quinta-feira, 6 de novembro de 2008

Eleições Americanas - a Vitória de Barack Obama

A grande participação popular na eleição já indicava que segmentos importantes do eleitorado estavam comparecendo maciçamente às urnas, a despeito das condições por vezes bizarras, dadas as longas esperas e a utilização de máquinas obsoletas ou defeituosas. Se jovens e negros, a par de outras minorias, acorreram em massa, o faziam no pressuposto de uma causa por eles julgada importante. Todo esse realce atribuído à eleição considerada histórica, não prenunciava resultados favoráveis ao candidato republicano. A força inercial que levou ao triunfo do candidato democrata obviamente terá neutralizado o dito ‘fator Bradley’, assim como a tática conservadora de atulhar a pauta nos estados com consultas destinadas a favorecer as causas dos republicanos. A par de ser do mesmo partido de um presidente que se despede do segundo mandato com um dos mais baixos índices de aprovação da opinião pública estadunidense, John McCain fez uma campanha algo errática, sempre em busca de um grande tema (issue) que não conseguiu encontrar.
A vitória de Barack Hussein Obama, o senador júnior pelo Estado de Illinois, é importante para a democracia americana. Por primeira vez, um negro chega à Casa Branca. Decerto, não foi eleito presidente por um acaso, ou por decisão abusiva da Corte Suprema, como ocorreu com George W.Bush, em seu primeiro mandato. Arrancou a designação do Partido Democrata, ao cabo de longa e desgastante campanha de primárias, em que enfrentou a senadora por New York, Hillary Clinton. Nesse particular, sua prevalência se deve mais a fatores psico-sociais e políticos, do que propriamente à força dos números, eis que a diferença em votos populares para Hillary foi pequena, ambos colhendo cerca de dezoito milhões de sufrágios.
A quatro de novembro, venceu com 349 delegados (maioria requerida 270), contra 163, de McCain. Além dos estados tradicionalmente democráticos (California, New York), Obama ganhou em estados como Ohio, Pennsilvania, Iowa, Virgínia e até na Flórida que penderam em comícios recentes para o lado republicano.
Obama foi eleito em plataforma centrada no tema da Mudança. No geral, a par de acenar com um término para a desastrosa guerra do Iraque, ele não foi muito específico. Evitou comprometer-se com posições determinadas e, em resultado, recebeu um endosso maciço do eleitorado americano, com 53% dos votos.
Com exceção da Rússia de Dmitri Medvedev/ Vladimir Putin, que o recebeu sem cumprimentos e com ataques verbais frontais aos Estados Unidos, Obama teve no mundo uma acolhida que deve ao seu carisma, à sua promessa de mudança, e, last but not least, à penosa tradição do governo de Bush júnior.
Obama não tem experiência de encargos administrativos. Os mandatos que exerceu até hoje (senador no senado de Illinois, senador federal a partir de 2004) pertencem ao ramo legislativo. Dispõe, no entanto, de ótimas condições de apoio, de início por aquele mítico prazo de confiança, dos cem dias – de que Franklin Delano Roosevelt soube valer-se, em meio à depressão, com maestria -, sem esquecer o domínio democrata do Congresso, com largas maiorias, na Câmara dos Representantes ( 254 democratas contra 173 republicanos) e no Senado, com 56 contra 40. Existem, ainda, no Senado quatro cadeiras indefinidas, e a possibilidade teórica de chegar às sessenta cadeiras, o que blindaria a maioria democrata contra as chamadas ‘fillibusters’, isto é, o prolongamento indefinido do debate, com vistas a inviabilizar a aprovação de uma lei.
O desafio a arrostar não é dos menores – afinal os Estados Unidos e a Europa ora enfrentam crise financeira sem precedentes, que decorreu em grande parte da desregulamentação dos mercados e do benign neglect dos republicanos; a dívida estadunidense já ultrapassou os dez trilhões de dólares; ao contrário dos superavits da Administração Clinton, enormes são os deficits legados pela irresponsável política fiscal de Bush e dos republicanos; a imagem dos Estados Unidos sofre bastante pela chamada política de segurança de Bush, com as guerras do Iraque e do Afeganistão, o despejado emprego da tortura; Guantanamo; a política de avestruz em termos de meio ambiente e do aquecimento global, etc. etc.
Se Barack Obama for prudente em termos de segurança pessoal e se corresponder em boa parte ao crédito de confiança que lhe é aberto, tanto nos Estados Unidos, quanto no mundo afora, ele poderá encetar realmente uma administração histórica, valendo-se da força de que dispõem os governos recém-empossados, e com grande mandato popular. Se tiver a história por mestra, a par de não sujeitar-se a repetir passados erros, poderá abrir janelas, e deixar entrar o ar generoso das boas mudanças. Dentre as providências há muito esperadas, está a derrogação do embargo a Cuba, prorrogado até hoje pela conjunção de imobilismo e mediocridade. Mais uma vez, Roosevelt seria imitado, que restabeleceu, no início de seu primeiro mandato (teve quatro) as relações diplomáticas com a então União Soviética, rompidas desde a revolução de outubro de 1917.

Nenhum comentário: