Um milhão e trezentos mil assinaturas endossaram o projeto de iniciativa popular para impedir a candidatura de políticos com ficha suja. A proposição, coordenada pelo Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE), proíbe que concorram às eleições pessoas condenadas em primeira instância, ou com denúncia recebida por um tribunal, por crimes de racismo, homicídio, estupro, tráfico de drogas e desvio de verbas públicas, além das já condenadas por compra de votos ou uso da máquina pública. Para evitar que sejam instrumentalizadas por adversários, as ações em telas precisam ser movidas pelo Ministério Público.
O projeto popular em apreço tem o benefício colateral de regulamentar o inciso 9º do artigo 14 da Constituição Federal. Essa determinação constitucional dorme um sono de mais de vinte de anos, pela desídia de sucessivas legislaturas :
“ Lei complementar estabelecerá outros casos de inegibilidade e os prazos de sua
cessação, a fim de proteger a normalidade e legitimidade das eleições contra a
influência do poder econômico ou o abuso do exercício de função, cargo ou
emprego na administração direta ou indireta.”
O projeto em apreço é mais uma demonstração de que a sociedade civil não tenciona abdicar de seu direito como Povo soberano de criar condições mais dignas e consentâneas com o próprio ambiente em que opera. O Povo brasileiro é trabalhador, honesto, e não é cinico nem indiferente diante da atual crise de valores, que tão melancolicamente reflete a maioria de seus representantes e, em especial, nos Poderes Legislativo e Executivo.
Ao recente arremedo de reforma eleitoral, elaborado de afogadilho, e que passa longe de qualquer medida moralizadora nesse sentido, contraponha-se a ética grandeza do projeto de iniciativa popular apresentado pelo MCCE. Ao contrário das inúmeras vantagens de inchados gabinetes e de dois dias de trabalho por semana, que pavoneiam os nossos parlamentares, o MCCE e as 43 entidades civis que o integram terão enfrentado presumíveis dificuldades materiais do cotidiano, não só para elaborar articulado respeitável, que silencia pela qualidade técnica os previsíveis e açodados críticos, senão para coletar as miríades de assinaturas de cidadãos brasileiros.
No sorrisinho contrafeito do Deputado Michel Temer (PMDB/SP), que fazia as honras da casa, se desenhava o fosso existente entre a sociedade civil, que ainda acredita, e o microcosmo corporativista que é formalmente o mandatário do Povo. Sua Excelência não se conteve e talvez nervoso diante da evidência da insatisfação popular cristalizada no projeto apressou-se em declarar: “Deixar na mão de um único juiz é problemático. A tendência será levar a decisão a um órgão colegiado.”
É voz corrente que cerca de dois terços ou três quintos dos senhores congressistas estariam impossibilitados de candidatar-se nas próximas eleições, se, tangidos por algum inesperado incorruptível, da têmpera de um redivivo Maximilien de Robespierre[1], os nossos deputados e senadores aprovassem, na presente versão, o texto proposto pelo Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral.
[1] Maximilien de Robespierre (1758-1794), convencional, chefe dos Jacobinos, um dos principais líderes da Revolução francesa, célebre pela incorruptibilidade, até hoje é personagem controverso, a ponto de o Presidente Mitterrand, nas comemorações do segundo centenário da Revolução (1989) ter determinado que não lhe fosse dada maior atenção, dentre os personagens celebrados.
quarta-feira, 30 de setembro de 2009
As Contas do Governo Lula
Passou o tempo das contas bem-comportadas. Tempos de dever de casa com a simplicidade da ortodoxia financeira, com o resultante equilíbrio das contas públicas, desnecessidade de inúteis e fantasiosos malabarismos em termos de justificação, e criação de condições para uma redução da dívida pública.
Em outras palavras, a boa gestão das contas do Estado – o que caracterizou o Governo Lula em seu primeiro mandato e, grosso modo, na primeira metade do segundo – com o consequente bom desempenho no superávit fiscal primário não parece ser mais a regra.
Como os leitores deste blog terão observado, tem havido desde princípios do corrente ano uma piora sustentada nos números do superávit primário, i.e., a economia de recursos para o pagamento de juros da dívida pública.
Dessarte, entre janeiro e agosto de 2009 as despesas do governo federal marcaram um aumento real de 12%, enquanto as receitas tiveram queda de 4,2% no período. Em consequência, o superávit primário do governo central (Tesouro Nacional, Previdência Social e Banco Central) despencou quase 70% no ano em relação a 2008, ficando em R$23,8 bilhões até agosto último, ou 1,21% do Produto Interno Bruto.
Se a diminuição nas receitas está ligada à crise financeira – a conhecida marolinha de Lula -, e é resultado da decorrente menor arrecadação fiscal e das desonerações fiscais (de veículos de modelos econômicos e de eletrodomésticos), o incremento nas despesas – que as autoridades fazendárias intentam explicar com política anticíclica para combater os efeitos da crise econômica – na verdade tem outra origem principal, de resto já apontada em comentários anteriores.
A referida elevação das despesas decorre precipuamente da elevação dos gastos correntes, notadamente com pessoal (15,1%). O aumento do empreguismo – que acompanha a inchação dos ministérios e da máquina pública - com a sua patente finalidade eleitoreira, comprova a recaída do governo Lula nas práticas irresponsáveis do clientelismo neopopulista. A esse propósito, as despesas com investimento – aquelas que são realmente importantes para estimular as atividades econômicas – assinalam um ritmo bem mais modesto de crescimento: 4,8%.
O aumento dos gastos correntes com pessoal, cujo peso é tanto mais grave porque destituído de flexibilidade, as desonerações fiscais para alavancar as vendas das montadoras estrangeiras, e a redução da arrecadação fiscal derivada do retraímento da economia não poderia, decerto, desembocar em outro resultado que a derribada do superávit fiscal e o consequente aumento da dívida.
Como se verifica, o quadro traçado em princípios de julho último, pelo ex-Secretário da Receita Federal, Everardo Maciel, continua tristemente a materializar-se: “(O Governo) está aumentando o gasto corrente de maneira irreversível. Ao mesmo tempo, está, por causa da crise, tendo uma queda de arrecadação de 6%., maior do que a queda do PIB. Está compensando os aumentos dos gastos e a queda da arrecadação, com a redução progressiva do superávit primário, o que elevará a dívida/PIB. Isso é um caminho suicida.”
Em outras palavras, a boa gestão das contas do Estado – o que caracterizou o Governo Lula em seu primeiro mandato e, grosso modo, na primeira metade do segundo – com o consequente bom desempenho no superávit fiscal primário não parece ser mais a regra.
Como os leitores deste blog terão observado, tem havido desde princípios do corrente ano uma piora sustentada nos números do superávit primário, i.e., a economia de recursos para o pagamento de juros da dívida pública.
Dessarte, entre janeiro e agosto de 2009 as despesas do governo federal marcaram um aumento real de 12%, enquanto as receitas tiveram queda de 4,2% no período. Em consequência, o superávit primário do governo central (Tesouro Nacional, Previdência Social e Banco Central) despencou quase 70% no ano em relação a 2008, ficando em R$23,8 bilhões até agosto último, ou 1,21% do Produto Interno Bruto.
Se a diminuição nas receitas está ligada à crise financeira – a conhecida marolinha de Lula -, e é resultado da decorrente menor arrecadação fiscal e das desonerações fiscais (de veículos de modelos econômicos e de eletrodomésticos), o incremento nas despesas – que as autoridades fazendárias intentam explicar com política anticíclica para combater os efeitos da crise econômica – na verdade tem outra origem principal, de resto já apontada em comentários anteriores.
A referida elevação das despesas decorre precipuamente da elevação dos gastos correntes, notadamente com pessoal (15,1%). O aumento do empreguismo – que acompanha a inchação dos ministérios e da máquina pública - com a sua patente finalidade eleitoreira, comprova a recaída do governo Lula nas práticas irresponsáveis do clientelismo neopopulista. A esse propósito, as despesas com investimento – aquelas que são realmente importantes para estimular as atividades econômicas – assinalam um ritmo bem mais modesto de crescimento: 4,8%.
O aumento dos gastos correntes com pessoal, cujo peso é tanto mais grave porque destituído de flexibilidade, as desonerações fiscais para alavancar as vendas das montadoras estrangeiras, e a redução da arrecadação fiscal derivada do retraímento da economia não poderia, decerto, desembocar em outro resultado que a derribada do superávit fiscal e o consequente aumento da dívida.
Como se verifica, o quadro traçado em princípios de julho último, pelo ex-Secretário da Receita Federal, Everardo Maciel, continua tristemente a materializar-se: “(O Governo) está aumentando o gasto corrente de maneira irreversível. Ao mesmo tempo, está, por causa da crise, tendo uma queda de arrecadação de 6%., maior do que a queda do PIB. Está compensando os aumentos dos gastos e a queda da arrecadação, com a redução progressiva do superávit primário, o que elevará a dívida/PIB. Isso é um caminho suicida.”
terça-feira, 29 de setembro de 2009
A Crise do Pântano
A cada dia que passa, a crise hondurenha tende a agravar-se. A cacofonia das partes continua a crescer. Todos os partícipes se acreditam donos da verdade, vestindo as alvas túnicas do direito e da legitimidade.
Um momento. Não seria o caso de repassar-lhes as respectivas contribuições à presente situação?
Comecemos por José Manuel Zelaya, o presidente constitucional. Sua deposição – excluída a expulsão inconstitucional – fora motivada pelas próprias irresponsáveis ações, que objetivavam a votação de um referendo contra cláusula pétrea da Constituição de Honduras (a não-reeleição absoluta). Zelaya tentou envolver o Comandante das Forças Armadas, e acabou tendo a prisão decretada pela Corte Suprema. Zelaya seguia o receituário chavista e por isso acabou apeado do poder.
O Presidente Roberto Micheletti, a despeito de apodado de ‘golpista’, na verdade foi sufragado pela maioria do Congresso, que já se tinha oposto aos intentos de Zelaya de subverter a ordem constitucional. Micheletti e a Corte Suprema hondurenha não têm mostrado muita abertura para a negociação, e decerto não facilitaram os trabalhos do mediador Presidente Oscar Arias, Premio Nobel da Paz, para a implementação do Acordo de San José. Tampouco Micheletti agiu com correção, ao proclamar o estado de sítio e fechar uma estação de tv e outra de rádio. Todavia, o decreto está previsto na Constituição e diante da oposição da maioria do Congresso, Micheletti prometeu revogar o estado de sítio.
Creio que não seja necessário discutir o papel do mentor Hugo Chávez na origem da crise. Sem ele e suas custosas fantasias da democracia bolivariana, seu discípulo hondurenho Zelaya continuaria filiado ao partido liberal-conservador e estaria, de forma bem-comportada, cuidando de influenciar na eleição constitucional de um sucessor.
Obviamente tal não se aplica à viabilização pelo coronel Chávez de todo o rocambolesco episódio da reinserção de Zelaya dentro do microcosmo hondurenho. É tão somente a ele que o presidente Lula da Silva deve agradecer pela chamada materialização de Zelaya às portas da chancelaria da embaixada brasileira.
Com o abrigo do presidente deposto na missão do Brasil em Tegucigalpa, a crise registra marcada deterioração. Se há muitas coisas a discutir, não há dúvida de que a situação se altera radicalmente com o ingresso de Manuel Zelaya na embaixada. Transformando o ambiente neutro e extraterritorial da missão diplomática em plataforma de ação política com viés insurrecional, a crise se agrava.
Não cabe mais discutir do acerto ou não da decisão do tandem Lula-Marco Aurélio Garcia de admitir a presença desestabilizadora de Zelaya na embaixada. Talvez fosse esta mesma a intenção, só que lhes terá escapado o matiz da distinção entre o asilo diplomático, reconhecido internacionalmente, e abrigo-refúgio que não tem qualquer embasamento jurídico.
Quiçá caberia ao Ministro das Relações Exteriores do Brasil, quando interveio no assunto a mando de Lula, ter fraseado de forma menos diplomática e mais explícita a determinação de que Zelaya respeitasse a forçosa neutralidade da missão. Não obstante, por bater de frente contra os manifestos objetivos da aventura, semelha dificil acreditar que mesmo em uma linguagem mais compreensível ao presidente deposto a advertência do Ministro Amorim fosse obedecida por Zelaya.
Com o agravamento da crise, decorrente da instrumentalização da missão como base avançada na criação de situação contrária ao governo de Micheletti, tampouco há de surpreender a reação deste último, com diversas medidas de cerco da chancelaria brasileira. Combatia-se o desvirtuamento de uma função da embaixada, com outro erro, i.e., cerceamento pelas forças governamentais das atividades legais desta missão.
Para tentar consertar o problema, o Itamaraty optou por recorrer ao Conselho de Segurança das Nações Unidas. Nesta oportunidade, por discordar da competência, houve altercação entre a Embaixadora americana junto às Nações Unidas (e atual presidente do Conselho) e o Ministro Amorim. Em consequência, as providências adotadas pelas Nações Unidas ficaram aquém das expectativas de Lula.
A questão voltou para a alçada da disfuncional Organização dos Estados Americanos. Excluída a iniciativa de Arias, com o seu Acordo (até hoje não aplicado), e que mais dependeu de apoio do State Department, a OEA tem mais uma vez comprovado a própria decenal ineficácia. Na reunião de ontem, ao cabo de intermináveis e improdutivas discussões, o Conselho ouviu com espanto o representante estadunidense qualificar de “irresponsável e tolo” o retorno de Manuel Zelaya à Tegucigalpa. Da forma com que pronunciada a invectiva atinge não apenas ao beneficiário direto da iniciativa, mas também respinga tanto no autor intelectual e logístico (Hugo Chávez), quanto em seus coadjuvantes (voluntários ou não, i.e., Lula, Marco Aurélio e Amorim).
Como declarações anteriores da Secretária de Estado, Hillary Clinton, houvessem sido interpretradas como relativamente favoráveis a Manuel Zelaya (assim como medidas posteriores mais enérgicas contra o regime de Micheletti), a observação do embaixador estadunidense lançou confusão sobre os demais delegados no Conselho da OEA. Para atuar corretamente, careciam de entender as implicações do relativo enigma lançado pela esfinge.
Sendo usuais as reprimendas e recriminações contra a pobre OEA, ora sob a direção algo controversa do chileno Insulza, e tendo o Conselho de Segurança das Nações Unidas marcado a sua posição, será no cenário acanhado da pequena Honduras que uma solução da presente crise deverá ser costurada.
Talvez disso o pressuposto básico seja a admissão por todos os atores, protagonistas ou secundários, de que são responsáveis pela situação. Seja humildade ou honestidade, representaria auxílio ponderável para encontrar uma saída do pântano em que se meteram.
Um momento. Não seria o caso de repassar-lhes as respectivas contribuições à presente situação?
Comecemos por José Manuel Zelaya, o presidente constitucional. Sua deposição – excluída a expulsão inconstitucional – fora motivada pelas próprias irresponsáveis ações, que objetivavam a votação de um referendo contra cláusula pétrea da Constituição de Honduras (a não-reeleição absoluta). Zelaya tentou envolver o Comandante das Forças Armadas, e acabou tendo a prisão decretada pela Corte Suprema. Zelaya seguia o receituário chavista e por isso acabou apeado do poder.
O Presidente Roberto Micheletti, a despeito de apodado de ‘golpista’, na verdade foi sufragado pela maioria do Congresso, que já se tinha oposto aos intentos de Zelaya de subverter a ordem constitucional. Micheletti e a Corte Suprema hondurenha não têm mostrado muita abertura para a negociação, e decerto não facilitaram os trabalhos do mediador Presidente Oscar Arias, Premio Nobel da Paz, para a implementação do Acordo de San José. Tampouco Micheletti agiu com correção, ao proclamar o estado de sítio e fechar uma estação de tv e outra de rádio. Todavia, o decreto está previsto na Constituição e diante da oposição da maioria do Congresso, Micheletti prometeu revogar o estado de sítio.
Creio que não seja necessário discutir o papel do mentor Hugo Chávez na origem da crise. Sem ele e suas custosas fantasias da democracia bolivariana, seu discípulo hondurenho Zelaya continuaria filiado ao partido liberal-conservador e estaria, de forma bem-comportada, cuidando de influenciar na eleição constitucional de um sucessor.
Obviamente tal não se aplica à viabilização pelo coronel Chávez de todo o rocambolesco episódio da reinserção de Zelaya dentro do microcosmo hondurenho. É tão somente a ele que o presidente Lula da Silva deve agradecer pela chamada materialização de Zelaya às portas da chancelaria da embaixada brasileira.
Com o abrigo do presidente deposto na missão do Brasil em Tegucigalpa, a crise registra marcada deterioração. Se há muitas coisas a discutir, não há dúvida de que a situação se altera radicalmente com o ingresso de Manuel Zelaya na embaixada. Transformando o ambiente neutro e extraterritorial da missão diplomática em plataforma de ação política com viés insurrecional, a crise se agrava.
Não cabe mais discutir do acerto ou não da decisão do tandem Lula-Marco Aurélio Garcia de admitir a presença desestabilizadora de Zelaya na embaixada. Talvez fosse esta mesma a intenção, só que lhes terá escapado o matiz da distinção entre o asilo diplomático, reconhecido internacionalmente, e abrigo-refúgio que não tem qualquer embasamento jurídico.
Quiçá caberia ao Ministro das Relações Exteriores do Brasil, quando interveio no assunto a mando de Lula, ter fraseado de forma menos diplomática e mais explícita a determinação de que Zelaya respeitasse a forçosa neutralidade da missão. Não obstante, por bater de frente contra os manifestos objetivos da aventura, semelha dificil acreditar que mesmo em uma linguagem mais compreensível ao presidente deposto a advertência do Ministro Amorim fosse obedecida por Zelaya.
Com o agravamento da crise, decorrente da instrumentalização da missão como base avançada na criação de situação contrária ao governo de Micheletti, tampouco há de surpreender a reação deste último, com diversas medidas de cerco da chancelaria brasileira. Combatia-se o desvirtuamento de uma função da embaixada, com outro erro, i.e., cerceamento pelas forças governamentais das atividades legais desta missão.
Para tentar consertar o problema, o Itamaraty optou por recorrer ao Conselho de Segurança das Nações Unidas. Nesta oportunidade, por discordar da competência, houve altercação entre a Embaixadora americana junto às Nações Unidas (e atual presidente do Conselho) e o Ministro Amorim. Em consequência, as providências adotadas pelas Nações Unidas ficaram aquém das expectativas de Lula.
A questão voltou para a alçada da disfuncional Organização dos Estados Americanos. Excluída a iniciativa de Arias, com o seu Acordo (até hoje não aplicado), e que mais dependeu de apoio do State Department, a OEA tem mais uma vez comprovado a própria decenal ineficácia. Na reunião de ontem, ao cabo de intermináveis e improdutivas discussões, o Conselho ouviu com espanto o representante estadunidense qualificar de “irresponsável e tolo” o retorno de Manuel Zelaya à Tegucigalpa. Da forma com que pronunciada a invectiva atinge não apenas ao beneficiário direto da iniciativa, mas também respinga tanto no autor intelectual e logístico (Hugo Chávez), quanto em seus coadjuvantes (voluntários ou não, i.e., Lula, Marco Aurélio e Amorim).
Como declarações anteriores da Secretária de Estado, Hillary Clinton, houvessem sido interpretradas como relativamente favoráveis a Manuel Zelaya (assim como medidas posteriores mais enérgicas contra o regime de Micheletti), a observação do embaixador estadunidense lançou confusão sobre os demais delegados no Conselho da OEA. Para atuar corretamente, careciam de entender as implicações do relativo enigma lançado pela esfinge.
Sendo usuais as reprimendas e recriminações contra a pobre OEA, ora sob a direção algo controversa do chileno Insulza, e tendo o Conselho de Segurança das Nações Unidas marcado a sua posição, será no cenário acanhado da pequena Honduras que uma solução da presente crise deverá ser costurada.
Talvez disso o pressuposto básico seja a admissão por todos os atores, protagonistas ou secundários, de que são responsáveis pela situação. Seja humildade ou honestidade, representaria auxílio ponderável para encontrar uma saída do pântano em que se meteram.
segunda-feira, 28 de setembro de 2009
Diplomacia no Pântano
A ‘materialização’ de José Manuel Zelaya, presidente deposto de Honduras, na porta da chancelaria da embaixada do Brasil em Tegucigalpa, se acontecida na segunda-feira, vinte e um de setembro, continua a se fazer sentir, e de forma cada vez mais incômoda, na política diplomática brasileira.
Ambiguidade não acidental caracterizou o ingresso de Manuel Zelaya em local submetido às normas da exterritorialidade. O asilo diplomático, que é instituto do direito internacional público, com particular uso na América Latina, vem sendo aí desvirtuado por objetivos que nada têm a ver com a sua finalidade jurídica, que é a de assegurar proteção ao demandante.
Segundo noticia a Folha, em despacho do enviado especial Fabiano Maisonnave, o presidente deposto Manuel Zelaya exortou ontem a população do país a “promover atos de desobediência civil”contra o regime de Roberto Micheletti. O comunicado de Zelaya prega abertamente a revolta : “chamamos (o povo) à resistência para vencer aos que nos roubaram a paz, e a organizar-se, em cada aldeia, povoado, município, para fazer atos de desobediência civil contra a ditadura”.
O incrível apelo acima transcrito contraria não só os ditames mais comezinhos de direito internacional. Ao instrumentalizar de modo tão gritante e desavergonhado o direito de asilo, antes convertido em equívoco direito de abrigo ou de refúgio, é imperativo que se tenha presente alguns fatos inarredáveis:
o único fundamento jurídico válido, a cuja proteção Zelaya pode aspirar, é o direito de asilo. Qualquer adaptação subreptícia deste instituto – como um suposto direito de abrigo ou de refúgio – não terá qualquer validade no direito internacional, eis que nenhuma autoridade pode legislar ad hoc, criando derivações jurídicas de um instituto de prática centenária;
ao aceitar o asilo, a pessoa favorecida deverá abster-se de qualquer atuação política, obrigação que carece de ser mantida durante toda a extensão de sua permanência nas dependências da missão diplomática; e
o princípio constitucional da não-intervenção nos assuntos internos do país em que a embaixada se acha acreditada é uma das bases do respeito à exterritorialidade dessa missão.
Ao comportar-se com a desenvoltura supramencionada, Zelaya se está colocando fora da lei e de quaisquer parâmetros diplomáticos. O presidente deposto ignora acintosamente as orientações do governo Lula, e em especial a recomendação do Ministro das Relações Exteriores que não faça “qualquer tipo de manifestação que possa ser interpretada de maneira equivocada”.
Forçoso será reconhecer que o señor Zelaya tem agido de forma contrária ao que se poderia esperar de um postulante de asilo. Diante de uma embaixada sublotada e com um único funcionário diplomático, José Manuel Zelaya se comporta mais como senhor da casa em que adentrou, de o que seria lícito esperar de um candidato a asilo diplomático (ou abrigo). Não só a esposa Xiomara e familiares o acompanham, senão uma centena de pessoas, causando o inevitável caos nos acanhados recintos da chancelaria da missão brasileira.
Atualmente, retém junto dele cerca de sessenta pessoas, em arremedo de comitiva ou de clientes e apaniguados de eventual chefe político. Pelas fotos do agrupamento, há ambiente de desmazelo e de informalidade vizinha da desordem. Nada que de longe pareça a sobriedade da situação penosa que procura manter a própria dignidade.
Não há de surpreender deveras que tudo isso conduza à emissão pelo governo de fato hondurenho de comunicado em que acusa o governo brasileiro de instigar uma insurreição dentro de suas fronteiras. No documento, o secretário de relações exteriores do governo Micheletti afirma que a embaixada tem sido usada para instigar a violência e a insurreição contra o povo hondurenho e o governo constitucional.
Nesse sentido, o governo de Honduras dá um prazo de dez dias para decidir sobre o status do presidente deposto José Manuel Zelaya.
A respeito do aludido comunicado, a parte brasileira já expediu nota à imprensa de que não tenciona responder ao dito ‘ultimatum’.
Por sua vez, Lula, na reunião organizada por Chávez em Isla Margarita, veio a público no seu estilo habitual para dizer que o Brasil não aceita ultimatuns de governos golpistas. Acrescentou, outrossim, que não tinha o que negociar com Micheletti e aduziu que “Zelaya era um hóspede da Embaixada do Brasil”.
Infelizmente, senhor presidente, a negação da evidência não determina necessariamente que a dita evidência deixe de existir.
Informações ulteriores parecem indicar, contudo, que o presidente não é tão impérvio à realidade hondurenha quanto aparenta. Preocupado com os abusos do refugiado, determinou ao seu Ministro das Relações Exteriores que telefone a Zelaya para dizer-lhe que não incite protestos de qualquer natureza enquanto estiver abrigado na embaixada. Isso não difere muito, é verdade, do anterior recado de Amorim, conquanto leve agora a chancela presidencial. O futuro dirá se Zelaya, nessa altura dos acontecimentos, se conformará à ordem de Lula.
Se Zelaya é hóspede, precisa respeitar a sua alegada condição, e sobretudo a tradição diplomática brasileira, que é avessa à utilização de embaixadas como plataformas de desrespeito à ordem constituída. A incitação à desordem é inadmissível. Há outros meios, constantes da prática diplomática, para alcançar a composição política.
Não se trata de dialogar com quem quer que seja, mas sim de atuar de forma responsável, coerente com os nossos princípios diplomáticos e toda a tradição diplomática brasileira.
Que de tão inconteste, se acha consignada até nos Princípios Fundamentais da Constituição vigente, de que consta o nome de Luiz Inácio Lula da Silva, na lista encabeçada pela assinatura do ilustre Ulysses Guimarães.
Ambiguidade não acidental caracterizou o ingresso de Manuel Zelaya em local submetido às normas da exterritorialidade. O asilo diplomático, que é instituto do direito internacional público, com particular uso na América Latina, vem sendo aí desvirtuado por objetivos que nada têm a ver com a sua finalidade jurídica, que é a de assegurar proteção ao demandante.
Segundo noticia a Folha, em despacho do enviado especial Fabiano Maisonnave, o presidente deposto Manuel Zelaya exortou ontem a população do país a “promover atos de desobediência civil”contra o regime de Roberto Micheletti. O comunicado de Zelaya prega abertamente a revolta : “chamamos (o povo) à resistência para vencer aos que nos roubaram a paz, e a organizar-se, em cada aldeia, povoado, município, para fazer atos de desobediência civil contra a ditadura”.
O incrível apelo acima transcrito contraria não só os ditames mais comezinhos de direito internacional. Ao instrumentalizar de modo tão gritante e desavergonhado o direito de asilo, antes convertido em equívoco direito de abrigo ou de refúgio, é imperativo que se tenha presente alguns fatos inarredáveis:
o único fundamento jurídico válido, a cuja proteção Zelaya pode aspirar, é o direito de asilo. Qualquer adaptação subreptícia deste instituto – como um suposto direito de abrigo ou de refúgio – não terá qualquer validade no direito internacional, eis que nenhuma autoridade pode legislar ad hoc, criando derivações jurídicas de um instituto de prática centenária;
ao aceitar o asilo, a pessoa favorecida deverá abster-se de qualquer atuação política, obrigação que carece de ser mantida durante toda a extensão de sua permanência nas dependências da missão diplomática; e
o princípio constitucional da não-intervenção nos assuntos internos do país em que a embaixada se acha acreditada é uma das bases do respeito à exterritorialidade dessa missão.
Ao comportar-se com a desenvoltura supramencionada, Zelaya se está colocando fora da lei e de quaisquer parâmetros diplomáticos. O presidente deposto ignora acintosamente as orientações do governo Lula, e em especial a recomendação do Ministro das Relações Exteriores que não faça “qualquer tipo de manifestação que possa ser interpretada de maneira equivocada”.
Forçoso será reconhecer que o señor Zelaya tem agido de forma contrária ao que se poderia esperar de um postulante de asilo. Diante de uma embaixada sublotada e com um único funcionário diplomático, José Manuel Zelaya se comporta mais como senhor da casa em que adentrou, de o que seria lícito esperar de um candidato a asilo diplomático (ou abrigo). Não só a esposa Xiomara e familiares o acompanham, senão uma centena de pessoas, causando o inevitável caos nos acanhados recintos da chancelaria da missão brasileira.
Atualmente, retém junto dele cerca de sessenta pessoas, em arremedo de comitiva ou de clientes e apaniguados de eventual chefe político. Pelas fotos do agrupamento, há ambiente de desmazelo e de informalidade vizinha da desordem. Nada que de longe pareça a sobriedade da situação penosa que procura manter a própria dignidade.
Não há de surpreender deveras que tudo isso conduza à emissão pelo governo de fato hondurenho de comunicado em que acusa o governo brasileiro de instigar uma insurreição dentro de suas fronteiras. No documento, o secretário de relações exteriores do governo Micheletti afirma que a embaixada tem sido usada para instigar a violência e a insurreição contra o povo hondurenho e o governo constitucional.
Nesse sentido, o governo de Honduras dá um prazo de dez dias para decidir sobre o status do presidente deposto José Manuel Zelaya.
A respeito do aludido comunicado, a parte brasileira já expediu nota à imprensa de que não tenciona responder ao dito ‘ultimatum’.
Por sua vez, Lula, na reunião organizada por Chávez em Isla Margarita, veio a público no seu estilo habitual para dizer que o Brasil não aceita ultimatuns de governos golpistas. Acrescentou, outrossim, que não tinha o que negociar com Micheletti e aduziu que “Zelaya era um hóspede da Embaixada do Brasil”.
Infelizmente, senhor presidente, a negação da evidência não determina necessariamente que a dita evidência deixe de existir.
Informações ulteriores parecem indicar, contudo, que o presidente não é tão impérvio à realidade hondurenha quanto aparenta. Preocupado com os abusos do refugiado, determinou ao seu Ministro das Relações Exteriores que telefone a Zelaya para dizer-lhe que não incite protestos de qualquer natureza enquanto estiver abrigado na embaixada. Isso não difere muito, é verdade, do anterior recado de Amorim, conquanto leve agora a chancela presidencial. O futuro dirá se Zelaya, nessa altura dos acontecimentos, se conformará à ordem de Lula.
Se Zelaya é hóspede, precisa respeitar a sua alegada condição, e sobretudo a tradição diplomática brasileira, que é avessa à utilização de embaixadas como plataformas de desrespeito à ordem constituída. A incitação à desordem é inadmissível. Há outros meios, constantes da prática diplomática, para alcançar a composição política.
Não se trata de dialogar com quem quer que seja, mas sim de atuar de forma responsável, coerente com os nossos princípios diplomáticos e toda a tradição diplomática brasileira.
Que de tão inconteste, se acha consignada até nos Princípios Fundamentais da Constituição vigente, de que consta o nome de Luiz Inácio Lula da Silva, na lista encabeçada pela assinatura do ilustre Ulysses Guimarães.
domingo, 27 de setembro de 2009
Colcha de Retalhos XXIII
Cúpula América do Sul – África (ASA)
Em Isla Margarita, na Venezuela, o Coronel Hugo Chávez é o anfitrião da segunda cúpula da América do Sul e da África. Neste importante encontro, a que não podia obviamente faltar o nosso Presidente Lula da Silva, estavam igualmente presentes dois estadistas africanos, Muamar Kadafi, da Líbia, e Robert Mugabe, do Zimbabue.
Kadafi estava chegando de Manhattan, onde discursara para uma atenta plateia por cerca de duas horas. Ao final, o governo da Confederação Helvética respirou aliviado eis que o prócer da revolução verde em seu desértico país se absteve de propor a dissolução da velha Suiça. O diretório suiço decerto festejou o êxito de sua tática de enfrentar o desafio líbico, que se centrou notadamente nos abjetos mas bem fundados pedidos de desculpas ao ex-major acerca da impensada detenção do filhinho Haníbal, por ter espancado dois funcionários de hotel helvético.
Kadafi voltou a verberar a atuação do Conselho de Segurança das Nações Unidas. Nesse contexto, diante de um público que já viu (quase) de tudo, não trepidou em rasgar – o que provocou mais uma dobra em sua contorcida fisionomia – o livreto com a Carta das Nações Unidas. Agora, em Isla Margarita, sob os olhares embevecidos de Chávez, Lula e Mugabe, Kadafi não mais dilacerou a Carta, mas tornou a censurar em palavras que jamais serão esquecidas o Conselho de Segurança.
Abrilhantou também a cimeira – talvez esse vocábulo luso empreste mais dignidade à reunião – o veterano Robert Mugabe, o ditador do Zimbabue. Incompreendido por muitos – o que terá causado uma série de lamentáveis mandados de busca internacionais, que obrigam o pobre Mugabe a se deslocar com extrema cautela, para evitar a desagradável surpresa de se descobrir atrás das grades -, Mugabe deixou por uns dias o seu assolado e devastado país (pelo cólera generalizado e pela corrupção e violência de seus devotados correligionários), para gozar da asiática hospitalidade do caudilho Chávez, que transita com tanta alacridade por destinos tão visitados pelo jet set quanto a Teerã, de Ahmadinejad e a Trípoli, de Kadafi.
Quanto ao Nosso Guia, recebeu ele o confortante apoio do Caudilho Chávez pelos problemas que está enfrentando a Embaixada do Brasil em Tegucigalpa. A esse respeito, Chávez terá comovido a Lula ao declarar : ‘Em qualquer lugar que vamos (sic), temos de rechaçar com muita força esta agressão à embaixada brasileira’. Há de compreender-se a emoção sentida por Lula, sobretudo pela circunstância de que se deve às determinações do líder supremo da Alba a situação em que ora se encontra a representação diplomática brasileira em terras da antiga República das Bananas.
Processo do Presidente Sarkozy contra o ex-rival Dominique de Villepins
Nesta semana foi iniciado o julgamente do ex-Primeiro Ministro francês, Dominique de Villepins, bastante chegado ao ex-presidente Jacques Chirac. O processo, motivado por acusação do atual Presidente da França, Nicolas Sarkozy – e sucessor de Chirac – tem demasiadas conotações políticas, para que possa parecer suscetível de ensejar uma avaliação justa, equilibrada, e não influenciada pela presente disparidade de poder entre as partes em litígio.
No banco dos réus, Dominique de Villepins não é decerto personagem que semelhe coadunar-se com a sua atual posição. Além de primeiro ministro, Villepins foi igualmente ministro dos negócios estrangeiros, durante os mandatos presidenciais de Jacques Chirac. A par disso, Villepins postulou a candidatura à sucessão de seu mentor, tendo sido o principal rival de Sarkozy.
O processo que ora chega aos tribunais se deve à queixa-crime do atual presidente da república, que acusa Dominique de Villepins – juntamente com quatro outros – de planejar campanha difamatória, em 2003 e 2004, com o intuito de minar-lhe as ambições presidenciais.
Em uma entrevista televisada em circuito nacional, de New York, Sarkozy declarou que : “depois de uma investigação de dois anos, dois juízes independentes determinaram que as partes culpadas devem ser julgadas em uma corte penal.”
Conquanto o presidente não tenha dado os nomes dos culpados, os seus comentários foram interpretados como violação de sua responsabilidade como Presidente, de ficar acima da lei, mesmo quando ele é parte civil da acusação, como nesse caso.
O advogado de Villepins considerou ‘escandalosas’ as observações de Sarkozy e acrescentou que o ex-Primeiro Ministro processaria o Sr. Sarkozy pela violação de seu direito à presunção de inocência (o Presidente francês só pode ser processado depois de deixar o cargo).
O processo se reporta a Clearstream, estabelecimento sediado em Luxemburgo,
de que teria vazado para um juiz de instrução uma lista de clientes detentores de contas secretas (oriundas de comissões de vendas de armas). A citada lista de contas – que depois se soube tinha sido adulterada – continha várias versões do sobrenome de Sarkozy.
De Villepins, acusado de cumplicidade no complô, tem afirmado a sua inocência e disse estar sendo julgado ‘por causa da impiedosidade de um só homem, Nicolas Sarkozy’.
Sarkozy constituíu-se parte acusadora no processo em 2006 e de Villepins foi indiciado em novembro de 2008, não por haver encomendado a lista falsa, mas por alegadamente tê-la usado para prejudicar Sarkozy.
No país de tantos processos célebres, o que se inicia já acena alguns títulos para reivindicação futura nessa categoria. François Bayrou, líder do centristra Movimento Democrático, fez comentário interessante: “Freud diria que é um lapso revelador, que desvela a ambiguidade da posição de Sarkozy neste affair. Ele é parte civil, isto é, entrou com uma queixa na qualidade de vítima, mas também é garante da justiça, a autoridade superior dos promotores na hierarquia.”
Dominique de Villepins pode ser condenado a cinco anos de prisão e a uma multa de quarenta e cinco mil euros. O julgamento deve estender-se até 23 de outubro próximo.
( Fontes: O Globo e International Herald Tribune)
Em Isla Margarita, na Venezuela, o Coronel Hugo Chávez é o anfitrião da segunda cúpula da América do Sul e da África. Neste importante encontro, a que não podia obviamente faltar o nosso Presidente Lula da Silva, estavam igualmente presentes dois estadistas africanos, Muamar Kadafi, da Líbia, e Robert Mugabe, do Zimbabue.
Kadafi estava chegando de Manhattan, onde discursara para uma atenta plateia por cerca de duas horas. Ao final, o governo da Confederação Helvética respirou aliviado eis que o prócer da revolução verde em seu desértico país se absteve de propor a dissolução da velha Suiça. O diretório suiço decerto festejou o êxito de sua tática de enfrentar o desafio líbico, que se centrou notadamente nos abjetos mas bem fundados pedidos de desculpas ao ex-major acerca da impensada detenção do filhinho Haníbal, por ter espancado dois funcionários de hotel helvético.
Kadafi voltou a verberar a atuação do Conselho de Segurança das Nações Unidas. Nesse contexto, diante de um público que já viu (quase) de tudo, não trepidou em rasgar – o que provocou mais uma dobra em sua contorcida fisionomia – o livreto com a Carta das Nações Unidas. Agora, em Isla Margarita, sob os olhares embevecidos de Chávez, Lula e Mugabe, Kadafi não mais dilacerou a Carta, mas tornou a censurar em palavras que jamais serão esquecidas o Conselho de Segurança.
Abrilhantou também a cimeira – talvez esse vocábulo luso empreste mais dignidade à reunião – o veterano Robert Mugabe, o ditador do Zimbabue. Incompreendido por muitos – o que terá causado uma série de lamentáveis mandados de busca internacionais, que obrigam o pobre Mugabe a se deslocar com extrema cautela, para evitar a desagradável surpresa de se descobrir atrás das grades -, Mugabe deixou por uns dias o seu assolado e devastado país (pelo cólera generalizado e pela corrupção e violência de seus devotados correligionários), para gozar da asiática hospitalidade do caudilho Chávez, que transita com tanta alacridade por destinos tão visitados pelo jet set quanto a Teerã, de Ahmadinejad e a Trípoli, de Kadafi.
Quanto ao Nosso Guia, recebeu ele o confortante apoio do Caudilho Chávez pelos problemas que está enfrentando a Embaixada do Brasil em Tegucigalpa. A esse respeito, Chávez terá comovido a Lula ao declarar : ‘Em qualquer lugar que vamos (sic), temos de rechaçar com muita força esta agressão à embaixada brasileira’. Há de compreender-se a emoção sentida por Lula, sobretudo pela circunstância de que se deve às determinações do líder supremo da Alba a situação em que ora se encontra a representação diplomática brasileira em terras da antiga República das Bananas.
Processo do Presidente Sarkozy contra o ex-rival Dominique de Villepins
Nesta semana foi iniciado o julgamente do ex-Primeiro Ministro francês, Dominique de Villepins, bastante chegado ao ex-presidente Jacques Chirac. O processo, motivado por acusação do atual Presidente da França, Nicolas Sarkozy – e sucessor de Chirac – tem demasiadas conotações políticas, para que possa parecer suscetível de ensejar uma avaliação justa, equilibrada, e não influenciada pela presente disparidade de poder entre as partes em litígio.
No banco dos réus, Dominique de Villepins não é decerto personagem que semelhe coadunar-se com a sua atual posição. Além de primeiro ministro, Villepins foi igualmente ministro dos negócios estrangeiros, durante os mandatos presidenciais de Jacques Chirac. A par disso, Villepins postulou a candidatura à sucessão de seu mentor, tendo sido o principal rival de Sarkozy.
O processo que ora chega aos tribunais se deve à queixa-crime do atual presidente da república, que acusa Dominique de Villepins – juntamente com quatro outros – de planejar campanha difamatória, em 2003 e 2004, com o intuito de minar-lhe as ambições presidenciais.
Em uma entrevista televisada em circuito nacional, de New York, Sarkozy declarou que : “depois de uma investigação de dois anos, dois juízes independentes determinaram que as partes culpadas devem ser julgadas em uma corte penal.”
Conquanto o presidente não tenha dado os nomes dos culpados, os seus comentários foram interpretados como violação de sua responsabilidade como Presidente, de ficar acima da lei, mesmo quando ele é parte civil da acusação, como nesse caso.
O advogado de Villepins considerou ‘escandalosas’ as observações de Sarkozy e acrescentou que o ex-Primeiro Ministro processaria o Sr. Sarkozy pela violação de seu direito à presunção de inocência (o Presidente francês só pode ser processado depois de deixar o cargo).
O processo se reporta a Clearstream, estabelecimento sediado em Luxemburgo,
de que teria vazado para um juiz de instrução uma lista de clientes detentores de contas secretas (oriundas de comissões de vendas de armas). A citada lista de contas – que depois se soube tinha sido adulterada – continha várias versões do sobrenome de Sarkozy.
De Villepins, acusado de cumplicidade no complô, tem afirmado a sua inocência e disse estar sendo julgado ‘por causa da impiedosidade de um só homem, Nicolas Sarkozy’.
Sarkozy constituíu-se parte acusadora no processo em 2006 e de Villepins foi indiciado em novembro de 2008, não por haver encomendado a lista falsa, mas por alegadamente tê-la usado para prejudicar Sarkozy.
No país de tantos processos célebres, o que se inicia já acena alguns títulos para reivindicação futura nessa categoria. François Bayrou, líder do centristra Movimento Democrático, fez comentário interessante: “Freud diria que é um lapso revelador, que desvela a ambiguidade da posição de Sarkozy neste affair. Ele é parte civil, isto é, entrou com uma queixa na qualidade de vítima, mas também é garante da justiça, a autoridade superior dos promotores na hierarquia.”
Dominique de Villepins pode ser condenado a cinco anos de prisão e a uma multa de quarenta e cinco mil euros. O julgamento deve estender-se até 23 de outubro próximo.
( Fontes: O Globo e International Herald Tribune)
sábado, 26 de setembro de 2009
O Grupo dos Vinte
Há austero simbolismo na circunstância de que Pittsburgh tenha sido escolhida como sede para esta reunião do G-20. Que o antigo centro da pujança do aço na economia americana seja o cenário dos ritos de passagem do exclusivo G-8 para o abrangente G-20 só não hão de ver os que se recusam ou não podem enxergar a nova realidade.
Desenvolvimento desse gênero seria impensável na Administração de George W Bush pelo unilateralismo de sua política exterior e pelo consequente apego a situações que os novos tempos, com a sobrevinda dos países emergentes, tornavam já inadequadas e insatisfatórias.
Em tal contexto, o Presidente Barack Obama representa, de um lado, o retorno do bom senso e do multilateralismo, e de outro, a necessária adaptação a novo quadro econômico e político no mundo.
Desde a primeira participação do Presidente Obama no Grupo dos Oito, em L’Aquila (Itália), firmaram-se suas dúvidas sobre a capacidade do grupo restrito continuar a lidar com as questões mundiais. Daí a passagem para o G-20, atendida a relevância dos BRIC (Brasil, Rússia, India e China) e de outras nações para compor o novo quadro. Por ora, o G-8 deveria continuar com suas sessões bianuais, porém somente para cuidar de aspectos de segurança.
Embora não seja o momento para bravatas, é inquestionável o progresso alcançado. O próprio Presidente Obama tem ressaltado a importância de China, Brasil e Índia na economia mundial. A União Européia – que é o vigésimo membro do G-20 – tem sentido o interesse estadunidense de apoiar o esforço de outros países, como o Brasil, de forjar acordo global de comércio para derribar barreiras nas áreas de agricultura e de serviços.
