Eis o que disse: ‘O Irã não vai permitir que o eixo da resistência, do qual considera a Síria uma parte essencial, seja quebrado de forma alguma. (O levante contra Assad) é um conflito entre o eixo de resistência e os seus inimigos na região e no mundo.’
Deixemos de lado esse suposto ‘eixo de resistência’, que na verdade se reporta à aliança, na guerra de 2006 contra Israel, firmada por Irã, Síria e grupos palestinos em apoio ao movimento xiita Hezbollah. Vangloriar-se na imagem do eixo será cortejar a sorte daqueles que, desconhecendo a tragédia do passado, estão condenados a repeti-las em farsas.
Com efeito, a razão que traz Jalili à conflagrada Síria não se afigura tão altissonante. Ele vem em busca dos 48 iranianos, ditos peregrinos, que caíram em mão da Liga Rebelde.
Malgrado Teerã se apressure em rotulá-los como tal, as suspeitas gerais se voltam a assessores dos serviços de segurança dos ayatollahs. Ter-se-á talvez pensado que as condições na bíblica terra da passagem para o Oriente se confundissem com as da capital do Irã. Lá os basiji – milicia estipendiada pelo poder clerical – e os temidos grupos de segurança seviciam e prendem os demonstrantes pró-liberdade. Nas plagas que foram dos Assad e ora são contestada pela liberdade, a ação da violência bruta já não tem a facilidade dos primeiros tempos, em que pacíficos manifestantes pela democracia eram abatidos com as covardes balas dos homiziados capangas do ditador. Agora é luta renhida, que aos fortes não atemoriza, mas aos fracos agentes das sombras pode criar peças a que não estão acostumados.
É de ver-se a frenética movimentação do governo de Khamenei no transe presente. Esquecidas as tíbias censuras aos eventuais excessos de Bashar al-Assad, o regime dos mullahs se debate em pedidos de intercessão urgente ao Secretário-Geral das Nações Unidas, Ban Ki-moon, solicitação de auxílio temperada com veladas ameaças ao vizinho turco, e fulminações ao Ocidente – o presidente do Parlamento Iraniano, Ali Larijani foi além: ‘o regime americano e alguns países na região são responsáveis por esses crimes. E eles vão receber a resposta.’
Além do palavrório e dos ocos impropérios, Teerã vê alevantar-se o horrendo espectro de uma Síria livre dos Assad, e com a seita alauíta de volta à secundária posição de sua modesta parcela nas religiões do velho país de passagem, antes do golpe de mão do general Hafez al-Assad. Para os aprendizes de feiticeiro da antiga capital de Ciro, será apavorante não ter mais acesso ao movimento terrorista do Hezbollah, com a sua atual ascendência no Líbano, e sobretudo descobrirem-se isolados, sem o gentil conduto proporcionado por Damasco, alegadas vítimas de traiçoeiro golpe dos rivais sunitas, capitaneados pelos reinos da Arábia Saudita e do Qatar, em cordão que não teria a frouxidão e as aberturas ensejadas pelo bom irmão do xiismo, o alauíta Bashar al-Assad.
Entrementes, as deserções aumentam, incham os campos de refugiado na vizinha Turquia, e o horizonte se enegrece sempre mais, defronte do oftalmólogo Bashar e de sua minguante corte de devotados , que assistem aturdidos à fuga desabalada das ratazanas saídas dos porões da nave hoje balançada por procelas e vendavais que lhes espicaçam cruéis o instinto da sobrevivência.
( Fonte: O Globo )
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