terça-feira, 7 de agosto de 2012

Guerra Civil Síria: Perspectivas

                          
       O que significa a defecção do primeiro ministro do governo sírio, Riyad Hijab ? O Departamento de Estado a define como um acontecimento encorajante. Não é só mais uma autoridade de peso que abandona  Bashar al-Assad, mas aquela de mais alto nível.
       Ele se dissocia da administração, que nominalmente chefiava, por não mais querer pertencer a  governo que assassina o próprio povo. De confissão sunita, Hijab era o chefe da administração. A inferência de Washington é a de que a sua defecção representa indicação clara de que o regime de Assad estaria no caminho da saída.
        Os expertos consultados pela CNN concordam com a relevância do fato, mas a partir disso não são tão otimistas quanto aos prováveis ulteriores desenvolvimentos do processo político sírio.
        Hijab não comandava o governo. A administração síria – ou talvez o que resta dela após dezesseis meses da chegada da primavera árabe – tem  estrutura que, grosso modo, lembra a do governo gaulês. No presidencialismo parlamentarista da França, a mais alta autoridade está com o presidente. O segundo nível é representado pelo Primeiro Ministro e seu gabinete. Como toda comparação, não é perfeita, eis que o Premier, na democracia francesa, tem a responsabilidade política perante a Assembleia Nacional, e se ocupa mais diretamente de assuntos internos. Cabe ao Presidente a orientação geral e o interesse especial nos assuntos externos, com ênfase na União Europeia.
       Por isso, a hipótese do State Department  de que a partida de Riyad Hijab é inequívoca indicação de que o regime alauíta está no caminho da saída deveria ser qualificada, no entender  de estudiosos na matéria.
      Na realidade, Riyad Hijab seria o mais alto funcionário da administração, mas segundo os expertos não participaria do núcleo duro do poder na Síria. Dessa maneira, para Andrew Tabler, do Instituto Washington para o Oriente Próximo o poder na Síria está nos serviços de segurança,  exército e  família Assad[1]. Tabler concorda em que a defecção de Hijab é politicamente significativa, por desvelar a erosão política no governo. Sem embargo, aduz que tal ocorrência tem de ser redimensionada, pela mera circunstância de Riyad Hijab não fazer parte do núcleo central do poder.
        Por seu lado, Aram Nerguizian, do Centro de Estudos Estratégicos e Internacionais, posto que substancialmente concorde com a análise de Tabler, é ainda um pouco mais pessimista quanto ao real aporte da saída de Riyad Hijab. Conforme a sua avaliação, o aludido núcleo central do poder na Síria se comporia de catorze pessoas, v.g., o irmão e a irmã de Bashar,os chefes das diversas agências de segurança e os principais comandantes militares.  Por ora, para Nerguizian  não é animador  o fato de que neste círculo alauíta nenhuma defecção haja sido registrada.
         De acordo com essa tese, esse núcleo ainda não apresentaria fissuras, e está empenhado em brutal projeto de sobrevivência política. Na atual situação, com os bombardeios de Alepo e a maciça utilização de artilharia pesada, incluidas as incursões de aviões e helicópteros militares, o regime alauíta parece ter chegado à conclusão de que somente através desse tipo de operações – as quais, com a única exceção da guerra química  já chegam ao extremo em uma conflagração interna – se afiguraria realista a perspectiva da preservação da presente estrutura de poder.
         Se esta é a maior crise enfrentada pelo regime fundado por Hafez al-Assad em 1970, Bashar al-Assad e o núcleo alauíta que o sustenta semelham ainda acreditar na possibilidade de prevalecerem sobre o exército livre sírio e a sua coalizão de rebeldes, que é a expressão do majoritário repúdio da população civil à ditadura dos Assad.
        Resta verificar, por outro lado, até que ponto Vladimir Putin está disposto a continuar apoiando o regime Bashar, dado o óbvio desgaste político decorrente da paralisação por vetos sucessivos das funções precípuas do Conselho de Segurança.
         De qualquer forma, como em todo processo revolucionário, o caráter abrupto do fim costuma colher os especialistas muita vez ainda enredados em elaboradas hipóteses a respeito de imprecisas situações a propósito das quais o respectivo conhecimento só pode cingir-se a sofisticados, complexos mas necessariamente precários palpites.



( Fonte: CNN )          



[1] Esta imbricação no poder se reflete, v.g., no fato de que o irmão Maher é o comandante da principal divisão blindada do exército sirio.

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