Conquanto a participação dos BRICs no Banco Mundial não tenha sido atendida em Pittsburgh segundo as suas pretensões, haverá no FMI a transferência de pelo menos 5% das cotas dos países ricos para este grupo, e de 3%, no Banco Mundial, o que foi bem recebido por Lula e demais líderes interessados.
No final da reunião do G-20 a entrevista do Presidente Obama, na qualidade de anfitrião do grupo, despertou a previsível atenção.
A respeito, tampouco há de despertar espécie que a próxima reunião, em outubro, de Estados Unidos, Reino Unido, França, Rússia, China e Alemanha com representação do Irã haja motivado o maior número de perguntas dos jornalistas credenciados.
Obama sublinhou o consenso existente – não só entre os ocidentais, mas também de China e Rússia – quanto à inadmissibilidade do programa nuclear iraniano. Nas palavras do presidente americano, este programa ‘representa ameaça direta para as próprias fundações do regime de não-proliferação’.
A situação diplomática do Irã não se fortaleceu com a revelação da existência neste pais de usina subterrânea secreta para a fabricação de combustível nuclear. Essa é portanto a segunda usina destinada ao fabrico de combustível nuclear. Obama decidiu tornar pública a descoberta, pelo fato de que Teerã se dera conta da quebra do segredo pelas agências ocidentais de inteligência, como comprova críptica carta oficial dirigida à AIEA pelo governo iraniano, em que comunicou estar em construção uma ‘usina piloto’. Obama, Gordon Brown e Sarkozy – com a anuência de Angela Merkel – exigiram que o Irã permita logo uma inspeção pela Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) no local, que se supõe distar 160 km de Teerã, nas cercanias da cidade de Kom.
Na entrevista, Obama deixou claro que daria prioridade à diplomacia para resolver a questão, nisso enfatizando o apoio inclusive de China e Rússia. Não excluíu, porém, o recurso a outros meios, dependendo da atitude do Irã. Nessa oportunidade, disse : “Eles têm de fazer uma opção. Desejam seguir o caminho de maior prosperidade e segurança para o Irã, renunciando à aquisição de armas nucleares, ou ... então continuarão na senda que levará à confrontação ?”
A esse respeito, a assertiva do presidente Mahmoud Ahmadinejad de que as acusações de Obama não tinham qualquer base não há de surpreender a ninguém, pela credibilidade das negações do regime iraniano.
(Fontes: CNN, International Herald Tribune e Folha de São Paulo)
Desenvolvimento desse gênero seria impensável na Administração de George W Bush pelo unilateralismo de sua política exterior e pelo consequente apego a situações que os novos tempos, com a sobrevinda dos países emergentes, tornavam já inadequadas e insatisfatórias.
Em tal contexto, o Presidente Barack Obama representa, de um lado, o retorno do bom senso e do multilateralismo, e de outro, a necessária adaptação a novo quadro econômico e político no mundo.
Desde a primeira participação do Presidente Obama no Grupo dos Oito, em L’Aquila (Itália), firmaram-se suas dúvidas sobre a capacidade do grupo restrito continuar a lidar com as questões mundiais. Daí a passagem para o G-20, atendida a relevância dos BRIC (Brasil, Rússia, India e China) e de outras nações para compor o novo quadro. Por ora, o G-8 deveria continuar com suas sessões bianuais, porém somente para cuidar de aspectos de segurança.
Embora não seja o momento para bravatas, é inquestionável o progresso alcançado. O próprio Presidente Obama tem ressaltado a importância de China, Brasil e Índia na economia mundial. A União Européia – que é o vigésimo membro do G-20 – tem sentido o interesse estadunidense de apoiar o esforço de outros países, como o Brasil, de forjar acordo global de comércio para derribar barreiras nas áreas de agricultura e de serviços.
Conquanto a participação dos BRICs no Banco Mundial não tenha sido atendida em Pittsburgh segundo as suas pretensões, haverá no FMI a transferência de pelo menos 5% das cotas dos países ricos para este grupo, e de 3%, no Banco Mundial, o que foi bem recebido por Lula e demais líderes interessados.
No final da reunião do G-20 a entrevista do Presidente Obama, na qualidade de anfitrião do grupo, despertou a previsível atenção.
A respeito, tampouco há de despertar espécie que a próxima reunião, em outubro, de Estados Unidos, Reino Unido, França, Rússia, China e Alemanha com representação do Irã haja motivado o maior número de perguntas dos jornalistas credenciados.
Obama sublinhou o consenso existente – não só entre os ocidentais, mas também de China e Rússia – quanto à inadmissibilidade do programa nuclear iraniano. Nas palavras do presidente americano, este programa ‘representa ameaça direta para as próprias fundações do regime de não-proliferação’.
A situação diplomática do Irã não se fortaleceu com a revelação da existência neste pais de usina subterrânea secreta para a fabricação de combustível nuclear. Essa é portanto a segunda usina destinada ao fabrico de combustível nuclear. Obama decidiu tornar pública a descoberta, pelo fato de que Teerã se dera conta da quebra do segredo pelas agências ocidentais de inteligência, como comprova críptica carta oficial dirigida à AIEA pelo governo iraniano, em que comunicou estar em construção uma ‘usina piloto’. Obama, Gordon Brown e Sarkozy – com a anuência de Angela Merkel – exigiram que o Irã permita logo uma inspeção pela Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) no local, que se supõe distar 160 km de Teerã, nas cercanias da cidade de Kom.
Na entrevista, Obama deixou claro que daria prioridade à diplomacia para resolver a questão, nisso enfatizando o apoio inclusive de China e Rússia. Não excluíu, porém, o recurso a outros meios, dependendo da atitude do Irã. Nessa oportunidade, disse : “Eles têm de fazer uma opção. Desejam seguir o caminho de maior prosperidade e segurança para o Irã, renunciando à aquisição de armas nucleares, ou ... então continuarão na senda que levará à confrontação ?”
A esse respeito, a assertiva do presidente Mahmoud Ahmadinejad de que as acusações de Obama não tinham qualquer base não há de surpreender a ninguém, pela credibilidade das negações do regime iraniano.
(Fontes: CNN, International Herald Tribune e Folha de São Paulo)
sexta-feira, 25 de setembro de 2009
A Tradição Diplomática e o Pântano
Quando as questões diplomáticas são mal conduzidas seja política, seja juridicamente, ou, talvez como se configure no presente caso, em ambas as vertentes, não se poderia esperar que os resultados sejam satisfatórios, ou que acenem em melhorar com a evolução (ou involução) dos acontecimentos.
Como referi anteriormente, a tradição diplomática brasileira é originária de Alexandre de Gusmão, o célebre secretário de D. João V, que foi o autêntico maestro do Tratado de Madri de 1750, base do traçado do Brasil moderno, e tão justamente admirado, até pelos próprios negociadores de Castela, com à frente o grande de Espanha D. José de Carvajal y Lancaster.
Além do grande princípio do uti possidetis, a base jurídica e o segredo do êxito não só de Alexandre de Gusmão, mas de seu epígono e patrono da diplomacia brasileira, o Barão do Rio Branco, outro princípio basilar da diplomacia nacional sempre foi desde os tempos do Império, com os trabalhos do Barão de Ponte Ribeiro, o estudo da documentação pertinente e dos antecedentes, a seriedade e a consequente coerente continuidade nas negociações diplomáticas.
Os grandes sucessos de José Maria da Silva Paranhos Júnior, o Barão do Rio Branco, não são o produto de mágica ou da deusa Fortuna. Respondem ao trabalho diuturno com velhos mapas, alfarrábios, maços de chancelaria, muitos livros e a própria experiência diplomática, em que o saber do ofício se conjuga com o conhecimento geral e a necessária prudência do negociador.
A vigente Constituição brasileira, assinada em 5 de outubro de 1988, pelo seu artigo 4º dispõe que o Brasil se rege nas suas relações internacionais, dentre outros, pelos seguintes princípios: independência nacional, auto-determinação dos povos, não intervenção, solução pacífica dos conflitos e concessão de asilo político.
Tais institutos não surgem por acaso em nossa Constituição. São o resultado de longa evolução, que fez a Chancelaria brasileira, muito antes de conhecida por Itamaraty, reconhecida e respeitada pelos governos dos países irmãos da América Latina e, em particular, da América do Sul. Tais princípios portanto não são adornos postiços de nossa cultura diplomática.
Quanto mais se aprofunda a análise da atual crise hondurenha, é necessário ter presente alguns fatos que para observadores não toldados pela parcialidade se afiguram inegáveis:
- tanto o presidente constitucional Manuel Zelaya, quanto o presidente de fato Roberto Micheletti, não estão isentos de culpa no surgimento e na eclosão da crise. O principal erro de Zelaya está em querer forçar o referendo da reeleição, abolindo a cláusula pétrea da não-reeleição; o de Micheletti e seu grupo, o de expatriar à força o presidente constitucional, ao arrepio de norma da Constituição hondurenha;
- a volta de Zelaya à Honduras, afinal alcançada, teve o apoio logístico do caudilho Hugo Chávez, que disso não fez segredo na tribuna da Assembleia Geral;
- as elogiosas referências de Zelaya ao Presidente Lula e a Marco Aurélio Garcia tendem a apontar para uma entrada em cena ex-post do Itamaraty. Sem embargo, a ‘decisão pessoal’ de Zelaya de refugiar-se na Embaixada do Brasil foi antecedida por consultas do presidente hondurenho a Lula e ao Ministro Celso Amorim;
- ao concordar em dar refúgio a Manuel Zelaya, classificando de ‘abrigo’ a sua situação, o Itamaraty se afastou de secular postura de não-intervenção nos assuntos de outros países, eis que, pelo desvirtuamento do instituto do ‘asilo diplomático’ se deu ao presidente hondurenho a possibilidade de atuar politicamente, usando a acanhada plataforma da embaixada brasileira em Tegucigalpa. Ora, esta jogada decerto ideada por Hugo Chávez, tenciona valer-se indevidamente da proteção jurídica concedida pelo asilo diplomático, para a intervenção política que o direito constitucional de asilo não comporta;
- em consequência, o Itamaraty, por motivos e/ou conjuntura política interna que não nos é dado determinar, foi forçado a sair do régio caminho aberto por nossos antepassados, para cair no pântano das artimanhas ad hoc que nunca foram da preferência dos grandes responsáveis pela diplomacia imperial e republicana brasileira.
Ao abandonarmos, outrossim, o princípio da não-intervenção em questões internas de outros países, corremos o risco, como se verifica no presente, de perdermos a condição de parte insuspeita e de sermos alvo de diatribes e de acusações de outra parte, que não mais se vê tolhida pelo respeito ditado por participação acima das eventuais conveniências de partido.
A diplomacia não é campo para troca de doestos e de incriminações. Se principiamos a ser alvo desse tipo de argumentação, algo está errado e, quem sabe ?, disso não tenhamos eventual culpa em cartório.
Como referi anteriormente, a tradição diplomática brasileira é originária de Alexandre de Gusmão, o célebre secretário de D. João V, que foi o autêntico maestro do Tratado de Madri de 1750, base do traçado do Brasil moderno, e tão justamente admirado, até pelos próprios negociadores de Castela, com à frente o grande de Espanha D. José de Carvajal y Lancaster.
Além do grande princípio do uti possidetis, a base jurídica e o segredo do êxito não só de Alexandre de Gusmão, mas de seu epígono e patrono da diplomacia brasileira, o Barão do Rio Branco, outro princípio basilar da diplomacia nacional sempre foi desde os tempos do Império, com os trabalhos do Barão de Ponte Ribeiro, o estudo da documentação pertinente e dos antecedentes, a seriedade e a consequente coerente continuidade nas negociações diplomáticas.
Os grandes sucessos de José Maria da Silva Paranhos Júnior, o Barão do Rio Branco, não são o produto de mágica ou da deusa Fortuna. Respondem ao trabalho diuturno com velhos mapas, alfarrábios, maços de chancelaria, muitos livros e a própria experiência diplomática, em que o saber do ofício se conjuga com o conhecimento geral e a necessária prudência do negociador.
A vigente Constituição brasileira, assinada em 5 de outubro de 1988, pelo seu artigo 4º dispõe que o Brasil se rege nas suas relações internacionais, dentre outros, pelos seguintes princípios: independência nacional, auto-determinação dos povos, não intervenção, solução pacífica dos conflitos e concessão de asilo político.
Tais institutos não surgem por acaso em nossa Constituição. São o resultado de longa evolução, que fez a Chancelaria brasileira, muito antes de conhecida por Itamaraty, reconhecida e respeitada pelos governos dos países irmãos da América Latina e, em particular, da América do Sul. Tais princípios portanto não são adornos postiços de nossa cultura diplomática.
Quanto mais se aprofunda a análise da atual crise hondurenha, é necessário ter presente alguns fatos que para observadores não toldados pela parcialidade se afiguram inegáveis:
- tanto o presidente constitucional Manuel Zelaya, quanto o presidente de fato Roberto Micheletti, não estão isentos de culpa no surgimento e na eclosão da crise. O principal erro de Zelaya está em querer forçar o referendo da reeleição, abolindo a cláusula pétrea da não-reeleição; o de Micheletti e seu grupo, o de expatriar à força o presidente constitucional, ao arrepio de norma da Constituição hondurenha;
- a volta de Zelaya à Honduras, afinal alcançada, teve o apoio logístico do caudilho Hugo Chávez, que disso não fez segredo na tribuna da Assembleia Geral;
- as elogiosas referências de Zelaya ao Presidente Lula e a Marco Aurélio Garcia tendem a apontar para uma entrada em cena ex-post do Itamaraty. Sem embargo, a ‘decisão pessoal’ de Zelaya de refugiar-se na Embaixada do Brasil foi antecedida por consultas do presidente hondurenho a Lula e ao Ministro Celso Amorim;
- ao concordar em dar refúgio a Manuel Zelaya, classificando de ‘abrigo’ a sua situação, o Itamaraty se afastou de secular postura de não-intervenção nos assuntos de outros países, eis que, pelo desvirtuamento do instituto do ‘asilo diplomático’ se deu ao presidente hondurenho a possibilidade de atuar politicamente, usando a acanhada plataforma da embaixada brasileira em Tegucigalpa. Ora, esta jogada decerto ideada por Hugo Chávez, tenciona valer-se indevidamente da proteção jurídica concedida pelo asilo diplomático, para a intervenção política que o direito constitucional de asilo não comporta;
- em consequência, o Itamaraty, por motivos e/ou conjuntura política interna que não nos é dado determinar, foi forçado a sair do régio caminho aberto por nossos antepassados, para cair no pântano das artimanhas ad hoc que nunca foram da preferência dos grandes responsáveis pela diplomacia imperial e republicana brasileira.
Ao abandonarmos, outrossim, o princípio da não-intervenção em questões internas de outros países, corremos o risco, como se verifica no presente, de perdermos a condição de parte insuspeita e de sermos alvo de diatribes e de acusações de outra parte, que não mais se vê tolhida pelo respeito ditado por participação acima das eventuais conveniências de partido.
A diplomacia não é campo para troca de doestos e de incriminações. Se principiamos a ser alvo desse tipo de argumentação, algo está errado e, quem sabe ?, disso não tenhamos eventual culpa em cartório.
quinta-feira, 24 de setembro de 2009
A Terra da Fartura
Os italianos, que se assemelham aos brasileiros em tantos aspectos, tem uma expressão bastante vívida: terra della cuccagna. Segundo o dicionário Zingarelli, Cuccagna é um país de fábula, onde se encontra toda espécie de delícias.
Lendo hoje os jornais, creio que alguns de meus compatriotas acreditam – ou fingem acreditar, o que dá no mesmo – que vivem em uma terra onde tudo lhes é permitido.
Por exemplo, os senhores magistrados, no que é considerada vitória pessoal do atual presidente do Supremo Tribunal Federal, Ministro Gilmar Mendes, terão aumento de cerca de 9%, votado por unanimidade pela Comissão de Constituição e Justiça do Senado Federal. Embora comemore, o Ministro Marco Aurélio Mello acha, no entanto, o valor baixo.
Que valor, por obséquio ? Agora os Ministros do STF ganham apenas R$24.500 e passarão a ganhar em fevereiro de 2010 (o incremento será em duas etapas) R$26.723,13 !
Não importa que a disposição constitucional que hierarquiza as remunerações no Governo – o salário do Presidente da República deveria ser o mais alto – continue a não ser respeitada. No entendimento da CCJ, a generosa União deve estipendiar bem os seus juízes. Assim, os Ministros dos Tribunais Superiores passarão a receber R$ 25. 386,97, os juízes dos tribunais regionais, R$24.117,62, os de primeira instância, R$ 22.911,73 e os substitutos, R$21.766,14.
Lá nas alturas de Brasília, a reivindicação não pára por aí. Para simbolizar o irrealismo e a desconexão com a realidade nacional, os senhores senadores julgam chegado o momento de pedir mais.
E a crise do Senado ? Ela pertence a todos os Pais da Pátria, ou é do seu Presidente, José Sarney ? Dentre eles há de reinar a impressão de que o pior já passou, todos foram perdoados, e os atos secretos – pelo menos alguns deles – acenam reingressar pela porta dos fundos.
Nada há mais ilustrativo da total alienação desse aglomerado de favorecidos que o primeiro a protestar seja o Senador Wellington Salgado (PMDB-MG). Este senhor ocupa uma cadeira da Câmara Alta não por vontade do eleitor – não recebeu um voto sequer – e sim pela suplência devida ao Ministro Hélio Costa.
E, nesse sentido, o líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR) o apoiou vivamente, sugerindo a imediata equiparação salarial dos integrantes do Executivo, Legislativo e Judiciário.
O problema com a visão de Jucá é que, para corrigir um desacerto – a circunstância de um juiz ganhar mais do que o Presidente da República – vamos provocar um trem-de-alegria muito maior, com aumentos em cascata em todos os poderes.
Não ignoramos que o Governo Lula tem causado marcado incremento nos gastos correntes do orçamento. Tais aumentos são determinados não por necessidades gritantes e que estejam no interesse da Nação, como seria o reajuste para os professores, cuja pauperização não se reflete apenas sobre eles, mas também na qualidade do ensino.
Não, para a Administração Lula a terra da Cuccagna vale para os correligionários que passaram a engordar as folhas salariais do Governo Federal, em consonância com a inchação de ministérios – e das respectivas estruturas hierárquicas – sobrecarregando o orçamento com pouco flexiveis novos encargos. Os professores devem continuar a perceber remunerações que fariam sorrir a ascensorista do Congresso Nacional.
Haveria acaso esperança de que o Coordenador-Geral da Nação – quando regressar da presente viagem ao exterior – se disponha a conter o afã dos altos funcionários por gordos salários ? Nem pensar!... Tampouco pensará em controlar a onda de greves por aumentos salariais, que se repete a cada ano nos Correios e agora nos Bancos.
Às vezes, se tem a impressão de que toda essa farra de greves nos vem de um país que se notabilizou pela alta e prolongada inflação. Não importa que o real não se desvalorize a cada mês, como ocorria com os seus antepassados, o cruzado e o cruzeiro. Que, fora do tempo, se continue a reivindicar, e por que não começar logo pela greve ? Elas incomodam a coletividade que trabalha, mas que importância têm ?
Por mais de vinte anos, o Congresso se abstém de regulamentar a greve no serviço público, sobretudo no que concerne às atividades essenciais, mas que importância isso tem ?
Estamos no país da Cuccagna e o seu presidente há de dar o exemplo...
Lendo hoje os jornais, creio que alguns de meus compatriotas acreditam – ou fingem acreditar, o que dá no mesmo – que vivem em uma terra onde tudo lhes é permitido.
Por exemplo, os senhores magistrados, no que é considerada vitória pessoal do atual presidente do Supremo Tribunal Federal, Ministro Gilmar Mendes, terão aumento de cerca de 9%, votado por unanimidade pela Comissão de Constituição e Justiça do Senado Federal. Embora comemore, o Ministro Marco Aurélio Mello acha, no entanto, o valor baixo.
Que valor, por obséquio ? Agora os Ministros do STF ganham apenas R$24.500 e passarão a ganhar em fevereiro de 2010 (o incremento será em duas etapas) R$26.723,13 !
Não importa que a disposição constitucional que hierarquiza as remunerações no Governo – o salário do Presidente da República deveria ser o mais alto – continue a não ser respeitada. No entendimento da CCJ, a generosa União deve estipendiar bem os seus juízes. Assim, os Ministros dos Tribunais Superiores passarão a receber R$ 25. 386,97, os juízes dos tribunais regionais, R$24.117,62, os de primeira instância, R$ 22.911,73 e os substitutos, R$21.766,14.
Lá nas alturas de Brasília, a reivindicação não pára por aí. Para simbolizar o irrealismo e a desconexão com a realidade nacional, os senhores senadores julgam chegado o momento de pedir mais.
E a crise do Senado ? Ela pertence a todos os Pais da Pátria, ou é do seu Presidente, José Sarney ? Dentre eles há de reinar a impressão de que o pior já passou, todos foram perdoados, e os atos secretos – pelo menos alguns deles – acenam reingressar pela porta dos fundos.
Nada há mais ilustrativo da total alienação desse aglomerado de favorecidos que o primeiro a protestar seja o Senador Wellington Salgado (PMDB-MG). Este senhor ocupa uma cadeira da Câmara Alta não por vontade do eleitor – não recebeu um voto sequer – e sim pela suplência devida ao Ministro Hélio Costa.
E, nesse sentido, o líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR) o apoiou vivamente, sugerindo a imediata equiparação salarial dos integrantes do Executivo, Legislativo e Judiciário.
O problema com a visão de Jucá é que, para corrigir um desacerto – a circunstância de um juiz ganhar mais do que o Presidente da República – vamos provocar um trem-de-alegria muito maior, com aumentos em cascata em todos os poderes.
Não ignoramos que o Governo Lula tem causado marcado incremento nos gastos correntes do orçamento. Tais aumentos são determinados não por necessidades gritantes e que estejam no interesse da Nação, como seria o reajuste para os professores, cuja pauperização não se reflete apenas sobre eles, mas também na qualidade do ensino.
Não, para a Administração Lula a terra da Cuccagna vale para os correligionários que passaram a engordar as folhas salariais do Governo Federal, em consonância com a inchação de ministérios – e das respectivas estruturas hierárquicas – sobrecarregando o orçamento com pouco flexiveis novos encargos. Os professores devem continuar a perceber remunerações que fariam sorrir a ascensorista do Congresso Nacional.
Haveria acaso esperança de que o Coordenador-Geral da Nação – quando regressar da presente viagem ao exterior – se disponha a conter o afã dos altos funcionários por gordos salários ? Nem pensar!... Tampouco pensará em controlar a onda de greves por aumentos salariais, que se repete a cada ano nos Correios e agora nos Bancos.
Às vezes, se tem a impressão de que toda essa farra de greves nos vem de um país que se notabilizou pela alta e prolongada inflação. Não importa que o real não se desvalorize a cada mês, como ocorria com os seus antepassados, o cruzado e o cruzeiro. Que, fora do tempo, se continue a reivindicar, e por que não começar logo pela greve ? Elas incomodam a coletividade que trabalha, mas que importância têm ?
Por mais de vinte anos, o Congresso se abstém de regulamentar a greve no serviço público, sobretudo no que concerne às atividades essenciais, mas que importância isso tem ?
Estamos no país da Cuccagna e o seu presidente há de dar o exemplo...
quarta-feira, 23 de setembro de 2009
Asilo de Zelaya na Embaixada do Brasil (II)
O refúgio de Manuel Zelaya na chancelaria da embaixada do Brasil entrou no seu segundo dia em condições caóticas.
Em entrevista por celular à Eliane Cantanhede, da Folha, disse Zelaya: “O Brasil não sabia dos meus planos. Tomei a decisão de vir direto à embaixada por uma questão de estratégia, uma posição de reserva, para que o plano não corresse risco.” Perguntado do porquê do Brasil, respondeu: “(foi) por causa da vocação democrática do Brasil, do Presidente Lula e de Marco Aurélio Garcia (assessor internacional da presidência). E também pelo peso internacional que eles têm.”
Zelaya tem aparentemente uma ideia um tanto nebulosa de o que significa a exterritorialidade de missão diplomática. Sem decerto sabê-lo, a sua noção talvez se aproxime mais do costume dos gregos antigos de buscarem asilo em templos, onde a condição de súplices (sobretudo junto a determinados deuses) lhes garantia escaparem da morte ou da escravidão nas mãos de seus inimigos também gregos.
De qualquer forma, a despeito do apelo de Lula a Zelaya para que não promova atos que deem argumento a eventual invasão pelas forças policiais do governo Micheletti, semelha claro que o presidente Manuel Zelaya não está muito preocupado ou não tem condições de controlar o número de pessoas que o acompanham na ocupação da chancelaria. De qualquer forma, diante do único diplomata brasileiro, o conselheiro Francisco Catunda, e de um plantel de administrativos em sublotação extrema, não havia quaisquer meios de evitar a invasão de populares e políticos simpatizantes de Zelaya.
A proposital ambiguidade da situação do presidente Manuel Zelaya – que, no intento de quebrar o impasse existente, a instrumentaliza como recurso in extremis – cria inegável dificuldades para o governo Lula e seus representantes. Nesse universo peculiar, o Ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, pretende requerer reunião de emergência do Conselho de Segurança das Nações Unidas, para garantir a segurança do presidente deposto, da embaixada brasileira em Honduras, e de seus funcionários.
Para contextualizar o pedido do atual responsável pelo Itamaraty, a atenção internacional dedicada à situação hondurenha não se afigura das mais altas, diante do presente momento nas Nações Unidas, quando, ao ensejo da reabertura da Assembleia Geral, se retoma o trato intensivo das questões diplomáticas mais importantes.Assim, coberturas locais à parte, um exame dos principais meios internacionais de comunicação há de ressaltar o pouco e mesmo nenhum destaque reservado ao estado de coisas na centro-americana Honduras.
O governo de fato de Roberto Micheletti, se voltou atrás no inaceitável corte de água, luz e telefone na chancelaria brasileira, busca pressionar o Itamaraty na questão do status do presidente Manuel Zelaya. O governo saído do golpe de 28 de junho último acredita dispor de uma vantagem na intencional ambiguidade da presença de Zelaya na embaixada do Brasil.
Não basta encher a boca para asseverar que Zelaya não é asilado, dada a sua condição de presidente constitucional. Em diplomacia e política, devemos lidar necessariamente com situações de fato. Toda a nossa diplomacia, a partir de Alexandre de Gusmão, e o princípio do uti possidetis, é o reconhecimento de que será forçoso levar em conta tais fatores, de certo dentro de um mínimo de respeito ao direito internacional.
Dessarte, para vencer aqueles que desejam prevalecer-se de situações de força, o Brasil e sua diplomacia, atendido o interesse de que o Itamaraty esteja realmente à frente do processo negociatório, deveriam ter presença menos retórica e mais efetiva.
Se, com efeito, o Brasil se propõe a corresponder ao alegado prestígio que lhe é atribuído por outrem, é mais do que tempo não só de reforçar numericamente o minguado plantel em Honduras, senão e sobretudo de ter presença mais pró-ativa, confiando-se a negociação a tarimbados profissionais da diplomacia em exercício, que, no Itamaraty, sempre se assinalaram, pela tradição, experiência e conhecimento.
Em entrevista por celular à Eliane Cantanhede, da Folha, disse Zelaya: “O Brasil não sabia dos meus planos. Tomei a decisão de vir direto à embaixada por uma questão de estratégia, uma posição de reserva, para que o plano não corresse risco.” Perguntado do porquê do Brasil, respondeu: “(foi) por causa da vocação democrática do Brasil, do Presidente Lula e de Marco Aurélio Garcia (assessor internacional da presidência). E também pelo peso internacional que eles têm.”
Zelaya tem aparentemente uma ideia um tanto nebulosa de o que significa a exterritorialidade de missão diplomática. Sem decerto sabê-lo, a sua noção talvez se aproxime mais do costume dos gregos antigos de buscarem asilo em templos, onde a condição de súplices (sobretudo junto a determinados deuses) lhes garantia escaparem da morte ou da escravidão nas mãos de seus inimigos também gregos.
De qualquer forma, a despeito do apelo de Lula a Zelaya para que não promova atos que deem argumento a eventual invasão pelas forças policiais do governo Micheletti, semelha claro que o presidente Manuel Zelaya não está muito preocupado ou não tem condições de controlar o número de pessoas que o acompanham na ocupação da chancelaria. De qualquer forma, diante do único diplomata brasileiro, o conselheiro Francisco Catunda, e de um plantel de administrativos em sublotação extrema, não havia quaisquer meios de evitar a invasão de populares e políticos simpatizantes de Zelaya.
A proposital ambiguidade da situação do presidente Manuel Zelaya – que, no intento de quebrar o impasse existente, a instrumentaliza como recurso in extremis – cria inegável dificuldades para o governo Lula e seus representantes. Nesse universo peculiar, o Ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, pretende requerer reunião de emergência do Conselho de Segurança das Nações Unidas, para garantir a segurança do presidente deposto, da embaixada brasileira em Honduras, e de seus funcionários.
Para contextualizar o pedido do atual responsável pelo Itamaraty, a atenção internacional dedicada à situação hondurenha não se afigura das mais altas, diante do presente momento nas Nações Unidas, quando, ao ensejo da reabertura da Assembleia Geral, se retoma o trato intensivo das questões diplomáticas mais importantes.Assim, coberturas locais à parte, um exame dos principais meios internacionais de comunicação há de ressaltar o pouco e mesmo nenhum destaque reservado ao estado de coisas na centro-americana Honduras.
O governo de fato de Roberto Micheletti, se voltou atrás no inaceitável corte de água, luz e telefone na chancelaria brasileira, busca pressionar o Itamaraty na questão do status do presidente Manuel Zelaya. O governo saído do golpe de 28 de junho último acredita dispor de uma vantagem na intencional ambiguidade da presença de Zelaya na embaixada do Brasil.
Não basta encher a boca para asseverar que Zelaya não é asilado, dada a sua condição de presidente constitucional. Em diplomacia e política, devemos lidar necessariamente com situações de fato. Toda a nossa diplomacia, a partir de Alexandre de Gusmão, e o princípio do uti possidetis, é o reconhecimento de que será forçoso levar em conta tais fatores, de certo dentro de um mínimo de respeito ao direito internacional.
Dessarte, para vencer aqueles que desejam prevalecer-se de situações de força, o Brasil e sua diplomacia, atendido o interesse de que o Itamaraty esteja realmente à frente do processo negociatório, deveriam ter presença menos retórica e mais efetiva.
Se, com efeito, o Brasil se propõe a corresponder ao alegado prestígio que lhe é atribuído por outrem, é mais do que tempo não só de reforçar numericamente o minguado plantel em Honduras, senão e sobretudo de ter presença mais pró-ativa, confiando-se a negociação a tarimbados profissionais da diplomacia em exercício, que, no Itamaraty, sempre se assinalaram, pela tradição, experiência e conhecimento.
terça-feira, 22 de setembro de 2009
O Asilo de Zelaya na Embaixada do Brasil
O presidente de Honduras, José Manuel Zelaya, 85 dias após a sua deposição, ingressou clandestinamente no país, procedente da Guatemala, em viagem de quinze horas pelas montanhas, até chegar à acanhada chancelaria brasileira em Tegucigalpa. Segundo despacho de Fabiano Maisonnave, da Folha, a esposa, Xiomara Castro, foi à embaixada para transmitir ao encarregado de negócios a.i., Conselheiro Francisco Chagas Catunda Resende, que Zelaya estava nas cercanias, e desejava refugiar-se na representação brasileira.
De acordo com esta versão de imprensa, não teria sido recebido qualquer aviso prévio. Feita a consulta ao Itamaraty – possivelmente ao próprio Ministro Amorim, que se encontrava em New York, para a abertura da Assembleia Geral das Nações Unidas – foi então autorizada a entrada do Presidente Manuel Zelaya.
Como se observa, as modalidades deste asilo diferem de o que geralmente ocorre em tais casos. Assim, o asilo diplomático costuma ser concedido a naturais do país em que esteja acreditada a missão do Brasil, pelo fato de se encontrarem ameaçados de detenção injusta ou mesmo em perigo de vida. O asilo é concedido pela Chancelaria de país acreditado junto ao governo local para ensejar à pessoa refugiada o salvo-conduto, a ser outorgado pelas autoridades locais, para que possa sair do país.
Ao invés da situação anterior, ora quem se asila na Embaixada o faz para ter pleno retorno a seu país, no caso, reassumindo a presidência da república.
Segundo asseverado por autoridade competente, Zelaya não é considerado asilado pela Embaixada, porque para o Brasil ele continua a ser o presidente constitucional de Honduras.
Se a assertiva possui base jurídica formal, para fins de assegurar a necessária proteção ao ilustre refugiado, a inviolabilidade do espaço da chancelaria brasileira, acrescida da circunstância de asilo diplomático mutatis mutandis, constituem fatores importantes para dar todas as garantias a Manuel Zelaya na sua presente condição de asilado sui generis.
Informado pelo Ministro das Relações Exteriores do Brasil, o Secretário-Geral da OEA, José Miguel Insulza obteve do Conselho da Organização o necessário apoio para que se implemente a reassunção de Zelaya na presidência de Honduras, consoante o plano de mediação de Oscar Arias.
Tomada alegadamente de surpresa pelo asilo de Zelaya na embaixada brasileira, a Secretária de Estado Hillary Clinton afirmou que é a oportunidade de quebrar o impasse existente, com a reassunção de Zelaya na Presidência. Com isso concordou o Presidente Oscar Arias,também em New York para a abertura da Assembléia Geral. A propósito, aduziu caber a aplicação do Acordo de São José, por ele negociado. E acrescentou: não existe nenhum plano ‘B’.
Por sua vez, o governo de Roberto Micheletti negou, a princípio, a presença de Zelaya em Tegucigalpa. Após ser informado pelo chanceler brasileiro, mudou a atitude, com a decretação de toque de recolher, a partir de quatro da tarde de ontem, segunda-feira, e válido até às seis da tarde desta terça-feira.
Por outro lado, o Presidente Micheletti fez apelo, obviamente pro forma, ao governo do Brasil para que Zelaya seja entregue ‘ às autoridades competentes’. Para tal exigência, Micheletti se baseou na circunstância de que Zelaya está com a prisão preventiva decretada.
É de augurar-se que de parte a parte se mostre a necessária boa vontade para que se ultime sem maior tardança o entendimento que possibilitará o retorno de José Manuel Zelaya à Casa Presidencial de Honduras. Condições jurídicas para tanto já existem, configuradas pelo acordo de mediação negociado pelo prêmio Nobel da Paz e Presidente da Costa Rica, Oscar Arias.
Com vistas a mostrar o seu empenho na questão, o State Department suspendeu toda ajuda não humanitária ao Governo de Honduras, com o que reforça as suas mensagens no sentido de obtenção de acordo que garanta a reassunção de Zelaya, a realização das eleições, e a devida sucessão presidencial já no próximo ano.
O Brasil, que recebeu do presidente José Manuel Zelaya a distinção de ter sido a repartição diplomática a escolhida para o seu refúgio na própria capital hondurenha, carece de corresponder a essa prestigiosa confiança, e contribuir de forma pró-ativa, por intermédio de representantes para tanto qualificados, com vistas a coroar de êxito o intento de Zelaya para o feliz término da longa crise da democracia em Honduras.
De acordo com esta versão de imprensa, não teria sido recebido qualquer aviso prévio. Feita a consulta ao Itamaraty – possivelmente ao próprio Ministro Amorim, que se encontrava em New York, para a abertura da Assembleia Geral das Nações Unidas – foi então autorizada a entrada do Presidente Manuel Zelaya.
Como se observa, as modalidades deste asilo diferem de o que geralmente ocorre em tais casos. Assim, o asilo diplomático costuma ser concedido a naturais do país em que esteja acreditada a missão do Brasil, pelo fato de se encontrarem ameaçados de detenção injusta ou mesmo em perigo de vida. O asilo é concedido pela Chancelaria de país acreditado junto ao governo local para ensejar à pessoa refugiada o salvo-conduto, a ser outorgado pelas autoridades locais, para que possa sair do país.
Ao invés da situação anterior, ora quem se asila na Embaixada o faz para ter pleno retorno a seu país, no caso, reassumindo a presidência da república.
Segundo asseverado por autoridade competente, Zelaya não é considerado asilado pela Embaixada, porque para o Brasil ele continua a ser o presidente constitucional de Honduras.
Se a assertiva possui base jurídica formal, para fins de assegurar a necessária proteção ao ilustre refugiado, a inviolabilidade do espaço da chancelaria brasileira, acrescida da circunstância de asilo diplomático mutatis mutandis, constituem fatores importantes para dar todas as garantias a Manuel Zelaya na sua presente condição de asilado sui generis.
Informado pelo Ministro das Relações Exteriores do Brasil, o Secretário-Geral da OEA, José Miguel Insulza obteve do Conselho da Organização o necessário apoio para que se implemente a reassunção de Zelaya na presidência de Honduras, consoante o plano de mediação de Oscar Arias.
Tomada alegadamente de surpresa pelo asilo de Zelaya na embaixada brasileira, a Secretária de Estado Hillary Clinton afirmou que é a oportunidade de quebrar o impasse existente, com a reassunção de Zelaya na Presidência. Com isso concordou o Presidente Oscar Arias,também em New York para a abertura da Assembléia Geral. A propósito, aduziu caber a aplicação do Acordo de São José, por ele negociado. E acrescentou: não existe nenhum plano ‘B’.
Por sua vez, o governo de Roberto Micheletti negou, a princípio, a presença de Zelaya em Tegucigalpa. Após ser informado pelo chanceler brasileiro, mudou a atitude, com a decretação de toque de recolher, a partir de quatro da tarde de ontem, segunda-feira, e válido até às seis da tarde desta terça-feira.
Por outro lado, o Presidente Micheletti fez apelo, obviamente pro forma, ao governo do Brasil para que Zelaya seja entregue ‘ às autoridades competentes’. Para tal exigência, Micheletti se baseou na circunstância de que Zelaya está com a prisão preventiva decretada.
É de augurar-se que de parte a parte se mostre a necessária boa vontade para que se ultime sem maior tardança o entendimento que possibilitará o retorno de José Manuel Zelaya à Casa Presidencial de Honduras. Condições jurídicas para tanto já existem, configuradas pelo acordo de mediação negociado pelo prêmio Nobel da Paz e Presidente da Costa Rica, Oscar Arias.
Com vistas a mostrar o seu empenho na questão, o State Department suspendeu toda ajuda não humanitária ao Governo de Honduras, com o que reforça as suas mensagens no sentido de obtenção de acordo que garanta a reassunção de Zelaya, a realização das eleições, e a devida sucessão presidencial já no próximo ano.
O Brasil, que recebeu do presidente José Manuel Zelaya a distinção de ter sido a repartição diplomática a escolhida para o seu refúgio na própria capital hondurenha, carece de corresponder a essa prestigiosa confiança, e contribuir de forma pró-ativa, por intermédio de representantes para tanto qualificados, com vistas a coroar de êxito o intento de Zelaya para o feliz término da longa crise da democracia em Honduras.
segunda-feira, 21 de setembro de 2009
Colcha de Retalhos XXII
Kadafi e a Confederação Helvética
Por primeira vez o líder Muamar Kadafi discursará na Assembleia Geral das Nações Unidas. Pária internacional por muitos anos, o ditador líbico armará a sua tenda em Manhattan.
Tantos personagens já passaram pela movimentada ilha, que será difícil prever a reação dos nova-iorquinos. É possível, no entanto, que a atenção do público tenda a crescer diante do inusitado tema objeto da memorável peça oratória a ser pronunciada por Kadafi.
Compreensivelmente irritado pelo tratamento dispensado por suiços ao seu dileto filho caçula, Hannibal, ele concebeu inflingir-lhes terrível represália.
No ano passado, por haver espancado dois funcionários de hotel genebrino, Hannibal sofreu o agravo de ser detido em uma delegacia suiça. Esse comportamento inadmissível dos helvéticos, desencadeou a cólera do máximo líder. Não só suspendeu o comércio com a Suiça – inclusive a venda de petróleo – mas também sequestrou dois naturais da Confederação Helvética que, por infelicidade, encontravam-se então na Líbia. Por conta do ultraje cometido contra o filho caçula, eles estão lá retidos há mais de quatrocentos dias.
Contudo, a ira do líder líbico não ficou nisso. Em sua alocução perante os delegados das Nações Unidas, Kadafi pretende exigir a dissolução da Suiça. Para tanto, segundo o ditador, não haveria maiores dificuldades: bastaria que cada região do país fosse devolvida, respectivamente, a França, Alemanha e Itália.
Dentre os bizarros comportamentos que a solene tribuna da Assembleia Geral terá padecido se anotam as batidas do sapato de Nikita Krushev – então todo-poderoso Secretário-Geral do Partido Comunista da União Soviética - e, em tempos bem mais recentes, o farejar por Hugo Chávez de supostos odores demoníacos deixados por Bush júnior.
Agora, com tradução simultânea em cinco línguas - mais do que as quatro da Suiça – falará o homem do manto de leopardo para mostrar que o poder além de corromper pode enlouquecer.
A Censura ao Estado de São Paulo completa 52 Dias
O afastamento do desembargador Dácio Vieira, declarado suspeito, não teve a consequência que a maior parte dos juristas antecipara. Estranhamente, o TJ-DF manteve em vida a censura ao Estado de São Paulo imposta por Vieira, sem embargo da suspeição declarada pelo Tribunal. Consultados pelo jornal paulista, grande número de especialistas se manifesta pela simultânea anulação da censura. Falando ‘em tese’, o ministro Marco Aurélio Mello, do STF, afirmou que “a consequência natural é a insubsistência dos atos praticados por magistrado dado como suspeito”.
A fortiori, outro aspecto que causa espécie foi o fato de a decisão do Tribunal de Justiça do D.F. ter sido tomada em reunião secreta. A esse respeito, o regulamento do Supremo Tribunal Federal – que é lei para todos os tribunais de inferior hierarquia – proibe as sessões secretas, admitindo-as apenas em um ou dois casos excepcionais (que, como é evidente, não se aplicam à presente situação).
Por ter incorrido nessa ilegalidade, o Tribunal de Justiça recebeu comunicação do Conselho Nacional de Justiça, em que se relembra ao colegiado que falecia base legal para que o TJ-DF optasse por tornar secreta a apreciação da questão pelos desembargadores mais antigos.
Pergunta-se, por conseguinte, por quanto tempo ainda se prolongará a censura inconstitucional para manter fora do conhecimento público as investigações da Polícia Federal acerca dos negócios do empresário Fernando Sarney, filho de José Sarney. A mordaça judicial impede, por ora, que o Estado de São Paulo divulgue reportagens já elaboradas acerca da operação ‘Boi Barrica’ e as suspeitas que recaem sobre Fernando Sarney.
Diante do tratamento dispensado pelo TJ-DF – e por juízes de primeira instância, como assinalei em blog anterior – se reforça o interesse de que a reintrodução da censura pela porta dos fundos seja combatida e debelada com maior eficácia.
Não é admissível que se permita a sobrevida de uma liminar por tanto tempo, em manifesto atentado contra a Constituição de 1988, o que só pode ser interpretado como favorecimento indevido, ilegal e inconstitucional de uma das partes. É necessário e mesmo indispensável que se criem condições, através de súmula vinculante do Supremo, para que a Lei Magna não seja arranhada por quem ex-officio deveria defendê-la e salvaguardá-la, máxime em suas cláusulas pétreas.
Por primeira vez o líder Muamar Kadafi discursará na Assembleia Geral das Nações Unidas. Pária internacional por muitos anos, o ditador líbico armará a sua tenda em Manhattan.
Tantos personagens já passaram pela movimentada ilha, que será difícil prever a reação dos nova-iorquinos. É possível, no entanto, que a atenção do público tenda a crescer diante do inusitado tema objeto da memorável peça oratória a ser pronunciada por Kadafi.
Compreensivelmente irritado pelo tratamento dispensado por suiços ao seu dileto filho caçula, Hannibal, ele concebeu inflingir-lhes terrível represália.
No ano passado, por haver espancado dois funcionários de hotel genebrino, Hannibal sofreu o agravo de ser detido em uma delegacia suiça. Esse comportamento inadmissível dos helvéticos, desencadeou a cólera do máximo líder. Não só suspendeu o comércio com a Suiça – inclusive a venda de petróleo – mas também sequestrou dois naturais da Confederação Helvética que, por infelicidade, encontravam-se então na Líbia. Por conta do ultraje cometido contra o filho caçula, eles estão lá retidos há mais de quatrocentos dias.
