O Drama da Síria
A ditadura de Bashar al-Assad não dá qualquer sinal de que pretenda composição com a frente das oposições. Ao invés - e, nesse contexto, a própria perplexidade do chefe da delegação de observadores da Liga Árabe é digna de nota - o general Muhamad Ahmed al-Dabi, do Sudão declarou: “A atual situação, em termos de violência, em nada ajuda para preparar atmosfera para negociações”.
O número de mortes ocasionadas desde o início do levante já é orçado em cinco mil e quatrocentos. Como ambas as partes – seja as forças de Assad, seja os opositores – evidenciem maior agressividade, com a continuação dos tiroteios, mesmo com os intentos da missão da Liga Árabe de informar-se acerca da situação, a conclusão inelutável é que não subsiste a menor segurança para um exame da presente confrontação. Os ativistas de direitos humanos na Síria relatam ataques pelas forças de Assad nas cidades centrais de Homs e de Hama, assim como em Idlib, ao norte. Especialmene em Homs, é grande o derramamento de sangue, com trinta mortes desde quinta-feira passada, inclusive mulheres e crianças. A investida se concentra nas áreas ao sul de Baba Amr e Inshaat, em que a resistência dos habitantes seria maior.
Se a missão da delegação da Liga Árabe se propunha criar condições para explorar possibilidades de entendimento entre o governo Assad e a frente das oposições, o que vem acontecendo no terreno tem demonstrado de forma sobeja a irrelevância da delegação, como virtual fator de paz ou de composição.
Se, contudo, o escopo dos observadores encabeçados pelo a princípio contestado general al-Dabi seria o de pôr a nu, mesmo a contrario sensu, a crescente gravidade e radicalização do embate entre o esquema de sustentação de Bashar al-Assad e grande parte da população, não há negar que tal finalidade vem sendo amplamente corroborada pela progressiva deterioração entre as relações de ambas as parte em confronto.
Inserida em meio de crescente violência, a função de observação da delegação se torna cada vez mais precária. Se houvera objetivos mais ambiciosos, a situação não deixaria dúvidas quanto a falta de condições no terreno para quaisquer eventuais progressos em termos de entendimento.
Na verdade, Bashar al-Assad,malgrado o número de estados que dele se dissociaram, goza de dois importantes apoios.
Circulam notícias de que se está negociando, no âmbito do Conselho de Segurança das Nações Unidas, projeto de resolução de condenação ao Presidente sírio. Como ele dispõe do apoio de dois membros permanentes desse Conselho – a Federação Russa e a República Popular da China parece muito longínqua a possibilidade de que essa resolução tenha dentes, ou coloque condições que constranjam Bashar a negociar ou a ser mais flexível.
O seu principal paladino semelha o atual Primeiro Ministro Vladimir Putin. Por motivos políticos e ideológicos, o seu veto tenderá a impedir a aprovação de documentos com alguma eficácia para determinar uma solução aceitável para a maioria da população síria.
Pelas declarações de seu ministro do exterior e do respectivo embaixador, a menos que intervenham fatores imprevisíveis, será assim pouco provável que Bashar al-Assad seja cominado a renunciar ao mando e a transferir o poder para o vice-presidente.
Como a contraposição só tem sido acirrada pelos métodos e a violência das forças que sustentam Assad, a barreira dos vetos no Conselho de Segurança, se não lograr salvar o déspota alauíta, há de assegurar um ulterior apodrecimento na situação geral.
Nesse caso, tem muita pertinência a anterior advertência de Recip Erdogan, Primeiro Ministro da Turquia, que encarecera ao antigo aliado que renunciasse para evitar males maiores (como o que veio a ocorrer com Muammar Kaddafi).
Israel atacará ou não ao Irã ?
Para o ex-chefe do Mossad (serviço secreto) Meir Dagan e o antigo chefe de estado maior Gabi Ashkenazi a ameaça iraniana não seria tão iminente, quanto sugerido por Barak e Netanyahu, a par de que operação militar (military strike) poderia ser catastrófica.
