sexta-feira, 28 de novembro de 2008

Dos Jornais - XXV

Desastres a granel - FOLHA DE S. PAULO de 27.XI.2008

Enchentes em Santa Catarina
. O jornalista Janio de Freitas, em sua coluna na Folha, se reporta à atual calamidade em Santa Catarina, e faz oportuna e pertinente análise sobre a falta de providências preventivas pelo Poder Público, no que concerne a desastres naturais, de que a presente situação no estado de Santa Catarina constitui o exemplo da vez.

Comentário do cidadão. Como ironicamente assinala Janio de Freitas, durante os últimos vinte e cinco anos, “as enchentes cumpriram com regularidade a sua programação anual, concedendo apenas na intensidade variável de suas perversidades”. “Grande parte (desses desastres naturais) seria evitável ou poderia ser atenuada, muitos são objeto de velhos projetos preventivos, mas seguem se repetindo como se fossem uma fatalidade acima do poder humano”. E, em conclusão, põe o articulista o dedo na ferida aberta da inação do Poder Público: a razão é que essas providências se acham. na ótica distorcida e imediatista dos poderes federal, estadual e municipal, “abaixo do poder dos interesses” (meu o grifo). E quais são tais interesses que se sobrepõem na prática ao bem comum ? Segundo Janio de Freitas são “eleitorais, comissionais, negociais”. Nessa visão imediatista, tais interesses teriam prioridade sobre o bem comum, que lida “com vidas irreconhecíveis, por não terem presença social, como classe”.
Em tal contexto de ausência do Estado, em termos de providências preventivas para controlar ou minorar os efeitos das calamidades naturais, o desconforto da autoridade pública diante de tais fenômenos – que vitupera em discursos ocos e sem efeitos práticos, excluidas umas tantas medidas assistencialistas – poderia ser entrevisto na óbvia relutância do Presidente Lula em manifestar pessoalmente a própria solidariedade ao povo catarinense. Como observa J. de Freitas, “só ontem (26 de novembro) se dispôs ao esforço de dar um pulo em Santa Catarina. E assim mesmo porque também ontem recebeu duras críticas por sua distância apática.”
O último presidente da República Velha, Washington Luiz, é muito citado pela assertiva de que “governar é fazer estradas”. Em escala de prioridades, pode-se compreender essa afirmação, no contexto da época de agudas limitações em comunicações viárias. Salta aos olhos que governar não é só construir estradas. Mas, para trazer a questão aos problemas atuais, tampouco o bom governo se restringe à conformidade aos altos superavits primários e ao incremento das despesas de custeio e as de cariz assistencialista.
Não pretendo aqui discriminar as medidas e providências que caracterizam o bom governante. Apenas encareço a paciência do leitor para a referência a umas poucas, que dizem mais de perto respeito ao problema aqui tratado. Muitas dessas medidas e providências não implicam obras nem gastos de vulto, mas sim determinação inequívoca e vontade politica de coibir as eventuais transgressões: reporto-me à ordenação territorial, para combater e prevenir os danos e ameaças da especulação imobiliária nas encostas e em outros acidentes topográficos do interesse de toda a comunidade. Tampouco não é só aos ricos e abastados que se deve impor limites. O mesmo interesse geral incumbe ao poder do Estado não assistir inerte às invasões e ao crescimento descontrolado das favelas. Se tais competências caem sob os poderes municipal e estadual, à União caberia fornecer o aporte necessário para os grandes empreendimentos voltados para a contenção e diminuição dos efeitos negativos das calamidades naturais.
Em outras palavras, ao povo interessaria menos o discurso pós-factual, com as providências assistencialistas que não afetam as possibilidades futuras de repetição do fenômeno natural (presumivelmente de forma mais agressiva, pela inoperância em matéria de controles), e sim programas responsáveis de um Estado moderno, que não encara a natureza de uma forma supostamente resignada e totêmica, mas cuida de atender ao interesse maior da população. O flagelado do vale do Itajaí, ao invés dos abrigos de circunstância e das cestas básicas, preferiria decerto não estar nesta condição e continuar a viver na sua casa, ora levada pela enxurrada. Seria acaso ser ingênuo esperar do poder público – federal, estadual e municipal – que assuma as próprias responsabilidades, e que não se esconda atrás do discurso vazio da ocasional compunção ?

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