A segunda Administração Barack
Obama, ao submeter à aprovação do Senado os nomes dos que, por motivos
voluntários ou não, deverão substituir os antigos ocupantes, dá oportunidade a
que venham à luz traços e características pouco conhecidas do grande público.
O processo de
confirmação das autoridades, que é prerrogativa constitucional do Senado,
presta-se muita vez a essa lavagem de roupa suja, ou até mesmo de discussão de
tópicos especiais, até então, ou não referidos, ou apresentados com pouca
transparência. Há, no entanto, marcadas diferenças entre George W. Bush, o 43º presidente, e Barack H. Obama, o 44º, em termos de lidar com a al-Qaida, e as manifestações do terrorismo internacional.
O Senador júnior pelo Illinois que se tornou o fenômeno eleitoral de 2008, desbancando a senadora Hillary Clinton, que se acreditara ‘dona’ da nomination democrática, construíu a própria plataforma com as tábuas da mudança (change) e da recusa à ruinosa guerra no Iraque.
Sua inexperiência executiva, Obama a pagaria com o shellacking (tunda) da eleição intermediária. Se essa derrota persiste até hoje no domínio republicano da Casa de Representantes (agora por obra e graça do gerrymandering, que por manifesta ilegalidade terá de ser exposto e derrubado pela vendada justiça e não aquela sectária), em outros aspectos, o primeiro presidente afro-americano aprendeu depressa e bem, como o evidenciou no segundo biênio. Nesse sentido, sua reeleição, contra vento e maré, mostrou a importância dos 47% de tomadores (mulheres, latinos, negros e velhos que enfrentaram as odiosas filas urdidas pelo GOP) e a irrelevância propositiva do candidato adversário.
Ora, quando soa a campainha do segundo mandato, campainha que no discurso desta nova posse o povo sentiu estridente, menos difusa e com a afirmação do caminho percorrido e de varridas ilusões. Cumpre não enganar-se com falsas similitudes, mas tampouco buscar disfarçar as verdades da travessia.
Em termos de comprometimento com os menos afortunados, semelha difícil confundir Bush com Obama. Para tanto, bastaria recordar dois desastres naturais, o Katrina, que afundaria o republicano no descrédito e quase no deboche, e Sandy, que fez o democrata interromper a campanha para prodigar-se na ajuda, a ponto de colher o rasgado elogio do governador Chris Christie, que tivera a incumbência, pelo GOP, de encaminhar à Convenção da Flórida a candidatura de Mitt Romney, ex-governador de Massachusetts.
Se Obama não logrou fechar Guantánamo, conforme prometera, tal se deve mais ao choque com as idiossincrasias do processo jurídico americano, do que com a irresolução do presidente. Sem embargo, mesmo o seu crítico liberal mais impiedoso não se animará a cotejá-lo com o antecessor, em termos de método interrogatório.
A eliminação da tortura não é um processo semântico como afetaram pensar os ideólogos da administração anterior. Assim, não basta chamá-la de interrogação incrementada (enhanced interrogation) para fantasiá-la de legalidade.
Por outro lado, a utilização dos drones (aviões não-pilotados) foi objeto de escrutínio cerrado da oposição republicana na audiência senatorial destinada à avaliação de John O. Brennan para a direção da CIA. Silentes durante os anos de Bush agora, fora do governo, censuram o que antes calavam.
Se os ventos mudam conforme as cores da administração, a ambivalência da assertiva não nos deve impedir de confrontar algumas realidades, por incômodas que possam ser.
Como se assinala, durante quatro anos Obama se tem beneficiado, pelo menos em parte, da relutância dos críticos mais virulentos de Bush em censurarem um presidente democrata. Nesse contexto, a ex-governadora Jennifer Granholm, de Michigan asseverou: “Confiamos no Presidente. E se fosse Bush, penso que estaríamos em armas porque não confiaríamos em que atuasse de forma restrita (targeted way)”.
Se a utilização dos drones levanta muitas questões éticas, não se pode confundi-la com aparências ilusórias. Como cotejar o tosco memorandum jurídico de John Yoo, um funcionário do Departamento de Justiça de Bush, que declarava legal a interrogação forçada (harsh interrogation) com o memorandum secreto que autoriza o Presidente Obama a fulminar indivíduos considerados perigosos para a superpotência ?
Antes de adentrarmos esse campo traiçoeiro, seria mister colocar as questões dentro do seu devido contexto. A utilização do drone como todos os atos que se baseiam no conceito da Raison d’Etat, se pode ser discutida teoricamente, levanta considerações práticas, em que o interesse do poder da superpotência marca um distinto e incontrastável limite no exame. Na verdade, o drone corresponde a uma sofisticação tecnológica dentro de uma mesma tática de administrações americanas anteriores. Assim, sob Bill Clinton se utilizaram métodos análogos – para evitar o emprego de tropas no terreno e as eventuais consequências, como no episódio da Somália – com os bombardeios sobre a antiga Iugoslávia, e os mísseis contra Osama bin-Laden (Afeganistão e fábrica suspeita no Sudão).
A suposta timidez de Barack Obama e a sua verdolência em matéria castrense se tornaram de árdua, senão impossível, apresentação por críticos – como o seu antigo adversário John McCain e veterano do Vietnam (com longa passagem pelo cárcere do inimigo) - após a coragem presidencial demonstrada pela operação no Paquistão, com a eliminação física de Osama bin-Laden, feito que escapara do inepto Bush em Bora-bora.
Se é vezo do GOP tentar manchar os presidentes democratas com fragilidades na defesa, o Partido Democrata – e o titular da vez – desde muito cuidaram de tornar patente a sua visão da defesa nacional como tema bipartidário. Não é por acaso que Obama escolhe o republicano moderado Chuck Hagel como seu indicado para Secretário da Defesa.
Que tal agora que amainou a estridência das supostas fraquezas do ex-senador republicano por Nebraska, de virar a página e aprová-lo ?
( Fonte: International
Herald Tribune)
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