quinta-feira, 3 de julho de 2008

Fluminense x LDU - uma Reflexão.

Lamento o acontecido com o Fluminense na sua campanha pela conquista da Taça Libertadores. Jogou bem e na antiga maneira brasileira de um futebol leal. Deixou pelo caminho muitos adversários ilustres, que se acreditavam mais credenciados a avançar para a final. Embora não seja meu time do coração, sinceramente apreciaria estar hoje cumprimentando a equipe de Álvaro Chaves, cuja sede freqüentei no passado como sócio.
E, no entanto, pesa-me dizê-lo, o resultado era previsível. Depois de um esforço hercúleo, o jovem time do técnico Renato Portalupi morreu na praia. Nos minutos que antecederam a partida, em meio à euforia do estádio Mário Filho lotado, a alegre câmera da Globo nos mostrou diversas criancinhas, muitas pintadas com as tintas tricolores, e uma delas com fita branca a emoldurar-lhe a fronte inocente. Se aí ficasse, que bela visão seria ! Contudo, alguém, muito provavelmente o pai, escrevera os dizeres ‘a caminho de Tóquio’ ou cousa parecida. Devo confessar que, a despeito da beleza da menina, não gostei do que estava lendo. Era o mesmo estado de espírito que se mostrara nos rojões e foguetes lançados das arquibancadas do velho estádio de Alvaro Chaves, ao ensejo de um simples treino da equipe às vésperas do embate decisivo. O próprio superintendente Branco, que abrira os portões, reclamou das comemorações antecipadas.
De resto, com a prestimosa ajuda da mídia brasileira, que não faz segredo de patriótico e irreprimível otimismo, o júbilo e a empolgação se achavam por toda a parte. O entusiasmo, seja insuflado, seja espontâneo, se exibia e espoucava sem limites, na comemoração prévia de quem confunde mando de campo por mando de jogo. A ovação, na Roma antiga, era a homenagem do Senado e do Povo romano aos generais vitoriosos em difíceis campanhas. Só que aqui no Brasil muita vez a ovação é concedida antes do sucesso, na presunção, que deve ser bem arraigada, de que a dita vitória está garantida.
Lá estava, imodesto e imprudente como de hábito, o espírito do ‘ já ganhou’. Pergunto-me do porquê da firme, inabalável convicção do técnico Renato de que o seu time faria os gols que se fizessem necessários para ganhar a partida e o título. De onde tirava tanta segurança, que para outros poderia parecer bazófia? A determinação não carece de muitas palavras. Ao contrário, a discrição pode ser um instrumento mais eficaz para alcançar o próprio objetivo.
Há tantos exemplos do lamentável e penoso ‘ já ganhou’ – com o auxílio sempre prestimoso da mídia – que me limitarei ao primeiro avatar desse triste fenômeno que nos persegue a nós brasileiros. Reporto-me ao Brasil x Uruguai de 1950, que também teve como palco o Maracanã, e mais de duzentos mil espectadores.
Nenhuma equipe teria tantas razões para ser otimista. No quadrangular final, vencera de goleada a Suécia (7x1) e a Espanha (6x1). Faltava apenas o Uruguai, de Obdúlio Varela...E não é que, já no segundo tempo, Friaça aos cinco minutos abriu o marcador, para o Brasil a que bastava o empate ? Poupo ao leitor o que se seguiu, por demasiado conhecido.
Não posso permitir, todavia, que se achincalhe a seleção de 1950, uma das melhores que o Brasil teve. E o scratch de Flávio Costa, se permitiu a atmosfera do já ganhou na concentração de São Januário, na véspera da decisão pela taça Jules Rimet, tinha pelo menos a desculpa de lidar com tal situação por primeira vez.
Decerto, não é o que está ocorrendo com os seus sucessores. Não seria oportuno ter presente o sábio dito de quem desconhece o passado está condenado a repeti-lo ?
Desejaria acrescentar mais duas considerações. Li em jornal de grande circulação atribuir-se novamente ao estádio Mário Filho, ao velho e glorioso Maracanã, a designação – que nada tem de brasileira – ‘Maracanazo’, surgida além fronteiras em conseqüência do resultado do Brasil x Uruguai de 1950. Na verdade, o Maracanã já assistiu a muitas vitórias memoráveis da seleção e não tem culpa alguma dos fátuos entusiasmos e do espírito de ‘já ganhou’ de espectadores nas arquibancadas, e dos jogadores no gramado.
Por outro lado, da próxima vez, esperemos que o técnico arme um bom esquema tático para sua equipe, não a faça recuar demasiado, treine bastante a batida dos pênaltis e, sobretudo, diga aos comandados que, se perderem um gol ou não converterem penalidade máxima, não abaixem a cabeça. De preferência, mostrem brio, mantendo-a erguida, o que talvez os ajude a errar menos no futuro.

2 comentários:

Mauro disse...

Discordo desse ponto de vista. Como cobrar comedimento e cautela de algo que é intrinsecamente ilógico e emocional? Vai contra o espírito da coisa. No fim, vencer ou perder dá na mesma para os torcedores, mesmo que nunca tenham pensado nisso, pois o que precisam é reafirmar sua identidade de grupo. Basta de distanciar um pouco para ouvir os longos debates sobre "se a bola tivesse entrado" para reconhecer a perda de tempo e de faculdades envolvida. Sem falar dos ódios e sentimentos extremados que o torcer alimenta, principalmente nos mais simples. No fim, está mais para religião do que para diversão, e como cobrar comedimento ao padre e aos fieis em seu fervor?

Mauro M. de Azeredo disse...

Respeito o ponto de vista do comentarista, porém precisamos atentar para o fato de que, a despeito de envolver fatores emocionais, o jogo de futebol, como qualquer exercício agonístico, tem igualmente a ver com a vontade e a razão. Nesse embate que é essencialmente de desígnios opostos, será determinante para estabelecer-se qual parte terá mais elementos para prevalecer que esta parte saiba 'blindar' a sua própria convicção de que possui condições para neutralizar o adversário e implementar o próprio objetivo. Em toda e qualquer atividade lúdica, existe esse confronto. E decerto terá melhores condições de vencer aquele que, respeitando o adversário, não o deixa influir na sua auto-estima, de forma a que possa empregar o máximo da respectiva potencialidade.