Segundo as últimas prévias, os percentuais de Barack Obama e Mitt Romney,
ao se aproximarem das respectivas convenções e da arrancada final para as urnas
de seis de novembro, assinalam um equilibrio entre os dois candidatos. Depois
de longa fase em que o presidente se distanciava do contendor republicano com
diferenças de um dígito, os cerca de
quatro meses que ainda restam apontam para um virtual empate entre os dois
adversários.
Os prenúncios seriam de uma eleição
bastante apertada, e nesse sentido os especialistas vem revendo similares
pleitos no passado, como os embates entre Truman
e Dewey, em 1948, Kennedy e Nixon, em 1960, e o de Nixon e Humphrey, em 1968. Tendo presente a acirrada disputa, e a palavra final dada ao voto eleitoral – a vitória no voto popular total não se traduz em conquista da presidência, de que Al Gore, em 2000, constitui eloquente exemplo, pois distanciou em mais de quinhentos mil votos de George Bush na votação nacional, para perder no voto eleitoral, por causa da Flórida – as atuais duas candidaturas têm priorizado um grupo de dez estados, os chamados swing states em que está em aberto se vão pender para Obama ou Romney.
Assim, os maiores fundos de propaganda são descarregados nos estados de Michigan, Colorado, Flórida, Iowa, Carolina do Norte, New Hampshire, Nevada, Ohio, Pennsilvania e Virginia.
Determinada a presidência pela maioria no colégio eleitoral, não tem nenhum significado para a conquista da presidência que a vantagem em um estado seja de um dígito, ou de um milhão. É a maioria simples que determina a transferência em bloco de todos os votos eleitorais (de um estado determinado), que correspondem ao peso político e congressual dessa unidade dos Estados Unidos para o candidato que tiver a supremacia numérica.
Por isso, apesar de importantes pelo número de votos eleitorais, o GOP não costuma alocar muitos recursos para a campanha presidencial em New York e na Califórnia, eis que são estados azuis, i.e., que pendem em geral para o Partido democrata. O mesmo comportamento é seguido, mutatis mutandis, pelos democratas no que respeita ao Texas e aos estados do Deep South (Sul profundo), que são vermelhos (e votam em maioria no candidato republicano).
Na linguagem da campanha presidencial, a vantagem de um candidato logicamente corresponde à desvantagem de seu antagonista. E vice-versa. A principal desvantagem de Barack Obama é a atual situação da economia. Na eleição de 1992, Bill Clinton superou a George H.W. Bush, o presidente em funções, pela então recessão, e por transmitir ao eleitor a sensação de que poderia melhor lidar com o problema. As atuais dificuldades de Obama com a economia – traduzidas em índice alto de desemprego (em torno 8,2%) e em números decepcionantes de novas contratações, o que é típico do panorama recessivo imperante – não podem mais ser jogadas no regaço do antecessor Bush jr., por mais irresponsável que tenha sido a sua gestão diante da crise do subprime e da grande recessão.
Será talvez no livro de Ron Suskind – Homens de Confiança – que se traçou o retrato sem retoques da relativa incompetência do novo presidente no primeiro biênio, e a resultante falta de medidas relevantes para combater a crise. Ao perder-se em inúteis discussões acadêmicas nos conciliábulos da Casa Branca, e ao não valer-se da maioria congressual de que então dispunha, Obama deixou passar o tempo, e, em consequência, o eleitor lhe aplicou o castigo americano nos comícios intermediários de 2010, i.e., a perda da maioria na Casa de Representantes, e a redução de sua bancada ainda majoritária no Senado. Em resultado, não tendo mais o controle do Legislativo, ficou de mãos atadas para a tomada de providências que virassem o jogo, e alavancassem a economia. Lá estavam agora os republicanos – com a nova bancada de ultra-direita do Tea Party – para barrar-lhe o caminho. A perda de oportunidades em política em geral costuma custar caro para os presidentes irresolutos.
É cedo, no entanto, para considerar Barack H. Obama como destinado ao obscuro papel dos presidentes de um só mandato, como o foram no século XIX James Buchanan, e no século XX, Herbert Hoover e Jimmy Carter. O líder da minoria republicana no Senado, Mitch McConnell não fez segredo da principal missão de seu partido, nesta época em que o espírito bipartidário semelha morto e enterrado: fazer que Obama entre para essa companhia de presidentes malogrados.
De que trunfos dispõe Obama para reeleger-se ? A par de ser o presidente em funções – vantagem não-negligenciável por atribuir-lhe os elementos do gabinete presidencial (e Harry Truman, pela sua indômita vontade, é talvez o melhor exemplo dessa posição favorável) – o 44º sucessor de George Washington aprendeu bastante no exercício do mandato. Por outro lado, Obama pode não ser um grande executivo, mas não é um aprendiz nem um tímido quando se trata de um pleito.
