sexta-feira, 6 de julho de 2012

Notícias do Front (24)

                                   
Relatório final sobre o voo AF-447       


      Não é muito tranquilizante o relatório do Bureau Francês de Investigação e Análise sobre o desastre do voo AF-447, na rota Rio de Janeiro – Paris, na noite de primeiro de junho de 2009. O Airbus A330 transportava 228 pessoas (entre passageiros e tripulantes). Havia entrado na chamada Zona de Convergência inter-tropical. É área de baixa pressão atmosférica e ali se chocam os ventos procedentes dos dois hemisférios. A aeronave da TAM que seguia na mesma rota optou por contornar a área em apreço. Por sua vez, na sua fatídica escolha de rota,  todos morreriam na queda de barriga ,no oceano, do Airbus da Air France.
     Depois de quatro longas buscas, a despeito da grande profundidade do oceano no sítio do acidente, foi possível localizar a maior parte dos destroços da aeronave, assim como a maioria dos corpos.  As caixas pretas com a gravação das vozes da cabine de comando, e o gravador dos dados do voo só foram recuperados do abismo oceânico em maio de 2011.
     Os problemas do AF-447 se iniciaram quando os tubos pitot – que formam sistema utilizado para determinar a velocidade de voo – tiveram os sensores bloqueados por cristais de gelo. Com esta falha, desconectou-se  o piloto automático. Embora o relatório não trate precipuamente de apontar a responsabilidade pelo desastre - que está sendo objeto de um inquérito judiciário independente - o relatório não deixa de assinalar que os pilotos não souberam como reagir diante do que estava acontecendo e para o qual não tinham sido treinados.
     Segundo o relatório, ‘a ocorrência da falha no quadro de um voo de cruzeiro surpreendeu por completo a tripulação’. Nesse sentido, os pilotos manipularam de forma excessiva os comandos da aeronave, o que desestabilizou a rota de voo e provocou ulterior série de confusas leituras. ‘No primeiro minuto após o desligamento do piloto automático, o fracasso da tentativa de entender a situação e a quebra (disruption) na cooperação da tripulação tiveram um efeito multiplicador, induzindo à perda total de controle cognitivo sobre a situação.’
     O Airbus 350 entrou em um contínuo stall[1], o que foi sinalizado por um aviso gravado, a par de movimentos bruscos da aeronave (buffeting).
     Malgrado tais persistentes sintomas, a tripulação nunca entendeu que se achava em situação de stall, e por isso não tomou as providências pertinentes. A resposta dos pilotos foi acionar os comandos para elevar o nariz da aeronave, ao contrário de abaixá-lo, de forma a que recuperasse a sustentabilidade.
     O relatório conforme divulgado não trata da ausência do comandante quando a crise se manifestou, com o desligamento do piloto automático. Em espaço de tempo de três minutos e meio – a duração da queda do Airbus – ele foi chamado de urgência, mas pelo visto, além de gritar para os co-pilotos a iminência do desastre, não teve tempo útil para tentar controlar a situação. Assinale-se que nenhum aviso foi feito para os passageiros.
         O relatório leva a interpretar que o acidente foi causado pela falta de treinamento dos pilotos para uma situação de desligamento do piloto automático. Traumatizados por processo bastante rápido – e agravado por manobras inadequadas – sem conhecimento de crises como a configurada na altitude de 38 mil pés, a sua atabalhoada reação foi instrumental para a ocorrência do desastre, que, no entender do especialista Richard Quest, da CNN, ‘nunca deveria ter acontecido’.
         Foi a chamada falha humana, a que colaborou  equipamento já sabido como passível de deficiências, como de fato ocorreu com os sensores  pitot, para medir a velocidade do avião.  