Contudo, a ira do líder líbico não ficou nisso. Em sua alocução perante os delegados das Nações Unidas, Kadafi pretende exigir a dissolução da Suiça. Para tanto, segundo o ditador, não haveria maiores dificuldades: bastaria que cada região do país fosse devolvida, respectivamente, a França, Alemanha e Itália.
Dentre os bizarros comportamentos que a solene tribuna da Assembleia Geral terá padecido se anotam as batidas do sapato de Nikita Krushev – então todo-poderoso Secretário-Geral do Partido Comunista da União Soviética - e, em tempos bem mais recentes, o farejar por Hugo Chávez de supostos odores demoníacos deixados por Bush júnior.
Agora, com tradução simultânea em cinco línguas - mais do que as quatro da Suiça – falará o homem do manto de leopardo para mostrar que o poder além de corromper pode enlouquecer.
A Censura ao Estado de São Paulo completa 52 Dias
O afastamento do desembargador Dácio Vieira, declarado suspeito, não teve a consequência que a maior parte dos juristas antecipara. Estranhamente, o TJ-DF manteve em vida a censura ao Estado de São Paulo imposta por Vieira, sem embargo da suspeição declarada pelo Tribunal. Consultados pelo jornal paulista, grande número de especialistas se manifesta pela simultânea anulação da censura. Falando ‘em tese’, o ministro Marco Aurélio Mello, do STF, afirmou que “a consequência natural é a insubsistência dos atos praticados por magistrado dado como suspeito”.
A fortiori, outro aspecto que causa espécie foi o fato de a decisão do Tribunal de Justiça do D.F. ter sido tomada em reunião secreta. A esse respeito, o regulamento do Supremo Tribunal Federal – que é lei para todos os tribunais de inferior hierarquia – proibe as sessões secretas, admitindo-as apenas em um ou dois casos excepcionais (que, como é evidente, não se aplicam à presente situação).
Por ter incorrido nessa ilegalidade, o Tribunal de Justiça recebeu comunicação do Conselho Nacional de Justiça, em que se relembra ao colegiado que falecia base legal para que o TJ-DF optasse por tornar secreta a apreciação da questão pelos desembargadores mais antigos.
Pergunta-se, por conseguinte, por quanto tempo ainda se prolongará a censura inconstitucional para manter fora do conhecimento público as investigações da Polícia Federal acerca dos negócios do empresário Fernando Sarney, filho de José Sarney. A mordaça judicial impede, por ora, que o Estado de São Paulo divulgue reportagens já elaboradas acerca da operação ‘Boi Barrica’ e as suspeitas que recaem sobre Fernando Sarney.
Diante do tratamento dispensado pelo TJ-DF – e por juízes de primeira instância, como assinalei em blog anterior – se reforça o interesse de que a reintrodução da censura pela porta dos fundos seja combatida e debelada com maior eficácia.
Não é admissível que se permita a sobrevida de uma liminar por tanto tempo, em manifesto atentado contra a Constituição de 1988, o que só pode ser interpretado como favorecimento indevido, ilegal e inconstitucional de uma das partes. É necessário e mesmo indispensável que se criem condições, através de súmula vinculante do Supremo, para que a Lei Magna não seja arranhada por quem ex-officio deveria defendê-la e salvaguardá-la, máxime em suas cláusulas pétreas.
A Próxima Danca dos Números
Prevista para breve a divulgação de novas pesquisas sobre as posições dos candidatos às próximas eleições presidenciais. Ainda são indiscrições de fontes em geral bem informadas, mas que traçam bosquejos do quadro em que confirmadas expectativas se digladiam com eventuais surpresas.
Na floresta dos candidatos, há três imagens que avultam: o candidato José Serra, sem fazer campanha, continua no porte indisturbado dos 40% das intenções. Voeja à sua volta o moscardo Aécio Neves, que mineiramente se recusa a reconhecer-lhe a primazia partidária. A rivalidade terá efeito sobre a chapa dos tucanos ? Na aparência, sim, mas na realidade talvez não. Em se tratando de política café-com-leite, de fortes ingredientes das Alterosas, por ora o tom délfico se afigura mandatório.
Segue-se a segunda forma, que gravita em torno do presidente Lula da Silva e do situacionismo petista. Enquanto Sua Excelência permanece no alto – malgrado haja perdido mais uns pontinhos -, a sua criatura, a despeito dos ingentes esforços de Pigmalião, continua empacada. Por outro lado, o agourento índice da rejeição ameaça atingir os fatídicos 40% (o que, consoante os institutos, configura uma espécie de morte cerebral do candidato).
Saída do bolso do colete presidencial, Dilma Rousseff teima em não corresponder ao empenho de Lula. Se sobram boas intenções, falta-lhe carisma e certa empatia com os eleitores. Também a sorte lhe tem sido madrasta em outros aspectos. Conquanto seja cedo para predizer-lhe o afastamento, começam a amiudar-se nos jornais frases descrentes e ferinas, que acenam com o perigo da fritura.
Entretanto, na mata surge novo fenômeno, que chegaria mesmo a sobrepujar a anterior. Trata-se de árvore com espinhos, mas que tem formas e personalidade distintas. A candidatura de Ciro Gomes se alça no horizonte e o seu crescimento por certo não é bom presságio para a favorita do Presidente.
No pleito anterior, apesar do apoio de Roberto Jefferson, a sua performance não lhe enaltece o currículo, tendo, com 11,97% dos sufrágios, perdido o terceiro lugar para o populista Anthony Garotinho, com 17,86%. Não obstante as incontinências verbais, Ciro Gomes é candidato que merece respeito.
Completam o quadro a senadora Marina Silva (PV) e a vereadora Heloisa Helena (PSol). Marina, pela sua seriedade e dedicação ambientalista, terá sido o fator incógnito nesse processo eleitoral, que, pelo próprio surgimento, desconstruiu o esquema referendário que Nosso Guia tencionara impor ao povo soberano.
Nessa altura dos acontecimentos, semelha demasiado cedo para aventurar-se a pronunciar o óbito eleitoral – ou o corte para adequar-se às atuais insídias nas florestas de Pindorama – de qualquer uma das referidas árvores na contenda pela Primeira Magistratura da Nação.
Mas que algumas crescem mais frondosas aos olhos do Povão, lá isso crescem...
Na floresta dos candidatos, há três imagens que avultam: o candidato José Serra, sem fazer campanha, continua no porte indisturbado dos 40% das intenções. Voeja à sua volta o moscardo Aécio Neves, que mineiramente se recusa a reconhecer-lhe a primazia partidária. A rivalidade terá efeito sobre a chapa dos tucanos ? Na aparência, sim, mas na realidade talvez não. Em se tratando de política café-com-leite, de fortes ingredientes das Alterosas, por ora o tom délfico se afigura mandatório.
Segue-se a segunda forma, que gravita em torno do presidente Lula da Silva e do situacionismo petista. Enquanto Sua Excelência permanece no alto – malgrado haja perdido mais uns pontinhos -, a sua criatura, a despeito dos ingentes esforços de Pigmalião, continua empacada. Por outro lado, o agourento índice da rejeição ameaça atingir os fatídicos 40% (o que, consoante os institutos, configura uma espécie de morte cerebral do candidato).
Saída do bolso do colete presidencial, Dilma Rousseff teima em não corresponder ao empenho de Lula. Se sobram boas intenções, falta-lhe carisma e certa empatia com os eleitores. Também a sorte lhe tem sido madrasta em outros aspectos. Conquanto seja cedo para predizer-lhe o afastamento, começam a amiudar-se nos jornais frases descrentes e ferinas, que acenam com o perigo da fritura.
Entretanto, na mata surge novo fenômeno, que chegaria mesmo a sobrepujar a anterior. Trata-se de árvore com espinhos, mas que tem formas e personalidade distintas. A candidatura de Ciro Gomes se alça no horizonte e o seu crescimento por certo não é bom presságio para a favorita do Presidente.
No pleito anterior, apesar do apoio de Roberto Jefferson, a sua performance não lhe enaltece o currículo, tendo, com 11,97% dos sufrágios, perdido o terceiro lugar para o populista Anthony Garotinho, com 17,86%. Não obstante as incontinências verbais, Ciro Gomes é candidato que merece respeito.
Completam o quadro a senadora Marina Silva (PV) e a vereadora Heloisa Helena (PSol). Marina, pela sua seriedade e dedicação ambientalista, terá sido o fator incógnito nesse processo eleitoral, que, pelo próprio surgimento, desconstruiu o esquema referendário que Nosso Guia tencionara impor ao povo soberano.
Nessa altura dos acontecimentos, semelha demasiado cedo para aventurar-se a pronunciar o óbito eleitoral – ou o corte para adequar-se às atuais insídias nas florestas de Pindorama – de qualquer uma das referidas árvores na contenda pela Primeira Magistratura da Nação.
Mas que algumas crescem mais frondosas aos olhos do Povão, lá isso crescem...
domingo, 20 de setembro de 2009
A Ditadura Iraniana e a resistência
A despeito das ameaças do Ayatollah Ali Khamenei, o Supremo Líder da Teocracia iraniana, a sexta-feira, dezoito de setembro, dia reservado à manifestação de apoio ao povo palestino, transcorreu segundo o cenário previsto.
De início, o presidente Mahmoud Ahmadinejad pronunciou o habitual violento discurso, em que voltou a taxar de uma ‘mentira’ o Holocausto. No seu entender, seria um falso pretexto para justificar a criação do estado de Israel, em 1948.
Consoante o aranzel, para Ahmadinejad o regime israelense ‘não tem futuro. A sua vida chegou ao fim.’
Sem dignar-se a explicar como tal anunciado fato se refletia na realidade, tornou a reiterar que a confrontação com o ‘regime sionista’ constituía um dever nacional e religioso.
Por ter sobejas razões para não confiar em grandes afluxos de público procedente dos bairros de Teerã, a ditadura iraniana, como todos os regimes de similar pelugem, dispõe nas comemorações da sexta-feira – o dia santo para os muçulmanos – de esquema de transporte bastante eficiente.
Assim, se não há maior dificuldade para lotar as cadeiras da assistência para a arenga de Ahmadinejad – decerto a nomenclatura clerical, os altos funcionários e demais integrantes dos partidários da linha dura de Khamenei-Ahmadinejad não ousariam faltar a solenidades dessa natureza - , o mesmo não ocorre para emprestar às grandes marchas de rua e aos comícios a parecença imponente que só as multidões podem conferir.
Nesse aspecto, a teocracia iraniana, na verdade, não inova em relação à prática dos regimes autoritários do presente e do passado. Recordo-me, por exemplo, que no México, durante o longo reinado dos sucessivos sexênios presidenciais do antigo PRI, as aglomerações de entusiastas partídários do oficialismo eram carreadas de ônibus, trazendo não só as bandeirinhas, mas também os respectivos guias para entoarem os slogans, depois repetidos pelos diversos grupos.
No caso do Irã, as multidões também vêm de ônibus, das localidades interioranas menos expostas à deletéria propaganda dos reformistas.
Por sua vez, escarnecendo da tentativa de intimidação feitas por Khamenei, a oposição não careceu de preocupar-se com medidas logísticas de transporte de massa. Os partidários do campo reformista acorreram em grande número. Muitos daqueles que votaram no candidato Mir Hussein Moussavi traziam a cor verde em sinal de repúdio ao pleito fraudado e de reconfirmação das grandes manifestações que se sucederam à eleição presidencial de 12 de junho último.
Os três principais líderes reformistas – o citado Moussavi, o também candidato Mehdi Karroubi e o ex-presidente Mohammad Khatami – participaram da jornada de protesto, afrontando por conseguinte as ordens peremptórias do Ayatollah Ali Khamenei.
Segundo se determinou, as forças policiais se mantiveram à margem, deixando às turbas vindas do interior e à milícia basij – que brandiam cadeias de metal – o trabalho de confrontar os grupos de reformistas. Os choques existiram, mas não houve grandes excessos de violência, nem registro de mortes. Sem embargo, o líder reformista e ex-presidente Mohammad Khatami foi atacado por bandos de adeptos do regime, chegando a ser jogado ao chão. Khatami foi resgatado pelo grupo reformista, que enfrentou e repeliu aqueles que o assediavam.
Negociações com o Ocidente.
O Presidente Ahmadinejad, ao repetir as suas estultas negações do Holocausto, não terá preparado o ambiente para as próximas conversações, a se realizarem por ocasião da tradicional retomada das atividades diplomáticas, quando da tradicional abertura dos trabalhos da Assembleia Geral das Nações Unidas.
Ahmadinejad, a par de não encontrar interlocutores no Ocidente que não hajam verberado as suas rituais e absurdas assertivas, tampouco terá facilitado as condições de diálogo nas reuniões previstas para discutir as perspectivas do programa nuclear iraniano.
As conversações devem realizar-se a primeiro de outubro. Além dos Estados Unidos, está prevista a presença do Reino Unido, França, Alemanha, Russia e China. Quanto ao local da reunião, pode ser em Genebra, Viena e Istambul.
O Irã apresentou proposta de uma reunião em papel intitulado ‘Cooperação, Paz e Justiça’. Quanto à seriedade deste documento – que trata de tópicos políticos, sociais e econômicos, clama por reforma das Nações Unidas e acordo de paz para o Oriente Médio, além de um desarmamento nuclear universal – a ausência de qualquer menção ao programa nuclear iraniano já fornece uma boa indicação.
Nesse sentido, o senhor Ahmadinejad tem reafirmado com insistência que o Irã jamais suspenderá a produção de combustível nuclear, eis que o seu país não pretende renunciar aos próprios direitos fundamentais.
(Fonte: International Herald Tribune)
De início, o presidente Mahmoud Ahmadinejad pronunciou o habitual violento discurso, em que voltou a taxar de uma ‘mentira’ o Holocausto. No seu entender, seria um falso pretexto para justificar a criação do estado de Israel, em 1948.
Consoante o aranzel, para Ahmadinejad o regime israelense ‘não tem futuro. A sua vida chegou ao fim.’
Sem dignar-se a explicar como tal anunciado fato se refletia na realidade, tornou a reiterar que a confrontação com o ‘regime sionista’ constituía um dever nacional e religioso.
Por ter sobejas razões para não confiar em grandes afluxos de público procedente dos bairros de Teerã, a ditadura iraniana, como todos os regimes de similar pelugem, dispõe nas comemorações da sexta-feira – o dia santo para os muçulmanos – de esquema de transporte bastante eficiente.
Assim, se não há maior dificuldade para lotar as cadeiras da assistência para a arenga de Ahmadinejad – decerto a nomenclatura clerical, os altos funcionários e demais integrantes dos partidários da linha dura de Khamenei-Ahmadinejad não ousariam faltar a solenidades dessa natureza - , o mesmo não ocorre para emprestar às grandes marchas de rua e aos comícios a parecença imponente que só as multidões podem conferir.
Nesse aspecto, a teocracia iraniana, na verdade, não inova em relação à prática dos regimes autoritários do presente e do passado. Recordo-me, por exemplo, que no México, durante o longo reinado dos sucessivos sexênios presidenciais do antigo PRI, as aglomerações de entusiastas partídários do oficialismo eram carreadas de ônibus, trazendo não só as bandeirinhas, mas também os respectivos guias para entoarem os slogans, depois repetidos pelos diversos grupos.
No caso do Irã, as multidões também vêm de ônibus, das localidades interioranas menos expostas à deletéria propaganda dos reformistas.
Por sua vez, escarnecendo da tentativa de intimidação feitas por Khamenei, a oposição não careceu de preocupar-se com medidas logísticas de transporte de massa. Os partidários do campo reformista acorreram em grande número. Muitos daqueles que votaram no candidato Mir Hussein Moussavi traziam a cor verde em sinal de repúdio ao pleito fraudado e de reconfirmação das grandes manifestações que se sucederam à eleição presidencial de 12 de junho último.
Os três principais líderes reformistas – o citado Moussavi, o também candidato Mehdi Karroubi e o ex-presidente Mohammad Khatami – participaram da jornada de protesto, afrontando por conseguinte as ordens peremptórias do Ayatollah Ali Khamenei.
Segundo se determinou, as forças policiais se mantiveram à margem, deixando às turbas vindas do interior e à milícia basij – que brandiam cadeias de metal – o trabalho de confrontar os grupos de reformistas. Os choques existiram, mas não houve grandes excessos de violência, nem registro de mortes. Sem embargo, o líder reformista e ex-presidente Mohammad Khatami foi atacado por bandos de adeptos do regime, chegando a ser jogado ao chão. Khatami foi resgatado pelo grupo reformista, que enfrentou e repeliu aqueles que o assediavam.
Negociações com o Ocidente.
O Presidente Ahmadinejad, ao repetir as suas estultas negações do Holocausto, não terá preparado o ambiente para as próximas conversações, a se realizarem por ocasião da tradicional retomada das atividades diplomáticas, quando da tradicional abertura dos trabalhos da Assembleia Geral das Nações Unidas.
Ahmadinejad, a par de não encontrar interlocutores no Ocidente que não hajam verberado as suas rituais e absurdas assertivas, tampouco terá facilitado as condições de diálogo nas reuniões previstas para discutir as perspectivas do programa nuclear iraniano.
As conversações devem realizar-se a primeiro de outubro. Além dos Estados Unidos, está prevista a presença do Reino Unido, França, Alemanha, Russia e China. Quanto ao local da reunião, pode ser em Genebra, Viena e Istambul.
O Irã apresentou proposta de uma reunião em papel intitulado ‘Cooperação, Paz e Justiça’. Quanto à seriedade deste documento – que trata de tópicos políticos, sociais e econômicos, clama por reforma das Nações Unidas e acordo de paz para o Oriente Médio, além de um desarmamento nuclear universal – a ausência de qualquer menção ao programa nuclear iraniano já fornece uma boa indicação.
Nesse sentido, o senhor Ahmadinejad tem reafirmado com insistência que o Irã jamais suspenderá a produção de combustível nuclear, eis que o seu país não pretende renunciar aos próprios direitos fundamentais.
(Fonte: International Herald Tribune)
sábado, 19 de setembro de 2009
O Neopopulismo de Lula
Em meio ao nervosismo nas hostes oficiais, diante do recuo nas pesquisas da candidata do Presidente Lula da Silva, e não obstante a queda na arrecadação de impostos por dez meses seguidos, o governo, embriagado pelos fortes vapores eleitorais, continua a proceder na contramão da bem-comportada prudência fiscal que exibira por alguns anos.
É um chorrilho de medidas que ora só pode espantar uns poucos irredutíveis crentes no caráter duradouro da conversão de Lula à ortodoxia nas finanças. Para ele, pouco importa que as contas hajam sido saneadas, e que a situação da economia brasileira tenha mudado radicalmente, a ponto de tornar-se o Brasil um país credor, o que lhe permitiu arrostar a crise financeira sem os dissabores de antes.
Será que nosso loquaz guia se terá esquecido de que o por ele tão gabado empréstimo ao F.M.I. foi o resultado de política consequente e avisada, com o dever de casa atendido na gestão das finanças e em especial no aturado respeito ao superavit fiscal primário ?
Desde que Antonio Palocci, por problemas com um caseiro, perdeu a chave do cofre,seu substituto Guido Mantega não manifestou a mesma energia e personalidade em conter os arroubos do chefe e, com a aproximação dos comícios de 2010, os ímpetos da candidata à dama de ferro, posto que em diversa posição ideológica.
A presente iniciativa governamental, no entanto, supera as loucuras anteriores. Na passada quinta-feira, 17 de setembro, o Planalto enviou ao Congresso, com suposta discrição, projeto de lei que permitiria a redução do superavit primário em R$12,948 bilhões. Com isso, o superavit do governo federal cairá de 1,4% para 0,46% do PIB. Somando a economia feita pelas estatais e pelos estados, o superavit deve cair de 2,5% do PIB para 1,56%. Assinale-se que a previsão de receitas, estimada no relatório do terceiro bimestre em R$561 bilhões, caíu para R$555,2 bilhões.
Se não estamos em queda livre na arrecadação fiscal, a tendência descendente continua, com a redução de R$5,768 na estimativa das receitas para este ano. E como nos encontramos ainda na segunda quinzena de setembro, muita água há de passar por baixo da ponte, com possível incremento no deficit de arrecadação.
Qual é a reação do Presidente Lula? Ao invés de apertar o cinto, que é a imemorial atitude de os que enfrentam a escassez de recursos, Sua Excelência opta pelo feliz retorno aos encantos da heterodoxia fiscal. Mesmo apedeutas e gente de escassas luzes em temas econômicos, não desconhecem que a inventiva e o desrespeito das regras economico-financeiras nada de bom tendem a pressagiar. Se planos e programas heterodoxos funcionassem, o Brasil não teria penado tantos anos no deserto da hiperinflação, em meio a inúmeros, inúteis planos salvadores.
Não se criam créditos por decreto ou lei de uma arrecadação minguante, se se planeja diminuir artificialmente o superavit primário, para gastar a falsa sobra em verbas extras para ministérios e R$1,2 bilhão para atender emendas de parlamentares.
Aumentando os gastos, por um malabarismo legal, o governo Lula não deixa apenas de pagar boa parcela dos juros da dívida. Através dessa insana manobra eleitoreira, aumenta a dívida pública. Isso, de resto, não é novidade. Em meu blog de 29 de agosto, A Crise do Superavit Primário, mostrava o crescimento desta dívida, em função da política irresponsável de inchação dos gastos correntes a que se dedica com determinação de lemingue a administração petista.
Parece que o senhor Luiz Inácio Lula da Silva, inquieto com as perspectivas de sua candidata, finge ignorar o adágio de que não se pode ser servo de dois senhores. Arrotar empáfia em termos financeiros só é compatível se se cuidar com a atenção devida dos rudimentos da economia.
É um chorrilho de medidas que ora só pode espantar uns poucos irredutíveis crentes no caráter duradouro da conversão de Lula à ortodoxia nas finanças. Para ele, pouco importa que as contas hajam sido saneadas, e que a situação da economia brasileira tenha mudado radicalmente, a ponto de tornar-se o Brasil um país credor, o que lhe permitiu arrostar a crise financeira sem os dissabores de antes.