Posto que não conteste a outrem o direito de pareceres negativos, Barak tem presente a posição do Chefe do governo e do Ministro da Defesa como única no que tange à decisão definitiva. Frisando que essa determinação ainda não foi tomada, há três quesitos que careceriam de ser respondidos de modo afirmativo antes que viesse a ser implementada: (a) tem Israel a capacidade de causar pesados danos aos sítios nucleares iranianos, e dessarte provocar significativo atraso no projeto nuclear iraniano ?; (b) disporia Israel do apoio aberto ou tácito, em particular dos Estados Unidos, para realizar o ataque ?; e (c) teriam sido esgotadas as outras possibilidades para a contenção da ameaça nuclear iraniana, o que levaria Israel a não ter alternativa? Se esta correta a hipótese, seria esta a derradeira oportunidade para um ataque ?
Até o momento presente, Israel se tem servido de o que seria a alternativa do Mossad, o serviço secreto israelense. Nesse contexto, o projeto nuclear iraniano tem sido golpeado, a partir de 2005, por uma série de infortúnios e disastres – que os iranianos atribuem aos serviços de inteligência do Ocidente, e, em especial, ao Mossad. A exacerbação de tal processo estaria nos atentados dirigidos contra cientistas iranianos que trabalhem para o projeto nuclear. Oficialmente, Israel nunca admitiu qualquer envolvimento nos diversos assassínios, mas dirigentes do Mossad elogiam um efeito colateral das mortes de cientistas. Tais medidas incentivariam a defecção branca, vale dizer, muitos assustados cientistas iranianos teriam pedido transferência para projetos civis.
Contudo, tanto Barak quanto Netanyahu tem dúvidas sobre o sucesso a longo prazo da estratégia do Mossad. Na previsão israelense, o programa nuclear iraniano dispõe de janela de nove meses para neutralizar um ataque israelense. No entendimento estadunidense, dada a diferença em termos de eficácia no ataque, esta janela seria de quinze meses.
Nesse contexto, a questão mais delicada seria que indicações os Estado Unidos estariam passando para Israel e, em especial, se o governo israelense informaria previamente Washington de sua decisão de atacar.
Matthew Kroenig é membro do Conselho de Relações Exteriores e foi assessor especial do Pentágono, de julho de 2010 a julho de 2011. No seu entender, “os Estados Unidos pediram a Israel que não ataque o Irã e que dê informação prévia se pretende atacar. Israel respondeu negativamente às duas solicitações. Recusou-se a garantir que não vá atacar, ou a fornecer informação prévia se tenciona fazê-lo.”
Kroenig, no entanto, acrescenta: “ o meu palpite (hunch) é que Israel escolheria dar um préaviso de uma hora ou duas, apenas o bastante para manter boas relações, mas não o suficiente para permitir a Washington inviabilizar (prevent) o ataque”.
Para Kroenig, embora “ninguém queira ir na direção de uma ação militar, desafortunadamente este é o cenário mais provável. A questão mais interessante não é se isto vai acontecer, mas de que modo acontecerá (how). Os Estados Unidos deveriam tratar essa opção de forma mais séria, e começar a agregar apoio internacional, reforçando o seu argumento para o emprego da força sob o direito internacional.”
Dada a singular posição de Israel que evoluiu – ou involuiu – com o passar dos anos, acentuando-se a sua crescente autonomia a partir dos anos setenta, no que tange aos Estados Unidos, apesar de ser estado-cliente de Washington, uma conjunção de fatores o induz a uma independência condicional em termos de grandes decisões. A sua dependência de Washington não o impede de arrogar-se escolhas independentes, pois acredita fundamente que a potência protetora não se há de recusar, mesmo com grande relutância, a avalizar a posteriori decisões tomadas sem a sua prévia autorização. Dessarte, o grande isolamento de Israel em termos políticos não funciona para os seus dirigentes como efetivo deterrente. Pode estar relativamente sozinho no cenário mundial, mas até o presente os antecedentes lhe asseguram valer-se de cláusula excepcional: acredita estar em condições de, mesmo ao forçar-lhe a mão, poder dispor do auxílio da Superpotência.
Atendidas as possibilidades abertas pelo curso de ação de Tel Aviv, as perspectivas são de molde a induzir grande preocupação no que concerne às possíveis consequências político-militares de ação isolada e preventiva de Israel contra o projeto nuclear iraniano. A operação em tela tentaria repetir, em cenário internacional diverso, e com nível de dificuldade muito mais elevado, o que intervenção israelense lograra em 1981, ao destruir o reator de Osirak, reduzindo a pó o projeto nuclear de Saddam Hussein.
( Fonte: International Herald Tribune )
[1] São de meu alvitre, no entanto, as conclusões do artigo, máxime no que diz respeito às características específicas das relações entre a superpotência e Israel.
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