Já a sua eleição para o Senado, por Illinois, mostrara a sua capacidade. Terá sido, sem dúvida, a campanha para a Casa Branca em 2008 em que luziu com maior força, desconstruindo a pré-candidata favorita, Hillary Clinton, para tanto se valendo dos novos meios da internet, a par de mensagem de mudança (change), que lhe garantiu, em longas e difíceis primárias, a votação dos jovens.
Sem embargo, o problema com as promessa reside na circunstância de não traduzi-las na realidade. A campanha hodierna de Obama perdeu bastante do seu viço, justamente pelo fato de que, no gabinete oval, não soube (ou não pôde) transformar em dados concretos os seus votos de trazer a mudança para dentro do Belt-Way de Washington (vale dizer o espaço interior do anel rodoviário da capital, onde se concentram os instrumentos e os símbolos do poder).
Contudo, como referi acima, Obama tem evidenciado grande talento nas campanhas políticas, e a presente não constitui exceção. Por fortuna, abandonou o vezo do centrismo e da ênfase em governo por consenso. Uma temporada emWashington tende a convencer, mesmo os mais teimosos (ou obtusos) de que o espírito do bipartidarismo – ou a relação de cooperação patriótica entre democratas e republicanos – é figura do passado, substituída por atmosfera de faccioso sectarismo.
Por outro lado, nas últimas semanas os céus se têm desanuviado um pouco. A inesperada sentença da Suprema Corte afirmando a constitucionalidade da Lei da Assistência Sanitária Custeável livrou o presidente de um agourento fracasso. A vitória por cinco a quatro, pelo surpreendente voto do Presidente do Supremo, John G.Roberts, Jr., garantiu a Obama a implementação de uma grande reforma, perseguida desde a primeira década do século XX, e que as idiossincrasias americanas tinham até então inviabilizado. Proporcionou, a par disso, o galardão de um presidente que lograra realizar o que muitos de seus antecessores não tinham conseguido.
Barack Obama tem evidenciado, outrossim, como já referido, que é um temível adversário em campanhas políticas. Para que se tenha ideia disso, basta examinar o enfoque que tem logrado imprimir ao seu combate eleitoral.
Com efeito, através de propaganda negativa maciça Obama está dando a tônica da campanha, apresentando a atuação de Mitt Romney à frente da notória Bain Capital para desmistificar o alegado dom do candidato republicano de criar empregos. Ao invés de sua pregação eleitoral, Romney tem sido exposto como o homem que levava empresas a bancarrota, assim como despedia funcionários, dentro da suposta filosofia de Wall Street de amealhar polpudos saldos bancários à custa do sofrimento alheio.
A intensidade dada a esse tipo de campanha recorda o que obteve George Bush Jr. contra o Senador John Kerry, candidato democrata à presidência em 2004. Com a ajuda de um grupo de ex-combatentes no Vietnam, Bush transformou uma verdade – o heroismo de Kerry naquela guerra – em uma mancha no seu passado. Pouco importou para os hábeis diretores de sua campanha para a reeleição, que a tal mensagem dos swift boats (barcos velozes) fosse uma inverdade. Por não ter reagido a tempo, por pensar que a simples verdade seria suficiente (sem o apoio de uma reação na mídia) o candidato Kerry se deixou vencer por um truque publicitário de ética duvidosa.
Agora, os democratas parecem ter aprendido esta ‘lição’, a ponto de que a imprensa já assinale que a tática de Obama no que tange ao lado econômico (e empresarial) do milionário Mitt Romney segue o espírito do ataque feito contra Kerry por Bush jr.
Nesse capítulo, a campanha de Obama se orienta pelo princípio de marcar na mente do eleitor traços pouco favoráveis do adversário. É uma forma de condicioná-lo, o que não se afigura muito difícil na trajetória empresarial de Romney. Há uma reversão de imagem que pode ser irônica, mas que salpica o candidato do GOP com aparência tendente a pôr em dúvida a sua capacidade de criar empregos na economia, logo ele cuja especialidade na Bain Capital era de despedir funcionários...
A trilha para o seis de novembro é bastante comprida, muitos fatores pendentes podem tornar o desfecho ainda mais imprevisível, mas por ora semelha muito cedo para jogar a toalha. Obama está ainda de pé, e tem desferido jabs[1] e outros socos que debilitam o antagonista. Sem falar nas gafes de Romney, talvez herdadas do pai, como meter-se a desancar a Reforma da Saúde em um auditório de afro-americanos...
(Fonte:
International Herald Tribune)
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