as mudas crescem. Com uma chuva de apenas quatro polegadas, o reservatório fica cheio. Por meio de um fio no fundo do tanque a água é levada para a raiz em ritmo de quatro colheres de sopa por dia. Assim, um tanque isolado pode abastecer uma muda durante um ano sem nenhuma recarga. O calor é absorvido de dia e liberto à noite. O tubo está desenhado para deixar que o sol matinal e vesperal entre, mas dá sombra para a muda ao meio-dia.
A waterboxx procura imitar a natureza. ‘Mãe natureza planta as árvores de modo diverso da gente. Compramos uma planta grande e escavamos um buraco para ela. Mãe natureza começa com uma semente’, segundo observa Hoff. Dessarte, a waterboxx está planejada para encorajar a persistência da raiz na busca de água. Assim, como a natureza, principia com uma semente, dando para ela só o necessário para aguentar e sobreviver até encontrar um veio d’água. Depois de um ano, quando a raiz atinge um solo mais aquoso, a caixa pode ser retirada e reutilizada alhures.
Hoff encontra a mesma vontade de vencer o deserto no Oman do Sultão Qaboos bin Sa’id, há quarenta no poder, e que é por convicção e necessidade, um ambientalista. Como a península arábica é deserto há milhares de anos, as dificuldades para superá-lo são grandes. Até por aproveitamento excessivo da água sbterrâneo, parte dos aquíferos no território de Omã foram invadidos por água salgada. Não é tarefa simples esverdear o deserto, como se consegue em trechos menores, na área citadina de Omã.
A Grande Muralha Verde, um mega-projeto também do interesse de Hoff, foi proposta desde os oitenta, e obteve a aprovação da União Africana em 2007. O seu formato exato ainda não está determinado, mas a idéia original é de luminosa simplicidade. Para deter o avanço do Sahara, e conter, portanto, o Sahel (margem do Saara), onze nações africanas acordaram em erigir um muro de árvores através dos poeirentos terrenos do continente, partindo da costa atlântica do Senegal até as margens orientais de Djibouti, através de regiões arenosas e de vegetação baixa e de savanas ressecadas, em coluna de nove milhas de largura (cerca de catorze quilômetros e meio) e cinco mil milhas de extensão (oito mil quilômetros). É um projeto complexo, que envolve muitos países, e a pergunta do articulista é de como os líderes africanos lograrão mobilizar cerca de um bilhão de agricultores (para o plantio) assim como o numerário para sistemas de irrigação similares aos de Israel. Por ser uma opção muito menos dispendiosa, o projeto de Hoff vem a baila, mas o problema seria de coordenar tão grande extensão em tantos países, a que irmana a paucidade de recursos do tesouro.
Não obstante, o desafio do deserto e de seu crescimento (a desertificação) é muito real. Cerca de vinte milhões de milhas quadradas (trinta e dois milhões de quilômetros quadrados) - um terço da terra arável - foram tomados pelo deserto. E o aquecimento global está cuidando de aumentar esse sinistro total.
Aqui entra o Brasil de dona Dilma Rousseff. Quando se fala que o aquecimento global está aumentando as extensões desérticas, há um ominoso esquecimento. Porque esse apocalíptico e miserável trabalho dispõe de outro ajudante, que é o desmate como praticado na Amazônia, no Pantanal e no que resta da Mata Atlântica.
Com a alegre colaboração de um Executivo que tem enfraquecido os órgãos de defesa do meio ambiente – como o Ibama -, e a participação irresponsável de um Congresso que se reúne nas quartas-feiras para desfazer o antigo Código Florestal e implantar um Código Ruralista, que é um mostrengo da antiga legislação ambiental, nós brasileiros nos damos conta de quão estúpidos nos apresentamos para um país que pretende reunir conferência ambiental, dentro da linha das promessas de Rio – 92.
Pois enquanto o mundo de países desérticos e diretamente ameaçados se volta para todos os instrumentos tendentes a reverter esse terrível avanço, o nosso papel é o de abater árvores, criar savanas e preparar a antecâmera do deserto e da penúria. Em termos de boçalidade a quem pretendemos comparar-nos ?