Cresce o Autoritarismo na Ucrânia   


      Se o certamen da Copa Europeia, realizado por Ucrânia e Polônia, não rendeu para o governoYanukovich os esperados benefícios, por causa da perseguição judicial à chefe da oposição, Yulia Timoshenko, há outros acontecimentos que tendem a afastar a Ucrânia de maior integração com a Europa ocidental e democrática.
      Com efeito, a aprovação de afogadilho em  sessão noturna do Parlamento do russo como segundo idioma do país está na contramão de suposta tendência de aproximação com Bruxelas.
     Decerto a aprovação do russo também como língua oficial debilita um elemento importante para o reforço da nacionalidade ucraniana. Em diversas regiões do país o russo constitui a lingua franca. Se para os assuntos oficiais em diversas áreas administrativas os ucranianos podem utilizar o russo, não há o consequente incentivo para que em diversas regiões os habitantes tenham de empregar o idioma nacional.
    Dado o caráter permissivo da nova legislação – o russo ganha status  regional se 10% da população na área o emprega como língua materna - , será previsível o prejuízo a ser provocado para o nacionalismo ucraniano.
    Aprovada em sessão noturna, sem que muitos dos deputados sequer ouvissem a convocação, as características do processo levaram o presidente do Parlamento a renunciar. Para que o referido projeto se torne lei, carece de ser assinado pelo Presidente Viktor Yanukovich (o que não semelha em dúvida), mas também pelo presidente da assembleia, Volodymyr Lytvyn. Como este último renunciou, a validade da lei ficaria pendente da segunda assinatura.
    É difícil entender o que almeja o Presidente Yanukovich. Os seus esforços para aproximar-se da União Europeia, ele próprio os tem inviabilizado por práticas ditatoriais, como a perseguição judicial à líder da oposição e agora o enfraquecimento de um dos símbolos da nacionalidade, que é o de dispor de idioma próprio de uso corrente por toda a população. 
    Acenando para Bruxelas, Yanukovich no entanto se vai acercando dos vizinhos Vladimir Putin na Rússia, e Aleksandr Lukashenko, na Bielo-Rússia. Como política é paradoxal, e tende a reforçar a interpretação de que entre os ganhos da abertura comercial e a alegada segurança da via autocrática, prepondera em Viktor Yanukovich o apego ao poder discricionário que ora exibem, em gradações diversas, os dois regimes do Leste.
 


As muitas razões do apoio de Putin a Bashar al-Assad


        O New York Times faz considerações interessantes sobre os motivos da sustentação de Vladimir Putin ao Presidente da Síria. A análise semelha importante, porque se tal não apoio inexistisse, outra seria a situação em Damasco.
         É sobejamente conhecida a antiga aliança  entre Damasco e Moscou. Ela se traduz em intercâmbio de monta para a Síria, sendo a Rússia a principal fornecedora das forças armadas do regime alauíta. A base naval de Taurus, no Mediterrâneo oriental, tem particular relevância para o Kremlin, por ser a única da marinha de guerra russa em águas quentes.  Escusado notar que tal base é a jóia da coroa na relação russo-síria, com importância estratégica para a Rússia.
         Para a sustentação dada por Moscou a Damasco, a edição internacional daquele jornal aporta outro argumento para o apoio de Putin a Bashar al-Assad. A especial visão geopolítica do Kremlin, em que líderes pró-Moscou foram afastados nas revoluções coloridas do início dos anos 2000, em favor do Ocidente, só acentuou a desconfiança de Putin com tal suposta interferência. Essa postura dataria das lutas na Europa oriental em prol da democracia, e do afastamento da então suzerania soviética.
        Consoante tal interpretação, o jovem Putin defendeu o quartel-general da KGB em Dresden contra sublevadas multidões alemãs. Essa postura só se exacerbou com as chamadas ‘revoluções coloridas’ do novo milênio. Dentro desse enfoque reducionista, a liderança russa viu os levantes árabes não como produto de mudança social, mas como produto da interferência de Ocidente, com o intento de atingir a Rússia.
       Com a queda de Muammar Kaddafi, atribuída por Moscou aos bombardeios da OTAN e a licença concedida pelas Nações Unidas, o governante russo cuidou que o ‘erro’ anterior não se repetisse no que tange ao amical regime alauíta.
      Sem embargo, o próprio Vladimir Putin e o seu Ministro do Exterior Sergei Lavrov são realistas. Se o apoio a Bashar al-Assad estará contingente à realidade no terreno – e são múltiplos os sinais contrários – o Kremlin tudo fará para que a transição seja a mais lenta possível.
      Em termos de Realpolitik Moscou se aferra ao antigo aliado, com quem tem relação político-estratégica de mútuo interesse. No entanto, Putin conhece o seu manual e não ignora o que possa significar estender demasiado a corda, para um regime agônico.  
       Como assinala o jornal, é uma árdua escolha. Nela pesa a experiência da juventude, em que, há duas décadas, cercado por multidões hostis, o atribulado agente da KGB  passara dias difíceis no quartel-general em Dresden, a queimar papéis que representavam anos de trabalho.




( Fontes: O Globo, International Herald Tribune )



[1] Fenômeno físico, em que a aeronave perde sustentação e inicia a queda.

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