segunda-feira, 2 de julho de 2012

Rescaldo da Semana

                                        
 Guerra civil na Síria ?


      Já nasce sem perspectivas o acordo costurado pelo enviado Kofi Annan para pôr em marcha a transição política na Síria. O artificialismo do texto  sequer menciona a participação ou não de Bashar al-Assad e outros integrantes do regime alauíta.
      No caso do Plano de Paz para a Síria, o próprio Annan teve de reconhecer seu fracasso na tribuna da Assembleia Geral. Por imposição russa não se toca na  figura do ditador.
      O imobilismo de Putin impede que se remova a causa principal da virtual guerra civil a alastrar-se pelo território sírio. Ao inviabilizar qualquer recurso com o aval supranacional do Conselho de Segurança pode estender a vida de um regime por um tempo imprecisado. No entanto, o autocrata do Kremlin se engana quanto a sua capacidade taumatúrgica de manter o amigo Bashar no poder.
      Se as mortes aumentam – o macabro marco das dez mil vítimas desde muito foi ultrapassado – o aferrar-se a uma estrutura de que os indícios de colapso avultam, pode ao cabo deixar Moscou sem a base naval em Taurus.
      Por outro lado, o bombardeio que atinge Damasco, a explosão de uma tevê pró-regime e a notícia, ainda não confirmada, de que os rebeldes aprisionaram dois generais, traz um odor  de derrocada, ou de princípio do fim.
     A extrema rigidez de gospodin Vladimir Putin ameaça fazê-lo engolir solucão bastante mais amarga, do que há algumas semanas atrás.
    Assombra, por outro lado, que o experiente Kofi Annan continue a associar o seu nome a textos vagos, que não afrontam o problema. A essa altura do enfrentamento, soa falsa a declaração do ex-secretário-geral das Nações Unidas de que o conflito deva ser resolvido através da negociação pacífica.
    Com a exacerbação das mortes – 93 civis mortos no dia anterior – é de perguntar-se para quem Kofi Annan se está dirigindo.


Mercosul: O que é feito da diplomacia brasileira ?  


    O Itamaraty está atravessando mares encapelados na  crise do Paraguai, com o impeachment de Fernando Lugo, e os consequentes problemas no Mercosul. No passado, sob os mais diversos regimes, a Casa de Rio Branco, depositária de uma política externa secular soube conviver com e resolver árduas questões.
    A premissa básica para que tal missão haja sido cumprida a inteiro contento reside precipuamente no entendimento de pacta sunt servanda (os tratados devem ser cumpridos), a par de profissionalismo baseado no conhecimento do mister e, last but not least, o Itamaraty trata de assuntos de Estado, e não da promoção de projetos politico-partidários.
    Essa característica central de nossa diplomacia, pelo mérito e a competência, na defesa dos interesses nacionais sempre mereceu a aprovação da sociedade civil, e o respeito dos países com quem mantemos relações, a começar pelos nossos vizinhos sul-americanos. Essa tradição itamaratiana foi instrumental para que a Casa de Rio Branco tivesse a missão facilitada pelo reconhecimento de seus títulos como defensora do interesse nacional, que está colocado acima das conveniências e das vaidades partidárias.
    Não é o que deparamos hoje na leitura dos jornais. A propósito da crise – porque de crise se trata - o editorial de O Globo deste domingo se refere  à  Trajetória decadente do Itamaraty”. Por outro lado, o jornalista Elio Gaspari, na Folha de S. Paulo também de domingo, sob o título “Dilma deveria pedir uma aula a FHC”, se reporta a  episódio em que a discreta intervenção diplomática brasileira pôde resolver uma questão paraguaia que se mal conduzida poderia criar situação contrária ao interesse nacional brasileiro.
    Não é incomum encontrar em pessoas com superficiais conhecimentos de diplomacia a impressão de que a  competência do Ministério das Relações Exteriores seria, na verdade, sobre assuntos de fácil solução. Não é o que  ensinam  nosso patrono, o Barão do Rio Branco, nem os diplomatas da diplomacia do Império, para não falar da personalidade de Alexandre de Gusmão, o secretário de D. João V, e o cérebro do Tratado de Madrid, que riscou as fronteiras do Brasil moderno. Como paulista de Santos, ele é com justiça reconhecido como o Precursor da diplomacia brasileira.
    É importante ouvir e seguir o conselho dos profissionais no ofício. A única autoridade no capítulo  será o estudo dos antecedentes e as implicações da eventual questão para o interesse do Estado brasileiro. Atuar  de forma autoritária e tumultuada tão só  agrava o problema, além de correr o risco de agir a reboque de outrem.  Nosso Norte deve ser sempre o interesse do Estado brasileiro.Se o atendermos estaremos bem, porque estaremos construindo ou respeitando formas duráveis em nossas relações.
     Não vamos descambar para a diplomacia de afogadilho. Os aplausos para o Itamaraty não são gratuitos. E nunca se viu um chefe de Estado brasileiro reclamar por ter às suas ordens um organismo preparado para defender os nossos interesses.


( Fontes: O Globo, Folha de S. Paulo )  

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