Será que nosso loquaz guia se terá esquecido de que o por ele tão gabado empréstimo ao F.M.I. foi o resultado de política consequente e avisada, com o dever de casa atendido na gestão das finanças e em especial no aturado respeito ao superavit fiscal primário ?
Desde que Antonio Palocci, por problemas com um caseiro, perdeu a chave do cofre,seu substituto Guido Mantega não manifestou a mesma energia e personalidade em conter os arroubos do chefe e, com a aproximação dos comícios de 2010, os ímpetos da candidata à dama de ferro, posto que em diversa posição ideológica.
A presente iniciativa governamental, no entanto, supera as loucuras anteriores. Na passada quinta-feira, 17 de setembro, o Planalto enviou ao Congresso, com suposta discrição, projeto de lei que permitiria a redução do superavit primário em R$12,948 bilhões. Com isso, o superavit do governo federal cairá de 1,4% para 0,46% do PIB. Somando a economia feita pelas estatais e pelos estados, o superavit deve cair de 2,5% do PIB para 1,56%. Assinale-se que a previsão de receitas, estimada no relatório do terceiro bimestre em R$561 bilhões, caíu para R$555,2 bilhões.
Se não estamos em queda livre na arrecadação fiscal, a tendência descendente continua, com a redução de R$5,768 na estimativa das receitas para este ano. E como nos encontramos ainda na segunda quinzena de setembro, muita água há de passar por baixo da ponte, com possível incremento no deficit de arrecadação.
Qual é a reação do Presidente Lula? Ao invés de apertar o cinto, que é a imemorial atitude de os que enfrentam a escassez de recursos, Sua Excelência opta pelo feliz retorno aos encantos da heterodoxia fiscal. Mesmo apedeutas e gente de escassas luzes em temas econômicos, não desconhecem que a inventiva e o desrespeito das regras economico-financeiras nada de bom tendem a pressagiar. Se planos e programas heterodoxos funcionassem, o Brasil não teria penado tantos anos no deserto da hiperinflação, em meio a inúmeros, inúteis planos salvadores.
Não se criam créditos por decreto ou lei de uma arrecadação minguante, se se planeja diminuir artificialmente o superavit primário, para gastar a falsa sobra em verbas extras para ministérios e R$1,2 bilhão para atender emendas de parlamentares.
Aumentando os gastos, por um malabarismo legal, o governo Lula não deixa apenas de pagar boa parcela dos juros da dívida. Através dessa insana manobra eleitoreira, aumenta a dívida pública. Isso, de resto, não é novidade. Em meu blog de 29 de agosto, A Crise do Superavit Primário, mostrava o crescimento desta dívida, em função da política irresponsável de inchação dos gastos correntes a que se dedica com determinação de lemingue a administração petista.
Parece que o senhor Luiz Inácio Lula da Silva, inquieto com as perspectivas de sua candidata, finge ignorar o adágio de que não se pode ser servo de dois senhores. Arrotar empáfia em termos financeiros só é compatível se se cuidar com a atenção devida dos rudimentos da economia.
sexta-feira, 18 de setembro de 2009
A Reforminha Eleitoral da Vez
É inevitável a decepção ao tomar-se conhecimento do texto aprovado pelo Congresso para a reforma eleitoral, haja vista os mostrengos jurídicos introduzidos ou confirmados pelo projeto ontem à noite homologado em votação simbólica pela Câmara de Deputados. Infelizmente, porém, também será forçoso admitir que não se poderia esperar maravilhas nem disposições voltadas para a moralização de colegiados que parecem estar de costas para a opinião pública. Afinal, como se há de vê-los diversamente, se ali se coonestam a farra das passagens, os atos secretos, incensam o corporativismo, e cobrem de escárnio os conselhos de ética ?
Retornando o projeto à Camara, depois das emendas do Senado, coube à câmara baixa, de afogadilho, servindo-se do instrumento do consenso das lideranças e dos votos ditos simbólicos, aprovar-lhe a redação final, em rejeitando a mor parte das emendas moralizadoras introduzidas pela câmara alta.
Antes de rápida apreciação dos principais dispositivos da chamada reforma, é importante que se tenha presente as considerações abaixo: i. nenhum partido ou liderança na Câmara poderá afirmar, a posteriori, que o projeto terá sido aprovado a despeito de seus ingentes esforços. Um líder determinado dispunha dos instrumentos regimentais necessários para impossibilitar a aprovação simbólica (a reforma precisa ser sancionada até o dia dois de outubro, senão não terá validade para o próximo pleito). Se não o fez a tempo, que não apareça depois chorando lágrimas de carpideira e dizendo, para fins eleitoreiros, que a coisa foi aprovada sem o seu consentimento; ii. se o Presidente Lula, através de suas lideranças no Congresso, desejasse realmente melhorar o projeto, deveria orientá-las para que a Câmara não rejeitasse regras moralizadoras, como a não-participação de candidatos sub judice e com fichas sujas nas próximas eleições. É bem verdade que Sua Excelência dispõe do direito do veto para escoimar do texto tais despautérios, mas daí que vá utilizá-lo seria deveras lisongeira surpresa.
Notas sobre o articulado.
Campanha na Internet. Em realidade, a única melhoria trazida pelo Senado, que, em função de pressões difusas, o relator Deputado Flavio Dino (PCdoB-MA) e as bancadas partidárias tiveram de engolir, dada a inconstitucionalidade da proposta de censurar o domínio livre da internet. São proibidas as manifestações anônimas. A propaganda irregular (ofensas, calúnia e difamação) terá de ser retirada pelo respectivo provedor.
Fichas-sujas. Baseados na estranha jurisprudência do STF que espicha a presunção de inocência do réu até a condenação em última instância, os deputados reimpuseram a norma de que todas as pessoas processadas por qualquer tipo de crime podem concorrer. Até mesmo candidatos sub judice podem participar do programa eleitoral !
A esse respeito, o cientista político Rudá Ricci disse a última palavra: As mudanças aprovadas são pífias, já que 50% do Legislativo têm ficha suja.
Doação oculta. Doações de pessoas físicas e jurídicas podem ser feitas aos partidos e repassadas aos candidatos, sem que estes sejam identificados. Tanto partidos quanto candidatos não podem receber doações de entidades beneficentes e religiosas, de ONGs que recebam recursos públicos, e de entidades esportivas, como a CBF.
Voto em trânsito. O texto permite o voto em trânsito para presidente da república e vice-presidente nas capitais. Segundo consta, o Ministro Nelso Jobim tenciona sugerir ao Presidente Lula que vete esta disposição.
Prestação de Contas. Ao fazer o respectivo registro, o candidato apresenta não as contas aprovadas mas a prestação de contas da campanha.
Uso da Máquina Pública. Até três meses antes da eleição, candidatos podem inaugurar obras e ampliar ações sociais. Mas nos três meses de campanha, não podem participar de inaugurações. Em ano eleitoral, os programas sociais não podem ser executados por entidade nominalmente vinculada a candidato ou mantida por ele.
Debates. Os debates são permitidos em sites comerciais, com as mesmas regras de rádio e TV. A lei proibe excluir candidatos, a não ser que 2/3 deles concordem.
Retornando o projeto à Camara, depois das emendas do Senado, coube à câmara baixa, de afogadilho, servindo-se do instrumento do consenso das lideranças e dos votos ditos simbólicos, aprovar-lhe a redação final, em rejeitando a mor parte das emendas moralizadoras introduzidas pela câmara alta.
Antes de rápida apreciação dos principais dispositivos da chamada reforma, é importante que se tenha presente as considerações abaixo: i. nenhum partido ou liderança na Câmara poderá afirmar, a posteriori, que o projeto terá sido aprovado a despeito de seus ingentes esforços. Um líder determinado dispunha dos instrumentos regimentais necessários para impossibilitar a aprovação simbólica (a reforma precisa ser sancionada até o dia dois de outubro, senão não terá validade para o próximo pleito). Se não o fez a tempo, que não apareça depois chorando lágrimas de carpideira e dizendo, para fins eleitoreiros, que a coisa foi aprovada sem o seu consentimento; ii. se o Presidente Lula, através de suas lideranças no Congresso, desejasse realmente melhorar o projeto, deveria orientá-las para que a Câmara não rejeitasse regras moralizadoras, como a não-participação de candidatos sub judice e com fichas sujas nas próximas eleições. É bem verdade que Sua Excelência dispõe do direito do veto para escoimar do texto tais despautérios, mas daí que vá utilizá-lo seria deveras lisongeira surpresa.
Notas sobre o articulado.
Campanha na Internet. Em realidade, a única melhoria trazida pelo Senado, que, em função de pressões difusas, o relator Deputado Flavio Dino (PCdoB-MA) e as bancadas partidárias tiveram de engolir, dada a inconstitucionalidade da proposta de censurar o domínio livre da internet. São proibidas as manifestações anônimas. A propaganda irregular (ofensas, calúnia e difamação) terá de ser retirada pelo respectivo provedor.
Fichas-sujas. Baseados na estranha jurisprudência do STF que espicha a presunção de inocência do réu até a condenação em última instância, os deputados reimpuseram a norma de que todas as pessoas processadas por qualquer tipo de crime podem concorrer. Até mesmo candidatos sub judice podem participar do programa eleitoral !
A esse respeito, o cientista político Rudá Ricci disse a última palavra: As mudanças aprovadas são pífias, já que 50% do Legislativo têm ficha suja.
Doação oculta. Doações de pessoas físicas e jurídicas podem ser feitas aos partidos e repassadas aos candidatos, sem que estes sejam identificados. Tanto partidos quanto candidatos não podem receber doações de entidades beneficentes e religiosas, de ONGs que recebam recursos públicos, e de entidades esportivas, como a CBF.
Voto em trânsito. O texto permite o voto em trânsito para presidente da república e vice-presidente nas capitais. Segundo consta, o Ministro Nelso Jobim tenciona sugerir ao Presidente Lula que vete esta disposição.
Prestação de Contas. Ao fazer o respectivo registro, o candidato apresenta não as contas aprovadas mas a prestação de contas da campanha.
Uso da Máquina Pública. Até três meses antes da eleição, candidatos podem inaugurar obras e ampliar ações sociais. Mas nos três meses de campanha, não podem participar de inaugurações. Em ano eleitoral, os programas sociais não podem ser executados por entidade nominalmente vinculada a candidato ou mantida por ele.
Debates. Os debates são permitidos em sites comerciais, com as mesmas regras de rádio e TV. A lei proibe excluir candidatos, a não ser que 2/3 deles concordem.
quinta-feira, 17 de setembro de 2009
A Memória Perdida de Ipanema
Conheci Ipanema nos anos cinquenta e sessenta, quando ainda era um bairro de muitas casas e poucos edifícios. Excetuados os fins de semana, havia escasso movimento na Vieira Souto, ladeada por casas e prédios do gabarito de quatro andares.
Ao contrário de Copacabana, a praia não foi modificada. Andar à tardinha ao longo da calçada que a costeava, seria muita vez caminhada solitária, na companhia das dunas e dos ventos.
Na Visconde de Pirajá, com seus trilhos de bonde, e um que outro edifício, as casas se sucediam, com modestos jardins e largos quintais. Naquela artéria, apareciam as lojas, armazéns e os cinemas. Existiam os de luxo, como o Astória, próximo ao Jardim de Alá e Bar Vinte, e os populares, a exemplo do Pirajá e do Cine Ipanema. Eram os chamados ‘poeiras’.
As ruas tranquilas do bairro podiam ser percorridas a pé, a qualquer hora do dia e da noite. Muita vez retornei ao posto seis, onde morava, caminhando, em torno da meia-noite, por ermas calçadas e até nos paralelepípedos da deserta Visconde de Pirajá, sem nunca ter sido disturbado em meu solitário regresso à Copacabana.
Como bairro de classe média, Ipanema teria os seus bares e botequins, redutos boêmios e até ruidosos em fins de semana. No entanto, as luzes nas casas se recolhiam, pelas ruas e travessas em horas ajuizadas, sobretudo se a manhã seguinte fosse dia de trabalho.
Já nos sábados e domingos, havia mais gente na rua e na praia, espalhada pelos bares, restaurantes, filas de cinema e em algumas esquinas.
Com o moroso transporte dos bondes e dos próprios ônibus, menor número de carros, Ipanema seria menos movimentada e bastante mais sossegada do que Copacabana. Naqueles tempos em que as comunicações viárias ainda se esgueiravam ao longo das montanhas sem adentrá-las, Ipanema e Leblon se afiguravam ilhas pouco visitadas por gente de fora.
Frequentá-la como fazia, seria encontrar um vasto e plácido bairro, em que os imensos quarteirões se sucediam em espaços serenos e pouco povoados, com moças e rapazes como que criteriosa e esparsamente distribuídos por calçadas às vezes drummondianamente sonolentas.
Por que hoje me acodem tais reminiscências ? Andando pelas afobadas e atopetadas calçadas da descaracterizada Ipanema de hoje, me lembrei da iniciativa de algum prefeito de passado não-longínquo, que buscou preservar o inaferrável, que é trazer de volta ao ambiente atual, de modernosa aglomeração, a alma, as pessoas e os costumes de época soterrada por supermercados, lojas, bancos e muita edificações.
Pois a dita autoridade, de mim desconhecida, com louvável propósito mandou colocar, nos sítios adequados das calçadas, placas de bronze.
Assim, caminhando ao longo da Pirajá, alternando os lados direito e esquerdo conforme a localização, toparia com os dizeres: aqui funcionou o cinema Astória, aqui o bar Zeppelin, aqui a sorveteria Morais, aqui morou João Saldanha, aqui o cinema Pirajá, aqui prédio traçado por Oscar Niemeyer, aqui o cinema Ipanema...
Creio que o prefeito saudosista não se terá limitado a essas singelas,porém verazes homenagens. Outras placas terá ordenado fixar na pedra das calçadas.
Os tempos mudaram decerto. E somente os desavisados hão de divergir e rebelar-se contra esse princípio que nos rege a todos.
Só me pergunto, ao procurar em vão as placas que lá estavam não faz muito, por que elas se foram, deixando apenas nas calçadas as cicatrizes da sua não-presença.
Elas se foram, em silêncio e na calada da noite, arrancadas por mãos ignaras, no encalço de um pífio ganho.
Enquanto isso, o poder público assiste impotente ao estropiamento não só daquilo que foi, mas também das singelas marcas que se propunham estender a vicária vida das memórias de Ipanema.
Ao contrário de Copacabana, a praia não foi modificada. Andar à tardinha ao longo da calçada que a costeava, seria muita vez caminhada solitária, na companhia das dunas e dos ventos.
Na Visconde de Pirajá, com seus trilhos de bonde, e um que outro edifício, as casas se sucediam, com modestos jardins e largos quintais. Naquela artéria, apareciam as lojas, armazéns e os cinemas. Existiam os de luxo, como o Astória, próximo ao Jardim de Alá e Bar Vinte, e os populares, a exemplo do Pirajá e do Cine Ipanema. Eram os chamados ‘poeiras’.
As ruas tranquilas do bairro podiam ser percorridas a pé, a qualquer hora do dia e da noite. Muita vez retornei ao posto seis, onde morava, caminhando, em torno da meia-noite, por ermas calçadas e até nos paralelepípedos da deserta Visconde de Pirajá, sem nunca ter sido disturbado em meu solitário regresso à Copacabana.
Como bairro de classe média, Ipanema teria os seus bares e botequins, redutos boêmios e até ruidosos em fins de semana. No entanto, as luzes nas casas se recolhiam, pelas ruas e travessas em horas ajuizadas, sobretudo se a manhã seguinte fosse dia de trabalho.
Já nos sábados e domingos, havia mais gente na rua e na praia, espalhada pelos bares, restaurantes, filas de cinema e em algumas esquinas.
Com o moroso transporte dos bondes e dos próprios ônibus, menor número de carros, Ipanema seria menos movimentada e bastante mais sossegada do que Copacabana. Naqueles tempos em que as comunicações viárias ainda se esgueiravam ao longo das montanhas sem adentrá-las, Ipanema e Leblon se afiguravam ilhas pouco visitadas por gente de fora.
Frequentá-la como fazia, seria encontrar um vasto e plácido bairro, em que os imensos quarteirões se sucediam em espaços serenos e pouco povoados, com moças e rapazes como que criteriosa e esparsamente distribuídos por calçadas às vezes drummondianamente sonolentas.
Por que hoje me acodem tais reminiscências ? Andando pelas afobadas e atopetadas calçadas da descaracterizada Ipanema de hoje, me lembrei da iniciativa de algum prefeito de passado não-longínquo, que buscou preservar o inaferrável, que é trazer de volta ao ambiente atual, de modernosa aglomeração, a alma, as pessoas e os costumes de época soterrada por supermercados, lojas, bancos e muita edificações.
Pois a dita autoridade, de mim desconhecida, com louvável propósito mandou colocar, nos sítios adequados das calçadas, placas de bronze.
Assim, caminhando ao longo da Pirajá, alternando os lados direito e esquerdo conforme a localização, toparia com os dizeres: aqui funcionou o cinema Astória, aqui o bar Zeppelin, aqui a sorveteria Morais, aqui morou João Saldanha, aqui o cinema Pirajá, aqui prédio traçado por Oscar Niemeyer, aqui o cinema Ipanema...
Creio que o prefeito saudosista não se terá limitado a essas singelas,porém verazes homenagens. Outras placas terá ordenado fixar na pedra das calçadas.
Os tempos mudaram decerto. E somente os desavisados hão de divergir e rebelar-se contra esse princípio que nos rege a todos.
Só me pergunto, ao procurar em vão as placas que lá estavam não faz muito, por que elas se foram, deixando apenas nas calçadas as cicatrizes da sua não-presença.
Elas se foram, em silêncio e na calada da noite, arrancadas por mãos ignaras, no encalço de um pífio ganho.
Enquanto isso, o poder público assiste impotente ao estropiamento não só daquilo que foi, mas também das singelas marcas que se propunham estender a vicária vida das memórias de Ipanema.
Ayres Britto está preocupado
O Ministro Carlos Ayres Britto, atual presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) disse estar preocupado com as consequências da liminar concedida pelo Ministro Eros Grau, do STF. A citada liminar suspende a tramitação de todas as ações que pedem diretamente àquela corte a cassação de mandatos de governadores, senadores e deputados.
Talvez a preocupação do Ministro Ayres Britto tenha a ver com o número de processos que, em função da decisão do Ministro Grau, foram paralisados. Tratam-se, em verdade, de cinquenta e seis ações que tiveram sua origem no TSE.
Há duas maneiras de encarar a situação. Por um lado, a inquietude supostamente imediatista do Ministro Ayres Britto, a quem incomoda o acúmulo desses processos no TSE, forçados a aguardar a decisão de instância superior, no caso a nossa suprema corte.
Por outro – e nesse aspecto está a motivação da liminar do Ministro Eros Grau – o excesso de ações que batem às portas do TSE, sem passar pelo crivo dos tribunais regionais eleitorais, provoca demanda adicional nesse tribunal superior. Convertida em virtual instância única de uma súbita sede de justiça de partes derrotadas em pleitos eleitorais, compreende-se a sobrecarga do TSE.
Essa sobrecarga pode igualmente ser interpretada ou como o friso dourado de um acrescido poder ao TSE, ou como efeito desnecessário de expectativas aguçadas pela aparente agilização na tramitação.
Mandaria o bom senso que se deixasse aos Tribunais regionais a incumbência de triar as demandas respectivas. Se o recurso é prerrogativa do litigante, os TREs tenderão a poupar muita faina à instância superior, seja sob o prisma substantivo, seja por desencorajar um eventual prosseguimento da ação.
Essa inchação de processos – 56 pendentes de decisão – semelha indicar que a transformação do TSE em instância única aguçou o apetite de muitos contendores, com duas consequências imediatas: i. o apelo à justiça eleitoral vai descambando para um virtual terceiro round na contenda por mandatos majoritários ou proporcionais; e ii. há um sensível incremento no poder político dessa instância judicial.
Em passado recente e não tão recente, o TSE não se assinalou pelo menos no sentido para o qual foi criado por nossos constituintes, em duas sentenças de colegiados diversos que favoreceram indiretamente o senhor José Sarney. Como aponta, em já famosa entrevista, o professor Marco Antonio Villa, o TSE teria dado dois golpes de estado: o primeiro contra João Capiberibe (PSB-AP), que teve no Amapá a eleição cassada pela compra de dois votos a R$ 24 cada; e o segundo, que não só cassou Jackson Lago da governança do Maranhão, mas a outorgou à sua filha Roseana Sarney, segunda colocada na vontade popular.
A agilização do processo de questionamento do resultado das urnas cria um estranho facilitário político-jurídico. Esse incentivado recurso ao tapetão não se afigura de índole democrática. Pode subverter o processo eleitoral e se for duplo – como no caso do Maranhão, em que o TSE se arrogou a decisão não só de cassar um eleito, mas também a de indicar quem deva sucedê-lo – será inadmissível em um contexto de respeito à democracia.
Se esta abstrusa segunda vertente não é mais possível, por ter afinal o Congresso acordado para suas responsabilidades, a concentração de ações no TSE – a buscar a anulação de pleitos – desvela seja a ânsia de justiça, seja a cupidez dos eventuais derrotados nos prélios das urnas.
Então, o Ministro Carlos Ayres Britto, presidente do TSE, em decorrência da liminar do Ministro Eros Grau, resolveu procurar as diversas partes (o ministro Grau e o presidente do STF, Gilmar Mendes; o procurador-geral da República, Roberto Gurgel), a quem encareceu celeridade na apreciação, com vistas a que a liminar possa ser logo ser julgada pelo plenário da Corte.
O senhor presidente do Tribunal Superior Eleitoral tem pressa em que a questão seja decidida pelo plenário do STF. Assim se expressou Sua Excelência: (Ao informar-se da decisão do ministro Eros Grau, diante de tantos processos em andamento) “ fiquei preocupado. A tradição do TSE é a celeridade. Há mandatos em jogo. O tempo urge. O tempo na Justiça Eleitoral é mátéria-prima de primeira qualidade”. E aduziu: “Não me cabe criticar a decisão do ministro Eros Grau, mas posso dizer que fiquei surpreso.”