Para grandes males, se como os gregos diziam as lágrimas não bastam, tampouco se afiguram necessários dispensar muitas linhas com essa liderança do governo petista de Dilma Rousseff. Nada a ver com Chico Mendes, posto que em hora de perigo prometeu a reconversão ao ambientalismo no altar dos dezenove milhões de votos de Marina Silva.
Se a incompetência da campanha de José Serra no segundo turno não soube aproveitar os sufrágios depositados na postulação de Marina Silva, a candidata Dilma Rousseff terá esquecido o compromisso assumido e assinado com o ideal ambientalista que a Senadora pelo Acre personificara. Aquele pedaço de papel, com o aceno dos votos da candidata do P.V. não lhe terá valido nenhum cuidado, eis que parece desdenhar qualquer anseio voltado para a preservação de nossos recursos naturais ?
Tal não deveria surpreender, pois como Chefe da Casa Civil já muito contribuiria para escorraçar Marina da Administração de Lula da Silva. Agora, segundo os cômputos assinalam, tampouco deve espantar que o seu desempenho no primeiro ano de mandato tenha sido pior do que o de Fernando Collor, em cujo governo aconteceria a Eco-92.
Para quem tenciona presidir a Rio + 20, Dilma tem atuação mais do que apagada. Reinventou o projeto Belo Monte – atropelando muitas das condicionantes impostas pelo Ibama – quando Collor – que este tinha um senhor chefe na área do Meio Ambiente[1] – engavetara a então denominada usina de Cararaô, no mesmo rio Xingu, ora reexumado.
Não se deve esquecer a sanha com que a Primeira-Ministra de Lula da Silva represara a criação de novas unidades de conservação. Elas são indicativas do desempenho ambiental do governo, na medida em que mexem na estrutura fundiária e em interesses econômicos nas regiões onde são criadas.
Quantas unidades criou dona Dilma, em seu primeiro ano ? Nenhuma !Como se há de negar que se determinarmos a natureza de alguém por suas obras e não por vãs e ocas promessas, teremos de vê-la mais ao lado de Blairo Maggi e Kátia Abreu, na triste vanguarda de um movimento que promete destruição ao invés de produção. Fernando Collor, em período equivalente, criou quinze áreas protegidas. Este número, nós o devemos notadamente à iniciativa de seu Secretário para o Meio Ambiente, José Lutzenberger. No entanto, haver selecionado secretário de estado (na época não havia essa pletora de ministros) de tal qualidade já representa um traço especialmente positivo.
Igualmente no plano da prevenção e da contenção, ignorância e demagogia se dão as mãos. O codigo florestal estadual de Santa Catarina – que persiste malgrado inconstitucional – tornou tão diáfanas as matas ciliares a ponto de transformá-las em inúteis. esquálidos fantasmas de proteção tão necessária quanto natural. A visão aérea de outro espaço, o do vale do rio Muriaé mostra o quanto se avançou também no estado do Rio de Janeiro para aumentar as enchentes e o sofrimento do povo ribeirinho. Se a mata ciliar que a natureza criara tivesse permanecido, metade do vale e das cidades não estariam inundados.
Como se vê, no campo ambiental, enquanto os mais diversos povos – e até os chineses ! – procuram combater a desertificação, nós, que dispomos ainda de inigualáveis recursos naturais, permitimos que a aliança da demagogia e da cega ganância de quem não pensa no amanhã, constituam a triste carantonha que expomos ao mundo! Enquanto tantos outros, menos providos pela natureza, lutam contra o deserto, a aliança ruralista do Congresso das Quartas Feiras, e o Governo de Dilma Rousseff, o que fazem ?
Um comentário:
Matéria de suma importância, com exemplos consistentes de outras experiências mundiais que efetivamente enquadram-se no viéz da sustentabilidade.
Extremamente interessante o trabalho que vem sendo desenvolvido pelo holandês Hoff. No caso da grande muralha verde a implementação da idéia será de difícil viabilização. São muitos países e a extensão da obra imensa.
O caso do Brasil é trágico. O cineasta Meirelles finalizou um filme mostrando como as áreas da Amazônia eram e como ficaram depois do desmate. É de chorar. Talvez fosse o caso da pré-estreia ocorrer no Congresso Nacional.
Considero que o mais importante não é criar mais Unidades De Conservação mas colocar em prática um processo de gestão compartilhada entre o poder instituído e a população em relação às já existentes.
Postar um comentário