Demorou bastante para que tomassem corpo as suspeitas dos órgãos oficiais sobre os incêndios no Pantanal. A cautela é decerto uma qualidade, mas negar a evidência em certas situações pode representar uma mostra de fraqueza da autoridade federal. Dada a amplitude das ditas "queimadas", essa caracteriza-ção corria o risco de ser confundida com uma cegueira voluntária da autoridade federal.
A evolução recente ensejou que o Governo Federal reconheça a situação de emergência decretada mais cedo em Mato Grosso do Sul, por força dos incêndios florestais que devastam o estado há mais de um mês e vem consumindo boa parte da vegetação do Pantanal.
O ato em apreço foi publicado em portaria da Secretaria Nacional de Proteção e Defesa Civil, ligada ao Ministério do Desenvolvimento Regional (MDR), o que foi implementado em edição extra do Diário Oficial da União, e já está em vigor.
Nesse contexto, o governador de Mato Grosso do Sul, Reinaldo Azambuja (PSDB), decretou situação de emergência em todo o Estado pelo prazo de noventa dias, por conta de "propagação de fogo sem controle, em qualquer tipo de vegetação, em áreas legalmente protegidas e não protegidas, com queda da qualidade do ar."
De acordo com o MDR, o reconhecimento garante que o governo estadual possa ter acesso a recursos da União para ações de socorro, assistência, restabelecimento de serviços essenciais à população e recuperação de infraestruturas públicas danificadas.
Alexandre Lucas, Secretário Nacional de Proteção e Defesa Civil, que assinou a portaria, está em Mato Grosso do Sul desde o fim desta semana. Segundo ele, os repasses vão custear transportes, combustível e locação de aeronaves para o combate aos incêndios. Por outro lado, a Polícia Federal cumpriu dez mandados de busca e apreensão nas cidades de Corumbá e Campo Grande, nesta segunda-feira, catorze de setembro. A operação (Mataá) tem por escopo identificar os responsáveis por promover queimadas na região. Dados do Prevfogo, (o Centro Nacional de Prevenção e Combate aos incêndios florestais do Ibama, em 2020 mostram que a área queimada no Pantanal já passa de 2,3 milhões de hectares, sendo 1,2 milhão em Mato Grosso e mais de um milhão em Mato Grosso do Sul (a extensão equivale ao território de Israel).
As investigações da P.F. recaem sobre cinco fazendeiros cujas propriedades se acham em áreas remotas do Pantanal. Por ora, não há mandados de prisão expedidos, porém podem ocorrer prisões em flagrante nos locais onde estão sendo feitas as buscas.
A suspeita é de que as queimadas em torno dessas cinco fazendas possam ter sido organizadas da mesma forma que o chamado "Dia do Fogo", no ano passado. no Pará quando fazendeiros teriam se articulado para atear fogo em áreas da floresta amazônica.
Nesse contexto, o chefe da delegacia da P.F. em Corumbá, Alan Nascimento, disse que os indícios são de que as queimadas realizadas nessas fazendas também foram intencionais.
"Elas ficam em áreas inóspitas que, de outra forma, dificilmente pegariam fogo. Os indícios apontam que esse fogo pode ter sido proposital - afirmou o delegado.
O Delegado Nascimento declarou que a Polícia pretende analisar o conteúdo de e-mails e mensagens de texto enviados pelos fazendeiros e seus funcionários para averiguar se houve algum tipo de orquestração entre os proprietários para dar início às queimadas na região.
Alan Nascimento disse, outrossim, que o volume das queimadas na região atrapalhou até a deflagração da Operação. O planejamento previa que helicópteros fossem utilizados durante a ação, mas a extensão da fumaça inviabilizou a sua utilização.
Efeitos no Sul e Sudeste.
A fumaça das queimadas no Pantanal e na Amazônia continua a chegar às regiões do Sul e Sudeste, e podem ter efeitos similares àquele de agosto de 2019, quando o céu de São Paulo ficou escurecido no meio da tarde , e nos recentes incêndios na California (oeste dos EUA) , quando ficou alaranjado pelos grandes incêndios florestais lá ocorridos.
Nesse contexto, os efeitos devem ser mais notados nos próximos dias, quando há previsão de queda na temperatura e aumento da umidade, ainda que alterações como nascer e pôr do sol avermelhados e céu de cor leitosa já sejam observáveis. Além dos efeitos meteorológicos, eles não se circunscrevem ao aspecto estético, pois tal ação criminosa origina uma fumaça repleta de partículas tóxicas e por conseguinte prejudiciais à saúde humana.
(fONTE: O Globo)