Não há dúvidas, portanto, de que o Ministro Ayres Britto, presidente do TSE tem pressa. Dentro do ritual princípio do cui prodesti, de encanecida e oportuna serventia através de tantos séculos, será o caso de perguntar a que serve tal pressa.
Talvez a preocupação do Ministro Ayres Britto tenha a ver com o número de processos que, em função da decisão do Ministro Grau, foram paralisados. Tratam-se, em verdade, de cinquenta e seis ações que tiveram sua origem no TSE.
Há duas maneiras de encarar a situação. Por um lado, a inquietude supostamente imediatista do Ministro Ayres Britto, a quem incomoda o acúmulo desses processos no TSE, forçados a aguardar a decisão de instância superior, no caso a nossa suprema corte.
Por outro – e nesse aspecto está a motivação da liminar do Ministro Eros Grau – o excesso de ações que batem às portas do TSE, sem passar pelo crivo dos tribunais regionais eleitorais, provoca demanda adicional nesse tribunal superior. Convertida em virtual instância única de uma súbita sede de justiça de partes derrotadas em pleitos eleitorais, compreende-se a sobrecarga do TSE.
Essa sobrecarga pode igualmente ser interpretada ou como o friso dourado de um acrescido poder ao TSE, ou como efeito desnecessário de expectativas aguçadas pela aparente agilização na tramitação.
Mandaria o bom senso que se deixasse aos Tribunais regionais a incumbência de triar as demandas respectivas. Se o recurso é prerrogativa do litigante, os TREs tenderão a poupar muita faina à instância superior, seja sob o prisma substantivo, seja por desencorajar um eventual prosseguimento da ação.
Essa inchação de processos – 56 pendentes de decisão – semelha indicar que a transformação do TSE em instância única aguçou o apetite de muitos contendores, com duas consequências imediatas: i. o apelo à justiça eleitoral vai descambando para um virtual terceiro round na contenda por mandatos majoritários ou proporcionais; e ii. há um sensível incremento no poder político dessa instância judicial.
Em passado recente e não tão recente, o TSE não se assinalou pelo menos no sentido para o qual foi criado por nossos constituintes, em duas sentenças de colegiados diversos que favoreceram indiretamente o senhor José Sarney. Como aponta, em já famosa entrevista, o professor Marco Antonio Villa, o TSE teria dado dois golpes de estado: o primeiro contra João Capiberibe (PSB-AP), que teve no Amapá a eleição cassada pela compra de dois votos a R$ 24 cada; e o segundo, que não só cassou Jackson Lago da governança do Maranhão, mas a outorgou à sua filha Roseana Sarney, segunda colocada na vontade popular.
A agilização do processo de questionamento do resultado das urnas cria um estranho facilitário político-jurídico. Esse incentivado recurso ao tapetão não se afigura de índole democrática. Pode subverter o processo eleitoral e se for duplo – como no caso do Maranhão, em que o TSE se arrogou a decisão não só de cassar um eleito, mas também a de indicar quem deva sucedê-lo – será inadmissível em um contexto de respeito à democracia.
Se esta abstrusa segunda vertente não é mais possível, por ter afinal o Congresso acordado para suas responsabilidades, a concentração de ações no TSE – a buscar a anulação de pleitos – desvela seja a ânsia de justiça, seja a cupidez dos eventuais derrotados nos prélios das urnas.
Então, o Ministro Carlos Ayres Britto, presidente do TSE, em decorrência da liminar do Ministro Eros Grau, resolveu procurar as diversas partes (o ministro Grau e o presidente do STF, Gilmar Mendes; o procurador-geral da República, Roberto Gurgel), a quem encareceu celeridade na apreciação, com vistas a que a liminar possa ser logo ser julgada pelo plenário da Corte.
O senhor presidente do Tribunal Superior Eleitoral tem pressa em que a questão seja decidida pelo plenário do STF. Assim se expressou Sua Excelência: (Ao informar-se da decisão do ministro Eros Grau, diante de tantos processos em andamento) “ fiquei preocupado. A tradição do TSE é a celeridade. Há mandatos em jogo. O tempo urge. O tempo na Justiça Eleitoral é mátéria-prima de primeira qualidade”. E aduziu: “Não me cabe criticar a decisão do ministro Eros Grau, mas posso dizer que fiquei surpreso.”
Não há dúvidas, portanto, de que o Ministro Ayres Britto, presidente do TSE tem pressa. Dentro do ritual princípio do cui prodesti, de encanecida e oportuna serventia através de tantos séculos, será o caso de perguntar a que serve tal pressa.
quarta-feira, 16 de setembro de 2009
Sarney e a Tropa de Choque
Não se ouvirão tilintar os cálices dos salvadores do cargo e do mandato do Senador José Sarney, porque os diretamente interessados evitariam esse gesto passível de interpretações contraproducentes. Metaforicamente, no entanto, o som dos cristais se torna a cada semana mais audível.
Será acaso prematura essa comemoração ? Afinal, o movimento Fora Sarney ! ganhou as ruas, chegando a incomodar Lula e seu ministério durante a parada do Sete de Setembro (matreiramente Sarney evitou comparecer ao desfile).
Decerto, a rejeição popular permanecerá alta. A opinião pública, se consultada, indicará a extensão do próprio repúdio ao coronel-oligarca do Nordeste. E, por isso, o veterano político há de evitar excessivas exposições a números respeitáveis de pessoas, no compreensível temor das vaias.
No entanto, a cada dia que passa, a cada sessão plenária que transcorre sem contestações, sem discursos pró-renúncia, sem cartões vermelhos e sem constrangimentos, será ulterior motivo na progressiva conscientização de um salvamento político que antes parecera impossível, mesmo para operadores da experiência de Renan Calheiros.
Sem dúvida, o Presidente da República, ao jogar as considerações éticas no lixo, terá contribuído para o feliz desenlace (sob o prisma do Palácio do Planalto e de sua candidata, tirada do bolso do colete).
Sem embargo da desmoralização do P.T. e de seus líderes Aloizio Mercadante e Ideli Salvati, o improvável resgate do velho oligarca se deve a três fatores: Renan Calheiros e sua tropa de choque, a desunião das bancadas contrárias à permanência, e ao próprio senador José Sarney.
A tropa de choque, na qual incluo Paulo Duque, segundo suplente de senador e presidente do Conselho de Ética, criou as condições para a manutenção do protegido de Renan na presidência. Fê-lo através da desmoralização do dito Conselho, evidenciada no menosprezo a qualquer escrúpulo de respeito às regras mínimas de decoro e de tramitação judicial.
Tangidas a princípio pelo temor de represálias – no discurso de Sarney, o da abertura das hostilidades, em que disse ser a crise do Senado e não dele - as bancadas, faltas de lideranças consistentes e determinadas, nunca souberam amalgamar-se em unidade de negação ao presidente de escândalos em cascata. Tudo acabou, por fim, em estranhas manobras, quando representações contra Sarney e Arthur Virgílio semelharam neutralizar-se.
Voto de louvor caberá sem dúvida ao bravo presidente do Senado que, oscilando entre hábeis táticas de refúgios e negaças (jamais estar presente em momentos de contestação explícita), mostrou não ser por acaso que é desde os anos sessenta praticante convicto de comprovadas técnicas de sobrevivência política.
Assim, se acontecimentos inesperados e para muitos benfazejos não irromperem em cena, nada há de impedir que José Sarney venha à tribuna para pronunciar lamentáveis discursos do jaez do ontem pronunciado, quando teve a coragem de criticar a imprensa, e dizer que são os parlamentares e não a mídia os verdadeiros representantes do povo.
Como sempre, o vice-rei do Nordeste confunde as coisas. Ninguém nega o caráter representativo do Congresso. Tampouco a tarefa dos órgãos de comunicação de veicular as posições da opinião pública. Esta tem a ver com liberdade de expressão, que deve ser sempre preservada e defendida.
Os senhores congressistas devem cuidar do real interesse da Nação e não dos próprios. Não faz bem à democracia que invistam contra os mensageiros da opinião pública.
Se o consenso dos ouvintes da alocução de Sua Excelência serve para algo, será para indicar que Sarney perdeu uma boa ocasião de ficar calado em sua curul.
Será acaso prematura essa comemoração ? Afinal, o movimento Fora Sarney ! ganhou as ruas, chegando a incomodar Lula e seu ministério durante a parada do Sete de Setembro (matreiramente Sarney evitou comparecer ao desfile).
Decerto, a rejeição popular permanecerá alta. A opinião pública, se consultada, indicará a extensão do próprio repúdio ao coronel-oligarca do Nordeste. E, por isso, o veterano político há de evitar excessivas exposições a números respeitáveis de pessoas, no compreensível temor das vaias.
No entanto, a cada dia que passa, a cada sessão plenária que transcorre sem contestações, sem discursos pró-renúncia, sem cartões vermelhos e sem constrangimentos, será ulterior motivo na progressiva conscientização de um salvamento político que antes parecera impossível, mesmo para operadores da experiência de Renan Calheiros.
Sem dúvida, o Presidente da República, ao jogar as considerações éticas no lixo, terá contribuído para o feliz desenlace (sob o prisma do Palácio do Planalto e de sua candidata, tirada do bolso do colete).
Sem embargo da desmoralização do P.T. e de seus líderes Aloizio Mercadante e Ideli Salvati, o improvável resgate do velho oligarca se deve a três fatores: Renan Calheiros e sua tropa de choque, a desunião das bancadas contrárias à permanência, e ao próprio senador José Sarney.
A tropa de choque, na qual incluo Paulo Duque, segundo suplente de senador e presidente do Conselho de Ética, criou as condições para a manutenção do protegido de Renan na presidência. Fê-lo através da desmoralização do dito Conselho, evidenciada no menosprezo a qualquer escrúpulo de respeito às regras mínimas de decoro e de tramitação judicial.
Tangidas a princípio pelo temor de represálias – no discurso de Sarney, o da abertura das hostilidades, em que disse ser a crise do Senado e não dele - as bancadas, faltas de lideranças consistentes e determinadas, nunca souberam amalgamar-se em unidade de negação ao presidente de escândalos em cascata. Tudo acabou, por fim, em estranhas manobras, quando representações contra Sarney e Arthur Virgílio semelharam neutralizar-se.
Voto de louvor caberá sem dúvida ao bravo presidente do Senado que, oscilando entre hábeis táticas de refúgios e negaças (jamais estar presente em momentos de contestação explícita), mostrou não ser por acaso que é desde os anos sessenta praticante convicto de comprovadas técnicas de sobrevivência política.
Assim, se acontecimentos inesperados e para muitos benfazejos não irromperem em cena, nada há de impedir que José Sarney venha à tribuna para pronunciar lamentáveis discursos do jaez do ontem pronunciado, quando teve a coragem de criticar a imprensa, e dizer que são os parlamentares e não a mídia os verdadeiros representantes do povo.
Como sempre, o vice-rei do Nordeste confunde as coisas. Ninguém nega o caráter representativo do Congresso. Tampouco a tarefa dos órgãos de comunicação de veicular as posições da opinião pública. Esta tem a ver com liberdade de expressão, que deve ser sempre preservada e defendida.
Os senhores congressistas devem cuidar do real interesse da Nação e não dos próprios. Não faz bem à democracia que invistam contra os mensageiros da opinião pública.
Se o consenso dos ouvintes da alocução de Sua Excelência serve para algo, será para indicar que Sarney perdeu uma boa ocasião de ficar calado em sua curul.
Primeiro Passo na Derrubada da Censura
No 46º dia da vigência da censura ao Estado de São Paulo, foi afinal tomada a primeira medida para a derrubada da inconstitucional liminar de Dácio Vieira.Não deve ser omitido o fato de que todo o mês de agosto e metade do mês de setembro tenham trascorrido até que o Tribunal de Justiça do Distrito Federal enfim decidisse tomar uma providência: afastar o desembargador Dácio Vieira, que nas palavras do procurador regional da República Osório Silva Barbosa Sobrinho sentara em cima de processo dessa importância.
Por fim, o afastamento de Dácio Vieira foi decretado em sessão secreta do conselho especial do TJ-DF, órgão que reúne os dezesseis desembargadores mais antigos do tribunal. Eles acolheram um dos dois pedidos de suspeição formulados pelos advogados do “Estado”. A manifesta protelação de uma decisão de parte de Vieira contribuíu decerto para que o colegiado não o considerasse imparcial.
A ação será redistribuída para outro desembargador. É de se esperar que o magistrado a quem for cometida a responsabilidade seja não só expedito na prolatação da sentença, senão em igualmente acatar o mandado de segurança em que o jornal pede a anulação da liminar que o proíbe de divulgar os grampos da Polícia Federal.
É mais do que hora que comece a ser rasgado o manto da indevida influência judiciária do Presidente José Sarney e de seu clã. Como se sabe, a censura ao Estadão foi recurso judicial apresentado por Fernando Sarney, suspeito de tráfico de influência, lavagem de dinheiro e remessa ilegal de divisas para o exterior. A obsequiosa censura, outorgada pelo desembargador sobre quem pesam fundadas suspeitas de proximidade com a família Sarney, aconteceu em meio à campanha Fora Sarney , para que Sua Excelência se apeasse da presidência do Senado Federal.
Comentário do Cidadão.
Enquanto se aguarda, com compreensível ansiedade, que seja virada definitivamente a página dessa tentativa inconstitucional de reimplantação judicial da censura, é mister assinalar mais uma mostra de falta de real solidariedade no que concerne ao combate comum contra a censura em todas as suas formas.
Não se deve condenar a censura com o necessário destaque somente nos casos em que ela afete ao órgão de imprensa diretamente atingido. A censura deveria ser encarada como um flagelo que é inimigo de todos os órgãos de comunicação. Cabe reservar-lhe, portanto, seja na sua irrupção, seja no seu combate e eventual supressão, por ser ameaça de cunho geral e irrestrito à liberdade de expressão, realce similar ao que lhe será atribuído pela parte diretamente atingida.
Por conseguinte, mais do que estranheza, merece repúdio o tratamento que foi hoje dado pela Folha de São Paulo à evolução da censura judicial ao seu confrade – e principal rival em São Paulo – O Estado de São Paulo.
Ao invés de chamada de primeira página – como fez O Globo – a Folha optou por enfurnar a matéria em página interna, reservando-lhe risível espaço (também em contrário ao grande jornal do Rio de Janeiro, que destinou meia página ao afastamento do juiz e a assuntos conexos).
A Folha dispõe de um Ombudsman – o que a distingue na imprensa. Parece mais do que oportuno que ele analise no particular o comportamento do jornal.
Por fim, o afastamento de Dácio Vieira foi decretado em sessão secreta do conselho especial do TJ-DF, órgão que reúne os dezesseis desembargadores mais antigos do tribunal. Eles acolheram um dos dois pedidos de suspeição formulados pelos advogados do “Estado”. A manifesta protelação de uma decisão de parte de Vieira contribuíu decerto para que o colegiado não o considerasse imparcial.
A ação será redistribuída para outro desembargador. É de se esperar que o magistrado a quem for cometida a responsabilidade seja não só expedito na prolatação da sentença, senão em igualmente acatar o mandado de segurança em que o jornal pede a anulação da liminar que o proíbe de divulgar os grampos da Polícia Federal.
É mais do que hora que comece a ser rasgado o manto da indevida influência judiciária do Presidente José Sarney e de seu clã. Como se sabe, a censura ao Estadão foi recurso judicial apresentado por Fernando Sarney, suspeito de tráfico de influência, lavagem de dinheiro e remessa ilegal de divisas para o exterior. A obsequiosa censura, outorgada pelo desembargador sobre quem pesam fundadas suspeitas de proximidade com a família Sarney, aconteceu em meio à campanha Fora Sarney , para que Sua Excelência se apeasse da presidência do Senado Federal.
Comentário do Cidadão.
Enquanto se aguarda, com compreensível ansiedade, que seja virada definitivamente a página dessa tentativa inconstitucional de reimplantação judicial da censura, é mister assinalar mais uma mostra de falta de real solidariedade no que concerne ao combate comum contra a censura em todas as suas formas.
Não se deve condenar a censura com o necessário destaque somente nos casos em que ela afete ao órgão de imprensa diretamente atingido. A censura deveria ser encarada como um flagelo que é inimigo de todos os órgãos de comunicação. Cabe reservar-lhe, portanto, seja na sua irrupção, seja no seu combate e eventual supressão, por ser ameaça de cunho geral e irrestrito à liberdade de expressão, realce similar ao que lhe será atribuído pela parte diretamente atingida.
Por conseguinte, mais do que estranheza, merece repúdio o tratamento que foi hoje dado pela Folha de São Paulo à evolução da censura judicial ao seu confrade – e principal rival em São Paulo – O Estado de São Paulo.
Ao invés de chamada de primeira página – como fez O Globo – a Folha optou por enfurnar a matéria em página interna, reservando-lhe risível espaço (também em contrário ao grande jornal do Rio de Janeiro, que destinou meia página ao afastamento do juiz e a assuntos conexos).
A Folha dispõe de um Ombudsman – o que a distingue na imprensa. Parece mais do que oportuno que ele analise no particular o comportamento do jornal.
terça-feira, 15 de setembro de 2009
Suspensa a Farra das Cassações
O Ministro Eros Grau, do Supremo Tribunal Federal, concedeu liminar à ação intentada por cinco partidos (PDT, PMDB, PRTB, PPS e PR), com efeito imediato de suspender a tramitação de pelo menos 77 processos em curso no Tribunal Superior Eleitoral. Tais processos pedem a cassação de governadores, senadores e deputados federais.
A liminar concedida pelo Ministro Grau vale apenas para os processos que se tenham originado no TSE, e que, portanto, não se hajam iniciado nos Tribunais Regionais Eleitorais.
Dentre os processos suspensos pelo Ministro, se acham três contra a novel Governadora Roseana Sarney (Maranhão) e um contra o Governador de Sergipe, Marcelo Deda.
A decisão do Ministro Eros Grau irá agora ao plenário do Supremo Tribunal Federal. Se o STF confirmar a liminar, governadores cassados anteriormente pelo TSE – v.g., Jackson Lago (Maranhão) e Marcelo Miranda (Tocantins) – poderão contestar o resultado do precedente julgamento.
Dentre as sentenças do TSE, provocou espécie a concessão da governança do Maranhão à senadora Roseana Sarney, filha do Presidente do Senado, José Sarney. Anteriormente, outra incrível sentença do TSE despojara da governança do Amapá a João Capiberibe, cassado por dois votos de eleitores supostamente comprados a R$ 24.00! Para honra de seu nome, o Ministro Sepúlveda Pertence se dissociara de tão escandalosa decisão.
Assinale-se, por oportuno, que o TSE, sob a presidência do Ministro Ayres Britto, outorgou o governo do Maranhão, ao arrepio da vontade do eleitorado, a Roseana, a segunda colocada no pleito. Não se cingiu, por conseguinte, como devera, a cancelar o resultado, e convocar nova eleição (como se procederia no caso de Marcelo Miranda, do Tocantins). A esse respeito, semelha oportuno citar a declaração do professor Marco Antonio Villa: “No Maranhão, Sarney deu um golpe de estado com o auxílio do Tribunal Superior Eleitoral (sua filha Roseana assumiu o governo). É algo absurdo! Nunca vi isso. A derrubada de Jackson Lago é algo gravíssimo para a democracia brasileira. E houve um silêncio nacional.”
Com efeito, no caso do Maranhão o TSE foi muito além do que caberia à instância judicial. Não se limitou a cassar Jackson Lago. Pela mesma decisão, procedeu a gritante intervenção judiciária, eis que houve por bem designar para a governança a candidata Roseana Sarney, rejeitada no pleito pela maioria do eleitorado maranhense.
Se não houve reação da opinião pública nacional diante desta estranha decisão, não se pode dizer o mesmo das expectativas despertadas pela manifesta judicialização do processo político. Na verdade, agindo como agiu o TSE presidido por Ayres Britto, se abria na prática para todos os candidatos derrotados por esses brasis afora, a perspectiva de um terceiro round, em que a vontade soberana do povo de cada estado da Federação poderia ser anulada por um colegiado de sete Ministros.
O açodamento dos 77 processos - que a liminar do Ministro Eros Grau em boa hora deteve – responde a um desvirtuamento do processo de revisão judiciária. Ao invés de correção de eventuais excessos nas eleições, o apelo ao tapetão como instância decisória se amiudava a ponto de lançar fundadas dúvidas à própria admissibilidade de tais recursos.
Com a palavra o plenum do Supremo Tribunal Federal, para que a Nação saiba do destino da farra das cassações.
A liminar concedida pelo Ministro Grau vale apenas para os processos que se tenham originado no TSE, e que, portanto, não se hajam iniciado nos Tribunais Regionais Eleitorais.
Dentre os processos suspensos pelo Ministro, se acham três contra a novel Governadora Roseana Sarney (Maranhão) e um contra o Governador de Sergipe, Marcelo Deda.
A decisão do Ministro Eros Grau irá agora ao plenário do Supremo Tribunal Federal. Se o STF confirmar a liminar, governadores cassados anteriormente pelo TSE – v.g., Jackson Lago (Maranhão) e Marcelo Miranda (Tocantins) – poderão contestar o resultado do precedente julgamento.
Dentre as sentenças do TSE, provocou espécie a concessão da governança do Maranhão à senadora Roseana Sarney, filha do Presidente do Senado, José Sarney. Anteriormente, outra incrível sentença do TSE despojara da governança do Amapá a João Capiberibe, cassado por dois votos de eleitores supostamente comprados a R$ 24.00! Para honra de seu nome, o Ministro Sepúlveda Pertence se dissociara de tão escandalosa decisão.
Assinale-se, por oportuno, que o TSE, sob a presidência do Ministro Ayres Britto, outorgou o governo do Maranhão, ao arrepio da vontade do eleitorado, a Roseana, a segunda colocada no pleito. Não se cingiu, por conseguinte, como devera, a cancelar o resultado, e convocar nova eleição (como se procederia no caso de Marcelo Miranda, do Tocantins). A esse respeito, semelha oportuno citar a declaração do professor Marco Antonio Villa: “No Maranhão, Sarney deu um golpe de estado com o auxílio do Tribunal Superior Eleitoral (sua filha Roseana assumiu o governo). É algo absurdo! Nunca vi isso. A derrubada de Jackson Lago é algo gravíssimo para a democracia brasileira. E houve um silêncio nacional.”
Com efeito, no caso do Maranhão o TSE foi muito além do que caberia à instância judicial. Não se limitou a cassar Jackson Lago. Pela mesma decisão, procedeu a gritante intervenção judiciária, eis que houve por bem designar para a governança a candidata Roseana Sarney, rejeitada no pleito pela maioria do eleitorado maranhense.
Se não houve reação da opinião pública nacional diante desta estranha decisão, não se pode dizer o mesmo das expectativas despertadas pela manifesta judicialização do processo político. Na verdade, agindo como agiu o TSE presidido por Ayres Britto, se abria na prática para todos os candidatos derrotados por esses brasis afora, a perspectiva de um terceiro round, em que a vontade soberana do povo de cada estado da Federação poderia ser anulada por um colegiado de sete Ministros.
O açodamento dos 77 processos - que a liminar do Ministro Eros Grau em boa hora deteve – responde a um desvirtuamento do processo de revisão judiciária. Ao invés de correção de eventuais excessos nas eleições, o apelo ao tapetão como instância decisória se amiudava a ponto de lançar fundadas dúvidas à própria admissibilidade de tais recursos.
Com a palavra o plenum do Supremo Tribunal Federal, para que a Nação saiba do destino da farra das cassações.
segunda-feira, 14 de setembro de 2009
A Fábula do Fantástico
Desde algum tempo me assaltou uma dúvida sobre as perspectivas do Fantástico, programa dominical da Rede Globo, e que acompanha os teslespectadores desde os tempos da ditadura militar.
A fórmula do Fantástico era a de manter a audiência no domingo, a partir das oito horas da noite, a despeito de não haver nesse dia nem jornal nacional, nem novelas para prender a atenção do público. O grande desafio era evitar o horror dos baixos índices de Ibope, na indiferença dos enormes percentuais de aparelhos desligados.
O esquema terá funcionado por muitos anos. Foram os áureos tempos de Glória Maria e Pedro Bial. Depois, por evidente incompatibilidade de temperamento do casal, Zeca Camargo seria efetivado. Pouco mais tarde, Glória Maria pediu para sair, e veio a musa do Veríssimo, Patrícia Poeta.
Sangue novo para o velho programa ? Apesar da simpatia de Glória, muitos acharam que a vinda da doce Patrícia seria uma injeção de novos encantos em um cansado espetáculo de variedades.
E, no entanto, com o passar das semanas, as minhas inquietudes quanto à saúde do Fantástico, ao invés de diminuirem, aumentaram.
A princípio, me pareceu estranho o arranjo de não determinar um horário fixo para lançar na telinha o Fantástico. Por que espichar o programa do Faustão, com as suas sádicas videocassetadas, e não começar no horário das oito o show da Patrícia Poeta ?
Por mais que resistisse à ideia, a suspeita era de que só o Faustão, na guerra com as concorrentes, poderia reter a audiência. Nessa hipótese catastrófica, fazer o Fantástico entrar na hora aprazada seria um desastre... no Ibope.
Devo confessar aos meus leitores que não tenho assinatura do Ibope, nem me é dado acesso às suas tabelas de audiência.
No entanto, se tenho a televisão ligada, procuro ser um telespectador atento. Certos fatos e circunstâncias, por se repetirem, me intrigaram. Além da abertura do programa não ter hora marcada, começaram a aparecer outros sinais que não me tranquilizaram.
Assim, em horas presumidas de alta audiência na Rede Globo, se amiudaram as chamadas com Patrícia Poeta e seu acompanhante (Zeca Camargo ou Tadeu Schmidt). A visão de Patrícia será sempre agradável mas as aparições tinham aquele jeito embaraçoso de visita de primos pobres ao primo rico. Tomando carona nas altas audiências dos fins de novela davam a impressão de mendigar um pouco daquela atenção toda para o seu programinha dominical.
Poderia ter dúvidas quanto ao acerto de minhas suposições,mas a chamada até no jogo Brasil xArgentina, e o olhar maroto do Galvão Bueno, me convenceu de que a situação do Fantástico, em termos de audiência, devia beirar o desesperador.
Já chamaram esse programa de revista de variedades. Ora, não é necessário ser cliente do Ibope para saber que passou o tempo dessas revistas. Lembram-se de Cruzeiro, Manchete, Life, Paris-Match ? Ou já se foram, ou estão nas últimas convulsões de tiragem.
Será que soou também a hora do Fantástico ?
Que me desculpe a poderosa Rede Globo e o embaraçado silêncio de tantos que a temem, mas, na minha modesta condição de telespectador, me parece que o rei está nu em matéria de audiência.
Talvez esteja na hora de desistir das tentativas desesperadas de ressuscitar um Fantástico com sinais vitais bastante fracos e partir para outra.
A fórmula do Fantástico era a de manter a audiência no domingo, a partir das oito horas da noite, a despeito de não haver nesse dia nem jornal nacional, nem novelas para prender a atenção do público. O grande desafio era evitar o horror dos baixos índices de Ibope, na indiferença dos enormes percentuais de aparelhos desligados.
O esquema terá funcionado por muitos anos. Foram os áureos tempos de Glória Maria e Pedro Bial. Depois, por evidente incompatibilidade de temperamento do casal, Zeca Camargo seria efetivado. Pouco mais tarde, Glória Maria pediu para sair, e veio a musa do Veríssimo, Patrícia Poeta.
Sangue novo para o velho programa ? Apesar da simpatia de Glória, muitos acharam que a vinda da doce Patrícia seria uma injeção de novos encantos em um cansado espetáculo de variedades.
E, no entanto, com o passar das semanas, as minhas inquietudes quanto à saúde do Fantástico, ao invés de diminuirem, aumentaram.
A princípio, me pareceu estranho o arranjo de não determinar um horário fixo para lançar na telinha o Fantástico. Por que espichar o programa do Faustão, com as suas sádicas videocassetadas, e não começar no horário das oito o show da Patrícia Poeta ?
Por mais que resistisse à ideia, a suspeita era de que só o Faustão, na guerra com as concorrentes, poderia reter a audiência. Nessa hipótese catastrófica, fazer o Fantástico entrar na hora aprazada seria um desastre... no Ibope.
Devo confessar aos meus leitores que não tenho assinatura do Ibope, nem me é dado acesso às suas tabelas de audiência.
No entanto, se tenho a televisão ligada, procuro ser um telespectador atento. Certos fatos e circunstâncias, por se repetirem, me intrigaram. Além da abertura do programa não ter hora marcada, começaram a aparecer outros sinais que não me tranquilizaram.
Assim, em horas presumidas de alta audiência na Rede Globo, se amiudaram as chamadas com Patrícia Poeta e seu acompanhante (Zeca Camargo ou Tadeu Schmidt). A visão de Patrícia será sempre agradável mas as aparições tinham aquele jeito embaraçoso de visita de primos pobres ao primo rico. Tomando carona nas altas audiências dos fins de novela davam a impressão de mendigar um pouco daquela atenção toda para o seu programinha dominical.
Poderia ter dúvidas quanto ao acerto de minhas suposições,mas a chamada até no jogo Brasil xArgentina, e o olhar maroto do Galvão Bueno, me convenceu de que a situação do Fantástico, em termos de audiência, devia beirar o desesperador.
Já chamaram esse programa de revista de variedades. Ora, não é necessário ser cliente do Ibope para saber que passou o tempo dessas revistas. Lembram-se de Cruzeiro, Manchete, Life, Paris-Match ? Ou já se foram, ou estão nas últimas convulsões de tiragem.
Será que soou também a hora do Fantástico ?
Que me desculpe a poderosa Rede Globo e o embaraçado silêncio de tantos que a temem, mas, na minha modesta condição de telespectador, me parece que o rei está nu em matéria de audiência.
Talvez esteja na hora de desistir das tentativas desesperadas de ressuscitar um Fantástico com sinais vitais bastante fracos e partir para outra.
domingo, 13 de setembro de 2009
Colcha de Retalhos XXI
Golpe em Honduras : Posição americana
Cresce o isolamento do governo Micheletti em Honduras. Para sinalizar a própria insatisfação com a pouca disposição dos golpistas hondurenhos em chegar a acordo, de forma a possibilitar a reassunção do Presidente José Manuel Zelaya (afastado do poder em 28 de junho último), o Departamento de Estado revogou os vistos concedidos ao Presidente Roberto Micheletti e aos catorze juízes da Suprema Corte. É, com efeito, da parte do Judiciário de Honduras que se verifica talvez a maior resistência à viabilização da volta de Zelaya à presidência.
Nessa saraivada de anulações de vistos foi também incluído o do atual Ministro do Exterior, Carlos López. A esse propósito, semelha oportuno assinalar que a chamada elite dominante centro-americana considera não só evidência de status, mas também indispensável instrumento dispor de visto diplomático para o ingresso nos Estados Unidos.
Por isso, a revogação do visto pelo Governo estadunidense é havida como verdadeira capitis diminutio. Além de significar sério desprestígio, essa camada de centro-americanos a interpreta como limitação de peso, tal é o seu desejo de frequentar e, sobretudo, comprar na metrópole americana.
Tal iniciativa do State Department não se afigura, portanto, como algo de somenos importância.
Mais até do que o simultâneo corte, pela governamental Millenium Corporation, de onze milhões de dólares aplicado na ajuda prestada à Honduras, a revogação dos vistos sinalizará para o grupo de Micheletti de que não mais poderá contar a relativa moderação da Administração Obama, evidenciada até o presente.
Nesse sentido, torna-se muito mais provável que tanto a OEA, quanto o mediador Oscar Arias encontrem doravante maior flexibilidade de parte do governo golpista.
Irã: Ameaças do Líder Khamenei
A crescente identificação do Supremo Líder Ayatollah Ali Khamenei com seu subordinado na teocracia iraniana, o Presidente Mahmoud Ahmadinejad, é desenvolvimento, decerto previsível – após o pronto e despejado apoio à reeleição fraudulenta de Ahmadinejad – que porém sinaliza igualmente, por sua modificação de postura, o relativo enfraquecimento do Supremo Lider.
Com efeito, consoante o modelo instituído pelo Imã Khomeini, na teocracia iraniana, o Líder pairava acima da política, desempenhando o papel de árbitro in extremis.
Ao descer para a refrega, Khamenei se torna o mais alto representante da facção conservadora. Nesse sentido, Khamenei, cuja ascensão política ao topo da hierarquia iraniana sinaliza a própria fraqueza intelectual e doutrinal junto ao estamento teológico de Kom, se torna na prática refém dos segmentos interessados na manutenção da face conservadora e repressora do poder, em detrimento de sua feição democrática, consubstanciada na adesão de camadas popular e estudantil, no que representou o aspecto dual da democracia clerical iraniana.
Despojando-se da ficção de imparcialidade, Khamenei veio a público no ritual sermão da sexta-feira (o dia santo para os muçulmanos) para ameaçar os líderes oposicionistas – leia-se Mehdi Karroubi, antigo presidente do Parlamento, e Mir Hussein Moussavi, ex-primeiro ministro e o candidato espoliado na eleição de doze de junho – de ‘resposta áspera’ se continuarem a desafiar o establishment islâmico.
Tal advertência foi interpretada como ameaça de prisão de Karroubi e Moussavi, o que implicará em agravamento da crise, com consequências imprevisíveis. A notar que os esbirros da segurança política já fecharam os escritórios de Karroubi e Moussavi, além de prender os seus principais assessores.
Sabedor da própria intrínseca fraqueza dos tiranos, Khamenei afirmou que “o sistema tolera diferentes opiniões desde que não haja falsas acusações, boatos e mentiras”. Dentro desse nervosismo, o líder supremo anunciou que não se há de tolerar que a oposição instrumentalize para os próprios fins a última sexta-feira do mês de Ramadã, ao ensejo do tradicional comício de respaldo ao movimento palestino.
Os manifestantes que apoiam Moussavi indicaram que pretendem comparecer ao comício usando roupas de cor verde, que é marca registrada das multidões de partidários do candidato derrotado, em seus protestos contra a fraude do sistema.
Na mesma linha, o clérigo Karroubi, que tem sido bastante ativo em expressar a respectiva discordância da linha Khamenei-Ahmadinejad, prometeu igualmente participar da manifestação.
(Fonte: International Herald Tribune)
Cresce o isolamento do governo Micheletti em Honduras. Para sinalizar a própria insatisfação com a pouca disposição dos golpistas hondurenhos em chegar a acordo, de forma a possibilitar a reassunção do Presidente José Manuel Zelaya (afastado do poder em 28 de junho último), o Departamento de Estado revogou os vistos concedidos ao Presidente Roberto Micheletti e aos catorze juízes da Suprema Corte. É, com efeito, da parte do Judiciário de Honduras que se verifica talvez a maior resistência à viabilização da volta de Zelaya à presidência.
Nessa saraivada de anulações de vistos foi também incluído o do atual Ministro do Exterior, Carlos López. A esse propósito, semelha oportuno assinalar que a chamada elite dominante centro-americana considera não só evidência de status, mas também indispensável instrumento dispor de visto diplomático para o ingresso nos Estados Unidos.
Por isso, a revogação do visto pelo Governo estadunidense é havida como verdadeira capitis diminutio. Além de significar sério desprestígio, essa camada de centro-americanos a interpreta como limitação de peso, tal é o seu desejo de frequentar e, sobretudo, comprar na metrópole americana.
Tal iniciativa do State Department não se afigura, portanto, como algo de somenos importância.
Mais até do que o simultâneo corte, pela governamental Millenium Corporation, de onze milhões de dólares aplicado na ajuda prestada à Honduras, a revogação dos vistos sinalizará para o grupo de Micheletti de que não mais poderá contar a relativa moderação da Administração Obama, evidenciada até o presente.
Nesse sentido, torna-se muito mais provável que tanto a OEA, quanto o mediador Oscar Arias encontrem doravante maior flexibilidade de parte do governo golpista.
Irã: Ameaças do Líder Khamenei
A crescente identificação do Supremo Líder Ayatollah Ali Khamenei com seu subordinado na teocracia iraniana, o Presidente Mahmoud Ahmadinejad, é desenvolvimento, decerto previsível – após o pronto e despejado apoio à reeleição fraudulenta de Ahmadinejad – que porém sinaliza igualmente, por sua modificação de postura, o relativo enfraquecimento do Supremo Lider.
Com efeito, consoante o modelo instituído pelo Imã Khomeini, na teocracia iraniana, o Líder pairava acima da política, desempenhando o papel de árbitro in extremis.
Ao descer para a refrega, Khamenei se torna o mais alto representante da facção conservadora. Nesse sentido, Khamenei, cuja ascensão política ao topo da hierarquia iraniana sinaliza a própria fraqueza intelectual e doutrinal junto ao estamento teológico de Kom, se torna na prática refém dos segmentos interessados na manutenção da face conservadora e repressora do poder, em detrimento de sua feição democrática, consubstanciada na adesão de camadas popular e estudantil, no que representou o aspecto dual da democracia clerical iraniana.
Despojando-se da ficção de imparcialidade, Khamenei veio a público no ritual sermão da sexta-feira (o dia santo para os muçulmanos) para ameaçar os líderes oposicionistas – leia-se Mehdi Karroubi, antigo presidente do Parlamento, e Mir Hussein Moussavi, ex-primeiro ministro e o candidato espoliado na eleição de doze de junho – de ‘resposta áspera’ se continuarem a desafiar o establishment islâmico.
Tal advertência foi interpretada como ameaça de prisão de Karroubi e Moussavi, o que implicará em agravamento da crise, com consequências imprevisíveis. A notar que os esbirros da segurança política já fecharam os escritórios de Karroubi e Moussavi, além de prender os seus principais assessores.
Sabedor da própria intrínseca fraqueza dos tiranos, Khamenei afirmou que “o sistema tolera diferentes opiniões desde que não haja falsas acusações, boatos e mentiras”. Dentro desse nervosismo, o líder supremo anunciou que não se há de tolerar que a oposição instrumentalize para os próprios fins a última sexta-feira do mês de Ramadã, ao ensejo do tradicional comício de respaldo ao movimento palestino.
Os manifestantes que apoiam Moussavi indicaram que pretendem comparecer ao comício usando roupas de cor verde, que é marca registrada das multidões de partidários do candidato derrotado, em seus protestos contra a fraude do sistema.
Na mesma linha, o clérigo Karroubi, que tem sido bastante ativo em expressar a respectiva discordância da linha Khamenei-Ahmadinejad, prometeu igualmente participar da manifestação.
(Fonte: International Herald Tribune)
sábado, 12 de setembro de 2009
Das Alianças e Andanças do Caudilho Chávez
Segundo informam os meios de comunicação, o quase-ditador Coronel Hugo Chávez Frias - que, dentro da linhagem de tantos predecessores seus, almeja tranformar-se em Presidente perpétuo da Venezuela, - empreendeu mais um dos seus triunfais périplos. Essas viagens costumam ser abertas confissões da opção ideológico-autoritária do caudilho e, com exceção que confirma a regra, não trouxeram surpresas pelo menos neste aspecto.
De início, Chávez foi abraçar o velho amigo Coronel Kadafi – que trajava branco uniforme ad-hoc desenhado – por ocasião da comemoração do quadragésimo aniversário da deposição do esquecido Rei Idris (que, em má hora, decidira viajar para o exterior, com árabe comitiva). A seguinte democracia adjetivada do programa seria o pobre Irã, do Supremo Líder Khamenei e do efusivo amigo Ahmadinejad.
Decerto o coronel Chávez – a exemplo de seu predecessor Carlos Andrés Perez, contra quem o então ambicioso tenente-coronel intentara um golpe que, embora malogrado, o ajudaria a galgar a escadaria do poder - tem vocação peripatética. Viaja muito, o que pode lhe criar problemas, como, e duplamente, se acaba de verificar.
Não importa, eis que as alturas do mando sóem dissipar esses temores. A escala ulterior foi a Rússia de Medvedev e Putin – em termos da chamada hierarquia chinesa a ordem está invertida. Estará sendo arguto o coronel Chávez ao trazer a Rússia para a América do Sul ? Em um jogo de poder que se acha muito acima das veleidades do caudilho venezuelano, a Rússia discretamente estimula esses arroubos.
Tal se insere na complexa relação de Moscou com a superpotência, e serve quiçá como retorsão às mostras de simpatia de Washington para com a Georgia do Presidente Mikhail Saakashvili.
A par da estranheza que as continuadas aquisições de armas russas não deixam de suscitar, é inqualificável a apreciação do estabanado reconhecimento diplomático concedido por Chávez às duas repúblicas da Abkhazia e da Ossétia do Sul. Em glorioso isolamento, o caudilho de Caracas resolve ser o terceiro país no mundo a reconhecer as duas províncias-tampão que, à sombra do urso moscovita, se separaram da Geórgia. No exagero de barretada sem qualquer significado econômico ou geo-político, o pobre Chávez não se dá conta de que faz apenas confrangedora bajulação de vassalo para com o suserano do Kremlin.
A derrota do Presidente Hugo Chávez o leva a Madri, onde lentes impiedosas o pilham a prestar homenagem àquele que, tempos atrás, interrompeu-lhe a logorréia com o famoso ‘por que no te callas ?’.
Podemos acoimar o coronel de muitos defeitos, mas não de falto de esperta inteligência. Soube com destreza engolir o sapo da dita reprimenda, a ponto de rir, em companhia do terno algoz, com a referência ao puxão de orelhas. E agora, nos salões do Palácio da Zarzuela, troca chistes com o soberano.
Terá Chávez pendores monárquicos ? Ou verá com a secreta inveja do candidato a ditador a serena fidalguia que provém de outra linhagem, diversa da de seus amigos arrecém visitados, e que se baseia em esquiva, quase inefável legitimidade ?
De início, Chávez foi abraçar o velho amigo Coronel Kadafi – que trajava branco uniforme ad-hoc desenhado – por ocasião da comemoração do quadragésimo aniversário da deposição do esquecido Rei Idris (que, em má hora, decidira viajar para o exterior, com árabe comitiva). A seguinte democracia adjetivada do programa seria o pobre Irã, do Supremo Líder Khamenei e do efusivo amigo Ahmadinejad.
Decerto o coronel Chávez – a exemplo de seu predecessor Carlos Andrés Perez, contra quem o então ambicioso tenente-coronel intentara um golpe que, embora malogrado, o ajudaria a galgar a escadaria do poder - tem vocação peripatética. Viaja muito, o que pode lhe criar problemas, como, e duplamente, se acaba de verificar.
Não importa, eis que as alturas do mando sóem dissipar esses temores. A escala ulterior foi a Rússia de Medvedev e Putin – em termos da chamada hierarquia chinesa a ordem está invertida. Estará sendo arguto o coronel Chávez ao trazer a Rússia para a América do Sul ? Em um jogo de poder que se acha muito acima das veleidades do caudilho venezuelano, a Rússia discretamente estimula esses arroubos.
Tal se insere na complexa relação de Moscou com a superpotência, e serve quiçá como retorsão às mostras de simpatia de Washington para com a Georgia do Presidente Mikhail Saakashvili.
A par da estranheza que as continuadas aquisições de armas russas não deixam de suscitar, é inqualificável a apreciação do estabanado reconhecimento diplomático concedido por Chávez às duas repúblicas da Abkhazia e da Ossétia do Sul. Em glorioso isolamento, o caudilho de Caracas resolve ser o terceiro país no mundo a reconhecer as duas províncias-tampão que, à sombra do urso moscovita, se separaram da Geórgia. No exagero de barretada sem qualquer significado econômico ou geo-político, o pobre Chávez não se dá conta de que faz apenas confrangedora bajulação de vassalo para com o suserano do Kremlin.
A derrota do Presidente Hugo Chávez o leva a Madri, onde lentes impiedosas o pilham a prestar homenagem àquele que, tempos atrás, interrompeu-lhe a logorréia com o famoso ‘por que no te callas ?’.
Podemos acoimar o coronel de muitos defeitos, mas não de falto de esperta inteligência. Soube com destreza engolir o sapo da dita reprimenda, a ponto de rir, em companhia do terno algoz, com a referência ao puxão de orelhas. E agora, nos salões do Palácio da Zarzuela, troca chistes com o soberano.
Terá Chávez pendores monárquicos ? Ou verá com a secreta inveja do candidato a ditador a serena fidalguia que provém de outra linhagem, diversa da de seus amigos arrecém visitados, e que se baseia em esquiva, quase inefável legitimidade ?
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